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  • VortCast 89 | Diários de Quarentena XVII

    VortCast 89 | Diários de Quarentena XVII

    Bem-vindos a bordo. Rafael Moreira (@_rmc), Filipe Pereira (@filipepereiral), Jackson Good (@jacksgood), Bruno Gaspar e Flávio Vieira (@flaviopvieira) retornam para mais um papo sobre editores, política e muito mais.

    Duração: 100 min.
    Edição: Rafael Moreira e Flávio Vieira
    Trilha Sonora: Rafael Moreira e Flávio Vieira
    Arte do Banner:
     Bruno Gaspar

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  • [Ideias no Vórtice] O Poder no Planeta dos Macacos

    1 capa planeta dos macacos

    Desde a publicação do romance de Pierre Boulle há uma enorme discussão a respeito do sub-texto presente na franquia do Planeta dos Macacos. A trama que ganharia as telas em fevereiro de 1968 fazia uso da solidão de um homem, que em meio a um local desconhecido, luta por sua sobrevivência, superando as condições inóspitas do clima, do ecossistema e também do preconceito por ser tão diferente física e culturalmente dos seres soberanos do lugar. Os dois filmes desta nova franquia, sem dúvida alguma, trazem bons temas à discussão aberta, alguns deles já mencionados em momentos anteriores, e outros inéditos no comentário social executado na saga dos símios.

    Ao contrário do que ocorria com os filmes produzidos por Arthur P. Jacobs, a franquia deste novo século não precisou esconder o cunho político e nem o debate socioeconômico latentes. Com o fim da Guerra Fria, o revisionismo se tornou algo muito bem-vindo, uma vez que o campo a ser explorado era vasto e o tema prolífico. Taylor, o primeiro protagonista da saga, vivido por Charlton Heston, era um dos poucos personagens a quem era permitido alguma nuance de caráter. Seu personagem vivenciava uma forte dicotomia, dividido pelo desprezo à guerra entre semelhantes e o cinismo, fruto de seu egoísmo e de seu comportamento canastrão. A abordagem política do primeiro filme foi ainda pouco profunda. Já no novo nascimento da história, as surpresas quanto ao destino do mundo não seriam tão chocantes quanto os plot twists, e seriam abordadas questões mais palpáveis e comuns aos humanos.

    Taylor, ante seu nêmese, Dr. Zaius. A barba que deixou crescer visava aproximar o homem do seu primo mais peludo.

    A pueril e óbvia referência contida no segundo filme da primeira franquia, Beneath of The Planet of the Apes, traduzido como De Volta ao Planeta dos Macacos, focava  mais na Guerra Fria e lidava com os protestos anti-guerra do Vietnã, uma vez que no momento era, finalmente, pertinente falar sobre o assunto. Já em Fuga dos Planetas dos Macacos, há uma inversão dos papéis de vilões e heróis, transformando os perseguidores em perseguidos, replicando a dualidade da história mundial, além de ratificar a máxima do final pouco feliz ou otimista.

    A impessoalidade marcaria o quarto episódio, A conquista do Planeta dos Macacos, com um visual urbano moderno, que simula um futuro mais evoluído, mais próximo do que Boulle pensou, e mais focado na discussão racial. São introduzidas no filme, questões como o ódio que o homem nutre por si mesmo, o auto-controle e a redução do pensamento bestial associado aos macacos, enquanto raça, além da sutil abordagem sobre a psiquê humana. O discurso rebelde militante que dá o tom do filme, é amenizado no final, diante da possível não aceitação do público, transformando-se algo muito mais otimista do que questionador.

    O último filme da primeira franquia, Batalha do Planeta dos Macacos, foi pensado unicamente para ser uma ficção científica para toda a família, em que a existência pacífica entre as raças é o mais importante. Algumas falhas conceituais podem ser notadas, como a milagrosa descoberta da fala pelos símios, e a utilização de humanos sobreviventes fora da aldeia, supostamente os mutantes do segundo filme. A superficialidade da abordagem social e o excesso em tentar condensar tudo, conduz o filme a uma série de furos enormes, como as ambíguas lágrimas diante da estátua de Cesar, que poderiam expressar tanto a possibilidade de convivência tranquila entre macacos e homens, quanto a impossibilidade de paz entre as duas raças. O derradeiro capítulo da primeira franquia dá um triste fim às pretensões propostas pelo primeiro filme, mas abre, ainda assim, um enorme leque para a exploração da marca.

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    A “Visão” de Tim Burton

    Em um documentário da HBO a respeito do filme de 2001, Tim Burton declara que sua ideia não era refilmar o clássico protagonizado por Charlton Heston, mas sim, conduzir o texto de Pierre Boulle por outro caminho, mostrando uma supremacia símia diferente de tudo que já se viu, tanto na franquia quanto em sua filmografia. Romper com o seu costumeiro modo de contar histórias por meio de elementos puramente góticos, se mostrou algo mal planejado, já que ficou perceptível que o tom barroco inserido em seus filmes serviam para ludibriar o público, desviando a atenção de um roteiro pouco elaborado.

