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  • Crítica | Kingsman: O Círculo Dourado

    Crítica | Kingsman: O Círculo Dourado

    A carreira de Mathew Vaughn enquanto diretor é bastante promissora. Sua filmografia passa principalmente por adaptações de quadrinhos, foi assim com Stardust, Kick-Ass, X-men: Primeira Classe e Kingsman: Serviço Secreto. Em Kingsman: O Círculo Dourado, oVaughn retorna para adaptar a continuação dos quadrinhos de seu amigo, Mark Millar, e mais uma vez repete toda a fórmula de sucesso que já está habituado.

    Para muitos, o primeiro Kingsman ficou entre os melhores filmes de 2014, o que é um exagero, uma vez que nele havia apenas o desenvolvimento de uma fórmula pré-estabelecida nas outras traduções do Millarverso, com protagonistas juvenis em situações limites e edição rápida, se valendo do formato de videoclipes. Talvez o diferencial de Círculo Dourado para Serviço Secreto seja o foco no emocional dos personagens, movimento esse muito parecido com o ocorrido em Guardiões das Galáxias Vol. 2.

    O roteiro de Vaughn e Jane Goldman  introduz um novo grupo de vilões, uma organização chamada Círculo Dourado, capitaneada pela excêntrica Poppy (Juliane Moore), uma especialista em robótica que resolve regularizar seus negócios ilegais. Para isso, ela organiza um ataque a Kingsman, obrigando Eggsy (Taron Egerton) e Merlin (Mark Strong) a reinventar a organização, indo até os Estados Unidos, trabalhar com a Statesman, filial americana do serviço.

    A viagem aos EUA serve para fazer diversas piadas com o American Way of Life, seja na figura grotesca do seu presidente (Bruce Grenwold), que é mais uma caricatura inteligente de Donald Trump e seu reacionarismo, como também no modo agressivo e descerebrado que alguns personagens vivem, tanto Poppy, uma psicopata adorável que faz questão de consumir todos os traidores de seu clã, quanto com os membros do alto escalão do Statesman.

    O problema maior dessa versão é que parte dos seus méritos passam longe de serem inéditos, que funciona no primeiro volume funciona, e não tão brilhantemente em sua continuação – fato que talvez justifique as notas baixas nas cabines do filme. As lutas em computação gráfica, por exemplo, abusam de bonecos digitais sem textura, e em transmissões em IMAX se percebe o quão toscos são os personagens brigando. Outro grave sintoma dos novos tempos de filme de heróis, é o retorno de Harry (Colin Firth), que não foi sequer escondido nos primeiros trailers. Não há sequer um impacto emocional do seu retorno em tela, uma vez que já havia sido anunciado em todos os materiais de divulgação.

    Ainda assim e apesar das reclamações por parte dos críticos que achavam o primeiro filme um pseudo-libelo de originalidade no subgênero de super-heróis, Kingsman: O Círculo Dourado segue divertidíssimo, com piadas rápidas e um tom de humor superior ao original, inclusive com uma participação bem ativa de Elton John. Mesmo tendo um discurso sobre a guerra às drogas um pouco anacrônico, todo o restante da aura de espiões super-fantásticos funciona bem, o carisma dos personagens segue intacto, só uma pena que claramente haja uma repetição tão evidente de ciclos dentro do subgênero, e a tendência com o tempo é que tal filão caia em impopularidade, como foram os filmes de brucutus dos anos 1980 e 1990 ou os faroestes pós anos 1960. Somente o futuro dirá.

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  • Crítica | O Lar das Crianças Peculiares

    Crítica | O Lar das Crianças Peculiares

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    O Lar das Crianças Peculiares é o nome da adaptação cinematográfica do livro de Ransom Riggs, mas também serve em perfeição como adjetivação à filmografia recente de seu diretor Tim Burton, que coleciona fracassos de críticas em meio a poucos sucessos de qualidade indiscutível, como foi com a excelente animação em longa Frankenweenie. Não à toa, este último filme citado era um retorno às origens, como também o objeto analisado, que mistura elementos de A Fantástica Fábrica de Chocolate no visual colorido, e Edward Mãos de Tesoura ao exibir um ideário gótico e repleto de criaturas anormais e simpáticas.

    A história é contada a partir da visão de Jake, interpretado pelo mesmo Asa Buterfield que fez A Invenção de Hugo Cabret. Seu personagem é bastante parecido com o visto no filme de Martin Scorsese, mostrando um garoto excluído socialmente e com sérios problemas psicológicos. A única pessoa que tem por hábito conversar francamente com o menino, é seu avô Abe (Terence Stamp), que é um homem já muito idoso e portador de demência. O medo do rapaz logo vai de encontro ao infortúnio de seu avô, com o receio de cair no mesmo problema de saúde pelo qual passa seu antigo mentor.

