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  • Resenha | De Que Lado Você Está? – Guilherme Boulos

    Resenha | De Que Lado Você Está? – Guilherme Boulos

    A extrema direita comanda o Brasil em 2020 e assim o isola, nas trevas da ignorância e da radicalização sobre tudo e todos. E a esquerda, com isso? Mais perdida e bombardeada que cego em tiroteio, segue colhendo os cacos da demonização atribuída a ela – não apenas por seus erros do tempo do PT, mas para manter no poder vigente o fascismo que assolou o ex-país colorido e amoroso do Carnaval. De certa forma, De Que Lado Você Está? expõe e analisa a conjuntura política, econômica e social de 2014 pra cá, ostentando uma ingenuidade com gosto de esperança quanto a uma mudança sociopolítica, reconhecendo porém que o Brasil possui problemas estruturais e crônicos que só boas intenções jamais irão resolver. Mas Guilherme Boulos é um humanista, e ler suas palavras e reflexões urbanas sobre São Paulo e o Brasil pode ser um bálsamo para tempos de negação do Governo Federal até mesmo acerca de uma pandemia global no século XXI.

    Longe de portar um elitismo em suas análises, o realismo de Boulos serve para transmitir soluções e críticas aos erros e vícios da nossa mídia, da nossa política e nossos valores nacionais. Não é novidade para ninguém que a corrupção é sobrenome do Brasil, e que desde o “impeachment” de Dilma Rousseff, racistas e homofóbicos e neonazistas saíram do armário empoderados por um discurso de ódio e confronto. Em menos de 5 anos, a política do “todo mundo ganha” de Lula morreu, empurrada pelas crises econômicas externas e a lógica do “tem que matar uns 30 mil pra dar jeito nesse Brasil, tá okay?!?!”. Boulos investiga a engrenagem e a mentalidade destas eras políticas, e nos leva a refletir, por um viés solidário, os seus apelos temporários e as suas consequências a médio e longo prazo para com o cidadão e sua vida em comunidade. O Brasil nunca deixou de ser uma continental Casa Grande, cuja “elite”, ao ver o filho negro da empregada fazendo pós-doutorado na USP, resolveu parar com essa palhaçada.

    Custasse o que for. Em poucas páginas, Boulos esclarece a estratégia e a tática da esquerda brasileira, para garantir o bem estar das classes médias e baixas, e o fim da radicalização partidária para enfrentarmos, juntos, os poderosos e seus serviçais no Governo, e na mídia, por trás deste projeto de desmonte e emburrecimento do Brasil. Com foco prioritário em São Paulo em seus 42 artigos publicados de 2014, a 2015, já prevendo o fenômeno “mitológico” de Jair Bolsonaro, João Dória, Ricardo Salles e outras gárgulas do submundo, Boulos revira desde o lado obscuro do transporte público paulistano (a cartelização e os negócios ilícitos por trás das concessões de milhares de ônibus e micro-ônibus, em São Paulo), até o pensamento coxinha do sul e sudeste, e o custo do neoliberalismo no (inexistente) progresso da nação. De Que Lado Você Está? destrincha as feridas abertas do país, e sobretudo simboliza a esperança de uma figura política de esquerda para com um futuro menos contraditório, e mais humanitário, nesta década de 2020 a frente.

  • Resenha | Último Aviso

    Resenha | Último Aviso

    Poucas obras conseguem produzir um profundo e ao mesmo tempo divertido debate sobre o papel da mulher e do homem na sociedade quanto Último Aviso, publicada em 2010 no Brasil pelo selo Barricada, da editora Boitempo. Em seu renomado trabalho de caricaturar a realidade dos sexos e seu icônico “embate” ao longo da vida, sem contar sua difícil e complexa relação de poder (que torna o mundo o que ele é), a cartunista alemã Franziska Becker usa do seu sarcasmo e afiadíssima sagacidade para impressionar os mais sensíveis com seus comentários e críticas ilustradas, ou aqueles que encaram as artes apenas como um entretenimento descompromissado, no fim do dia. Toda arte é política, todo artista sabe disso, não há escapatória para o público, e Becker trata de nos lembrar deste fato a cada página desta coletânea.

    Seus desenhos são como onomatopeias visuais, estridentes em suas cores e situações quanto ao absurdo que domina a base do nosso cotidiano. Cotidiano este resiste entre as gerações que o perpassam, e cujo apelo se faz universal para todos os públicos que permitem-se encantar pelos traços e a dinâmica inconfundíveis de Becker, que já inspirou tantos gigantes mais famosos que ela, hoje em dia. Sem limites em sua retratação das rotinas e do banal, Becker usou, durante toda a sua carreira, de um surrealismo que serve para invocar o lado cômico da vida, geralmente urbana, dialogando por essência com o ridículo das crises de meia-idade, ou do papel que pode ser desastroso dos homens nas atividades domésticas – quase sempre relegadas ao “sexo frágil” feminino. A crítica social de Becker é tão forte quanto irresistível, conseguindo fazer com que o mais machista dos seus leitores ria com os seus desenhos, para logo depois sentir vergonha por ter traído seus pobres ideais.

