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  • Crítica | Já Vimos Esse Filme

    Crítica | Já Vimos Esse Filme

    Já Vimos Esse Filme é a versão de Boca Migotto para o golpe parlamentar aplicado contra oo mandato da Presidenta da República Dilma Rousseff. Diferente de O Processo, de Maria Augusta Ramos, esse é um documentário mais formulaico e começa com depoimentos, desde gente mais simples como o pregador que abre o longa, além de falas de acadêmicos como Francisco Marshall, Bernardo Lucero, entre outros.

    O lado do filme é facilmente visto. Na boca dos que falam a respeito do quarto governo presidencial com o Partido dos Trabalhadores no poder, há tanto o assumir da negligência quanto ao combate a corrupção que ocorre em Brasilia, e também dentro do próprio partido. Mesmo as pessoas comuns e mais simples que são enquadrados pela câmera tem um olhar crítico sobre o modo de governar petista, em especial aqueles que acham que os dividendos vindo da exploração do petróleo e do pré-sal devem ser divididos com o restante do povo e não loteado para empresas estrangeiras, até os que engrossam o discurso direitista da saída de Rousseff, que vociferam que as pedaladas fiscais justificam o impedimento do exercer da candidatura, assim como flagra boa parte da paranoia desses mesmos manifestantes, que acreditam piamente que a luta de classes que ocorre no Brasil é culpa de um partido, e não da desbalanceada diferença de renda entre os poucos ricos e os muito pobres e consequente dificuldade de conquista de direitos para esses últimos.

    O desenho politico histórico dos golpes que foram dados (ou tentados) no Brasil são muito bem explicitados, explicados de maneira didática, em especial por Lucero, que explica como a morte de Getúlio Vargas desacelerou a tentativa dos militares de tomar o poder e como ocorreu com Jango, afilhado politico de Vargas no anos sessenta.

    No entanto, a vazão ao discurso de que as manifestações de 2013 tiveram como legado apenas os movimentos contra o PT, pró-golpe, semelhantes a Marcha da Família Com Deus Pela Liberdade que ocorreu pré-intervenção de 1964 é extremamente equivocada, mesmo porque foi nessa época que surgiram coletivos como a Mídia Ninja e tantos outros, não somente os grupos como o MBL. Ainda assim, o fato de se dar voz a discursos diferentes mostra um caráter bastante universal, mesmo que claramente pese mais para o lado que acusa o processo todo como um golpe e não como um impeachment legítimo.

    O documentário se dedica a grifar o ciclo repetitivo, e mostrar o quão frágil é a democracia brasileira, argumentando bem sobre os pequenos ciclos em que o Estado Democrático de Direito segue intacto. Apesar de apelar para algumas obviedades, Migotto acerta demais ao ir na contramão do que a imprensa grande faz, dando muito mais voz aos opositores do governo que estavam no poder à época do que normalmente os granes jornais e redes de televisão davam aos que consideravam injusto e arbitrário todo o processo politico que culminou na subida de Michel Temer ao posto de presidente do Brasil.

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  • Crítica | Operações de Garantia da Lei e da Ordem

    Crítica | Operações de Garantia da Lei e da Ordem

    O novo filme de Julia Murat, com codireção de Miguel Antunes Ramos é um arremedo de reportagens, coberturas jornalísticas e flagrantes virtuais que tomam por base as manifestações de cunho progressista que ocorreram recentemente, em especial as que tomaram o Junho de 2013, os protestos que rodearam a Copa de 2014 e mais recentemente, os eventos no entorno do Impeachment de Dilma Rousseff. Operações de Garantia da Lei e da Ordem é dividido em atos, ou melhor em passos que visam mostrar o quão hipócrita e mesquinha é a busca pela manutenção do status quo, independente de quem está no poder.

    As primeiras cenas são da presidenta Dilma, que à época, usava seu espaço enquanto comandante em chefe eleita para falar de alguns dos atos mais agressivos dos manifestantes que tomavam as grandes cidades brasileiras. De certa forma, esse foi o modo do documentário denunciar a culpa do Partido dos Trabalhadores e seus representantes em torno da promulgação da Lei Antiterrorismo que possibilita a qualificar manifestantes como terroristas. No entanto, o filme prossegue criticando a mídia manipuladora, em especial a Rede Globo de Televisão e seus demais canais de comunicação.

    Há um debruçar aprofundado sobre as coberturas da mídia independente como Mídia Ninja, Coletivo Mariachi e até ao (hoje sumido) Rafucko, mostrando uma época em que praticamente todos esses canais estavam em uma fase embrionária e falando no mesmo tom e língua. A investigação dos cineastas inclui a culpabilização de Bruno Ferreira Teles, um rapaz que ficou famoso por ter sido acusado pela Polícia Militar do Rio de ter arremessado um coquetel molotov nos agentes da lei, sendo tudo isso desmentido graças as muitas câmeras que habitavam essas concentrações. Tal caso também foi bastante investigado em Encriptado (Black Code), de Nick de Pencier, que esteve presente no Festival do Rio, com a diferença que Pencier teve acesso a Bruno diretamente.

