Crítica | Os Estranhos 2: A Caçada Continua
Voyeurismo. Um dos maiores temores até para quem não conhece a patologia pelo nome, sendo quase uma forma de curiosidade mórbida com relação ao que é privativo, privado ou íntimo. Essa impotência por si só já é uma tortura, uma sensação de profundo desagrado, a privacidade indo pelo ralo. O irônico é notar como esse fato, cada vez mais presente com hackers invadindo webcams via redes wi-fi já foi mostrado num sem-número de produções semelhantes de antigamente e de hoje em dia, explorado com êxito por tantos tratados de Cinema de grande ou questionável qualidade.
Mas se o que importa para um tema já dilacerado é a dosagem para a sobrevivência da temática, os soberbos filmes de John Carpenter (Halloween, Eles Vivem, O Enigma de Outro Mundo) são de longe o que de mais saudável foi cometido a favor do cinema de suspense e de terror do século XXI, conseguindo nutrir inclusive uma grande prolixidade além do gênero em uma aula de closes tenebrosos, sonoridade contínua, construção atmosférica impecável e insinuante, realmente sedutora para quem é fã ou não de uma boa tensão, e uma iluminação claustrofóbica inspirada por clássicos de Alfred Hitchcock (Psicose) e Jacques Tourneur (Sangue de Pantera). Carpenter foi O cara, e segue sendo, principalmente quando assistimos pequenos filmes como Os Estranhos 2: A Caçada Continua, de Johannes Roberts (Medo Profundo).
É aquela história de sempre, tratada da mesma forma de antes: longe de todos, e na pior noite das suas vidas, membros de uma família começam a ser perseguidos e abatidos feito gado por três assassinos mascarados, sem espaço para piedade e com aparente falta de motivação para a insistente matança. O filme usa bem o potencial atmosférico criado pelo uso das máscaras: insensíveis e desumanas na caracterização do medo ambulante que usa de facas e machados no meio de um acampamento para promoverem o caos, mas peca pela total falta de criatividade não na condução da trama, mas sobretudo no roteiro propriamente dito, e o incômodo nisso chega a ser grande.
Quantas vezes já não vimos e nos divertimos com Jason, Freddy, Chucky e principalmente, Mike Myers caçando suas vítimas sem descanso, nos fazendo reféns junto às pobres ovelhas de um medo icônico que tão bem ilustra o poder do terror americano suburbano? Já para a sequência do bom Os Estranhos, de 2008, mais parece que o tempo não amadureceu uma suposta ideia original, e a história agora se apoia e gira em torno do que sobrou de elementos que ainda perturbam, mas já não são relevantes para um bom conto de horror em 2018, e não mais entretém alguém que mantém contato mínimo com o mundo macabro dos sociopatas cinematográficos.
Boas cenas como o assassino espiando sorrateiro no fundo da imagem, a morte na piscina e todo o confronto que a antecipa salvam o filme da mesmice que ele nunca foi projetado para evitar ter. A Corrente do Mal ou o japonês Eu Vi o Diabo, filmaços recentes que lidam de uma forma muito mais engrandecedora com essas forças malignas e implacáveis da natureza, travestidas ou não de seres humanos desumanizados a cada morte que cometem, são ótimos exemplos macabros e perfeitamente pontuais de uma homenagem ao passado, mas que não falham em tentar uma revitalização de um gênero sempre cativante – em mãos certas, ainda mais naquelas que mantém o legado de Carpenter como uma bússola confiável. Quanto à Os Estranhos 2, valeu a tentativa, mas fica por isso mesmo.
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