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  • Crítica | X-Men: O Confronto Final

    Crítica | X-Men: O Confronto Final

    O terceiro capítulo da franquia X-Men começa no passado, mostrando duas crianças que faziam parte do quinteto inicial de mutantes treinados por Charles Xavier e Magneto, em uma versão rejuvenescida Patrick Stewart e Ian McKellen terrivelmente animados e artificiais de um modo assustador. Sem saber, Brett Rattner condenaria seu filme e seria mais lembrado por esses erros crassos do que pela boa ação que em alguns momentos apresenta.

    X-Men: O Confronto Final parece a receita de um bolo que não deu certo, apela para uma questão densa em seu início, depois tem momentos de ação bem filmados em uma luta com Sentinelas, mas que não vale de nada, pois ocorria numa simulação dentro da Sala de Perigo – que mais parecia o holodech de Jornada nas Estrelas: A Nova Geração, série que também tinha Stewart como líder dos heróis – e por mais infame que soe a insinuação de roubo de tecnologia do Capitão Picard para seu grupo de mutantes, certamente é algo menos desequilibrada do que a construção feita no começo deste filme.

    Uma versão de Hank McCoy é apresentada, e coitado de Kelsey Grammer, seu intérprete, que tem que agir como um macaco de circo, que lida com as questões do governo relacionadas aos mutantes, como secretário dessa pasta específica. Se as autoridades agem de modo bizarro, o núcleo escolar também, Scott (James Marsden) não superou o luto, mas Marie (Anna Paquin) não, ela age como uma adolescente em fúria, que involuiu de X-Men 2 para este. Mesmo a líder tática Tempestade é desequilibrada, parecendo mais uma criança, para desgosto de Halle Berry, que acreditava que teria um melhor papel nesse.

    Nada justifica a saída de Noturno do elenco (nem a presença de Fera) ou a participação de Ciclope, basicamente porque Marsden aceitou um papel no Superman: O Retorno de Bryan Singer e teve um conflito de agenda. No caso do primeiro, o motivo oficial dado era que Alan Cumming faria uma pequena participação, mas o processo de maquiagem era caro e demorado demais para utilizar em uma cena tão curta, mas o que mais se falou na época é que o público o confundiria com McCoy. No game oficial do filme, se afirma que Wagner abandonou os X-Men por não querer uma vida tão pouco pacífica quanto a de um X-Man. Se houvessem gasto algumas palavras nisso, certamente faria mais sentido.

    Há outra grave adaptação, os Morlocks são reduzidos a um grupo de mutantes que usam roupas da moda, tatuados e que adora fazer amostras gratuitas de seus poderes. O visual neo punk não combina sequer com Callisto (Dania Ramirez), mas piora demais com o restante. Todo o retorno ao Lago Alkali, onde ocorreu a ação do filme anterior é equivocada, primeiro pelo retorno de Jean, que traz uma Famke Janssem com cabelos maiores e mais bela, com uma crueldade primária e inexplicada. Dito assim esses momentos soam patéticos, mas certamente não chegam nem perto da vergonha alheia que a cena em si provoca no espectador mais atento. É tudo muito mal construído, mal orquestrado e ofende até o bom desempenho da personagem no outro episódio da franquia.

    O terceiro longa da série de mutantes não sabe que história contar, e erra em todos os campos que atua. A ideia da cura mutante deveria ser melhor trabalhada, de preferência por um diretor que não fosse especialista apenas em filmes de ação. Não há profundidade, drama ou qualquer grau de complexidade, apenas simplismo. A ideia do doutor Worthington é tão frágil que nem seu filho acredita nela, e aparentemente não é definitiva, visto a cena do xadrez que envolve Magneto no final, além disso, o máximo que se discute a respeito da controvérsia e da opinião pública mutante é que alguns são a favor e outros contra, nada mais é desenvolvido.

    A redução de personagens inclui até Magneto, que em troca de ter mais capangas capazes de falar frases de efeito, abre mão de sua companheira Mística após salvá-lo. O vilão está longe de ser um personagem bidimensional capaz de abandonar sua antiga e mais fiel amiga à toa. Rattner não parece ter conhecimento disso. Tudo que envolve o retorno dos amigos mutantes a casa da pequena Jean é de fato a parte mais podre desse bolo azedo. O fim do Professor X, a transmutação que faz com que Janssen pareça um boneco zumbi, o acolhimento de Magneto, as falas do Fanático, é tudo muito digno de risos, assim como Wolverine ajoelhado, chorando, consolado por Ororo, tudo pífio de um jeito que é impossível não se irritar.

    Lady Letal, Groxo e Dentes de Sabre são três exemplos de personagens introduzidos nos filmes de mutantes para protagonizar bons momentos de ação, mas cada um deles é bem justificado ao menos, ao contrário da montanha de mutantes vistos aqui. É uma sucessão de equívocos, que faz deste filme uma desconstrução de todo o legado que os filmes anteriores tinham, não havia mesmo como continuar a partir desse ponto e a solução que Matt Vaughn encontrou em X-Men: Primeira Classe foi criativa e inteligente.