    A partir da realização de Planeta dos Macacos, de 2001, os filmes de Tim Burton começariam a ser apreciados de modo diferente. O diretor retornaria instantaneamente a sua antiga fórmula, saindo pouquíssimas vezes desse padrão, já que a cortina de fumaça que havia revelado a simplicidade de sua obra, evidenciou também alguns elementos grotescos. É como se a luz solar revelasse as vergonhas de alguém que tem muitos segredos degradantes escondidos, somente à espera da exposição.

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    Apesar do esmerado trabalho do treinador de dublês, Terry Notary, o modo como são conduzidas as atuações é demasiado caricato, o que faz o público automaticamente deixar de acreditar no filme. Todo o resto – exceto, é claro, o roteiro – cenário, vestimentas, direção de arte e até alguns planos de filmagem, funcionam bem, mas a edição é confusa, intercalando cenas que deveriam atemorizar o público com mostras gratuitas da convivência dos primata. O modo como os macacos gritam, estridentemente, ultrapassa o limite  da relação respeitosa entre os animais, tornando-os predadores dignos de riso.

    Dessa forma, a nova franquia optou por alterar o modo de contar a história, partindo de um visual bem distinto do filme de Burton, sepultando, infelizmente, a grande marca da cine-série, os “macacos fantasiados”, agora substituídos por animais digitais. A despeito do romantismo comum aos fãs deste universo ficcional, a decisão foi acertada, dando início a um novo começo.

    Uma Nova Origem

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    O primeiro ato notável no reboot da franquia de Planeta dos Macacos é a alcunha da macaca  inspirada em Zira,  já que a mãe de Cesar ganha o nome de Olhos Brilhantes (Bright Eyes) em Planeta dos Macacos: a origem. A inversão começa quando, na última franquia, o apelido era dado ao protagonista homem que representava o único fôlego de civilização humana, George Taylor. No novo filme, o apelido é dedicado à pobre chimpanzé fêmea, morta pela selvageria desencadeada pelo instinto de proteção materno que a fazia esconder seu filhote até mesmo de seus cuidadores, entre eles, Will Rodman, vivido por James Franco.

    Curioso é que logo no início do filme, o jovem primata  questiona sua condição, pois já que ele não era um animal de estimação, qual seria o motivo de usar uma coleira? E qual seria o motivo para ele viver enjaulado? Ao mesmo tempo em que indaga essa condição de semi-enclausuramento, Cesar dá amostras de seu instinto, o ímpeto em ser o mais ameaçador dentre os seres animalescos.

    O instinto recém descoberto faz com que seu desejo por liderar o topo da cadeia alimentar transpareça, o que é constantemente inibido pelo temor e controle humanos de suas ações. Cesar vê que sua inteligência e modo de agir causam medo nos homens, o que frusta o animal e o faz enxergar-se como errado, e até como vilão.

    Rise of the Planet of The Apes

    As cenas de interação entre os primatas é quase sempre silenciosa, o modo pelos quais os animais se comunicam é incivilizado, feroz, como a natureza é. Inserir-se nesse meio é um desafio para o primata inteligente. Os maus tratos dos domadores e o desprezo por ter de ficar longe de casa, causam nele uma amargura grande, que mais tarde o ajudaria a entender qual seria o seu papel em meio à sociedade que surgiria dali. Cesar também amadureceria o suficiente para ter uma postura equilibrada entre a autoridade representada pela supremacia, e a liderança que acarretaria em uma série de responsabilidades. Diante da iminente e facilitada saída de seu cativeiro, ele entende que é melhor permanecer onde está, em nome da organização em comunidade.

    A consciência e racionalidade de Cesar mostram serem herdados de Rodman, que em meio aos estudos que protagoniza, parece ser o único que se importa com o bem-estar das cobaias em detrimento do retorno financeiro desonesto que alcançaria com seus experimentos. O interesse e a falta de cuidado dos outros cientistas cobram o seu preço, e é partir do erro de um funcionário, que se dá a disseminação de um vírus, fruto do experimento 113. O governo de Cesar é liderado de modo justo, comedido e harmonioso. E mais do que demonstrar força, ele busca ser um exemplo de conduta, sendo pacífico quando possível e belicoso quando lhe é exigido.

    Uma vez expostos ao gás, os símios, sob a tutela de seu líder, agem como um exército treinado, com manobras e estratégias próprias, e modos de ataque elaborados. A evolução chegou, finalmente, aos primatas, que buscam o seu espaço a qualquer custo, passando por cima até mesmo do homem que um dia os encarcerou.

    planeta dos macacos a origem o negão mal

    Cesar evolui, amadurece, percebe que a sua vida deve ser com seus iguais, com aqueles que compartilham a mesma espécie que ele. Ao final, ele se despede de William de uma maneira simbólica. A mudança dentro de si já fazia sentido, mas precisava ser oficializada com seu mentor e tutor. A partir desse adeus, o símio torna-se livre para exercer o seu papel como líder da comunidade, deixando de lado os sentimentos que tem por Rodman, o rancor das memórias da estadia no “reformatório” e até a saudade de quem lhe ensinou como viver.

