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  • Review | Sherlock: A Noiva Abominável

    Review | Sherlock: A Noiva Abominável

    sherlock-the-abominable-bride_posterO especial de 2015 do seriado Sherlock, de Mark Gattis e Steve Moffat começa rememorando uma prática comum tanto ao Holmes clássico de Arthur Conan Doyle quanto a versão da BBC One. Os eventos de His Last Vow impediriam, a princípio, uma aventura corriqueira e escapista nos mesmos cenários e moldes do seriado, o que em parte, ajudaria a “justificar” o retorno a Era Vitoriana para contar que essa história fugiria aparentemente do status quo do programa televisivo.

    O clima de conto doyliano se fortifica quando o recém-aposentado médico do exército James Watson (Martin Freeman) encontra seu possível novo colega de quarto, Sherlock Holmes (Benedict Cumberbatch), nos trajes clássicos de uma época mais sombria e acinzentada, com tons variando entre bege e marrom, servindo de resumo a uma tendência de época. A quantidade de homenagens é imensa, começando pelo comércio da Strand Magazine, revista que publicava os contos, o que determina um salto temporal entre os eventos indicados em Estudo em Vermelho e a história apresentada pelo Inspetor Lestrade (Rupert Graves), já no hall do apartamento localizado no 221B da Baker Street.

    O desenrolar da trama envolve ainda um sem número de referências que não são simplesmente gratuitas, como a personificação de Mycroft Holmes, executado por Gattis com uma maquiagem pesada, como figura glutona e obesa. Apesar de exagerada, esta versão serve para solidificar a rivalidade fraterna entre os personagens, além de pôr o primogênito em uma posição superior, esbanjadora, o completo inverso da vida discreta e pobre de Sherlock, que em alguns momentos, até recorria ao irmão para cumprir somas importantes do seu orçamento. É desta fonte que surgem pistas importantes, que dão rumo à investigação que o Detetive começou.

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    O desenrolar do roteiro demonstra alguns dos maiores dissabores do investigador, entre eles a descrença em figuras e seres sobrenaturais e a natural aversão à associação de fantasmas ao desfecho do caso. Outra fobia é aventada, como o uso contínuo de cocaína, aspecto dado como superado pelo personagem já em seu piloto Study in Pink. O episódio especial talvez seja o mais próximo do clássico de Nicholas Meyer Solução a Sete Por Cento em que Moffat e Gattis poderiam homenagear alguma obra de Holmes que não fosse parte do cânone.

    Mesmo as viagens temporais são plenamente justificadas dentro do argumento, bem como as tramoias envolvendo supostos mortos andantes. A textura antiga faz assinalar ainda mais os claros poderes intuitivos. O foco maior é claramente nos fantasmas do passado de Holmes, que não consegue lidar com a perda de seu adversário maior, seu nêmese. Toda  a lógica por trás dele passa pela troca de insultos e estratégias com o Moriarty de Andrew Scott. O capítulo também serve para ratificar a ideia de que o ator nasceu para executar esse papel, que é entregue com uma maestria impressionante e poucas vezes vistas em sua carreira.

    O desfecho nas cataratas de Reichenbach é simbólico para o aficionado no personagem e serve de mergulho na alma do sujeito biografado, como um estudo da própria escrita de Watson/Doyle nas novelas, contos, romances e afins. As soluções encontradas para o saudosismo são plausíveis e não excluem qualquer retorno à atividade, já que A Noiva Abominável trata também disso, dos receios dos que deveriam estar encerrados. A cena final, misturando as linhas de tempo distintas, serve para edificar a obra de Doyle como algo universal e inspiradora de tantas releituras importantes, poucas tão reverenciais, fiéis e sensíveis quanto esta.

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  • Review | The Following – 3ª Temporada

    Review | The Following – 3ª Temporada

    the-following-3a-temporadaTerceira temporada da série, The Following finalizou seu último ano com um anuncio de cancelamento, ato justificável diante de uma média audiência e ausência de um roteiro sólido. Após encerrar o principal embate entre Tom Hardy e Joe Caroll na temporada anterior, o roteirista Kevin Williasom tinha nas mãos duas alternativas: abordar novos personagens ou mais uma vez utilizar o mesmo vilão para outro conflito.

    A escolha do roteirista foi uma abordagem mista. Aproveitando-se da mitologia criada em sua trama sobre um serial killer com pupilos fieis e desconhecidos entre si, potencializou novos assassinos seriais. Ao mesmo tempo em que fechava as pontas soltas da trama anterior como a fuga de Mark Gray, único sobrevivente da família, além iniciar o julgamento do mentor de Caroll, Dr. Strauss. Uma estrutura que une muitos psicopatas em cena, como se a narrativa os produzisse em serie, destruindo parte da credibilidade da história em um primeiro momento.

    A vingança é parte primordial destes argumentos e Ryan Hardy parece motivar uma fúria centralizadora nestes grupos como o único detetive e policial da cidade possível de investigá-los. Mark Gray deseja se vingar após o assassinato da mãe, expondo e recriando as cenas da morte de sua família, alertando as mentiras escondidas por Hardy, sua sobrinha e Mike Weston, em acontecimentos apresentados na segunda temporada. Um interessante argumento que poderia conduzir a equipe a ser investigada mas que, devido ao desejo de provocar muitos ganchos, é citada em poucos episódios.