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  • Crítica | X-Men 2

    Crítica | X-Men 2

    O início de X-Men 2 é eletrizante, e repete o monólogo que Xavier proferiu em X-Men: O Filme levemente modificado, apontando para as estrelas, mostrando que a ambição do filme mudou, assim como prestígio de Bryan Singer. A trama de fato começa na Casa Branca com o presidente dos EUA correndo perigo, ao ser facilmente invadido por um mutante. O Noturno de Alan Cumming é introduzido de maneira selvagem, agressiva e uma violência demoníaca, que combina com sua aparência, magnificada pela música repleta de elementos góticos. Em cinco minutos, Singer demonstra o que poderia ter sido feito em seu primeiro filme, caso tivesse mais dinheiro, e ainda faz a cena de abertura que melhor traduz o heroísmo e o escapismo dos quadrinhos até hoje.

    X-Men 2 não demora a mostrar seu protagonista, Wolverine (Hugh Jackman), achando o Lago Alkali, o lugar que deveria mostrar um pouco de sua origem. Também não há demora em apresentar os outros mutantes, mas claramente a idade pesa sobre Famke Janssen, que está claramente com idade demais para aparentar uma mulher de vinte e poucos anos, mas seu desempenho dramático surpreende. Singer e seus roteiristas eram mestres em por elementos a serem evoluídos, ao passo que não trabalhavam bem com sutilezas.

    O Xavier de Patrick Stewart é mais atuante, ele aparece em ação fora da mansão, e mesmo ao cometer atos antiéticos – quando manipula os pensamentos de pessoas inocentes que viram os seus alunos em ação – há um cuidado grande em mostra-lo como um grande mentor e ideal a ser seguido, ainda que algumas de suas ações sejam discutíveis.

    O roteiro tem bons momentos ao associar a origem de Logan, não resolvida em Alkali com o ataque na Casa Branca. Engraçado que Ororo/Tempestade (Halle Berry) deve uma certa submissão a Jean, e isso pouco se nota de tão sutil que é a cena de encontro com Kurt. Mesmo diante de clichês, como o fracasso com antigos alunos, o filme lida melhor com a carga dramática mais adulta, a exemplo da cena na casa dos Drake onde Bobby (Shawn Ashmore ) tem de ratificar que não escolheu nascer diferente, onde se resume bem a ideia do preconceito embutido na sociedade comum. Outra parte bem trabalhada se dá na cena da invasão da Mansão Xavier, que ocorre com pouco mais de 30 minutos de exibição, sendo esse o momento onde Wolverine pode ser o assassino sangue frio das HQs clássicas, escondendo o sangue nos corredores escuros das instalações.

    A figura de William Stryker (Bryan Cox) como vilão mistura elementos do chefe do projeto Arma X, que injetou adamantium em Wolverine com o personagem homônimo dos quadrinhos, que está em Deus Ama O Homem Mata, um pregador evangélico louco e intolerante. Ele usa os poderes de seu filho para seu próprio anseio maligno. Outro momento interessante e depois reutilizado em Logan, é a pressa em salvar o Professor X de se tornar uma arma de destruição em massa, referenciando ainda que de leve a famigerada saga Massacre.

    Claramente, Singer queria lidar com a Fênix nos filmes seguintes, pois há uma bela evolução de Jean Grey como personagem. Ela que antes só movimentava seringas com a mente agora é capaz de deter mísseis. A aproximação de Magneto com os alunos de Xavier faz uma bela referência as fases que o mestre do magnetismo se bandeou para o lado dos mocinhos, ainda que aqui fique bem claro que ele só se movimenta por interesse próprio. A união dessas forças gera bons momentos, como a cooperação em equipe bem coordenada por Singer, o brilho de Rebecca Romijin como espiã e alívio cômico (sua personalidade impressiona), e claro, as batalhas entre o casal Summers e os detentores do adamantium. O filme não é perfeito, existem algumas conversas complicadas, como a piegas fala entre Noturno e Mística, em que o rapaz a indaga sobre esconder a própria aparência. Esse ponto encontraria eco em X-Men: Primeira Classe, seja nos momentos bregas de demonstração dos poderes dos mutantes ou no clichê de orgulho mutante que Jennifer Lawrence profere.

    A modernização do mito de Frankenstein de Mary Shelley beira a perfeição na relação parental entre William e Jason funcionam como condutores do mal, um maquiavélico e outro tolamente manipulado pelo ideal de um fanático, e o resultado final não poderia ser mais agressivo, em especial na vendetta que Magneto arquiteta rapidamente, demonstrando seu enorme poder mutante, rivalizando ele com sua capacidade intelectual e tenacidade. A forma como os heróis corrigem esses rumos soa um pouco apressada, mas conversa muitíssimo bem com o cânone dos quadrinhos, resultando num belíssimo filme de equipe onde o protagonismo é mais balanceado, mesmo que Jackman tenha muito mais brilho. Janssen é soberba quando exigida, em melhor forma até que Stewart, e seu sacrifício no final faz o ate então inexpressivo James Marsden brilhar. A direção de atores de Singer é exigida e tem muito êxito, exceção a Halle Berry, mais uma vez sub aproveitada.