    O Despertar de um Novo Planeta

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    Ao contrário do que costuma acontecer com sequências, Planeta dos Macacos: o Confronto não se baseia no que deu certo no primeiro filme do reboot, rompendo com as amarras temporais ditadas pelo sucesso do filme anterior, e pulando dez invernos no futuro, o que, curiosamente, mostrou um roteiro amadurecido no hiato entre as duas produções.

    Planeta Dos Macacos: o Confronto revitaliza a temática presente em A Conquista do Planeta dos Macacos de J. Lee Thompson, quarto filme da cine-franquia, que já tomava para si alguns dos elementos presentes na novela de Pierre Boulle, como a perseguição ao diferente, proveniente do medo de uma raça. Tema que, devido a vários motivos, entre eles, as restrições orçamentárias para um filme dos anos sessenta, não foram incluídos no roteiro do filme Michael Wilson e Rod Serling.

    Enquanto a película de 1973 usa a relação entre espécies como arquétipos para discutir a segregação racial e a luta pelos direitos civis, antecipando grande parte das discussões a respeito do regime sul-africano do Apartheid, o viés utilizado em O Confronto tende mais à convivência entre espécies diferentes, que, em algumas análises, pode ser também associada à interação racial, a convivência entre espécies que teriam que lutar pela supremacia territorial e até pela existência. Tal assunto remete ao clássico Guerra do Fogo, de Jean-Jacques Annaud, que contempla a disputa entre hominídeos pela sobrevivência, sem qualquer fala conhecida pelo humano contemporâneo.

    planeta dos macacacos o confronto 2

    No filme o “meio” é preponderante para contar a história, remontando a máxima da teoria da comunicação para a qual  “o meio é a mensagem”, reunindo assuntos como a tolerância e a comunhão de seres diferentes no mesmo espaço físico e espiritual.

    O filme de Matt Reeves também retoma temas já abordados pelas cultura pop, como o paralelo entre as ideologias de Martin Luther King Jr. Malcom X, presente nos títulos de Chris Claremont e John Byrne de os X-Men. No filme, esses aspectos, ganham uma densidade que vai além do otimismo presente nas obras do título X, como Dias de um futuro esquecido,  através de um trabalho de roteiro bem elaborado por Rick JaffaAmanda SilverScott Z. Burns e Mark Bomback, aprofundando contrastes ideológicos sem a possibilidade de vislumbrar uma viagem no tempo redentora.

    Os disparates ideológicos dentro da raça ocorrem de maneira pouco amistosa  entre Cesar e Koba, dois dos macacos igualmente modificados no primeiro filme, mas que têm repertório muito distinto. Enquanto Cesar foi adestrado por um “bom homem”, como dito pelo próprio, Koba permaneceu toda a sua vida dentro de uma jaula, sofrendo inúmeros experimentos violentos, conhecendo, portanto, a dura face do homem, que impingia medo e tortura. Ele era um prisioneiro, de corpo e de alma, tão acostumado ao cárcere, que jamais conseguia vislumbrar a liberdade de fato. Tal condição foi assistida por Cesar, que representa o grande líder, o “homem” benevolente que entende as limitações daqueles que estão hierarquicamente abaixo dele, sem tratá-los como coitados ou como presas do jogo comum da cadeia alimentar.

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    Cesar trata Koba, como trata todos os outros símios, e até dá a ele uma parcela de confiança um tanto discutível, mostrando que o passado não deve subjugar os direitos de um cidadão. O preceito importado da antiga franquia, “Macaco não mata Macaco” justifica esse tratamento e, em alguns pontos da trama, chega à iminência de ser quebrado. Apesar do questionamento se esse limite pudesse ter sido ultrapassado ou não, à luz da lógica de Cesar, o dever sagrado não foi corrompido.

    A linha divisória entre os deveres de um líder e as ações de um tirano é bastante tênue, talvez até invisível para quem observa ao longe. Entretanto, fica bastante claro ao espectador, já que a câmera acompanha a trajetória de Cesar e seu modo de governo de forma detalhada, que a despeito de sua nomenclatura e das semelhanças com o ideal do socialismo marxista de não pôr o capital acima de tudo, seu regime não é ditatorial. Ao contrário do Caio Julio romano, o símio tem um enorme temor em castigar aqueles que erram com a sua sociedade. Seu ato final, ao segurar Koba pelas mãos por alguns instantes antes de liberá-lo para sua merecida queda, mostra a reticência e a dúvida de quem põe o ideal do bem comum acima até das questões pessoais e familiares, ao se deparar com seu antigo aliado e agora, traidor da espécie.

