Bem-vindos a bordo. Flávio Vieira (@flaviopvieira), Bernardo Mazzei, David MatheusNunes (@david_matheus), Jackson Good (@jacksgood), Julio Assano Júnior (@Julio_Edita) e Filipe Pereira abrem o coração e revelam os filmes que são amados pelo público e crítica, menos por nós. Venha conosco nessa polêmica e compartilhe sua lista de filmes.
Duração: 117 min. Edição: Julio Assano Júnior Trilha Sonora: Julio Assano Júnior
Arte do Banner: Bruno Gaspar
O nonsense, enquanto categoria de humor, foi reinventado pelo Monty Python. A Vida de Brian (1979, no original inglês Life of Brian), escrito por Graham Chapman, John Cleese, Eric Idle, Terry Jones, Terry Gilliam e Michael Palin, com direção também de Terry Jones, é outro filme da companhia britânica que explora o inusitado, o absurdo, o sem sentido, enquanto conta a trajetória de um galileu. Contudo, ao invés de contar o martírio de Jesus, acompanhamos a trajetória de Brian, um cidadão da Galileia que nasceu na mesma data e horário do Filho de Deus.
Para que este texto (ou o filme) não seja mal interpretado como uma sátira da religião alheia, transcrevo algumas frases de Eric Idle, um dos Pythons, sobre qualquer tentativa de associar o filme a ridicularizarão cristã. “Ele (Jesus) não é particularmente engraçado. O que ele diz não é motivo de piada, são coisas muito apropriadas”. Dito isso, o longa conta a odisseia de como o vendedor de quitutes do “Coliseum da Galileia” se tornou líder religioso e foi crucificado.
O filme é uma sequência de situações cômicas (sketches) da vida do personagem principal e daqueles que orbitam ao redor dele. Dessa forma, temos múltiplos dramas explorados. Logo no começo somos apresentados à Frente de Libertação da Galileia, um movimento popular que deseja chutar os romanos para fora da cidade, ao qual Brian se alia por ódio aos colonizadores. Os romanos, por sua vez, são liderados por César, um imperador com problemas para pronunciar certas consoantes (e de entender trocadilhos nos nomes).
Combatendo pela Frente de Libertação, Brian resolve se disfarçar como profeta para passar despercebido pelos romanos. O estratagema dá certo, mas as massas começam a suspeitar que mesmo aquele palavreado incoerente guarda algum tipo de salvação. Não demora muito para que ele angarie seguidores e se torne o novo Messias da Galileia. A escalada dos eventos discute como as pessoas, muitas vezes com liberdade cerceada e carentes de líderes representativos, por vezes aguarda um salvador, mas este é apenas uma farsa (nesse caso, uma comédia).
Brian e sua mãe começam a ser cultuados como milagreiros e libertadores com uma fila de alienados seguindo-os. Ele esquece o objetivo principal (acabar com os romanos), e começa a sofrer as consequências por ter sido o líder das multidões. O que foge à explicação, cabe ao nonsense. Piadas certeiras, humor com trejeitos impecáveis, e uma diversidade de personagens, que, mesmo com os atores principais da companhia se revezando entre dezenas deles, têm, cada um, um toque de vivacidade impressionante.
Nonsense é um gênero que divide facilmente o público. Ou você gosta ou não, não têm muitas pessoas no meio termo. Enquanto expectadores ficam se perguntando o motivo da situação absurda ou do desfecho ilógico da sketch, o apreciador do gênero se delicia com o inesperado rumo das ações. As situações ficam colossalmente inusitadas (ou ridículas) e qualquer tentativa de encontrar lógica naufraga frente o humor despropositado e sem sentido. A lógica é não ter qualquer lógica.
Curiosamente, o longa foi filmado na Tunísia, onde tinham acabado de gravar Star Wars: Uma Nova Esperança, de George Lucas, e Jesus de Nazaré, de Franco Zeffirelli, onde inclusive vieram a utilizar o resto de figurino e cenário do filme de Zeffirelli. A Vida de Brian contou ainda como principal financiador o beatle George Harrison, grande fã da companhia, que veio a investir 4 milhões de dólares na produção, o que veio a render um pequeno easter egg no final do filme, onde o cantor de Always Look on The Bright Side of Life fala bem baixo “Eu contei pra ele, eu disse ‘Bernie, eles nunca terão esse dinheiro de volta’”.
Por fim, o longa apresenta o humor no estilo mais primitivo, irônico, inusitado, ilógico, e algumas vezes até ingênuo, que possa imaginar. Simplesmente uma obra-prima do nonsense.