    O grande truque da história, que é baseada no livro O Orfanato da Srta. Peregrine Para Crianças Peculiares, é o de estabelecer uma dubiedade entre o argumento de loucura propriamente dita e o mundo novo a qual Jake é convidado a entrar. Variando entre a crença nas ultimas palavras de seu avô e o receio de estar ficando louco, ele viaja com seu pai, Franklin Portman (Chris O’Dowd), para o País de Gales, onde é apresentado as mesmas criaturas fantásticas narradas nas historias infantis estranhas que seu parente contava. A persona do pai aliás é uma face polêmica, já que é um homem claramente ausente e ainda assim preocupado, muito crítico a figura de Abe por também ter sido um pai que mantinha distância da família, repetindo assim o ciclo de erros ainda que por uma via bem diferente da geração anterior.

    É a partir desse mote que Burton pode soltar sua imaginação estranha para construir personagens que variam entre um CGI muito bem feito e técnicas de stop motion maravilhosamente bem conduzidas, sendo este o fator mais elogiável do longa metragem. Os personagens periféricos são críveis, apesar de suas habilidades estranhas, e carismáticas cada um ao seu jeito. Há pouco tempo de tela para cada um deles, mas é fácil estabelecer qual é o drama de cada um e as motivações. O destaque maior vai para duas personagens femininas, a primeira é Miss Alma LeFay Perigrine (Eva Green), que varia entre emoções fortes e bem interpretadas e excentricidades bem exageradas, e claro, a mocinha, Emma (Ella Purnell), uma moça graciosa que arrebata a atenção tanto do protagonista quanto do público quase que instantaneamente.

    A mitologia em torno do cenário fantástico e das regras daquele universo particular soam um pouco confusas, mas logo se tornam naturais para o público, apesar de algumas baboseiras fantasiosas e erros crassos de congruência. O roteiro de Jane Goldman sofre de uma irregularidade atroz, aliás praxe nos filmes de Burton (mesmo os bons), já que tem um final como uma solução um pouco fácil na escolha entre nutrir a história de amor em detrimento da completa falta de preocupação do herói com seus familiares, exceção claro ao seu avô. No fim, as jornadas dos dois homens do clã se repetem, mostrando que o destino tem de a seguir o mesmo fluxo sempre.

    Dadas expectativas em relação ao filme, O Lar das Crianças Peculiares é o melhor filme live action de Tim Burton em anos, superando em muito inclusive Grandes Olhos, esbarrando somente em Peixe Grande e Suas Histórias Maravilhosas. Talvez este seja um início (ainda que tímido) do realizador em tentar resgatar um cinema com menos maneirismos, iguais as suas primeiras produções, sendo menos ambicioso e preso a trucagens bobas e em exibir seus amigos e mais preocupado em mostrar um filme coeso e interessante, ao menos para o nicho buscado.

  • Crítica | X-Men: Dias de Um Futuro Esquecido

    Crítica | X-Men: Dias de Um Futuro Esquecido

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    A carreira de Bryan Singer se aproximava perigosamente da de seu contemporâneo Peter Jackson. Ambos tiveram um começo bom, com primeiros filmes de sucesso relativo, e que depois encabeçaram franquias de milhares de fãs, ainda que em X-Men, Singer dispusesse-se de muito (mas MUITO) menos orçamento do que Jackson angariou na trilogia O Senhor dos Anéis. Após ambos saírem de sua zona de conforto, insucessos vieram, já que King Kong, Um Olhar no Paraíso, Operação Valquíria e Jack, o Caçador de Gigantes não foram produções ruins necessariamente, mas ficaram muito aquém das expectativas dos estúdios. Em comum entre os dois estaria o retorno às franquias que os projetaram ao estrelato, mas diferentemente de seu igual, Singer logrou êxito ao falar dos seus conhecidos personagens, até porque sua vida pessoal o credencia a falar de excluídos. A segregação que sofreu por ser judeu e homossexual certamente é semelhante ao sofrimento mostrado em tela com a raça de homo superior caçada em 2023.

    O núcleo dos personagens “veteranos” é secundário, ainda que seja esta realidade a que origina o plot principal, pois como visto na publicação de Claremont e Byrne, o futuro dos mutantes e de seus simpatizantes é sombrio, com muitas referências visuais a Exterminador do Futuro de James Cameron  que por sua vez jamais assumiu a influência da história em sua obra. Kitty Pryde, personagem de Ellen Page, lidera um dos poucos grupos de resistência, e, por meio de uma mutação secundária (estigma adotado nas revistas X nos idos dos anos 2000), consegue transportar para um passado recente a consciência dos outros mutantes ao seu corpo. A Ninfa (ou Lince Negra), Robert Drake, o Homem de Gelo (Shawn Ashmore), e outros mutantes, vivem a fugir dos Sentinelas, até que recebem uma visita do que sobrou dos X-Men, Xavier, Magneto, Tempestade (Halle Berry) e, claro, Wolverine, interpretado por Hugh Jackman. O plano em conjunto é retornar ao passado através de Xavier para que este impeça Mística (Jennifer Lawrence) de assassinar Bolívar Trask, criador dos robôs caçadores. A saída do roteiro foi deveras inteligente, uma vez que a trama de Robert Kelly já havia sido descartada pelo próprio diretor, em 2000.