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    No núcleo dos humanos, pouco se sabe sobre a praga que exterminou a maior parte de sua população – o que evidencia ainda mais que o filme deve ser visto sob a ótica dos primatas. Ainda que a questão não seja aprofundada, as referências à praga levam o espectador a crer que a epidemia se deu por uma doença viral, ocorrido a partir do organismo dos macacos, o que cita sutilmente uma das teorias relativas à origem da AIDS.

    No entanto, o  paralelo mais forte, com certeza, é com o romance de Richard Matheson, Eu Sou A Lenda, em que a humanidade também sucumbiu ante uma doença devastadora, estabelecendo uma trama preconizada pela sobrevivência de um único indivíduo diante de uma competição entre raças. No desfecho, Robert Neville se depara com uma nova civilização, levantada a partir das ruínas da outra que acabou. Sua espécie não vive mais e deixou há muito de ser o topo da cadeia alimentar, assim, sua morte simbolizaria um novo degrau evolutivo, a sucessão na carreira de espécie dominante. É curioso como a conclusão de Robert Neville é tão diferente do discurso de Dreyfus, personagem de Gary Oldman, um homem que a princípio tem boas intenções, já viu muitos dos seus perecerem, mas que não consegue contemplar a realidade que se aproxima dele, já que o mundo não é mais o mesmo, e que os homens não estão mais sozinhos diante da existência de vida inteligente.

    Irremediável é, talvez, a palavra que sintetize com mais força a condição em que os fatos culminam no final do “confronto” previsto no título brasileiro, equilibrando-se com o “alvorecer” (dawn) do nome original. A guerra inicia, apesar da amizade dos dois heróis da jornada – Cesar e Malcolm (Jason Clarke), e inexorável, a batalha ocorre graças ao ódio e a intolerância, características que antes eram inerentes aos humanos, e que, aos poucos, mostram-se parte também do instinto selvagem dos símios.

    Os rumos que a franquia tomará no cinema permanecem incógnitos quanto aos fatos corridos, mas o espírito, claro, supondo que a produção continuará dando certo, deverá ser o mesmo, com a tentativa de tornar a guerra, algo mais que a simplista disputa territorial que traz como consequência rios de sangue, de inocentes e culpados, para mostrar o quão desnecessária ela é, ante a simples solução de problemas comunicacionais.

    Diante do estado de miséria pleno, a ganância é mais difícil de ser notada, mas ainda mora no interior de alguns que provaram dela em tempos passados. A extinção desse sentimento seria algo primordial, para que a impraticável paz entre espécies fosse finalmente instaurada. Dessa forma, o roteiro consegue abordar todas essas questões sem subestimar o público, e trazendo um fluxo de ações que mantém a atenção de todos, sem descuidar do sub-texto filosófico e social, presente desde o romance original de Pierre Boulle.

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  • Crítica | X-Men: Dias de Um Futuro Esquecido

    Crítica | X-Men: Dias de Um Futuro Esquecido

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    A carreira de Bryan Singer se aproximava perigosamente da de seu contemporâneo Peter Jackson. Ambos tiveram um começo bom, com primeiros filmes de sucesso relativo, e que depois encabeçaram franquias de milhares de fãs, ainda que em X-Men, Singer dispusesse-se de muito (mas MUITO) menos orçamento do que Jackson angariou na trilogia O Senhor dos Anéis. Após ambos saírem de sua zona de conforto, insucessos vieram, já que King Kong, Um Olhar no Paraíso, Operação Valquíria e Jack, o Caçador de Gigantes não foram produções ruins necessariamente, mas ficaram muito aquém das expectativas dos estúdios. Em comum entre os dois estaria o retorno às franquias que os projetaram ao estrelato, mas diferentemente de seu igual, Singer logrou êxito ao falar dos seus conhecidos personagens, até porque sua vida pessoal o credencia a falar de excluídos. A segregação que sofreu por ser judeu e homossexual certamente é semelhante ao sofrimento mostrado em tela com a raça de homo superior caçada em 2023.

    O núcleo dos personagens “veteranos” é secundário, ainda que seja esta realidade a que origina o plot principal, pois como visto na publicação de Claremont e Byrne, o futuro dos mutantes e de seus simpatizantes é sombrio, com muitas referências visuais a Exterminador do Futuro de James Cameron  que por sua vez jamais assumiu a influência da história em sua obra. Kitty Pryde, personagem de Ellen Page, lidera um dos poucos grupos de resistência, e, por meio de uma mutação secundária (estigma adotado nas revistas X nos idos dos anos 2000), consegue transportar para um passado recente a consciência dos outros mutantes ao seu corpo. A Ninfa (ou Lince Negra), Robert Drake, o Homem de Gelo (Shawn Ashmore), e outros mutantes, vivem a fugir dos Sentinelas, até que recebem uma visita do que sobrou dos X-Men, Xavier, Magneto, Tempestade (Halle Berry) e, claro, Wolverine, interpretado por Hugh Jackman. O plano em conjunto é retornar ao passado através de Xavier para que este impeça Mística (Jennifer Lawrence) de assassinar Bolívar Trask, criador dos robôs caçadores. A saída do roteiro foi deveras inteligente, uma vez que a trama de Robert Kelly já havia sido descartada pelo próprio diretor, em 2000.