    Fora o azedume com o modo como a Globo conduz sua Central de Jornalismo, há pouca contestação factual, nem mesmo nos momentos em que se discute as acusações a Marcelo Freixo de ter ligação com os Black Blocks. A sensação ao final é de assistir a um medley dos melhores momentos a respeito de tudo o que aconteceu politicamente nas ruas a partir de junho de 2013, com uma ironia fina e discreta que na maioria dos casos, mostrou pouco ou nada do motivo que a fez vir e o trabalho de Murat e Ramos é mais de curadoria e estudo do que de viés criativo. Não há nada de pejorativo nisso, aliás bons filmes recentes se utilizam de imagens alheias. Doméstica, Pacific, Carnívora são apenas alguns exemplos recentes brasileiros, mas em Operações de Garantia da Lei e da Ordem era esperado um pouco mais de senso crítico, ou um viés de discussão minimamente desenvolvido.

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  • Crítica | Real: O Plano Por Trás da História

    Crítica | Real: O Plano Por Trás da História

    Filme de humor involuntário que mira a qualidade de thriller político, Real: O Plano Por Trás da História é o longa-metragem de Rodrigo Bittencourt (Totalmente Inocentes) que pretende discorrer sobre a implantação de um novo plano econômico e uma nova moeda em território brasileiro, dado a crise inflacionária vivida à epoca, traçando um paralelo com a ascensão de Fernando Henrique Cardoso e seus partidários, desde a época em que foi ministro da Fazenda de Itamar Franco, até a presidência da república. O filme é contado através de uma entrevista do economista Gustavo Franco (Emilio Orciollo Neto) para a jornalista Valéria Villela (Cássia Kiss Magro), antes de uma CPI que ocorreria em 2003, no primeiro ano de mandato de Luiz Inácio Lula da Silva.

    O tom jocoso se dá principalmente graças as caricaturas dos personagens políticos do filme, em especial com Norival Rizzo fazendo FHC, em uma postura pouco parecida com a apresentada pelo sociólogo; de Bemvindo Siqueira, fazendo um Itamar histriônico e cheio de indagações sem respostas; e claro, o José Serra de Arthur Kohl – que claramente imita o político do PSDB – além é claro do senador (fictício) petista Gonçalves, interpretado por Juliano Cazarré que emprega três sotaques diferentes (mineiro, paulista do ABC e um nordestino genérico horrível) no decorrer do filme, mostrando uma imaturidade tremenda na composição de sua personagem.

    Parte dos elogios de algumas críticas – a maioria bastante pontual e parcial – é referente ao filme não utilizar em demasiado o linguajar dos economistas. Se por um lado há uma universalização de linguagem, por outro há também um esvaziamento de discurso. Há como se falar de um assunto tão complicado para o público leigo como os meandros da economia de um país sem tornar tudo enfadonho, A Grande Aposta fez isso e com um clima leve, Margin Call: O Dia Antes do Fim era mais pesado e mesmo com seus defeitos sabia passar a mensagem, e O Lobo de Wall Street apesar de ser um conto debochado, consegue traduzir muito melhor as questões financeiras importantes levantadas em seu roteiro, Real não passa perto disso.

    Muito se falou a respeito desse ser um filme anti-petista ou reacionário, e a realidade é que ele não é um e nem outro. Claro que há uma glorificação de figuras típicas do cenário tucano, em especial Fernando Henrique, que é visto como um homem acima dos outros, sendo esse o único a não sofrer a ira ou ingratidão de Franco, além de ser mostrado como uma pessoa distante de seus asseclas, como se os erros e trapalhadas em torno da implantação da moeda não fossem de sua responsabilidade. O curioso é que esse aspecto, de certa forma, revitaliza o argumento por muitas vezes associado à falácia, quando se tratava de uma defesa a não-ciência que eventualmente ocorria com os ex-presidentes Lula e Dilma Rousseff.

    O texto sofre com um maniqueísmo que torna todo o drama em algo imaturo, proposta que obviamente não parecia ser a inicial deste longa. Apesar de não tão ter nos personagens mais novos um tom tão parodial quanto com Itamar, FHC e Serra, há ainda uma construção muito rasa e arquetípica dos heróis da jornada, em especial de Gustavo Franco, que é um sujeito indócil, incorrigível e incapaz de apresentar qualquer nuance fora disso. Chega a ser estranho inclusive irônico que um acadêmico tão avesso ao socialismo possa ter uma admiração tão grande por um político que em seu passado, tinha tantas afinidades com a social-democracia, e é ainda mais risível uma quantidade de atitudes, como o uso do óculos de Franco para dar-lhe um tom despojado ao deixar o mesmo cair sobre seu rosto, assim como é escandalosamente boba a atitude dele invadindo um protesto em frente ao Banco Central, sendo esta uma bela versão em live-action de uma fanfic de direita. Outro momento constrangedor se dá quando ele ao ser recusado em um cargo que queria, joga para o alto um tabuleiro de xadrez de madeira, em uma cena que deveria parecer grave, mas que demonstra apenas a figura infantil do personagem.

