Tag: Adolf Hitler

  • Resenha | O Fantasma: O Fantasma Vai à Guerra

    Resenha | O Fantasma: O Fantasma Vai à Guerra

    Parte da iniciativa da Editora Pixel em publicar histórias antigas do Espírito que Anda em cores, O Fantasma Vai à Guerra é mais uma parceria de Lee Falk e Ray Moore (roteiro e arte, respectivamente) apresentando tramas mais longas, em um encadernado simples. Esse é mais um exemplo do esforço de guerra que boa parte dos heróis clássicos fizeram nos anos 1940, com o personagem participando do conflito contra o Eixo de Adolf Hitler, em uma época anterior até ao ataque a Pearl Harbor.

    A história mostra Bengala sendo invadida pelos japoneses, e contém os mesmos problemas ao retratar os selvagens, fato que já ocorreu em O Tesouro do Fantasma e tantos outros momentos do herói. Para fortalecer a ideia de que o Fantasma é o auge do homem civilizado, os pigmeus são mostrados como pessoas tolas e sem evolução mental e civilizatória. O protagonista defende os acordos para lidar com reféns iguais aos do Tratado de Genebra, humanizando os inimigos encarcerados.

    O roteiro surpreende por ser maduro para sua época, ainda mais se posto em comparação com outras aventuras do personagem. Quando chega para a ação, demonstra sua humanidade e sentimentalismo, sendo a exceção das outras pessoas “comuns”. Já os japoneses são mostrados como cruéis, como era de se esperar, afinal, eram tempos de guerra e essa era uma revista de propaganda também. Mesmo o herói sendo benevolente, lamentando a morte de seus adversários, há momentos que ele precisa assassinar os vilões, fato que o deixa claramente sensibilizado.

    Após 50 páginas a ação passa a ser frenética. Os combates entre aviões são bem feitos, Moore desenha bem momentos de tiroteios e veículos blindados. Dentre os gibis de esforço de guerra, O Fantasma Vai à Guerra não é dos mais escapistas, brinca bem com os clichês e até é bem sério se comparado com outras histórias dessa mesma época envolvendo Superman, Batman ou Capitão América. Lee Falk, mesmo fazendo tramas pueris, não tem receio de condenar veementemente o fato desse conflito armado, e propaga sua mensagem de maneira bastante sóbria.

  • Resenha | Eu Matei Adolf Hitler

    Resenha | Eu Matei Adolf Hitler

    Jason é um autor de quadrinhos bastante inventivo entre os que permeiam o circuito alternativo. A realidade que ele estabelece tem muitos momentos nonsense e o modo como suas personagens são apresentadas é igualmente diferenciada. Em Eu Matei Adolf  Hitler o que se vê é uma ficção científica, que apesar do nome forte, não tem grandes discussões políticas, e sim uma premissa básica: neste mundo, os personagens são antropomorfizados, a função de assassino de aluguel é uma profissão legalizada e bastante comum, e por fim, existem viagens no tempo.

    O personagem principal é um matador contratado para um trabalho, e em paralelo a isso, ele lida com uma forte crise emocional em seu relacionamento. Sua missão é baseada no título do quadrinho, e o motivo da história seguir reside exatamente no fracasso do personagem em matar o Fuhrer. A solução para o insucesso é engraçada, e lida muito bem com paradoxos temporais.

    A leitura é rápida, engraçada e mordaz, seu caráter episódico brinca com questões da vida adulta, discutindo as relações conturbadas do casal e que servem de exemplo universal para relacionamentos em crise. A exploração desses envolvimentos é tão madura que surpreendente por serem tão bem resolvidas na história, seus personagens são complexos e as situações corriqueiras conversam bem com o que é universal. Além disso, é interessante observar como o autor brinca com questões como o alvorecer do nazismo, e se torna ainda mais irônica por tratar de tal modo que o vai-e-vem de um casal tem maior importância do que a intolerância de um líder político mal resolvido com seus pensamentos e com sua própria identidade.