    Uma grande fonte de reclamações dos fãs relaciona-se à cronologia da franquia nos cinemas. Para todos os efeitos, o trabalho feito por Mathew Vaughn é sim um reboot que obviamente leva em consideração alguns pontos da história dos filmes de Singer. A Casa das Ideias sempre menciona que os quadrinhos Dias de Um Futuro Esquecido faz parte de uma realidade alternativa. Tais elementos podem ser encarados como problemas, mas para quem está acostumado a consumir quadrinhos mensais e tem de engolir novos recomeços a cada cinco anos, e claro, com conteúdos muito mais incongruentes, as concepções dentro do filme são de fácil digestão, até porque o foco maior é a continuação da trama inciada nos anos 60. Os dois grupos de mutantes liderados por Charles Xavier (James McAvoy) e Erik Lensher (Michael Fassbender) foram dissolvidos, e as causas dos eventos, muito ligadas ao aparentemente contido Bolívar Trask, são aos poucos mostradas em tela. Protagonizado pelo ótimo Peter Dinklage, Trask é um cientista que aparentemente busca a sobrevivência dos humanos, mas que impinge a muitos mutantes experimentos semelhantes aos que os nazistas realizavam com judeus. Obviamente, as experiências genéticas feitas por Trask causam ódio em Mística, que via seus iguais serem exterminados, o que a faz se transformar em uma autêntica máquina de matar suas cenas de ação são de um primor visual ímpar.

    O foco emocional é todo voltado à crise existencial de Xavier nos anos 70. O Professor X volta a andar graças a uma droga criada por seu então lacaio Hank McCoy (Nicholas Hoult), substância essa que reprime os poderes do Doutor, assim como seu ideal de querer mudar o status quo por meio do pacifismo. Ele é mostrado como um homem deprimido, resignado e desesperançoso, uma nuance pouco explorada nos quadrinhos, mas plenamente condizente com a época, visto que os anos 70 foram de muita decepção para os americanos, basta lembrarmos do Vietnã. Xavier quer interromper seus poderes por não aguentar mais ouvir em sua mente as vozes e as lamúrias das pessoas, além, é claro, de viver da culpa por ter perdido seus alunos e companheiros em lutas anteriores.

    Já Magneto também estava de mãos atadas, encarcerado, metros abaixo do Pentágono, acusado de um crime terrorista que não havia cometido. Sua fúria aumentou mais, a despeito até de sua postura mais calma quando reintroduzido. A ideologia presente nos primeiros discursos de Malcolm X torna-se ainda mais flagrante quando são analisadas as ações de seu passado em comparação com as de sua contraparte do futuro. Mas ambas as encarnações de Erik demonstram um poder magnânimo, algo que Singer ainda não podia mostrar antes nos filmes anteriores, talvez pela falta de verbas.

    Mesmo com tudo isso, os melhores momentos de Magneto são as discussões que envolvem Raven, Charles e ele, formando um triângulo amoroso/ideológico de cunho emocional e tocante, visto que todos se sentem traídos, até havendo razão em se sentirem assim. Dos embates o mais emocionante certamente é o primeiro encontro dos dois antigos amigos, precedendo uma sequência de ação das mais engraçadas, que, mesmo com o alívio cômico de Mercúrio (Evan Peters) — uma participação ótima —, consegue manter o tom emotivo e simbólico do que seria aquela amizade milenar e do quão ambos valorizariam um ao outro pela causa mutante.

    Pela primeira vez, em todos os filmes dos mutantes, Wolverine não é o protagonista. Porém, sua importância é obviamente gigante, fazendo a ponte para o encontro dos protagonistas, uma escada na maior parte de sua inclusões como personagem. Tal escolha não impediu que Singer registrasse o Carcaju expondo suas nádegas, dando vazão a (mais) fantasias de leitores talvez a questão esteja no contrato de Jackman com a Fox. Iniciada em X-Men – Primeira Classe, a pecha de transformar os filmes da franquia X-Men em películas em que se divide o protagonismo é cada vez mais solidificada, assim como o enfoque da questão social, deixada de lado em X-3 e nos spin-offs. Os assuntos mais interessantes retratados nas grandes histórias de mutantes são estes, o paralelo com as ideologias, a discussão a respeito do preconceito e até aonde esta guerra pode ir.

  • Crítica | X-Men: Dias de um Futuro Esquecido

    Crítica | X-Men: Dias de um Futuro Esquecido

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    Cronologia é algo divertido, mas complicado. Acompanhar os mesmos personagens ao longo de várias histórias e ver acontecimentos com consequências futuras são muito legais, mas os problemas não demoram a surgir. Além da necessidade de tudo estar amarrado e fazer sentido, o vício dos autores em revisitar o passado, recontar origens, adicionar mais detalhes ao background, invariavelmente leva aos famigerados furos da história. Nesse sentido, os X-Men são a franquia cinematográfica que melhor representa a mídia original, os quadrinhos. O mais recente longa dos mutantes chegou com a ambiciosa proposta de conectar a trilogia original, os filmes solo de Wolverine e o reboot não assumido X-Men: Primeira Classe. Se teve sucesso ou não, depende de como se avalia.