    É por isso que Último Aviso guarda em si grandes possibilidades de impacto. Temos aqui um verdadeiro mural de representações sobre o coletivo e o indivíduo, o culto pela beleza, moda, apropriação cultural, e até a vida sexual das pessoas – tudo sob um olhar irônico e delicioso. O jogo proposto em cada um dos seus desenhos é o de brincar com os arquétipos e estereótipos sociais ao nosso redor, e como eles moldam a estrutura das sociedades ao redor do mundo, em especial a sociedade alemã que, a grosso modo, é igual a qualquer outra. Becker, hoje com mais de 70 anos, cresceu no país europeu no pós-segunda guerra, e foi altamente empoderada pelo amor que seus pais tinham nos livros, e nas artes em geral. Isso é percebido, em especial, nas doze tirinhas que compõe as histórias de Felicidade de Mãe e Retrato do Artista Quando Criança (na clara alusão a James Joyce), a respeito de como nossos pais nos afetam, para o bem e para o mal, já que de médico e louco todo mundo tem um pouco.

    Assim, nota-se na evolução cronológica que as páginas de Último Aviso concedem a vasta obra da artista, que todo o comentário social (com toques apimentados de deboche), antes fortemente lançado no papel dos sexos na civilização, ampliou-se para outros temas que surgiram com as décadas, tais quais o protagonismo cada vez maior da tecnologia na vida humana, a violência com o meio-ambiente, ou o lado bizarro e alienante do capitalismo. O olhar satírico de Becker nunca mudou, mas aumentou com segurança o seu campo de alcance analítico. Vale destacar, também, que a arte de Becker é feita para adultos, uma vez que leva consigo uma gama de significados que só podem ser realmente compreendidos por quem já passou por certas loucuras que a vida nos presenteia. Isso está celebremente expresso em cada traço de Becker, o que torna o folhear desta coletânea um passeio quase epifânico na galeria de sua vida.

    Compre: Último Aviso.

  • Resenha | A Verdade Vencerá: O Povo Sabe Por Que Me Condenam

    Resenha | A Verdade Vencerá: O Povo Sabe Por Que Me Condenam

    A carreira de Luiz Inácio Lula da Silva é controversa até entre seus defensores e simpatizantes, a quem A Verdade Vencerá: O Povo Sabe Por Que me Condenam é destinado. Aos opositores mais extremos que afirmam que o político tentou implantar o comunismo no Brasil realmente não há o que argumentar, seja só para discutir ou para convencer, uma vez que ignoram a lógica. Na parte detrás do livro que Ivana Jinkings organizou com ajuda de Juca Kfouri, Maria Inês Nassif e Gilberto Maringoni lemos uma frase icônica “(…) não fui eleito para virar o que eles são, eu fui eleito para ser quem eu sou. Tenho orgulho de ter sabido viver do outro lado sem esquecer quem eu era“, e é nesse sentido que o livro se desenvolve.

    O livro desenvolve brevemente o início da trajetória como líder sindical – que Lula iniciou em 1977; passando pela construção do Partido dos Trabalhadores e sua ascensão popular, depois de algumas derrotas eleitorais até finalmente assumir a cadeira de Presidente da República e eleger sua sucessora. Para Lula, a ideia do PT sempre foi a de democratizar o Brasil por meio de seu partido, no intuito de dialogar com a população menos favorecida sem academicismos, de maneira franca.

    Na nota da edição, Ivana destaca duas datas importantes de janeiro de 2018, a primeira como dia 24, onde o presidente foi julgado e (ao ver dela) injustiçado, e dia 31 onde ele recebeu Ivana e outros entrevistadores para conversar. O livro da editora Boitempo contém  mais de 200 páginas e é composto por alguns textos de notáveis, como Luís Fernando Veríssimo, que faz o prólogo, anotações de Eric Nepomuceno, um artigo de Rafael Valim e uma cronologia da vida do politico feito pro Camilo Vannuchi.

    Luiz Felipe Miguel defende a tese de que a prisão de Lula é um segundo passo do movimento que antes cometeu o golpe em Dilma Rousseff, um movimento que visava aprovar medidas antipopulares como a reforma da previdência, que ao ver do escritor só foi freada pela proximidade das eleições, e a necessidade de reeleição dos que compõem o Congresso Nacional. Essa conclusão não é necessariamente acertada, uma vez que a pressão popular realmente pesou contra, além de alguns movimentos de imprensa livre, independente dos votos, até porque claramente boa parte dos que votaram a favor do congelamento do teto de gastos em pastas como Educação, Saúde e Cultura estão entre os candidatos com maior possibilidade de votos na eleição de 2018. Miguel também faz uma mini descrição da trajetória de Lula, dizendo que sua condenação se deu por suas virtudes e não por seus defeitos, e fica difícil analisar esse pequeno texto que não pelo viés de um sujeito que enxerga Lula como um herói incapaz de cometer falhas. Nenhuma simpatia política deveria suplantar o senso crítico, ainda que sua condenação tenha ocorrido de forma injusta.