    Surge em cena um novo personagem assassino parte do séquito de Dr. Strauss. Considerado o mais brilhante aluno, o assassino sabe matar sem chamar atenção da polícia e a habilidade em computação lhe garante um sigilo maior ocultando sua identidade. Trabalhando de maneira solitária, sua vantagem sobre a polícia é tamanha e desproporcional, um método que se tornou comum na série ao transformar a investigação policial em um grupo desconexo sempre um passo atrás dos vilões. Como a procura pelo assassino é difícil e, consequentemente, sem substância, a trama retoma Joe Caroll dias antes de sua execução.

    Os melhores momentos dessa temporada são as poucas cenas entre Kevin Bacon e James Purefoy. Após interpretar um detetive bêbado no primeiro ano e recuperado no segundo, Hardy está mais equilibrado mas consciente do mal que o cerca. Enquanto o vilão, prestes a ser executado, ainda possui seu charme de assassino que conquista o público, mesmo que os diálogos entre as personagens sejam exagerados e demonstrem uma ligação quase passional entre policial e bandido. Como a ação pauta a narrativa, o serial killer tem um último suspiro violento ao dominar uma sala da prisão com reféns. Outro ato exagerado para simbolizar o fim da personagem que, em seguida, cumpre sua pena de morte por injeção letal.

    Um desfecho que poderia ser impactante e aceitável para o bom vilão se transforma em um clichê que, mais uma vez, retira a força da trama. Um Hardy combalido emocionalmente começa a dialogar com Carell em sua imaginação. É um recurso rasteiro para ter Purefoy em cena e que não ajuda no andamento da história. Demonstrando novamente a falha estrutural ao não ter roteiro coeso que cobrisse todos os episódios desta temporada.

    A ausência de uma trama sólida faz a história ser dividida em vários pequenos núcleos, explicitando a possibilidade do surgimento de novos assassinos. Assim, entra em cena outro contato oriundo do Dr. Strauss, um grupo de milionários que, aparentemente, realizam festas excêntricas. Em poucas cenas, tem se a impressão de ser um clube que realiza fantasias limítrofes sem nenhuma moral, ainda que mais nada seja apresentado ao público. O apelo deste novo grupo é nulo e parece mais uma muleta criada as pressas do que uma peça fundamental a história.

    Tais núcleos tentam convergir em uma única narrativa tendo Ryan Hardy como grande epicentro. Porém, o investigador não é tão ameaçador como seus inimigos imaginam. A mística em torno do homem que preendeu Joe Caroll parece exagerada, assim como é exagerado o fato de personagens diversos desejarem destruiu o herói como se não houvesse nenhum outro alvo.

    O final da série parece ainda mais aleatório – ou desesperado – e trai a composição do personagem do policial ao transforma-lo em um vigilante oculto que promete desvendar este grupo excêntrico de poderosos.  Durante toda a trama, Hardy nunca pareceu potencialmente inteligente como o episódio piloto inferia. Pouco técnico, viciado em bebida, era um líder com mais força bruta do que inteligência. Sua angústia e feitos nada incríveis lhe transformava em um policial comum, atrativo como personagem central. Porém, assumir um manto de vigilante após simular sua morte parece destoar de sua personalidade, um gancho narrativo que seria a investigação de uma nova temporada que não existiu.

    Sustentada em muitos ganchos de ação, a série se manteve razoavelmente bem em suas duas primeiras temporadas, em grande parte, devido a química entre os atores principais. Sem o vilão em cena e com uso exagerado de clichês e de personagens, o terceiro ano não emplaca em nenhum momento e, não a toa, justifica o cancelamento da série. Em sua curta trajetória, The Following se tornou uma narrativa com um bom potencial que não soube reconhecer suas limitações e ousar quando poderia ser diferente de outras histórias policiais, recorrendo a velhos clichês sem nenhuma originalidade.

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  • Review | W/Bob & David – 1ª Temporada

    Review | W/Bob & David – 1ª Temporada

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    Misturando pioneirismo dentro do formato de séries originais da Netflix, ao mesmo tempo em que  resgata o bom e velho formato de comédia via esquetes nonsense,  W/ Bob & David é um produto descompromissado com a moda atual.

    A abertura da série guarda uma abordagem hermética, como era a orquestrada por Terry Gilliam em Monty Python: Flying Circus. A primeira esquete sequer é realizada por Bob Odenkirk e David Cross, o que possivelmente embaralha o ideário do espectador, não deixando claro qual a ideia do seriado. A justificativa para a multiplicidade de assuntos são as viagens no tempo, fator ignorado ao bel prazer dos produtores e astros que, em alguns pontos, seguem uma cronologia mal engendrada de propósito, servindo para fazer ainda mais troça dos programas televisivos normativos.

