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  • Crítica | Democracia em Vertigem

    Crítica | Democracia em Vertigem

    Democracia em Vertigem, documentário de Petra Costa, começa mostrando imagens de bastidores do Sindicatos dos Metalúrgicos do ABC, durante o dia que Luiz Inácio Lula da Silva foi preso. Há uma licença poética que o filme seja liberado pela Netflix na época em que vazamentos de conversas entre os responsáveis por todo o processo que pois o ex-presidente na cadeia.

    Tal qual foi Elena, esse é um filme pessoal, narrado pela própria, com uma direção e edição pesada, aproveitando a época do impeachment de Dilma Rousseff como ponto de partida, tal qual outros filmes também fizeram, a saber, O Processo, Já Vimos Esse Filme, Excelentíssimos etc. O filme de Petra se assemelha a este último, que em cima de seu lançamento, mudou um pouco seu viés, deixando de ser um filme sobre o golpe, passando a ser sobre a conjuntura mais atual, o que é natural, pois o impeachment parece ter ocorrido há décadas atrás.

    Ao falar do passado do Brasil, Petra tenta fugir de seu estilo de narrativa, apelando para um estilo de documentário diferente do que geralmente faz, lembrando um pouco do cinema de Silvio Tendler e outros exemplares  como Peões de Eduardo Coutinho e O ABC da Greve de Leon Hirzman, resgatando uma boa memória de construção do ideal político de Lula.

    O filme faz bastante uso de imagens de arquivo, mas também algumas pessoais, filmados pela própria diretora, com 19 anos comemorando a eleição do metalúrgico ao maior posto político do Brasil. Em sua narração, se nota que os abraços que ele dá no congresso refletem seu carisma, e seu espírito de conciliação. A voz de Costa conduz o longa, e interfere demasiado na mensagem, ao passo que condena a aproximação do PMDB, afirmando que o PT e seu presidente pecaram exatamente no que sempre atacou em seus adversários, se misturando com o partido mais repleto de patifaria.

    Lula dizia que Jesus se viesse ao Brasil, teria que fazer aliança até com Judas, e o destaque a essa frase no meio do filme faz ele soar muito maniqueísta. O documentário tenta ser poético, falando do distanciamento geográfico de Brasília do povo, mas no final das contas, fica parecendo bobo apenas, e em alguns pontos é irresponsável e  bastante generalista, quando fala do movimento de 2013, afirmando que o Vem Pra Rua tinha em sua gênese uma mentalidade direitista e anti comunista, e isso é bobo, tosco, e mentiroso, em especial quando utiliza uma forma de contar história generalista, falando que a mídia tradicional apoiou as manifestações daquele Junho, o que é mentira. Há inúmeros episódios (alguns até engraçados, como a vez que José Luiz Datena fez uma enquete sobre manifestações com baderna serem positivas ou não), e as grandes emissores de televisão  e os jornalões condenaram os Black Blocks, e havia claro campos progressistas nas passeatas, negar isso é ser mentiroso.

    Há zero novidade por em contra posição as falas de Eduardo Cunha, afirmando que Impeachment não pode ser arma eleitoral, depois acolhendo o processo. É redundante, Petra joga pra torcida, quem conhece a historia não muda em nada seu pensamento, e quem é oposição também não é nem um pouco atingido por isso, parece que esse trecho é mais protocolar do que qualquer coisa. O filme em última análise serve bem como resumo dos fatos, para alguém completamente alheio a historia, é um filme bom, mas somente isso, para quem sabe como foi todo o processo, há zero novidades, mesmo com as entrevistas a políticos notórios, como Roberto Requião, Paulo Maluf, Jean Willy,e uma tentativa (fracassada) de conversar com Aécio Neves.