  • Crítica | Fascismo de Todos os Dias

    Crítica | Fascismo de Todos os Dias

    Libelo do cinema soviético lançado no ano de 1965, Fascismo de Todos os Dias (conhecido anteriormente como Fascismo Ordinário) é um filme de Mikhail Romm, narrado de maneira bem óbvia e elementar, para demonstrar até ao espectador mais desatento e incauto como funciona o pensamento e modus operandi segregador do pensamento extremista via direita. Seu começo é tímido, mostra pessoas  comuns, pela ruas, em registro sem cores, se elucubra um pouco sobre a classe média, as relações, trocas de caricias e sensação de pertencimento aos grupos sociais.

    Antes de mergulhar em qualquer argumento político que fuja do geral e genérico, são mostrados desenhos infantis, em homenagem as mães dos pequenos, mostrando a admiração inconteste dos filhos a suas progenitoras, para logo depois, mostrar corpos desfalecidos de judeus, que morreram com suas famílias. Esse trecho não contem falas, as imagens mostram por si só que ter família não fazia com que os descentes de hebreus fossem vistos como entes detentores de humanidade.

    O filme é dividido em capítulos, e um deles se dedica a falar de Minha Luta (Mein Kampff), livro de Adolf Hitler. Nesse momento, a  narração do próprio Romm se permite o humor de dizer que caso ele tenha sido lido antes, pelos que votaram na Alemanha, certamente o Fuhrer não se tornaria chanceler, e por mais irônico que seja, é real também. O filme claramente tem um viés e um lado político anti nazista, de esquerda e comunista e não tem receio de não ser assim, e até por ser extremamente livre de isenções e opinativo, serve bem a desconstrução do pensamento raso,  que falaciosamente associa o Nazismo a esquerda.

    O filme debocha de figuras de poder do Partido Nacional Socialista, principalmente Hitler, ao analisar uma imagem sua, bem populista, cavando um buraco de terra numa obra, em um movimento que claramente não é o de quem está acostumado a pôr a mão no arado, em uma pá ou em qualquer instrumento de trabalho braçal. Isso faz um paralelo com a atualidade, com atitudes de lideranças pseudo carismáticas, que praticam muitos atos supostamente populares para angariar afeição do público e do eleitorado. A tática é velha como o mundo, comum não só a figura de Hitler, mas de tantos outras lideranças, e agride os olhos de quem é minimamente atento.

    A parte 2 do documentário começa mostrando crianças com brinquedos, na rua, variando entre jogos lúdicos, desenhos, e até provas onde as mesmas fazem sinais da suástica, ou colocam a saudação Heil Hitler textualmente em provas ou nos simples desenhos que fazem. Para boa parte da gritaria geral atual sobre as escolas partidarizarem ou não seu ensino, certamente os métodos do Ministério da Educação alemão fariam escandalizar caso fossem implementadas, no entanto os outros métodos de tática fascista que são empregados pela parte reacionária e mais radical da população e dos governos que pensam assim não assusta, especialmente quando o alvo são os ditos adversários políticos desses. Aparentemente a humanidade não evoluiu tanto quanto se pensava ou imaginava, especialmente no que tange o flerta com o fascismo em versões teoricamente mais suavizadas.

    O capitulo XX tem o título de Fascismo Ordinário, e utiliza uma música alegre para mostrar os corpos dos judeus e o deboche que as tropas nazistas tinham com esses adversários, variando entre cenas de violência física e sexual, com mulheres sendo humilhadas, crianças sendo maltratadas, e idosos em posições péssimas, com cenas dos militares nas praias, recreando. Enquanto uma parcela da população brinca e se diverte (mesmo com a guerra ocorrendo), outros tem toda sua liberdade destruída e toda sua dignidade zerada. Não há o que se reclamar em relação a panfletarismo, Romm acerta demais no didatismo das informações que traz, é preciso mesmo expor a fraude que o Reich era, e é desolador encontrar parelelos disso com a atualidade.

    O final de Fascismo de Todos os Dias é perturbador, envolva a narração de uma criança, sem legendas, invocando uma linguagem de impossível compreensão para adultos, variando as imagens entre as vitimas do holocausto, lembrando que a aura de normalidade permeou o governo nazista, e nem por isso o estrago e a chacina foram freadas. Por mais sensacionalista que o filme seja, é totalmente valido que ele seja assim, afinal, é importante denunciar as novas faces desse tipo de pensamento e ideologia, até para que se evite repetir essa historia.