Aproveitando a data festiva, me juntei ao Rafael, e chegamos à um consenso em uma lista de 10 filmes para indicarmos. Alguns desses filmes tem o Natal como plano de fundo da história, outros são praticamente um personagem dentro da trama. Como não poderia deixar de ser, muita coisa ficou de fora, mas tem dicas para todos os gostos. Confira nossas indicações abaixo.
Numa boa, quem nunca viu esse filme na Sessão da Tarde, ou nos “especiais de natal” da Globo, ou é muito novo, ou não teve infância. O filme que explodiu a fama de Macaulay Culkin, esquecido pela família que foi viajar no Natal, fazendo o diabo com os dois ladrões que tentam invadir a casa que pensam estar vazia. Diversão pura e simples. Com um bônus que beira o surreal, Joe Pesci, que no mesmo ano faz um mafioso e cascudo em Os Bons Companheiros, faz aqui Harry, um dos ladrões tapados da história, escolha certa para o Natal com a família.
Dono de uma narrativa muito diferente daquela que nos acostumamos a ver em filmes de super-espiões, O Espião que Sabia Demais tem uma atmosfera fria e nublada, contudo, contemplativa e romântica de personagens solitários e possuidores de uma visão angustiantes, mas ainda assim extremamente humanos. O que tudo isso tem a ver com o Natal? Quase nada, exceto que o filme se passa durante o período natalino, com um destaque especial para a sequência final ao som de La Mer, na interpretação de Julio Iglesias.
Entre viagens oníricas de Sam Lowry e aparições do nada de Harry Tuttle (Robert De Niro), vemos Mr. Helpman fantasiado de Papai Noel avisando que Jill Layton foi morto, duas vezes. Vai entender porque a cabeça maluca do Terry Gilliam quis localizar o tempo do filme justamente no natal. Talvez seja uma tentativa de contrastar ainda essa época clamada por ser de amor, paz e bla bla bla, com aquele universo frio e mecanicista criado no filme. Ou talvez seja uma critica ao natal e ao consumismo vindo com ele, que representam muito da nossa sociedade, enfim vai entender o Gilliam, o negócio é assistir porque Brazil é um filmaço de distopia, que deve fazer seu natal bem depressivo, como deve ser.
Houve um tempo que as bizarrices de Tim Burton vivia conjuntamente com sua sensibilidade artística, algo que parece esquecido pelo diretor já há algum tempo. No entanto, esse não é o caso de Edward Mãos de Tesoura. O personagem de Edward é um contraponto à uma sociedade que dita como ela deve se portar, que apesar de todas as sombras contidas no personagem, nota-se uma extrema inocência, tudo isso somado à direção de arte de cair o queixo. Um lindo conto de natal.
Duro de Matar, de John McTiernan (Por Rafael Moreira)
Duro de Matar é outro que dispensa qualquer apresentação, um dos melhores filmes de ação de todos os tempos, e é claro se passa no Natal. Quem se lembra do presentinho de Papai Noel que John McClane manda para Huns Gruber, com um “Agora eu tenho uma metralhadora” HO HO HO. Sem contar logo no início, quando o ele pergunta para o motorista que acabou de colocar o rap “Run DMC – Christmas In Hollis” no toca-fitas do carro, se ele não tem nenhuma música de natal, o chofer responde, “Isso é música de Natal.”
Eleito como o melhor filme de Natal de todos os tempos, pelo Rotten Tomatoes, não haveria como deixar de citá-lo nessa lista. A Felicidade não se Compra é uma linda história de redenção e toca em temas básicos mas fundamentais a todos nós como honestidade, compaixão e solidariedade. Apesar de pra muitos ser analisado nos dias de hoje como um filme bobo, o filme trata de valores da vida e sobre a ganância do ser humano. De 1946 mas ainda extremamente atual.
Quem diria, uma singela lista de 10 filmes de natal, e o Terry Gilliam envolvido em 2 desses filmes, mas aqui só como roteiro, já que a direção é do Terry Jones. Mas enfim, esse é um dos clássicos filmes do Monty Python, e mais natalino impossível, já que a história toda gira em torno de um cara que nasceu no mesmo dia que Jesus, e acho uma das melhores comédias de todos os tempos.
O Musical dirigido por Henry Selick e escrito e produzido por Tim Burton traz uma das mais bizarras histórias natalinas. A animação é realizada com bonecos de massinha em stop-motion e uma direção de arte lindíssima, com destaque especial para a paleta de cores quase monocromática na Terra do Halloween e as cores quentes e intensas na Terra do Natal, com uma ambiguidade visual presente no design do protagonista e o antagonista do filme, enquanto Jack veste roupas de cores pálidas que se tornam reluzentes frente à beleza do Natal, Papai Noel com seu vermelho vivo surge completamente apagado. Filme riquíssimo visualmente.