    Singer claramente queria fechar a trilogia, mas se envolveu em Superman: O Retorno, e a Fox optou por não esperá-lo. Jamais saberemos quais eram seus planos à época para o terceiro filme, ainda que ele tenha retornado a franquia como produtor em Primeira Classe e diretor em X-Men: Dias de Um Futuro Esquecido e X-Men: Apocalipse. X-Men 2 entrou para história como um dos melhores filmes de quadrinhos, sendo talvez o melhor no quesito ação, contendo um bom trabalho de equipe, oposição aos heróis carismática e bem representada, sacrifícios e um belo gancho para futuras obras, que jamais seriam tão bem urdidas e construídas quanto essa, mesmo com os remendos no reboot da saga anos depois.

    https://www.youtube.com/watch?v=xF9FW5_yDxs

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  • Crítica | X-Men: O Filme

    Crítica | X-Men: O Filme

    O filme que ajudou a inaugurar o exploitation de heróis recentes começa com um monologo, acompanhado de uma abertura em CGI que explora a sinapse cerebral de uma pessoa com gene x. Enquanto emula o início de Clube da Luta, Patrick Stewart empresta sua voz para explicar uma das razões pelos quais ele e os seus são discriminados. Os próximos momentos de X-Men: O Filme de Bryan Singer mostram dois cenários, e a origem de dois mutantes, Erik Lensher e Anna Marie, Magneto e Vampira, e tanto para o vilão quanto para a futura heroína, o mesmo destino, pessoas comuns olhando para eles com olhos vis, claro, em momentos da historia bem distintos, um nos campos de concentração durante o holocausto e outro nos anos 2000.

    A cena imediatamente posterior é pouco sutil, há uma apresentação de Jean Grey (Famke Janssen), no senado, interrompida por Robert Kelly (Bruce Davison), um político que usa sua influência para denegrir os mutante. O conteúdo do debate e da discussão entre os antigos amigos, Erik e Charles Xavier é bem explicito, fruto claramente da falta de investimento da Fox que não contratou um roteirista mais gabaritado e não permitiu que esse filme lançasse mão de obviedades para compor seu quadro. Tal qual foi com Star Wars, não se acreditava no potencial deste. O roteiro de David Hayter (baseado no argumento de Tom DeSanto e Singer) é apressado, com dez minutos a maioria dos personagens clássicos já aparecem e dão o ar de sua graça.

    Hoje, discutir Hugh Jackman no papel de Wolverine parece loucura, mas na época houve muita discussão, pelo fato de Logan ser baixo e Jackman ter pouco menos de dois metro de altura, mas fora toda a artificialidade da apresentação e no cenário que ele usa para conseguir alguns trocados em lutas clandestinas de arena, seu desempenho faz lembrar sim os quadrinhos clássicos de Frank Miller. Essa estranheza gritante até faz sentido, esse é um mundo preconceituoso, e Singer como diretor judeus e homossexual tenta passar o espectador um pouco das sensações que tinha ao perceber como as pessoas comuns o viam. A mão é um pouco pesada, mas a mensagem é passada de maneira inteligente.

    Mesmo Anna Paquin não tendo um desempenho espetacular, a condição de orelha não é totalmente descartável, de todas as caracterizações forçadas, a dela é uma das mais tranquilas, e é difícil não achar no mínimo engraçados alguns pontos, como o esconderijo da irmandade de mutantes, que é estiloso, feito por Magneto com um arquitetura terrível e nada prática- com bolinhas de bater que rodam sem cordas e que caem quando o mestre de magnetismo sai – ou a base dos heróis, com letras X por todo lado, exposição das roupas pretas dos mesmos, e acesso livre para Wolverine. Há também de se lembrar que ainda não havia sido lançado Homem Aranha de Sam Raimi e Batman Begins de Chris Nolan, filmes de herói eram comuns na Dc com Superman 22 anos antes e a recém acabada franquia do Morcego, onde Batman & Robin tinha encerrado mal a saga 3 anos antes. Ha muitas criticas injustas ao que Singer fez, mas esse ajudaria a pavimentar o caminho da Marvel, a partir de 2008 e de todo o campo de super heróis, que resolvia misturar a fantasia com algo mais realista. Mais do que isso, universo Ultimate da Marvel, lançado em 2001 bebia muita da fonte aberta por este filme, retribuindo assim as referências aos quadrinhos invertendo a lógica de inspiração e inspirado.

    É louvável que o ponto de partida do filme já tenha em mente a maioria dos aspectos básicos de revistas de heróis. Mesmo Vampira fazendo as vezes de menina desprotegida que Kitty Pride e Jubileu foram nas HQs, mesmo com Wolverine sofrendo explicações sobre o colégio de super dotados, a gênese da luta dos alunos de Xavier já é totalmente explicada com menos de 30 minutos, e a duração de 104 minutos é bem utilizada. Os momentos de ação também são eletrizantes, a Mistica de Rebecca Romijin é deslumbrante não só por conta das curvas da atriz e da forte maquiagem, o efeito usado na sua transformação é sensacional e o uso que ela faz dos pés é algo seminal também.

    O que se nota é que os conceitos e ideais estavam em estágio embrionário, fazendo assim justificado até o livre uso de arquétipos  nos personagens principais. Por mais que não tenham tanto espaço de tela quando Wolverine, são os dois mentores os melhor apresentados personagens. Enquanto Patrick Stewart inspira confiança, Ian McKellen é carismático e exibicionista. Toda a questão expositiva e exibicionista que apresenta tem sentido só por conta de seu desempenho, mesmo quando da show off de suas ideias, personalidade, poderes e habilidades de seus capangas. Ele precisa justificar isso, pois a exibição não é para o público, e sim para seu opositor politico, no caso, Kelly, que é seu prisioneiro. Essa exposição até conflita com alguns conceitos do filme, e claramente eles não são amadurecidos quanto deveriam, mas ainda assim há uma justificativa.

