Caio Oliveira e as Paródias em Quadrinhos
A produção nacional de quadrinhos é prolífica em paródias, em suas diferentes vertentes. Seguindo a tradição nacional de sucesso no humor, esse tipo de abordagem ganhou espaço e notoriedade por explorar chavões e clichês para gerar comicidade (e driblar licenciamentos editoriais).
Assim, não é de se espantar que o trabalho de um fenômeno da gibisfera brasileira como Caio Oliveira ganhe notoriedade com a velocidade que ganhou.
O quadrinista brasileiro tem uma capacidade ímpar de captar em seus Quadrinhos o zeitgeist e trabalhar a partir de uma perspectiva amplamente metarreferencial, empregando o humor como força motriz de suas inventivas histórias. Seguindo essa linha, temos aqui três diferentes trabalhos do autor, com propostas tão distintas quanto se poderia imaginar, mas que carregam consigo o humor gerado a partir da intertextualidade como traço marcante.
Em All Hipster Marvel, Caio apresenta uma sátira à cultura hipster, desenvolvida através da intertextualidade paródica em relação aos heróis da Marvel Comics, ironizando alguns dos clichês das histórias da editora, através de minicontos em cores e traços cartunescos, nos quais o riso é o alvo, nem tanto uma linha narrativa unificada e coerente. A HQ possui vinte páginas e foi publicada em papel reciclado, com lombada canoa.
Com Panza o quadrinista apresenta uma aventura de Sancho Pança, o fiel escudeiro de Dom Quixote, entrando em uma jornada para descobrir a verdade acerca da missão que norteou a vida do já idoso e doente Dom, enquanto sua sanidade é colocada à prova por seus surpreendentes inimigos.
Menos sarcástica que a história anterior, Panza investe em um traço mais firme e bem delineado em preto e branco, se aproximando muito mais do padrão das animações do que das charges, novamente brincando com referências até mesmo anacrônicas como o Monstro de Frankenstein saltar das páginas de um livro para enfrentar um assustado e impotente Sancho dentro de um moinho de vento.
O desdobramento criado por Caio a partir da história original conta com um humor mais comedido em seu tom, em contraponto com a narrativa visual expressiva e repleta de dinamismo em sua diagramação. Dessa simbiose, o autor concebe uma história que devolve o heroísmo ao Quixote, agora não mais um louco, mas sim um visionário incompreendido por seus pares, que repassa seu legado ao fiel e roliço escudeiro, forjando assim um herói improvável, mas o primeiro sidekick da história. Também em lombada canoa, Panza conta com quarenta páginas, impressas em papel pólen, além de capa cartonada.
Em R’lyehboy temos uma salada de referências saltando das páginas, passando por Hellboy, H.P. Lovecraft, Raça Negra e toda a estética e mecânica dos jogos de RPG como Dungeons & Dragons, em páginas dispostas no formato horizontal, com poucos quadros e uma proposta de traço que brinca com o expressionismo que norteia o trabalho de Mike Mignola em choque com o traço cartunesco já característico de Caio.
Assim acompanhamos a história nonsense de um investigador sobrenatural, claramente inspirado na criação máxima de Mignola e no famoso Cthulhu, símbolo maior da literatura lovecraftiana, diante de ameaças bizarras de toda sorte, como vikings cujo canto de guerra se assemelha a uma paródia de “É tarde demais”, do grupo de pagode Raça Negra. Falar em nonsense, como no início deste parágrafo, não se mostra um exagero agora que temos uma pequena noção do que estamos falando aqui, não é mesmo?
Como as duas obras anteriores, R’lyehboy foi publicada também em capa cartonada, lombada canoa e setenta e duas páginas e emula o padrão visual das capas de Hellboy, de Mignola.
Publicadas pela Quinta Capa e financiadas através do Catarse, as revistas de Caio Oliveira tecem um padrão narrativo hilário e despojado, fortemente calçado na paródia como estratégia de composição discursiva, alternando até mesmo entre estilos de narrativa visual de acordo com as propostas de cada história, evidenciando a versatilidade do quadrinista brasileiro, dono de um texto ácido e de uma arte dinâmica, que arrancam boas risadas até mesmo do leitor mais carrancudo.
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