    A história não pode ser chamada de adaptação, pois é apenas inspirada livremente na célebre hq oitentista Dias de um Futuro Esquecido, de Chris Claremont e John Byrne. Num futuro próximo, o mundo foi devastado pelos Sentinelas, robôs criados para caçar mutantes mas que acabaram se voltando contra toda a humanidade. Revemos algumas figuras da trilogia num grupo comandado por Xavier e Magneto que basicamente foge e se esconde para sobreviver. A última tentativa desesperada é um plano de enviar a consciência de  para o corpo dele em 1973, data em que Mística assassinou Bolívar Trask, o criador dos Sentinelas, e foi capturada. O DNA da mutante foi a chave para os robôs se tornarem invencíveis. Logan precisará reunir as versões mais jovens de Erik e Charles (X-Men – Primeira Classe) para ter alguma chance de mudar o passado e salvar o futuro.

    Havia a expectativa de que Dias de um Futuro Esquecido consertasse ou ao menos tentasse explicar as discrepâncias entre os capítulos anteriores. Nesse aspecto, não se pode negar que o filme falhou miseravelmente: não só deixou de explicar os furos, como ainda adicionou mais alguns. Kitty Pride (Ellen Page) surge com outro poder além de se tornar intangível: mandar a consciência dos outros de volta no tempo (como raios alguém descobre ter um poder desses?). Muito melhor seria apresentar isso como uma evolução dos poderes do próprio Xavier, ou usar o personagem Forge construindo uma máquina. Charles recuperou seu corpo explodido em X-Men – O Confronto Final, Logan recuperou as garras de adamantium perdidas em Wolverine – Imortal, e sem nenhuma menção a esse respeito. A impressão é de que o cenário apresentado era um futuro da linha temporal de Primeira Classe, que POR ACASO continha elementos que lembravam a trilogia original, confirmando assim duas realidades distintas – algo que os produtores nunca admitiram.

    Superada essa falha, o núcleo futurista funciona muito bem. O peso dramático de um mundo pós-apocalítico é sentido perfeitamente. Estes X-Men agem como uma experiente unidade paramilitar acostumada a táticas de guerrilha. As cenas de combate contra os Sentinelas são ótimas, violentas e fazem bom uso dos poderes de todos os mutantes envolvidos. Além dos velhos conhecidos Kitty, Tempestade, Homem de Gelo e Colossus (pra variar, mudo como uma estátua), vemos pela primeira vez no cinema Bishop, Apache, Blink e o brasileiro com cara de mexicano Mancha Solar. Além disso, é sempre ótimo ver atores do calibre de Ian McKellen e Patrick Stewart, ainda que rapidamente.

    Pois a maior parte do história se desenrola no passado, confirmando que o filme é, acima de tudo, uma continuação de Primeira Classe. E o salto de 10 anos se mostra brutal: Xavier caiu numa depressão extrema, fechou a escola e debandou os X-Men, dos quais vários morreram, vítimas das experiências de Trask (Peter Dinklage, discreto e eficiente). Apenas o Fera permanece ao seu lado. Magneto foi aprisionado após seu envolvimento na morte de JFK. Mística atua como uma terrorista solitária lutando pela causa mutante. Logan cai no meio disso, e, com toda a sua finesse, terá que reuni-los. Aqui entra o gancho para a divertida e pontual participação de Mercúrio, com Evan Peters carismático como o herói nunca conseguiu ser nas hqs. Nada de muito original e revolucionário ao retratar a supervelocidade, mas as duas percepções (a do próprio velocista e a dos outros) foram mostradas de forma muito interessante.

    Numa história com tantos personagens, era fundamental ter foco em alguns e (infelizmente) sacrificar outros. Uma pena que o Fera (Nicholas Hoult) seja apenas um assistente/guarda-costas/capanga do bem de Charles, mas o roteiro de Simon Kinberg, Jane Goldman e Matthew Vaughn alcança um louvável equilíbrio ao centralizar as atenções em quatro mutantes. Hugh Jackman naturalmente tem destaque como o fio condutor da trama, mas não é nem de longe um protagonista absoluto – o que não deixa de ser uma surpresa; Jennifer Lawrence tem a chance de aparecer bastante de cara limpa (o que não é surpresa nenhuma) numa sólida atuação, aproveitando a importância colocada em sua personagem; Michael Fassbender tem uma participação sensivelmente diminuída em relação ao filme anterior, que era quase um “Origens: Magneto”. Mas o cara é tão bom que não precisaria nem de cinco minutos para mostrar isso. Sempre na linha entre vilão e anti-herói, Erik é aquele que não faz concessões, segue firme em sua convicção e mantém alianças de acordo com a conveniência.