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  • Crítica | Olympia – Parte 1: Ídolos do Estádio

    Crítica | Olympia – Parte 1: Ídolos do Estádio

    Parte da construção da figura de cavaleiro perfeito que Adolf Hitler teve durante sua carreira  como chanceler, comandante em chefe e fuhrer na Alemanha se deu pela colaboração de imprensa e artista com o seu governo, e Leni Riefenstahl foi fundamental nesse quesito. Em 1938, já depois de A Vitória da Fé e O Triunfo da Vontade, ela trouxe a luz Olympia – Parte 1: Ídolos nos Estádios, um documentário que começa mudo, mostrando monumentos gregos, que ficam bastante bonitos com as técnicas de iluminação que a diretora sabia empregar, ganhando um ar de mistério ao reunir a trilha instrumental que induz emoção e a fumaça artificial empregada ali.

    Há de se lembrar que é um filme do início da era de outro do cinema, os clichês da arte ainda seriam inaugurados, estavam na verdade em construção com o cinema da diretora alemã e esse pode parecer menos patriótico e menos propagandista que O Triunfo, mas e bem pouco. Os esportes olímpicos eram competidos pela nata da humanidade, os melhores entre os melhores, os servos do panteão olímpico, e nada mais justo para um país totalitário e que acredita na raça pura, associar os feitos do ariano a isso.

    Hitler não demora a aparecer, aos 16 minutos ele saúda as comitivas esportivas que chegavam aos jogos de 1936 em Berlim, e os esportista saudavam o líder com a o símbolo Heil Hitler, bem como os italianos, que vinham do país de Mussolini, e segue bizarro a torcida se levantando no estádio para saudar a bandeira nazista, com uma suástica enorme. A prova cabal de que o povo estava com seu governo, é importante lembrar e frisar isso, não perder de vista que existia adesão do povo as idéias totalitárias e ao culto da imagem tiveram eco com o  povo.

    O meio do filme não é tão bem feito quanto a introdução, que é longa e semelhante aos filmes mudos, se valendo da imagem para contar sua historia. É engraçado, pois tanto as Olimpíadas quanto a obra de Rifenstahl são anteriores a Guerra, e aqui há até um certo louvor aos Estados Unidos, tocando o hino da nação que seria adversária do  Eixo em 1941. Com a União Soviética não participou da competição, nem houve necessidade de mostra-la em qualquer instância, evidentemente.

    O filme carece de um ritmo mais dinâmico, se torna enfadonho em alguns pontos, mesmo se descontando a questão temporal. Esperava-se que o tom competitivo salva-se isso, mas não, e ele é claramente menos propagandista que o resto da filmografia de Riefenstahl, embora, coincidência ou não, haja um enfoque grande em atletas do Japão, que formaria o Eixo com Itália e Alemanha, e muitas vaias para os atletas da America, sobretudo os negros.

    Assistir hoje Olympia Parte 1 é um misto de sensações, de asco pelo louvor que Riefenstahl propagava ao Fuhrer e ao seu governo, ao mesmo tempo que é um bom registro de como era as competições olímpicas nos  anos quarenta, ainda que essa versão tenha uma duração longa, de quase duas horas, fato um tanto incomum para a época, ainda assim a técnica da diretora, que tornou sua arte em algo ainda mais erudito, apesar dos pesares e da propaganda ao ideal nazi-fascista.

    https://www.youtube.com/watch?v=JOUFkMWPblY

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  • Crítica | O Triunfo da Vontade

    Crítica | O Triunfo da Vontade

    Em 1934 Leni Riefentstahl, uma cineasta alemã que acabou dedicando sua carreira e filmografia a registrar os feitos do terceiro reich, tratou de documentar a vitoria do partido nazista de Adolf Hitler. A primeira imagem é justamente da águia com a suástica e o ponto de partida é a festa do partido em 5 de Setembro de 34 em Nuremberg, onde se comemoravam as vitórias do governo tirano-fascista que assolou a Europa e o mundo nas décadas de trinta e quarenta do século XX.

    O filme trata de relembrar a perda da primeira Guerra Mundial 20 anos antes do lançamento deste, e essa nova fase política é chamada pelas cartelas de texto como o renascimento da alma alemã. As primeiras cenas com agentes humanos mostram Adolf Hitler saudado pelo povo, desfilando em um carro oficial, glorificado e adulado pelo povo alemão, que o adotou como chanceler e líder.