    O exemplo maior dessa fragilidade se vê na invasão fácil que Mística faz a escola, não há nenhuma segurança nem nesses tempos de paranoia e mesmo que isso já tenha ocorrido nos quadrinhos (aliás, o tempo todo), um filme que pretende ser realista precisa identificar isso como prioridade. Isso, unido a questão dos efeitos especiais serem fracos, faz a obra envelhecer mal. É absurdo como quando Singer era prolifico, não havia dinheiro, e hoje com ele em desgraça pessoal, há investimento em detrimento de péssimas historias.

    Falta em Hayter um trabalho mais acurado na adaptação dos roteiros dos quadrinhos, ainda que haja da parte do diretor claramente uma insistência em alguns momentos mais expositivos, no entanto o senso de urgência é grande, e até bem trabalhado, se não fosse tão acompanhado de conversas óbvias e não trabalhasse tanto mal os papeis de James Marsden e principalmente Halle Berry, que é completamente desperdiçada, certamente haveria maior êxito. Tal qual eram as reclamações de Chris Claremont quando roteirista dos Fabulosos X-Men, Tempestade não tem o destaque que merece, enquanto Logan é o centro das atenções, não surpreenderia se esse longa chama-se Wolverine e seus amigos.

    Alguns pequenos absurdos são bem charmosos, como o fato da pista de pouso e lançamento do jato Pássaro Negro ficar embaixo da quadra de basquete, mas dado a pouca verba, esse acaba mesmo sendo um evento engraçado. Dos aspectos técnicos, a música de Michael Kamen é bem icônica(ele aliás, também compôs a música tema do desenho de 1993), e a fotografia trabalha bem os elementos fantasiosos e o uso indiscriminado de CGI. É realmente uma pena o pouco orçamento, que influiu muito nos últimos atos, que careceram de una luta mais elaborada, sobrando apenas a breve batalha de Mistica e Wolverine como algo realmente bom.

    Cabe a Logan a pecha de heroi em sacrifício, o que vai para o combate final com o vilão e o que tenta resgatar a vida da mocinha, dando a Vampira seu poder, mas para cada um dos quatro X-Men há seu momento de brilho na Batalha de Manhattan, mesmo considerando estranho alguns pontos, como a batalha ser na Estátua da Liberdade. X-Men: O Filme está longe de ser perfeito, mas a despeito de todos os infortúnios que passou, certamente é uma bela obra, pavimenta bem a saga para mais filmes e para se tornar uma franquia, mas é auto contido ao ponto de soar bem como adaptação solo, capturando bem o espírito do grupo de alunos de Xavier, além de ter feito historia nos filmes de ação.

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  • Crítica | Mulher-Gato

    Crítica | Mulher-Gato

    O longa de Pitof fez história em 2004, trazendo Halle Berry no papel principal da mais famosa vilã das histórias em quadrinhos. Mulher Gato começa com uma introdução animada mostrando cenas do Egito, Grécia e outros lugares com mulheres vestidas como felinas. Antes de aparecer finalmente a personagem Patience Phillips, mal se nota o desastre que aguardaria o público.

    Está versão com roteiro de John Brancato, Michael Ferris e John Rogers (argumento de Brancato, Ferris e Theresa Rebeck) repaginar conceitos de Batman: O Retorno, mas sem a alcunha de Selina Kyle, sem Gotham, sem Batman 3 e principalmente, sem identidade. O estranho é que pouco tempo antes, em 2001 estreava A Última Ceia, longa que deu a Berry um oscar por sua atuação. Aparentemente a premiação não garantiu a ela um maior crivo na hora de escolher os produtos dos quais faria parte, até porque em 2002 ela co protagonizou  007: Um Novo Dia Para Morrer, com chances de ganhar um spin off onde sua personagem Jynx teria o papel principal. O resultado todos sabemos, críticas bastante negativas e um novo reboot em Cassino Royale, com outro ator e nada de spin off.

    Berry foi originalmente pensada para interpretar Selina Kyle no jamais feito Batman: Year One cancelado de Darren Aronofsky, inclusive quando a produção ficou parada em 2003, rumores indicavam que poderiam reaproveitar Berry  em Batman Begins, mas isso não passou de um rumor, tanto que o longa de Pitof foi ao ar antes do de Christopher Nolan. Outro fato curioso é que Laeta Kalogridis foi uma das consultoras do roteiro não creditadas do filme, ela que em 2002  idealizou o seriado Bird of Prey, que aqui no Brasil ficou conhecido como Mulher Gato também.

    Há uma tentativa genuína de fazer um drama acontecer, Patience é maltratada por seu patrão, George Hedare (Lambert Wilson, o Merovingian de Matrix Reloaded), defendida mal e porcamente pela esposa do mesmo – que aliás, é substituída na função de modelo da empresa que ajudou a fundar –  ela é oprimida por seu vizinho. Seus problemas são mundanos e nenhum é gravíssimo. Ao tentar salvar um gato ela quase se mata, sendo salva por Tom Lone (Benjamin Bratt), um policial que virá seu interesse romântico. A maneira como esse momento é conduzido por Pitof é estranho demais, e talvez a ideia fosse ser essa uma menção a tentativa de suicídio, no entanto, não há peso dramático nisto, nem de longe, no entanto esse é só mais um equívoco, como a construção Sally (Alex Borstein), a amiga gordinha da heroína como alivio cômico/predadora sexual ou da construção supostamente fetichista da vigilante, que basicamente não possui cenas de ação e sim pretextos para rebolar de maneira artificial pelos prédios da cidade.