    Uma grande fonte de reclamações dos fãs relaciona-se à cronologia da franquia nos cinemas. Para todos os efeitos, o trabalho feito por Mathew Vaughn é sim um reboot que obviamente leva em consideração alguns pontos da história dos filmes de Singer. A Casa das Ideias sempre menciona que os quadrinhos Dias de Um Futuro Esquecido faz parte de uma realidade alternativa. Tais elementos podem ser encarados como problemas, mas para quem está acostumado a consumir quadrinhos mensais e tem de engolir novos recomeços a cada cinco anos, e claro, com conteúdos muito mais incongruentes, as concepções dentro do filme são de fácil digestão, até porque o foco maior é a continuação da trama inciada nos anos 60. Os dois grupos de mutantes liderados por Charles Xavier (James McAvoy) e Erik Lensher (Michael Fassbender) foram dissolvidos, e as causas dos eventos, muito ligadas ao aparentemente contido Bolívar Trask, são aos poucos mostradas em tela. Protagonizado pelo ótimo Peter Dinklage, Trask é um cientista que aparentemente busca a sobrevivência dos humanos, mas que impinge a muitos mutantes experimentos semelhantes aos que os nazistas realizavam com judeus. Obviamente, as experiências genéticas feitas por Trask causam ódio em Mística, que via seus iguais serem exterminados, o que a faz se transformar em uma autêntica máquina de matar suas cenas de ação são de um primor visual ímpar.

    O foco emocional é todo voltado à crise existencial de Xavier nos anos 70. O Professor X volta a andar graças a uma droga criada por seu então lacaio Hank McCoy (Nicholas Hoult), substância essa que reprime os poderes do Doutor, assim como seu ideal de querer mudar o status quo por meio do pacifismo. Ele é mostrado como um homem deprimido, resignado e desesperançoso, uma nuance pouco explorada nos quadrinhos, mas plenamente condizente com a época, visto que os anos 70 foram de muita decepção para os americanos, basta lembrarmos do Vietnã. Xavier quer interromper seus poderes por não aguentar mais ouvir em sua mente as vozes e as lamúrias das pessoas, além, é claro, de viver da culpa por ter perdido seus alunos e companheiros em lutas anteriores.

    Já Magneto também estava de mãos atadas, encarcerado, metros abaixo do Pentágono, acusado de um crime terrorista que não havia cometido. Sua fúria aumentou mais, a despeito até de sua postura mais calma quando reintroduzido. A ideologia presente nos primeiros discursos de Malcolm X torna-se ainda mais flagrante quando são analisadas as ações de seu passado em comparação com as de sua contraparte do futuro. Mas ambas as encarnações de Erik demonstram um poder magnânimo, algo que Singer ainda não podia mostrar antes nos filmes anteriores, talvez pela falta de verbas.

    Mesmo com tudo isso, os melhores momentos de Magneto são as discussões que envolvem Raven, Charles e ele, formando um triângulo amoroso/ideológico de cunho emocional e tocante, visto que todos se sentem traídos, até havendo razão em se sentirem assim. Dos embates o mais emocionante certamente é o primeiro encontro dos dois antigos amigos, precedendo uma sequência de ação das mais engraçadas, que, mesmo com o alívio cômico de Mercúrio (Evan Peters) — uma participação ótima —, consegue manter o tom emotivo e simbólico do que seria aquela amizade milenar e do quão ambos valorizariam um ao outro pela causa mutante.

    Pela primeira vez, em todos os filmes dos mutantes, Wolverine não é o protagonista. Porém, sua importância é obviamente gigante, fazendo a ponte para o encontro dos protagonistas, uma escada na maior parte de sua inclusões como personagem. Tal escolha não impediu que Singer registrasse o Carcaju expondo suas nádegas, dando vazão a (mais) fantasias de leitores talvez a questão esteja no contrato de Jackman com a Fox. Iniciada em X-Men – Primeira Classe, a pecha de transformar os filmes da franquia X-Men em películas em que se divide o protagonismo é cada vez mais solidificada, assim como o enfoque da questão social, deixada de lado em X-3 e nos spin-offs. Os assuntos mais interessantes retratados nas grandes histórias de mutantes são estes, o paralelo com as ideologias, a discussão a respeito do preconceito e até aonde esta guerra pode ir.