    É importante lembrar que esse é um filme propaganda, um dos expoentes da cultura que Joseph Goebbels ajudou a montar como máquina forte do Estado, que transformava manifestações artísticas em meras formas de exaltar o poder e o domínio nazi-fascista e autoritário da ala de poder de Hitler. Perder isso de vista é sinônimo de auto enganação e para contextualizar leitores não cientes do cenário histórico politico, Riefenstahl acabou se tornando um dos principais nomes do cinema alemão justamente por essa vontade de fazer documentários sobre o regime, passando não só pelo louvor a Hitler, mas também nos encontros que o líder austríaco teve com outras lideranças do espectro de extrema direita, como Benito Mussolini e as tropas italianas, no entanto nada impressiona mais que a série de discursos dos politicos nacional socialistas, entre lideranças locais e governadores de lugares ocupados, como a Polônia.

    Os aplausos se intensificam com as falas de Goebbels, que destaca que a força autoritária alemã vem das mortes e tristezas de seu povo, evocando um sentimento nacionalista bem condizente com o discurso demagogo que a pátria deve ter seus anseios acima de qualquer outro ideal, justificando inclusive a segregação e obliteração de oposição ou algo que o valha.  Há um cuidado enorme em evocar um espírito de heroísmo e oportunismo barato, que se vale até do fato de Hitler ser veterano da  Primeira Guerra, ainda que claramente ele não tenha sido um dos que mais sofreu na pele a vitória dos opositores da Alemanha.

    É preciso ter estômago para assistir ao filme, soa tragicômico a relação de falsidade que vem de Hitler para os mais novos com quem fala, em especial a Juventude Hitlerista, assim como a idolatria que esses moços o dedicam, e não seria um absurdo afirmar que nem toda essa reverência seja necessariamente imposta, pois o discurso repleto de preconceitos e lugar comum é fácil de ser aderido pelo jovem sem conhecimento, suscetível ao engodo proveniente desse pensamento segregacionista. Engraçado são as partes escolhidas por Riefenstahl para estampar o discurso, com Adolf falando que aquele era um movimento que não diferenciava castas ou credos, quando a maior perseguição era exatamente em quem não se qualificava como membro da raça ariana, “pura” e “ideal”. O discurso demagogo servia principalmente para os de fora ou as plateias mais adultas, eram parte da tentativa de verniz social que a Alemanha pregava, e o discurso daria certo se tivessem sido eles os vencedores da Segunda Guerra.

    O final do longa metragem acontece em meio a grandes celebrações pós morte de militares e políticos importantes, com Hitler benzendo cada uma das novas bandeiras do exercito, cumprimentando um a um seus conterrâneos. Por mais o objetivo não fosse obviamente este, O Triunfo da Vontade registra uma fragilidade de discurso e estrutura do Reich, mostrando um bocado da hipocrisia alemã enquanto povo e dos oportunistas que tomaram o poder, mostrando bem como pode o sujeito comum se aliar a figuras nefastas basicamente por preconceito, prepotência ou por subestimar o potencial destrutivo de autoridades preconceituosas e castradoras.

    https://www.youtube.com/watch?v=WeZPDmGXtNI

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  • Crítica | Cinzas Sem Glória

    Crítica | Cinzas Sem Glória

    O filme de Stuart Heisler começa com uma bateria ao fundo, e pessoas marchando, enquanto isso ocorre, uma animação da suástica branca no fundo preto vai se montando ao compasso da marcha. Cinzas Sem Glória tem nome original Hitler, e ainda nessa introdução, há um destaque numa frase sua, de que moldaria o mundo segundo  sua imagem e semelhança, deturpando uma passagem bíblica, ou destruiria o mesmo através de seu  instinto predatório.

    Lançado em 1962 e sem cores, a ideia é emular o cinema da época em que o Terceiro Reich se levantou. Heisler, através do roteiro de Sam Neuman faz um filme anti propagandista, com o Adolf Hitler de Richard Basehart bastante caricato, um sujeito autoritário e malvado por natureza. Ele humilha até seus parentes próximos, fato esse que suscita suspeitas a respeito de seu envolvimento com sua sobrinha.