    Mas o coração da história é inegavelmente Charles Xavier. Pela primeira vez na franquia, os holofotes se concentram nele, e o resultado é sensacional. Quase sempre retratado como uma rocha inabalável, dessa vez ele atravessa uma crise de fé, e temos a noção do quanto isso afeta os mutantes e por consequência o mundo inteiro. Não é fácil ser bom, honesto, herói e líder, e acreditar na proposta otimista (e ingênua) da coexistência pacífica entre humanos e mutantes e ainda assim continuar lutando por ela, especialmente num mundo onde isso parece impossível. Outro ponto a ser aplaudido é a ausência de maniqueísmo no filme: as retaliações de lado a lado parecem inevitáveis e justificáveis; todos estão errados. E cabe a Charles manter o fardo de ser o certo, redimir Mística, perdoar Magneto e salvar os humanos que querem aniquilar sua raça. James McAvoy faz um trabalho espetacular.

    Os méritos desse acerto devem ser dados também a Bryan Singer. Ele mostra mais uma vez o quanto entende desse universo, e consegue enxergar aquilo que realmente importa nos X-Men. Não uma fidelidade total a uniformes ou a altura de personagens (inacreditável a essa altura do campeonato ainda existir quem questione o Wolverine de Jackman), mas conteúdo moral, social e filosófico que sempre foram o cerne das melhores histórias dos mutantes. Dias de um Futuro Esquecido é o tipo de filme imperfeito, mas com acertos tão gratificantes que os erros merecem ser perdoados. Como o próprio final indica, a postura do espectador deve ser curtir a homenagem à trilogia original, mas esquecê-la. Apreciar as próximas aventuras sem esquentar tanto a cabeça com a cronologia, algo que os leitores de quadrinhos já aprenderam (ou deveriam ter aprendido) há tempos.

    Texto de autoria de Jackson Good.

  • Crítica | Wolverine: Imortal

    Crítica | Wolverine: Imortal

    The Wolverine (Wolverine Imortal)

    Após o desastroso X-Men Origens: Wolverine, de 2009, é natural que qualquer fã do mutante mais famoso dos quadrinhos ficasse com um pé atrás a respeito de um novo filme do personagem, mesmo que os primeiros boatos a seu respeito fossem de um projeto com um cineasta de renome, como Darren Aronofsky, que acabou não se concretizando (para alegria de uns e tristeza de outros).

    Porém, as notícias da adaptação do clássico arco de histórias de Chris Claremont e Frank Miller com Wolverine no Japão permitiram novas possibilidades e o diretor James Mangold acabou por entregar uma história que por mais que não envolva totalmente o espectador nem apresente nada de novo em relação ao protagonista, ao menos não ofende o fã dos quadrinhos, de cinema e qualquer pessoa com senso crítico, como a produção anterior.

    Na nova história, Logan (Hugh Jackman) decidiu abandonar de vez a vida de herói e passou a viver sozinho na selva. Deprimido, ele é rastreado pela jovem Yukio (Rila Fukushima), enviada a mando de seu pai adotivo, Yashida (Hal Yamanouchi), que foi salvo por Logan algumas décadas antes, na detonação da bomba atômica em Nagasaki (em uma bela sequência). Yashida a princípio deseja reencontrar Logan para se despedir de seu salvador (já que está em seu leito de morte), mas depois faz uma proposta: transferir seu fator de cura para ele, de forma que Logan possa, enfim, se tornar mortal e levar uma vida como uma pessoa qualquer. Logan recusa o convite, mas acaba infectado por Víbora (Svetlana Khodchenkova), uma mutante especializada em biologia que é também imune a venenos de todo tipo. Fragilizado, Logan precisa encontrar meios para proteger Mariko (Tao Okamoto), a neta de Yashida, que é alvo tanto da máfia japonesa Yakuza quanto de outros oponentes que surgirão no decorrer da história, um tanto quanto cansativa.

    A trama, apesar de simples, é problemática em várias maneiras. Primeiro ao abordar novamente a Yakuza e seus membros tatuados e especialistas em artes marciais. Acredito que esse clichê já foi suficientemente usado em filmes de ação demais nos anos 80 e 90 (aliás, outro clichê é exatamente este: será que todo oriental sabe lutar e manejar armas?). A tentativa de dar ao filme um tom realista ao adotar a máfia como vilã inicial até funcionaria caso isso se sustentasse ao longo da narrativa, mas após sermos apresentados a Víbora e ao Samurai de Prata, toda a sequência com a Yakuza parece perder o sentido. Segundo por adotar corretamente a postura de dar tempo para os personagens se desenvolverem nos dois primeiros atos, mas se esquecer totalmente disso no terceiro, que é inchado com sequências de luta longas demais e, de certa forma, desnecessárias. E terceiro ao transformar radicalmente as relações dos personagens entre si e suas motivações gratuitamente de acordo com cada situação de maneira preguiçosa, a fim de encaixar a trama com um trabalho menor, torcendo para que ninguém perceba a incongruência.