    Daniel Waters, roteirista de Batman O Retorno deveria processar os que escreveram esse, pois Patience se vê em situações idênticas a Selina do filme de Tim Burton, sendo perseguido após descobrir segredos de seus empregadores, ainda que neste as cenas sejam mais agressivas que no filme de 1992, seguida de uma cena onde ela encontra o gato que tentou salvar é outros tantos, e eles aparentemente deram uma nova vida ela. Os gatos de CGI eram artificiais, mas não tão feios quanto a Halle Berry digital que pulou na janela do apartamento de Phillips.

    Patience passa a agir como um felino, em uma performance física que beira o ridículo e que só causa mais estranheza que o jogo de basquete (em uma escola) entre a heroína e o policial em um desempenho demasiado erótico, agravado pelo fato de estarem no meio de crianças, em uma versão ainda mais inadequada que a cena do parquinho em Demolidor: O Homem Sem Medo. As ações já como vigilante se diferem demais da ladra que a personagem original era, aqui ela é apenas uma justiceira genérica, com cabelo curto e na moda, que pega algumas joias para si, entre uma cena com CGI artificial e outra.

    A cena em que a personagem muda o visual é péssima, uma tentativa de mostrar ela como uma mulher independente, mas que ainda assim é refém de clichês sexistas. Ela entende o poder que lhe é conferido, e para praticar sua ideia de justiça ela faz uma roupa toda rasgada na parte das pernas e bunda, para sensualizar e para constranger seu dublê, que na maioria das vezes, era um homem.

    Toda a trama envolvendo a vilã que Sharon Stone faz – Laurel Hedare, a tal esposa desprezada de George – é mostrada de maneira gratuita, mesmo que seus motivos de ciúmes sejam explícitos desde sua primeira cena. Impressionante como tanto ela quanto Patience parecem se inspirar em visuais recentes da apresentadora Ana Maria Braga para compor seus personagens, ainda que a global passe menos vergonha que as duas, mesmo com as inúmeras gafes que já cometeu no Mais Você.

    É dificil encontrar o principal culpado para uma obra que adapta quadrinhos de maneira tão pífia, e certamente este fica no mesmo hall de Liga Extraordinária, Spirit, Lanterna Verde, mas não tendo o mesmo tom humorístico involuntário como Nick Fury e Spawn tiveram, uma vez que é bastante irritante, e também consegue ser tão esquecível quanto as versões de Vampirella e Model By Day, que também tinha supostas femme fatales como protagonistas, além é claro de ser o responsável por Berry ter vencido um Framboesa de Ouro, premio que ela fez questão de buscar, além de ter sepultado praticamente os trabalhos em direção de Pitof, além de ter comprometido também carreira de Stone como atriz, sendo até hoje relembrada como a péssima vilã que viveu.

    A luta final é patética, mas feia até que a imagem que Stone tem após ser arranhada pelas garras da Mulher é Gato. A queda é tão mal feita quanto as tramas dos personagens secundários que se fecham. A personagem que deveria soar como uma praticante de bondage fecha seu filme solo com uma figura patética e incapaz de controlar até simples atos, não atingindo o tal ápice físico que sempre foi a marca da personagem, além disso, a ideia de que um produto de beleza revolucionário que ao longo do tempo causa em quem usa a possibilidade de morrer estar prestes a entrar no mercado é complexo demais para a produção tão porca quanto é esta, que não consegue dar qualquer dimensão mais épica aos fatos  que ocorrem aqui.

    https://www.youtube.com/watch?v=SbfeJC1xfSc

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  • Crítica | 007: Um Novo Dia Para Morrer

    Crítica | 007: Um Novo Dia Para Morrer

    007 - Um Novo Dia Para Morrer - poster

    É impossível seguir um padrão. Por mais que se busque o linear, até o mais fervoroso fã de Harry Potter, Star Wars ou Crepúsculo vai achar prós e contras nos episódios favoritos de cada um. É bom que se saiba que esses produtos, encapados como se fossem o mais nobre Cinema, são feitos para fãs e abertos a todo tipo de debate e discussões. Quando 007 – Um Novo Dia Para Morrer estreou, a internet ainda era um luxo, mas uma coisa já se podia afirmar: o filme é o Batman & Robin das aventuras de James Bond, e este parece ser um fato difícil de se contestar.

    Logo na cena inicial, é impossível não rir com Bond surfando no litoral norte-coreano (?) vestido numa espécie de papel alumínio (??) com pranchas equipadas com armamento militar (???). É o tipo de comédia involuntária que, quanto mais se leva a sério, pior fica. Só faltou a MGM chamar o Joel Schumacher pra direção, bem antes do cara tentar se redimir com o mundo em dois bons episódios de House of Cards, em 2013. Boa tentativa, só que não.

    Pierce Brosnam nunca foi um Bond cool, e uma edição ruim entre as cenas dramáticas para ajudar o ator, enfim, não ajuda muito. Brosnam tem essa expressão natural de “eu sei o que você tá pensando, bonitão”, e na mitologia do espião isso encaixa mais que perfeitamente, contanto, é claro, que o ator não ligue o modo-automático para tentar entender os mistérios de uma incógnita em forma de personagem. Bond, nos livros, é uma sombra, o X das questões onde é jogado para resolver, e tentar sobreviver. O filme de 2002 não consegue ser mais infantil e deselegante, com subtramas políticas profundas como pouco mais que um copo d’água; mero produto de exportação.