    A ideia do filme é mostrar que as autoridades não estão livres de fofoca, ao contrário, pois as luzes da ribalta fazem com que essas pessoas estejam no centro das atenções, além do que há um maniqueísmo exacerbado e um grande moralismo textual, que tenta associar signos incestuosos em uma figura que é historicamente tratada como vilã. O caráter sensacionalista é tão gritante que até descaracteriza um pouco o personagem-título, deixando-o tão distante da humanidade que mal se percebe o seu poder de convencimento.

    As partes em que Adolf é  mais emocional, é ao perceber que perdeu sua amada sobrinha, ali se sepulta qualquer  possibilidade de dualidade, com ele praticamente assumindo seu lado lascivo e anti cristão. A cena em que acontece o assassinato da mesma também é mal construída, com um suspense forçado e anti climático, quase um anti Hitchcock.

    O filme referencia a historia famosa que inspirou o filme de Bryan Singer, Operação Valquiria, embora coloque esse atentado como somente um dos percalços pelos quais Hitler passou. A realidade é que o filme por se prestar a ser somente um panfleto anti hitlerista não consegue traçar a complexidade proveniente da época, nem o quanto o discurso nazi-fascista se tornou atraente a boa parte do povo, sobretudo a elite.

    A partir do momento que se demoniza o opositor, se perde boa parte da ideia de chocar as pessoas, pois se Hitler e seus asseclas eram servos do inferno ou o puro mal, se impessoaliza a crítica, tornando desumana a ideologia, quando a realidade é que a sociedade abraçou o discurso do austríaco. Ao final, os corpos de Adolf e Eva são queimados, o  nome nacional Cinzas Sem Gloria se justifica, pontuado por uma narração péssima, que termina de lidar com o personagem como apenas um sujeito escroque, tal qual um vilão de desenho animado, ao menos dá para notar como o cinema britânico-estadunidense vi o fuhrer à época dos anos sessenta e como a opinião pública digeriu essa figura difícil de engolir.

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  • Crítica | A Queda! As Últimas Horas de Hitler

    Crítica | A Queda! As Últimas Horas de Hitler

    No ano de 2004, chegava aos cinemas mundiais o filme A Queda! As Últimas Horas de Hitler, longa de Oliver Hirschbiegel que tinha a difícil tarefa de retratar os momentos finais da trajetória do Fuhrer, da maneira mais fiel possível. Grande parte do êxito disso se dá pela interpretação de Bruno Ganz como o tirano austríaco, onde o ator se dedica de maneira visceral ao papel, sendo parecido não só em aparência mas também em trejeitos e comportamento. Depois de um intenso trabalho de pesquisa com vídeos da época e com relatos de quem esteve próximo do político ele chegou ao ideal visto em tela.

    A historia é narrada pelos olhos de Traudl Junge (Alexandra Maria Lara), uma mulher que recém assumiu como secretária de Hitler. Há uma construção de normalidade politica no inicio, que faz o filme soar até moroso de tão lento que é, mas isso é extremamente necessário, pois a ideia de mostrar os bastidores  de como era o principal país do Eixo.

    Uma grave situação envolve o médico e oficial Prof. Ernst-Günther Schenck, que é interpretado por Christian Berkel. Sua inserção na trama se dá quando os militares estão se livrando das provas documentais, fazendo uma bagunça nas partes internas dos quartéis se livrando de papelada para queimá-las atrapalhando obviamente todo o trabalho de manutenção de mantimentos das tropas. Os soldados ficariam sem suprimentos, sem comida e essa preocupação foi dita por Schenck, que vai falar com outro oficial da parte operacional. A condição de não ter comida não era uma preocupação do partido nazista e de suas lideranças, e por mais explicito e didático que o roteiro de Bernd Eichinger seja nesse quesito, é um ponto importante de ser levantado, afinal, deflagra a total falta de compromisso com as tropas, e com os civis, pois os soldados certamente roubariam a comida destes para não padecerem de fome.