Outro filmaço de ação, Mel Gibson no começo de carreira com cara de alucinado, que pelo menos que se passa na época do Natal, mas acredito que não nos especias de fim de ano para a família 🙂 Mas quem se lembra da cena de tensão absurda do suicídio? Está lá passando na TV um especial de natal do Pernalonga, oras. Além do filme começar tocando Jingle Bell, e a transação das drogas que culmina naquela loucura do Mel Gibson, “Atire nele! Atira!” com cara de psicopata, é feita num caminhão vendendo árvores de natal. Com tudo isso ainda temos a lição moral típica desses filmes, com o Mel Gibson aprendendo a dar valor a sua vida, e o Danny Glover percebendo que não deve ter preconceito contra policiais malucos.
Nicolas Cage com toda a pieguice e previsibilidade que só o Natal traz, mas esqueçamos tudo isso, afinal o Natal é piegas por si só, e muitos de nós adoramos isso. De 2000, quando nosso amigo “Gaiola” ainda não tinha se rendido a roteiros sem ao menos lê-los, Um Homem de Família traz um conto de Natal ao melhor estilo A Felicidade Não se Compra, de Frank Capra (mencionado acima), repleto de clichês, mas com um elenco carismático e repleto de sensibilidade.
É isso galera, independente da religião ou crença de cada um, celebremos essa data com nossas pessoas queridas e que cada um esteja em paz com seus amigos e familiares. Desejamos à todos um Feliz Natal.
Só tive conhecimento da existência de Brazil, de 1985, em 2012, foi-me indicado como mais uma sociedade distópica, no melhor estilo 1984. Portanto, era uma obra de ficção científica obrigatória. E assim fui, com todas as expectativas. Não sabia nada, do diretor, roteirista, nada, a única pista que eu tinha era que Robert de Niro participava do elenco.
Aos 30 minutos do filme, confesso que tive que fazer uma pausa, para obter mais informações, quem era o diretor, roteirista, alguma pista que eu conseguisse para saber se aquelas 2:20 iriam valer a pena, pois a premissa do filme era muito oposta do que eu esperava, e qual não foi minha surpresa ao ver que era Terry Gilliam, diretor de Monty Python e o Cálice Sagrado e roteirista de A vida de Brian. Agora, tudo fazia sentido.
Esperamos em geral de filmes desse tipo, mundos tecnocratas, frios e sombrios. Em que a narrativa, incita aquele que a acompanha a sentir a mesma tensão que aquele mundo exige. Brazil vai além, contendo todos os elementos clássicos desse tipo de história, mas somando uma pitada de humor nonsense, beirando ao pastiche. E também com muitas viagens oníricas do personagem principal, que nos deixa totalmente confusos sobre o que é realidade e o que é sonho.
A história, é de um funcionário do ministério da informação Sam Lorry (Jonathan Price), que percebe que o sistema do governo errou, e esse erro, o une a Tuttle (Robert de Niro), um procurado terrorista. E Jill Layton (E aí… comeu?), sua amada. Ao tentar corrigir esse erro do Estado, Sam, acaba por se tornar um inimigo público também.
A própria trama, como o mundo proposto pelo filme, tem claras inspirações em 1984 de George Orwell. Chegando a dar uma impressão de ser uma sátira à própria obra (o diretor é um especialista nisso). Repleta de críticas à nossa sociedade. Como a indiferença dos indivíduos, às situações de horror e morte. O culto a beleza física, e cirurgias plásticas. A governos e instituições autoritárias, em que a única função é a manutenção do status-quo. Enfim, tudo que se espera em uma boa obra de ficção, em conjunto com uma sátira.
A trilha sonora, é composta praticamente, com apenas uma música, Aquarela do Brasil, que faz um ótimo contraponto ao clima da trama em seus momentos mais tensos. E colabora com as viagens oníricas do personagem principal, na estranheza sobre o que é um fato real, e um sonho. Claro, que é um tipo de obra que leva a uma reflexão, algumas mais óbvias e explicitas na obra, como as críticas sociais. Outras talvez mais pessoais do que realmente implícitas. Como, que em uma sociedade, apesar de distópica. Mas não tão distante da nossa, no tocante à manutenção do status quo presente, qualquer que seja o custo disso. Qual a real possibilidade de uma reversão desse estado? Ou ainda mais, ao chegar em tal estado de organização, e anestesia social. Qual a diferença entre sonho, realidade e alucinação. Ao se buscar um ideal melhor.
Brazil, é um ótimo filme, obrigatório para os fãs de ficção científica, ou até ficção política, como alguns gostam de caracterizar, Admirável Mundo Novo, Fahrenheit 451, e o já citado 1984.
PS. Você, brasileiro, por favor, não me envergonhe ao falar o nome desse filme como Brrrezil. Só porque está escrito com Z. Sério, além de pedante, é patético.