    Como qualquer produto televisivo de entretenimento simples, há quadros que funcionam quase à perfeição e outros que sequer fazem rir, mas nada que seja particularmente comprometedor para a qualidade geral do produto. No segundo episódio, há mais uma versão de quebra da parede em que os dois atores e criadores da série explicam a platéia a intenção de seus momentos cômicos, envolvendo discussões esdrúxulas sobre a hipocrisia de realizadores brancos que resolvem falar sobre escravidão, como se fossem protagonistas de tal luta e, claro, fazem chacota das religiões extremistas, incluindo as dos próprios membros do elenco – cristianismo e judaísmo – se valendo dos detalhes esquisitos dos ditames sagrados pra fazer as gags comicas.

    A saudade de realizar um programa juntos como o que ia ao ar nos anos noventa, além da profunda amizade da dupla, fez a equipe se reunir para essa espécie de revival de Mr. Show with Bob and David. Há quatro episódios com um elenco de outros humoristas, normalmente composto por Jay Johnston, Brian Posehn, Paul F. Tompkins, John Ennies, entre outros, que interpretam papéis dos mais esdrúxulos possíveis, em frente a uma plateia de fãs. Após o decorrer dos episódios nonsense encomendados, há a exibição dos detalhes das esquetes, através de um making of que mergulha fundo nas influências dos humoristas e nas suas intenções enquanto realizadores.

    W/ Bob & David tem sucessos e fracassos em sua composição, servindo de alento aos aficionados pelo antigo programa, além de cercear a saudade de assistir os dois atores juntos em tela após tanto tempo, vez por outra apresentando ideias bobas, porém capazes ainda de gerar boas risadas na audiência.

  • Review | Aquarius – 1ª temporada

    Review | Aquarius – 1ª temporada

    aquarius-posterUm ano após encerrar a jornada do escritor Hank Moody em Californication, David Duchovny estrela uma nova série, dessa vez pelo canal NBC. Criada por John McNamara, sua primeira produção, Aquarius, explora simultaneamente o final da década de 1960 nos Estados Unidos e enfoca o conhecido assassino serial Charles Manson.

    A produção se baseia livremente em acontecimentos reais e desenvolve personagens fictícios para ampliar sua trama ao acompanhar o detetive da polícia de Los Angeles Sam Hodiak, responsável pela investigação do desaparecimento de uma adolescente. Em companhia de um agente da Narcóticos que se torna seu parceiro em diversos casos, o paradeiro da garota leva diretamente a Charles Manson e sua conhecida família, o nome pelo qual era chamado o grupo de hippies que acompanhava Manson.

    A série explora tanto casos de investigação corriqueiros como o desenvolvimento de Manson e sua seita, a trama principal da série. Interpretado por Gethin Anthony (Games of Thrones), seu personagem não causa espanto nem mesmo empatia. Considerando que Manson se tornou famoso por sua transgressão das leis, falta maior empenho no roteiro em explorar esta faceta. Se imaginarmos que parte do público irá conhecer o assassino mais a fundo devido à série, sua caracterização se define como um louco que não apresenta um objetivo concreto a não ser se tornar um músico e viver em uma sociedade diferente daquela regida pela época. A mítica em torno de sua fama parece invadir o roteiro como se o público devesse saber de antemão tudo sobre a personagem.

    Do lado da lei, o Hodiak de Duchovny também é desequilibrado. Em alguns momentos, o ator entrega um personagem diferente do habitual, mais maduro e centrado, dando-nos a impressão de que o policial é dedicado ao trabalho e hoje sente cansaço pela burocracia. Em outros, parece reciclar o humor de Fox Mulder e Hank Moody com piadas encaixadas na hora certa que trazem à tona uma lembrança dissonante para o público, como se o ator não soubesse delimitar bem seu estilo próprio e as diferenças de cada uma de suas personagens.

    A série se torna mais funcional quando apresenta casos diversos investigados por Hodiak, representando uma tradicional série de investigação passada em uma época antiga. Quando Manson se torna o tema central, a trama nunca transparece urgência suficiente, parecendo mais um pano de fundo do que a estrela que deveria ser. Um conflito que torna a execução da série mediana. Mesmo que a ambientação seja bem composta e a trilha sonora utilize grandes clássicos da música, falta uma sustentação forte para a trama.

    O plano inicial do autor é desenvolver uma narrativa em seis temporadas que devem abarcar todo o fanatismo de Manson e sua trajetória. Porém, sem executar com qualidade sua trama principal, nem a boa ambientação da década de 1960 será suficiente para manter a série no ar. A temporada que começou com mais de cinco milhões de expectadores, terminou seu décimo terceiro episódio com pouco mais de 1 milhão. Uma queda significativa, ainda que tais números sejam parciais, não considerando quem assistiu à série no canal oficial da NBC.

    Com um inicio mediano, Aquarius não emplaca em seu primeiro ano, ainda que tenha uma história forte em potencial. Com o lançamento próximo de uma nova temporada de Arquivo X, é provável que a segunda temporada da série consiga manter-se no ar em parte graças à outra ou ser inteiramente eclipsada com a volta da personagem mais conhecida de Duchovny.