    O visual do filme se vale de uma cenografia e fotografia onde predominam tons mais claros, que facilitam a visualização de toda a grandiosidade visual que o Terceiro Reich tentava imprimir no detalhes de sua arquitetura e na construção do visual de seus líderes. Chega a ser irônico o contraste entre toda esse verniz que foi jogado em cima dos líderes nazistas com os ambientes mal acabados dos corredores dos bunkers, que obviamente não tinham o mesmo cuidado em serem construídos, pois eram abrigos de emergência.

    O contraste entre a alegria de Eva Braun (Juliane Köhler), dançando mesmo ao ter a noticia de que a Alemanha poderia cair e os  bombardeios que acontecem minutos depois as bases onde o exercito alemão está é impressionante. Não acontecem mortes gráficas, como nos filmes dirigidos por Mel Gibson, mas há apego a realidade o suficiente para que o espectador sinta que a situação é de calamidade.

    Adolf se sente sempre traído e injustiçado. Os soldados que desistem são chamados por eles de covardes e traidores da pátria o que demonstra mais uma vez o total distanciamento dele com relação as tropas e o desapego ao bem estar do povo, não só o civil como visto anteriormente, mas também aos alistados. Essa alienação e indecência moral é muito vista em lideranças autoritárias que emergiram recentemente e é catastrófico o rumo histórico que os países tomam, elevando figuras semelhantes a essa versão que normalmente sobre ao poder utilizando um discurso completamente inverso a isto, com foco no combate a corrupção e primando por caça a minorias.

    A Queda termina de maneira melancólica obviamente, dando o destino de cada um dos personagens que o publico acompanhou pelos quase 150 minutos de duração, mostrando a personagem que foi entrevistada para fazer o filme declarando que apesar de lamentar pelo numero absurdo de mortes que ocorreram na época, não poderia se sentir responsável por aquilo, dada a natureza burocrática de seus serviços, e isto é bastante simbólico, pois reflete o pensamento e o argumento geral de quem esteve ao lado do poder enquanto os governos tirânicos ocorriam, onde normalmente ocorria a ignorância aos fatos óbvios e aos acontecimentos nefastos praticados pelo poder em si, e apesar da linguagem visual se assemelhar demais aos especiais de televisão, a mensagem do roteiro é muito bem transmitida.

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  • Crítica | Arquitetura da Destruição

    Crítica | Arquitetura da Destruição

    De todos os temas da história, o Nazismo provavelmente é o mais conhecido e comentado pelas pessoas em geral, tanto por causa da dimensão do grotesco causado pelos nazistas quanto pela propaganda americana realizada por meio de seus filmes, que reforçam ser este o momento em que os EUA salvaram a humanidade deste mal. Portanto, fazer uma análise sóbria do que foi o fenômeno da ascensão e consolidação do poder nazista na Alemanha não é tarefa fácil.

    Felizmente, o documentarista sueco Peter Cohen consegue desvendar em grande parte o que está por trás de toda a psicologia do Nazismo em seu filme de 1992, Arquitetura da Destruição. A obra deixa de lado grande parte das análises superficiais e sensacionalistas feitas até então sobre Hitler e parte para tentar compreender os fatos enquanto fenômeno da própria humanidade, que é o que todos temos medo, de nos enxergar como iguais aos autores de tais atos.

    Narrado por Bruno Ganz (que ironicamente iria interpretar Hitler em A Queda, de 2004), o documentário tem três eixos principais. O primeiro, em que Hitler e grande parte da cúpula nazista eram artistas e por isso davam tanto valor à estética do III Reich, baseada principalmente na arte clássica greco-romana, quanto à perseguição à chamada “arte degenerada”; o segundo mostra que os nazistas viam na ciência e na Medicina uma forma de aumentar a expectativa de vida da “raça superior”, ao mesmo tempo em que os médicos alemães também estavam por trás da “solução final”; e finalmente o terceiro, em que aventa a tentativa quase desesperada de patologizar o “judeu” na sociedade alemã, investindo pesado em propaganda associando-os a insetos e ratos e outras pragas que contaminavam o “corpo alemão”.