    A personagem de Mariana Lima, Denise, também soa engraçada em alguns pontos, em especial graças a maquiagem carregada que ostenta, fazendo se assemelhar demais ao Coringa de Heath Ledger (Batman: O Cavaleiro das Trevas). Incrivelmente esta é uma das poucas personagens que tem uma mínima profundidade e apreço com a realidade, apesar de toda caracterização que lhe deram.

    Em última análise, a personalidade de Franco reflete demais a de muitos reacionários que vociferam opiniões intransigentes nas redes sociais, sem dar direito a qualquer outro argumentar contrariamente. Por isso, há por parte do público uma possível idolatria por esta versão do economista, e chama-se versão por que nem mesmo o Gustavo Franco original é tão teimoso e mimado quanto o representado por Orciollo Neto.

    Real: O Plano Por Trás da História tem uma dificuldade de identidade enorme, variando entre a comédia rasgada, graças ao deboche das figuras do cenário político brasileiro, variando entre o humor voluntário e involuntário, tornando difícil inclusive entender quais são as piadas propositais, visto que o roteiro de Mikael de Albuquerque não é claro quanto a isso. A meta de ser um thriller político também não é alcançada e o conjunto de músicas é até engraçado, com composições em sua maioria feitas por Maycon Ananinas e pelo próprio diretor, (com pérolas como Baila FHC, Exu Reunion, etc) ainda que não sejam mal executadas em tela. Bittencourt abusa de cortes rápidos, que em alguns momentos cansam seu espectador mas em outros aumentam a aura de tensão em torno dele. Claramente o diretor amadureceu desde Totalmente Inocentes, sendo este menos equivocado no geral que o anterior, mas claramente seu cinema não parece maduro o suficiente para algo tão grandioso e ambicioso quanto a transposição da literatura de Guilherme Fiuza (3000 dias no Bunker) quanto para contar uma história política tão densa e com discussões tão fortes como as propostas por um filme que pretende remontar a origem deste Plano Real.

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  • Crítica | O Mundo Segundo Lula

    Crítica | O Mundo Segundo Lula

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    Ao iniciar seu filme com um passeio por Brasília, German Gutierrez demonstra um pouco do que seria a incerteza da subida ao poder por Luiz Inácio Lula da Silva rumo ao palanque máximo do país brasileiro. A cerimônia de passagem de faixa de Fernando Henrique Cardoso, claramente contrariado, simboliza um pouco do que a narradora diz, os resquícios do que a burguesia pensava ao assistir a ascensão de um membro do proletário ao poder.

    Para Lula, sua vitória após tanto tempo é a mostra de uma evolução do pensamento do povo brasileiro, finalmente rompendo com a mentalidade de país colonial e colonizável, sempre subordinando-se às economias de países mais ricos e claramente exploradores. O começo da carreira do político foi feito em plena ditadura militar, em meio a um regime opressor que esmagava o homem.

    De família pobre, demorou a se alfabetizar, o que claramente se reflete nas suas falas tacanhas e repletas de vícios linguísticos, como a supressão do plural. Este defeito serviu bem para ele, ao menos num segundo momento eleitoral, uma vez que o aproximava do povo com quem ele tencionava falar. Aos trinta anos, tornara-se líder sindicalista, apoiando as eleições diretas, ao invés do regime ditatorial, como “único modo do povo se manifestar”. A partir daí, se explora o começo da trajetória do metalúrgico enquanto um governante.

    O horizonte mostrava o povo como um parceiro do político, feliz com o seu modo de tratar as relações exteriores, alguns até surpresos pelas origens humildes de sindicalista, mas as críticas também são devidamente documentadas, ainda que o cunho destas seja deveras tímida e comedida.

    A feitoria do filme foi logo após a reeleição de Lula, e não menciona em nenhum momento os escândalos políticos de seu partido, como o Mensalão, ainda que haja uma pequena menção nos letreiros ao final, claro, destacando-se o crescimento do país em um cenário mundial. A sensação de O Mundo Segundo Lula é um filme institucional é enorme, ao analisar-se seu caráter chapa-branca, mas é importante de ser analisado na contemporaneidade, especialmente pela avalanche de desinformação que corre a rede mundial em relação aos avanços do país nos anos em que Luiz Inácio foi presidente da República Federativa do Brasil, e a respeito de quem tem ou não lutado ao lado do proletariado brasileiro. Nisto, o filme de Gutierrez traça um bom prospecto, obviamente atentando para o bom mocismo do político.