    Na iminência de uma guerra entre as duas Coreias, a história tenta nos convencer que Bond sabe o que faz, quando é difícil de nos fazer acreditar na sua boa pontaria. Ao descobrir, por exemplo, da possível existência de um traidor, ou traidora, dentro da agência pra quem trabalha, a MI6, Bond prefere jogar esgrima e transar num cisne de gelo (o fogo é grande!) do que prestar serviços à embaixada britânica, afinal já virou rotina enfrentar os procurados pela Interpol. Por essas e por outras, Um Novo Dia Para Morrer (interminável) é o mais perto dos piores filmes de Jackie Chan e Os Pequenos Espiões que nosso agente já chegou; é a consolidação da falta de sorte de Sean Connery e Roger Moore, quando disseram-nos que já estavam velhos para acertar a mira. O mundo é um lugar frio, sim, mas o filme escolhe a pior maneira de demonstrar o que poucos ainda não sabem.

    E que abertura cheia de faíscas, mulheres de gelo e escorpiões é essa? Nem Madonna e Halle Berry na causa, aliás, deixemos Berry fora disso; aluguel é caro. Mas quer saber o que é legal na vida? Os Vilões de Bond? Sim, a maioria, em especial o icônico Jaws, de 007-Contra o Foguete da Morte, mas no caso, bacana mesmo são dois carros (não tão legais assim porque não são Transformers) correndo no gelo e explodindo montanhas árticas com mísseis atômicos – com uma desculpa qualquer para a brincadeira acontecer. É no que o filme se molda, em torno de uma grande piada, cuja melhor cena de ação, vulgo caricatura, é a famosa sequência que Speed Racer em 2007 quis se inspirar e reproduzir, mas até essa referência os Wachoswki conseguiram estragar. Parabéns.

    Promessas de Réveillon, piadas de português, alienação, cosplay da Madonna e cachorro. Outra coisa que também não falta nesse mundo é fã de James Bond, mas com um representante assim para o universo de espionagem criado por Ian Fleming, (“Parece que seu amigo acabou de vazar“, diz Bond a seu inimigo durante um acidente de avião), fica difícil afirmar que vida de fã é um mar de diamantes. Nem sempre.

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  • Crítica | X-Men: Dias de Um Futuro Esquecido

    Crítica | X-Men: Dias de Um Futuro Esquecido

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    A carreira de Bryan Singer se aproximava perigosamente da de seu contemporâneo Peter Jackson. Ambos tiveram um começo bom, com primeiros filmes de sucesso relativo, e que depois encabeçaram franquias de milhares de fãs, ainda que em X-Men, Singer dispusesse-se de muito (mas MUITO) menos orçamento do que Jackson angariou na trilogia O Senhor dos Anéis. Após ambos saírem de sua zona de conforto, insucessos vieram, já que King Kong, Um Olhar no Paraíso, Operação Valquíria e Jack, o Caçador de Gigantes não foram produções ruins necessariamente, mas ficaram muito aquém das expectativas dos estúdios. Em comum entre os dois estaria o retorno às franquias que os projetaram ao estrelato, mas diferentemente de seu igual, Singer logrou êxito ao falar dos seus conhecidos personagens, até porque sua vida pessoal o credencia a falar de excluídos. A segregação que sofreu por ser judeu e homossexual certamente é semelhante ao sofrimento mostrado em tela com a raça de homo superior caçada em 2023.

    O núcleo dos personagens “veteranos” é secundário, ainda que seja esta realidade a que origina o plot principal, pois como visto na publicação de Claremont e Byrne, o futuro dos mutantes e de seus simpatizantes é sombrio, com muitas referências visuais a Exterminador do Futuro de James Cameron  que por sua vez jamais assumiu a influência da história em sua obra. Kitty Pryde, personagem de Ellen Page, lidera um dos poucos grupos de resistência, e, por meio de uma mutação secundária (estigma adotado nas revistas X nos idos dos anos 2000), consegue transportar para um passado recente a consciência dos outros mutantes ao seu corpo. A Ninfa (ou Lince Negra), Robert Drake, o Homem de Gelo (Shawn Ashmore), e outros mutantes, vivem a fugir dos Sentinelas, até que recebem uma visita do que sobrou dos X-Men, Xavier, Magneto, Tempestade (Halle Berry) e, claro, Wolverine, interpretado por Hugh Jackman. O plano em conjunto é retornar ao passado através de Xavier para que este impeça Mística (Jennifer Lawrence) de assassinar Bolívar Trask, criador dos robôs caçadores. A saída do roteiro foi deveras inteligente, uma vez que a trama de Robert Kelly já havia sido descartada pelo próprio diretor, em 2000.

    Uma grande fonte de reclamações dos fãs relaciona-se à cronologia da franquia nos cinemas. Para todos os efeitos, o trabalho feito por Mathew Vaughn é sim um reboot que obviamente leva em consideração alguns pontos da história dos filmes de Singer. A Casa das Ideias sempre menciona que os quadrinhos Dias de Um Futuro Esquecido faz parte de uma realidade alternativa. Tais elementos podem ser encarados como problemas, mas para quem está acostumado a consumir quadrinhos mensais e tem de engolir novos recomeços a cada cinco anos, e claro, com conteúdos muito mais incongruentes, as concepções dentro do filme são de fácil digestão, até porque o foco maior é a continuação da trama inciada nos anos 60. Os dois grupos de mutantes liderados por Charles Xavier (James McAvoy) e Erik Lensher (Michael Fassbender) foram dissolvidos, e as causas dos eventos, muito ligadas ao aparentemente contido Bolívar Trask, são aos poucos mostradas em tela. Protagonizado pelo ótimo Peter Dinklage, Trask é um cientista que aparentemente busca a sobrevivência dos humanos, mas que impinge a muitos mutantes experimentos semelhantes aos que os nazistas realizavam com judeus. Obviamente, as experiências genéticas feitas por Trask causam ódio em Mística, que via seus iguais serem exterminados, o que a faz se transformar em uma autêntica máquina de matar suas cenas de ação são de um primor visual ímpar.