    A visão artística do III Reich era influenciada principalmente pelo romantismo alemão, movimento que vinha de uma forte herança nacionalista prussiana e antissemita e personificado na figura do compositor Richard Wagner, um dos ícones de Hitler. Também havia uma forte sensação de que o III Reich era o responsável por manter a linhagem da cultura greco-romana na era moderna, com foco especial em Esparta, sociedade considerada “ideal” por Hitler. As ruínas da Grécia exerciam forte fascínio sobre o Führer, tanto que ele e seu arquiteto, Albert Speer, projetaram vários prédios para a reconstrução de várias cidades alemãs, as quais imitavam a arquitetura grega para, no futuro, os povos olharem as ruínas dos nazistas com a mesma admiração com que, hoje, vemos as ruínas gregas. Por isso ele também proíbe expressamente o bombardeio de Atenas durante a invasão nazista a Grécia.

    Portanto, é fácil entender a importância que a arte tinha para os nazistas. Tanto que os artistas considerados “degenerados” foram perseguidos ferozmente e tiveram suas obras confiscadas e muitas vezes, destruídas. Para Hitler, a arte degenerada era a arte moderna, judaica e bolchevique, ou seja, sem traços definidos, o que para eles representava sinais de doença mental de seus autores, enquanto a arte considerada correta era aquela romântica, de paisagens campestres e bucólicas, sem nenhum tipo de conflito.

    O componente médico/científico do nazismo é também muito forte. Somos apresentados a dados impressionantes (como o de que quase metade dos médicos alemães aderiram à ideologia) e que reforçam ainda mais a tese de que o Nacional-Socialismo era muito mais um fenômeno de elite do que popular. Enquanto havia campanhas públicas para o alemão fazer exames e evitar a tuberculose e o câncer (tudo centrado na figura do “médico salvador de vidas”), os mesmos médicos estavam por trás dos primeiros passos do programa de extermínio dos “indesejáveis”, mostrando claramente que o uso dos campos de concentração era o passo final de um projeto que começa bem antes, sempre com o auxílio de vídeos feitos pelo governo. Um muito interessante mostra várias imagens de deficientes mentais vinculando-os a informações alarmantes (e falsas) de que, caso nada fosse feito, essa população iria ultrapassar a população alemã “saudável”, mostrando um indicativo de qual caminho os nazistas pensavam em seguir.

    Tendo em mãos relatórios, cartas e documentos da época, Cohen remonta em detalhes todo o plano de execução destes “indesejáveis” e a preocupação dos nazistas em esconder este fato, o que mostra que, mesmo no poder, suas ações não eram 100% aceitas ou inquestionáveis. Os primeiros modelos de execução, muito precários, eram em caçambas de veículos com o escapamento acoplado, o que causava a asfixia das vítimas por monóxido de carbono, enquanto os fornos incineravam os corpos em regiões próximas à cidade. Relatos de funcionários das tabernas, o cheiro forte e pedaços de cabelo nas ruas geravam um clima tenso. Foi quando os nazistas decidiram que migrar para longe das cidades seria melhor.

    Cohen também defende a tese de que a ação final contra os judeus acontece na parte final da Segunda Guerra Mundial, por conta da demora do conflito. Então Hitler decide acelerar os planos e passa a agir utilizando meios de comunicação em massa, especialmente o Cinema, para convencer a população alemã de que o judeu era uma praga que parasitava o estado e o povo alemão, portanto deveria ser exterminado. São categóricas as imagens de alemães dedetizando casas cheias de ratos e cupins com o mesmo gás que seria utilizado nas câmaras dos campos de concentração, o Zyklon B.

    Em resumo, Arquitetura da Destruição se mostra um filme indispensável a qualquer um que tenha a mínima pretensão de entender a fundo o que foi o Nazismo. Muito bem construído e documentado, é daquelas obras que se eternizam no tempo por sua qualidade e profundidade, pois, em um tema tão complexo, é fácil deslizarmos para o senso comum. Segundo o próprio filme, não é chamando Hitler de artista frustrado (ou monstro) que iremos entender tal fenômeno. Tampouco achando que foi uma obra feita por meia dúzia de alucinados ou, tão errado quanto, pela totalidade dos alemães do período. O Nazismo cresceu e virou o que virou porque foi fruto de pessoas de sua época, de contradições de sua época, da anuência do Ocidente com uma ideologia militarista e extremista; mas, acima de tudo, foi um fenômeno totalmente humano. E isso é o que mais nos assusta.

    Texto de autoria de Fábio Z. Candioto.