    Tal qual o filme de Douglas Duarte, esse dedica um bom tempo em desenrolar Bolsonaro como candidato em 2018, embora sua campanha estivesse bem tímida neste momento. Ao menos, Democracia em Vertigem não tem vergonha em assumir um lado, afirmando que o grande problema do país era a relação do grande empresariado brasileiro com a política nacional, seja ela do viés que for, tanto em Collor, nos governos tucanos ou petistas, ou mesmo com Jair Bolsonaro. O problema é que por conta das fragilidades dos discursos que Petra escolhe, esse argumento se dilui. É um filme de extrema vaidade, e há preocupação até em esclarecer a familiaridade da diretora com os  Andrade e Gutierrez, fato que faz ele passar  do ponto. A forma como o filme digere a conjuntura política é bem apaixonada e carente de razão, e isso não seria um defeito se o filme não tivesse a pretensão de soar mais sério e sóbrio que o resto da filmografia de Petra Costa, e por mais que tenha boas intenções,  Democracia em Vertigem  soa frívolo e parcial demais, quase míope na maioria de suas análises, e só acrescenta realmente para quem não sabe absolutamente nada da dantesca história do Golpe de 2016 e todo o desenrolar político posterior.

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  • Crítica | Olmo e a Gaivota

    Crítica | Olmo e a Gaivota

    Olmo e Gaivota 1

    Nova produção de Petra Costa – diretora de ElenaOlmo e a Gaivota é um filme bem ao estilo do outro sucesso de Costa, se valendo da literalidade do texto para desenvolver uma história metalinguística ao extremo. A fita depende fundamentalmente da entrega da atriz Olivia Corsini, que exibe seu corpo grávido, e alma também gestante, para exemplificar a rotina de uma artista temporariamente “impedida” de trabalhar.

    O acréscimo da co-diretora Lea Glob talvez tencionasse acrescentar mais um ponto de vista ao panorama artístico da obra, mas pouco se exprime desta parceria. O maior mérito do longa certamente é a a entrega de Olivia, uma mulher real, cheia de neuras e inseguranças em relação a si, aos seus e ao futuro que espera.

    A estética de Olmo e a Gaivota é completamente pautada na visão européia de cinema, tanto nos diálogos montados quanto nas situações flagradas pela câmera. O aspecto que pode ser encarado como defeito é a desnecessária intervenção da direção, que faz quebrar desnecessariamente a quarta parede, sem qualquer desculpa narrativa plausível para tal, estando prestes até ao terrível trocadilho de abortar os bons momentos do documentário dramático.

    Semelhante demais a Elena, a nova produção de Petra Costa quase não acrescenta nada à filmografia da diretora, resultando em uma redundância da própria em reprises que fazem a expectativa do espectador ser frustrada. As cenas ao menos são bem conduzidas, driblando inclusive o incômodo déjà vu artístico visto na película, que vale ser conferida graças à beleza inestimável da gravidez de Corsini, bem como seus nus e seu exercício dramatúrgico.

  • Agenda Cultural 53 | Angeli, Demolidor e Guerra Mundial Z

    Agenda Cultural 53 | Angeli, Demolidor e Guerra Mundial Z

    agenda53

    Bem vindos a bordo. Flávio Vieira (@flaviopvieira), Rafael Moreira (@_rmc), Isa Sinay (@isasinay), Jackson Good (@jacksgood), Filipe Pereira e Bruno Costa (@zumbirosca), dos blogs/podcasts Os Cinefilos e  Cruzador Fantasma, além da participação pontual de Mario Abbade (@fanaticc) em nosso bloco de cinema, se reúnem para comentar sobre o que rolou no circuito cultural das últimas semanas.

    Duração: 108 min.
    Edição: Rafael Moreira e Flávio Vieira
    Trilha Sonora: Flávio Vieira
    Arte do Banner: 
    Bruno Gaspar

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    Comentados na Edição

    Quadrinhos

    Resenha Toda Rê Bordosa – Angeli (compre aqui)
    Resenha O Lixo da História – Angeli (compre aqui)
    Resenha Demolidor 1 – Mark Waid (compre aqui)
    Actions Comics – Novos 52 – Grant Morrison

    Literatura

    Roberto Bolãnos – Chamadas Telefônicas (compre aqui)

    Cinema

    Crítica Em Transe
    Crítica Um Golpe Perfeito
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    Crítica Antes da Meia-Noite
    Crítica O Lugar Onde Tudo Termina
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  • Crítica | Elena

    Crítica | Elena

    elena_poster

    A definição fácil, e bastante incompleta de um documentário, é que, em oposição a ficção, se trata de um retrato da realidade. Há muito a dizer sobre o processo narrativo em documentários, o olhar do diretor e as escolhas de montagem, mas é senso comum dizer que são filmes que utilizam o real como matéria prima. Essa definição é a primeira coisa que Elena põe em cheque.