    O foco emocional é todo voltado à crise existencial de Xavier nos anos 70. O Professor X volta a andar graças a uma droga criada por seu então lacaio Hank McCoy (Nicholas Hoult), substância essa que reprime os poderes do Doutor, assim como seu ideal de querer mudar o status quo por meio do pacifismo. Ele é mostrado como um homem deprimido, resignado e desesperançoso, uma nuance pouco explorada nos quadrinhos, mas plenamente condizente com a época, visto que os anos 70 foram de muita decepção para os americanos, basta lembrarmos do Vietnã. Xavier quer interromper seus poderes por não aguentar mais ouvir em sua mente as vozes e as lamúrias das pessoas, além, é claro, de viver da culpa por ter perdido seus alunos e companheiros em lutas anteriores.

    Já Magneto também estava de mãos atadas, encarcerado, metros abaixo do Pentágono, acusado de um crime terrorista que não havia cometido. Sua fúria aumentou mais, a despeito até de sua postura mais calma quando reintroduzido. A ideologia presente nos primeiros discursos de Malcolm X torna-se ainda mais flagrante quando são analisadas as ações de seu passado em comparação com as de sua contraparte do futuro. Mas ambas as encarnações de Erik demonstram um poder magnânimo, algo que Singer ainda não podia mostrar antes nos filmes anteriores, talvez pela falta de verbas.

    Mesmo com tudo isso, os melhores momentos de Magneto são as discussões que envolvem Raven, Charles e ele, formando um triângulo amoroso/ideológico de cunho emocional e tocante, visto que todos se sentem traídos, até havendo razão em se sentirem assim. Dos embates o mais emocionante certamente é o primeiro encontro dos dois antigos amigos, precedendo uma sequência de ação das mais engraçadas, que, mesmo com o alívio cômico de Mercúrio (Evan Peters) — uma participação ótima —, consegue manter o tom emotivo e simbólico do que seria aquela amizade milenar e do quão ambos valorizariam um ao outro pela causa mutante.

    Pela primeira vez, em todos os filmes dos mutantes, Wolverine não é o protagonista. Porém, sua importância é obviamente gigante, fazendo a ponte para o encontro dos protagonistas, uma escada na maior parte de sua inclusões como personagem. Tal escolha não impediu que Singer registrasse o Carcaju expondo suas nádegas, dando vazão a (mais) fantasias de leitores talvez a questão esteja no contrato de Jackman com a Fox. Iniciada em X-Men – Primeira Classe, a pecha de transformar os filmes da franquia X-Men em películas em que se divide o protagonismo é cada vez mais solidificada, assim como o enfoque da questão social, deixada de lado em X-3 e nos spin-offs. Os assuntos mais interessantes retratados nas grandes histórias de mutantes são estes, o paralelo com as ideologias, a discussão a respeito do preconceito e até aonde esta guerra pode ir.

  • Crítica | X-Men: Dias de um Futuro Esquecido

    Crítica | X-Men: Dias de um Futuro Esquecido

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    Cronologia é algo divertido, mas complicado. Acompanhar os mesmos personagens ao longo de várias histórias e ver acontecimentos com consequências futuras são muito legais, mas os problemas não demoram a surgir. Além da necessidade de tudo estar amarrado e fazer sentido, o vício dos autores em revisitar o passado, recontar origens, adicionar mais detalhes ao background, invariavelmente leva aos famigerados furos da história. Nesse sentido, os X-Men são a franquia cinematográfica que melhor representa a mídia original, os quadrinhos. O mais recente longa dos mutantes chegou com a ambiciosa proposta de conectar a trilogia original, os filmes solo de Wolverine e o reboot não assumido X-Men: Primeira Classe. Se teve sucesso ou não, depende de como se avalia.

    A história não pode ser chamada de adaptação, pois é apenas inspirada livremente na célebre hq oitentista Dias de um Futuro Esquecido, de Chris Claremont e John Byrne. Num futuro próximo, o mundo foi devastado pelos Sentinelas, robôs criados para caçar mutantes mas que acabaram se voltando contra toda a humanidade. Revemos algumas figuras da trilogia num grupo comandado por Xavier e Magneto que basicamente foge e se esconde para sobreviver. A última tentativa desesperada é um plano de enviar a consciência de  para o corpo dele em 1973, data em que Mística assassinou Bolívar Trask, o criador dos Sentinelas, e foi capturada. O DNA da mutante foi a chave para os robôs se tornarem invencíveis. Logan precisará reunir as versões mais jovens de Erik e Charles (X-Men – Primeira Classe) para ter alguma chance de mudar o passado e salvar o futuro.