    A entrevista foi feita nos dias 7, 15 e 28 de fevereiro de 2018, pelos quatros entrevistadores. Há alguns bons momentos nessa conversa, como quando Lula diz que não queria voltar a presidência em 2014, comparando sua carreira com a de um jogador que brilha muito num time e tem medo de um retorno já sem o mesmo brilho. O entrevistado faz questão de deixar claro que não havia cisão entre ele e Dilma Rousseff, e que a imprensa tentou gerar uma situação de inimizade entre os dois, fato que jamais ocorreu ao menos segundo seu depoimento. Parte dessa retórica passa por uma conversa entre Lula e João Santana, publicitário da campanha sua e de Rousseff, onde Santana pediu para ele explicar à futura presidenta que ela era candidata tampão.

    Se percebe até nas criticas que ele faz a Dilma um certo carinho e grande apreço, onde o ex-presidente declara que a achava extremamente inteligente, mas com dificuldades de lidar com a política no dia-a-dia, e sua crítica é válida, opositores e apoiadores sempre repetiram isso, variando o tom entre essas críticas. A diferença de postura de ambos era gigante e exemplificada por Lula ao descrever como conversava com os ministros, sempre ouvindo primeiro o que eles falavam para depois opinar, enquanto Dilma falava antes de todos, praticamente impedindo qualquer um de opinar contrariamente por ter receio de parecer a pessoa como uma detratora, como “O Alguém” que contraria a cadeira presidencial. Desse modo, poucos iam na contramão do discurso da presidenta.

    Lula diz ainda que mudar-se de país impediria sua proximidade com o povo e que ir ao exílio seria uma alternativa se fosse culpado, sendo inocente, não havia como fazer isso. Essa fala soa romântica e até ingênua, mas levando em conta o caráter desse depoimento, faz sentido isso, evidentemente. Goste-se ou não de Lula, é inegável seu poder de oratória único e capacidade de gerar interesse e simpatia em quem o ouve, e a estrutura do livro favorece esse poder por ser uma conversa transcrita é fácil ler as palavras e associa-las ao modo do sujeito falar.

    O teor da discussão é informal, mas se trata de muitos assuntos sérios, como a questão do Pré-sal e a crença do ex-ministro de Relações Exteriores Celso Amorim de que os Estados Unidos tem interesse nisso, inclusive reativando a Quarta Frota Americana, em uma movimentação suspeita – e longa demais até para se discutir aqui, mas que conversa bastante com algumas especulações ligadas aos interesses que movimentam a candidatura e campanha de Jair Bolsonaro.

    Há muita informação e discussões ao longo das 126 páginas de entrevista. A conversa publicada permite que num espaço curto de páginas se discuta a ascensão direitista na América, que afetou El Salvador, Paraguai, Argentina e o Brasil. Lula ainda faz críticas duras ao judiciário brasileiro, as indicações políticas de  Temer, comentários sobre os presidenciáveis e uma leitura bastante sóbria sobre o futuro, inclusive verificando que a ascensão de Bolsonaro tinha grandes chances de acontecer.

    Uma de suas leituras é relativa a forma como o PT deveria se postar. No lugar da frase “Eleição Sem Lula é Fraude”, ele diz que preferia que se proclamasse algo como “Lula é inocente e por isso deveria ser candidato“, e salienta que obviamente que essa sentença não tem síntese, mas contém verdade. Ainda assim, Lula louva demais o legado de seu partido e entre muitas falas, afirma algo importante, que o Partido dos Trabalhadores deu cidadania à esquerda, que vivia marginalizada, um monte de grupelhos escondidos e que de repente tem um guarda chuva grande, com uma estrela vermelha.

    O modo de pensar de Lula, para o período do primeiro semestre de 2018 correu corretamente, mas a realidade é que em épocas de extremismo cada dia conta muito, assim como as semanas e meses também, e em tempos de eleição os cenários são de mutações ainda mais rápidas e extremas. Na fala de Luiz Inácio, o próximo presidente, e portanto o candidato também, precisa ser alguém com credibilidade e que fale a “língua” do povo. A Verdade Vencerá é certeiro em apresentar a versão do ex-presidente sobre os fatos que correram sobre essa fase de sua jornada, com defesas contundentes e suas intenções auto-proclamadas. Talvez essas palavras não provem nada, mas certamente são bem mais convictas que boa parte das acusações existente contra ele.

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  • VortCast 48 | O Que Estamos Lendo?

    VortCast 48 | O Que Estamos Lendo?

    Bem-vindos a bordo. Flávio Vieira (@flaviopvieira), Jackson Good (@jacksgood), Thiago Augusto Corrêa (@tdmundomente) e Rafael Moreira (@_rmc) se reúnem para mais uma série de indicações literárias que vão desde literatura fantástica a romances policiais, ficção científica a reportagens jornalísticas.

    Duração: 126 min.
    Edição: Thiago Augusto Corrêa e Flávio Vieira
    Trilha Sonora: Flávio Vieira
    Arte do Banner: 
    Bruno Gaspar

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