    O filme de Petra Costa é todo construído em cima do que não se sabe, mas completa-se no sonho, na memória, nas histórias. O desconhecido é Elena, irmã mais velha da diretora que aos 20 anos foi para Nova York ser atriz e consumida pela solidão, a angústia e a aridez da profissão que escolheu acaba se matando, deixando para trás a irmã de 7 anos. 20 anos mais tarde é Petra que se matricula no curso de teatro da Columbia e busca na cidade os rastros da irmã que não chegou a conhecer realmente.

    Elena é um misto de investigação e carta aberta, uma tentativa de reconstruir quem foi aquela jovem e o que a levou a seu fim e ao mesmo tempo uma confissão e desabafo em que Petra diz a irmã mais velha tudo aquilo que nunca teve chance. Poético, mais do que documental, ele se utiliza de depoimentos, imagens de arquivo e mesmo cenas gravadas que lembram video-arte.

    O documentário vai se construindo em fragmentos: ouvimos o nome de Elena já na abertura, mas é aos poucos que descobrimos quem é essa pessoa, qual sua relação com a diretora e o que afinal aconteceu com ela. Petra Costa constrói bem sua narrativa e prende o espectador, que se vê curioso para descobrir quem é essa moça, porque está sendo um filme sobre ela e onde está ela agora. Entretanto, conforme a história de Elena fica mais clara, sua personalidade se nubla e, assim como a irmã cineasta, nos vemos diante de um quebra-cabeça sem resposta, uma história que só se pode completar com ficção.

    Petra anda pelas ruas de Nova York, fala com a mãe, reconta a história da família e sua ida para a clandestinidade nos anos 70. Contudo, o filme nunca almeja ser sobre a cidade, ou sobre a ditadura, ou famílias na ditadura, é sobre aquela família, aquela moça, aquela história, excessivamente pessoal, Elena é um sopro de ar fresco no cinema brasileiro que busca sempre evitar o íntimo, o lírico e falar das grandes questões sociais do país. É corajoso da parte da diretora ignorar a tradição mais forte do cinema nacional e sem qualquer disfarce falar de si, construir um filme confessional ao extremo, um filme que expurga demônios e acaba entregando algo que falta.

    Porque Petra Costa é talentosa e sua poética é fluída e metafórica, o filme transcende a pequena crise pessoal de onde nasceu e se transforma em uma história sobre a arte, a necessidade da arte e os meios pelos quais as pessoas se perdem. Porque ninguém é absolutamente único e a experiência humana tem sempre algo de universal, ao falar de si e de sua irmã, a cineasta fala ao espectador, às dores e angústias daquele que a assiste e entrega um filme que comove, faz rir e chorar e que envolve quem assiste naquele mistério.

    Contar o que se sabe é algo muito pouco feito no cinema brasileiro, é mais comum vermos jovens de apartamento em bairros nobres falarem sobre uma vida no morro da qual tem pouca ideia, Petra assume seu próprio universo e constrói ali um mundo. Elena é um filme simples, despretensioso e delicado, mas que se torna memorável porque fala a algo de íntimo e sentimental com uma beleza óbvia. No fim, quando a autora abandona um pouco a história da irmã para contar a sua própria, o filme escorregue para algo meio “meu querido diário” que quebra a narrativa forte que vinha se construindo até então, ainda assim tem qualidade e é um dos acontecimentos mais únicos no cinema brasileiro atual.

    Texto de autoria de Isadora Sinay.