    Havia a expectativa de que Dias de um Futuro Esquecido consertasse ou ao menos tentasse explicar as discrepâncias entre os capítulos anteriores. Nesse aspecto, não se pode negar que o filme falhou miseravelmente: não só deixou de explicar os furos, como ainda adicionou mais alguns. Kitty Pride (Ellen Page) surge com outro poder além de se tornar intangível: mandar a consciência dos outros de volta no tempo (como raios alguém descobre ter um poder desses?). Muito melhor seria apresentar isso como uma evolução dos poderes do próprio Xavier, ou usar o personagem Forge construindo uma máquina. Charles recuperou seu corpo explodido em X-Men – O Confronto Final, Logan recuperou as garras de adamantium perdidas em Wolverine – Imortal, e sem nenhuma menção a esse respeito. A impressão é de que o cenário apresentado era um futuro da linha temporal de Primeira Classe, que POR ACASO continha elementos que lembravam a trilogia original, confirmando assim duas realidades distintas – algo que os produtores nunca admitiram.

    Superada essa falha, o núcleo futurista funciona muito bem. O peso dramático de um mundo pós-apocalítico é sentido perfeitamente. Estes X-Men agem como uma experiente unidade paramilitar acostumada a táticas de guerrilha. As cenas de combate contra os Sentinelas são ótimas, violentas e fazem bom uso dos poderes de todos os mutantes envolvidos. Além dos velhos conhecidos Kitty, Tempestade, Homem de Gelo e Colossus (pra variar, mudo como uma estátua), vemos pela primeira vez no cinema Bishop, Apache, Blink e o brasileiro com cara de mexicano Mancha Solar. Além disso, é sempre ótimo ver atores do calibre de Ian McKellen e Patrick Stewart, ainda que rapidamente.

    Pois a maior parte do história se desenrola no passado, confirmando que o filme é, acima de tudo, uma continuação de Primeira Classe. E o salto de 10 anos se mostra brutal: Xavier caiu numa depressão extrema, fechou a escola e debandou os X-Men, dos quais vários morreram, vítimas das experiências de Trask (Peter Dinklage, discreto e eficiente). Apenas o Fera permanece ao seu lado. Magneto foi aprisionado após seu envolvimento na morte de JFK. Mística atua como uma terrorista solitária lutando pela causa mutante. Logan cai no meio disso, e, com toda a sua finesse, terá que reuni-los. Aqui entra o gancho para a divertida e pontual participação de Mercúrio, com Evan Peters carismático como o herói nunca conseguiu ser nas hqs. Nada de muito original e revolucionário ao retratar a supervelocidade, mas as duas percepções (a do próprio velocista e a dos outros) foram mostradas de forma muito interessante.

    Numa história com tantos personagens, era fundamental ter foco em alguns e (infelizmente) sacrificar outros. Uma pena que o Fera (Nicholas Hoult) seja apenas um assistente/guarda-costas/capanga do bem de Charles, mas o roteiro de Simon Kinberg, Jane Goldman e Matthew Vaughn alcança um louvável equilíbrio ao centralizar as atenções em quatro mutantes. Hugh Jackman naturalmente tem destaque como o fio condutor da trama, mas não é nem de longe um protagonista absoluto – o que não deixa de ser uma surpresa; Jennifer Lawrence tem a chance de aparecer bastante de cara limpa (o que não é surpresa nenhuma) numa sólida atuação, aproveitando a importância colocada em sua personagem; Michael Fassbender tem uma participação sensivelmente diminuída em relação ao filme anterior, que era quase um “Origens: Magneto”. Mas o cara é tão bom que não precisaria nem de cinco minutos para mostrar isso. Sempre na linha entre vilão e anti-herói, Erik é aquele que não faz concessões, segue firme em sua convicção e mantém alianças de acordo com a conveniência.

    Mas o coração da história é inegavelmente Charles Xavier. Pela primeira vez na franquia, os holofotes se concentram nele, e o resultado é sensacional. Quase sempre retratado como uma rocha inabalável, dessa vez ele atravessa uma crise de fé, e temos a noção do quanto isso afeta os mutantes e por consequência o mundo inteiro. Não é fácil ser bom, honesto, herói e líder, e acreditar na proposta otimista (e ingênua) da coexistência pacífica entre humanos e mutantes e ainda assim continuar lutando por ela, especialmente num mundo onde isso parece impossível. Outro ponto a ser aplaudido é a ausência de maniqueísmo no filme: as retaliações de lado a lado parecem inevitáveis e justificáveis; todos estão errados. E cabe a Charles manter o fardo de ser o certo, redimir Mística, perdoar Magneto e salvar os humanos que querem aniquilar sua raça. James McAvoy faz um trabalho espetacular.

    Os méritos desse acerto devem ser dados também a Bryan Singer. Ele mostra mais uma vez o quanto entende desse universo, e consegue enxergar aquilo que realmente importa nos X-Men. Não uma fidelidade total a uniformes ou a altura de personagens (inacreditável a essa altura do campeonato ainda existir quem questione o Wolverine de Jackman), mas conteúdo moral, social e filosófico que sempre foram o cerne das melhores histórias dos mutantes. Dias de um Futuro Esquecido é o tipo de filme imperfeito, mas com acertos tão gratificantes que os erros merecem ser perdoados. Como o próprio final indica, a postura do espectador deve ser curtir a homenagem à trilogia original, mas esquecê-la. Apreciar as próximas aventuras sem esquentar tanto a cabeça com a cronologia, algo que os leitores de quadrinhos já aprenderam (ou deveriam ter aprendido) há tempos.

    Texto de autoria de Jackson Good.