    Exemplos disso não faltam: Shingen é envenenado pela Víbora e sofre alucinadamente, para depois aparecer e lutar de igual para igual com Yukio e vencê-la. Ela que antes havia dito que ele lutava “para o gasto”. Depois de vencê-la, Shingen ainda luta ferozmente contra Wolverine, em uma tentativa de remeter a icônica luta dos quadrinhos, mas extremamente mal-executada, já que, de uma hora para outra, Wolverine solta uma frase de efeito e abandona a luta para, segundos depois, voltar e matar o vilão que nunca deixa nada passar. Harada (Will Yun Lee) também é outro que age em um padrão o filme todo para no final, tomar uma atitude totalmente descabida. Há também a excessiva aparição de Jean Grey (Famke Janssen) nos sonhos de Logan, na função de servir de guia e desnecessariamente explicar a plateia cada momento do filme e o estado psicológico do protagonista.

    Os pontos positivos do filme ficam nas cenas iniciais (como a do urso e o enfrentamento no bar) e nas de ação, durante o enterro de Yashida e, principalmente, no trem, rendendo algumas cenas engraçadas. São cenas que, apesar de faltar violência e sairmos com a impressão de que ninguém foi morto pelas garras de Logan, conseguem transmitir perigo e um senso de urgência, além de serem bem executadas de modo que consigamos acompanhar, passo a passo, onde cada personagem está em determinado momento e o que estão fazendo, o que muitas vezes não é feito por diretores atuais. Porém, a melhor parte do filme ainda é a cena pós-crédito, que liga diretamente o filme ao próximo filme da franquia, chamado “Dias de um Futuro Esquecido”, trazendo personagens e atores conhecidos do público em um momento empolgante.

    Ao final, fica a impressão de que talvez tenha chegado a hora de tanto Marvel quanto Fox (assim como Hugh Jackman) repensarem o que a superexposição do Wolverine pode causar no desgaste do personagem, já que o veremos novamente protagonizado a sequência do ótimo X-Men: Primeira Classe. Encerrar aqui este ciclo do herói a exemplo da trilogia Batman de Nolan/Bale, daria chance a outras pessoas retomarem o herói com outros olhos e revigorar a combalida franquia solo de “Wolverine” nas telonas.

    Texto de autoria de Fábio Z. Candioto.

  • Resenha | X-Men: Garotas em Fuga

    Resenha | X-Men: Garotas em Fuga

    X Men - Garotas em Fuga - Milo Manara

    Sempre achei os heróis e arcos da Marvel um tanto “adolescentes demais”, por isso o fraco interesse pelo selo. Só que uma vez ou outra a editora lança algo que me chama a atenção. A mais recente foi com a revista X-Men – Garotas em Fuga. A quantidade de curvas e cenas sensuais é tão grande que fui obrigado a ler e comentar sobre essa obra fora dos padrões Marvel de ser.

    A descoberta de Garotas em Fuga se deu meio que por acaso, estava eu matando tempo em uma banca de jornal e a vi jogado num canto com algumas publicações que também saíram esse mês. Eu já tinha lido algo sobre a HQ e mesmo com o nome do Milo Manara, não me interessei muito. Acabei folheando algumas páginas e descobri que se não comprasse a revista, provavelmente me sentiria frustrado. Li a hq em menos de meia hora e durante o trabalho, o que não é muito aconselhável, porém o conteúdo contido naquelas páginas foi o suficiente para me alegrar e fazer valer o 15 reais pagos.

    A história tem aquele jeitão “X-Men de ser”, nela vemos um time de mutantes montados apenas pelas representantes femininas do Instituto Xavier Para Estudos Avançados. Vampira, Garota Marvel (Rachel Summers-gray), Psylock, Lince Negra e Tempestade saem para tirar férias na recém adquirida casa de praia que Anne (Vampira) herdou de sua família. O legal é que não é uma simples casa de praia e sim uma mega mansão numa ilha no meio do Mar Mediterrâneo, porém, como a própria Kitty (Lince Negra) diz durante toda a HQ, nada é fácil quando estamos falando sobre os X-men. A viagem acaba sendo interrompida quando a Garota Marvel é sequestrada por um homem que supostamente a estava paquerando. Os eventos consecutivos estão dentro de um tempo surreal onde o grupo sai em resgate a sua companheira que se encontra no meio da fictícia ilha de Madripoor e terminam num final totalmente “festivo”.

    O fato é que, apesar de bem construído e bem terminado, o roteiro tem alguns elementos persistentes no que diz respeito ao universo Marvel. Boa parte das motivações não são críveis, nem mesmo para o mundo dos quadrinhos, assim como os diálogos entre as personagens tem aquela pretensão de serem “reais”, criando um efeito de falsificação do comportamento. Quem está acostumado com o existencialismo e discussões subliminares sobre preconceito, tão característicos das revistas referentes ao mundo X-men, talvez não consiga ver essa história como um componente da linha cronológica dos heróis. O que posso fazer é comentar que esses elementos só se tornam aceitáveis, porque a arte caiu como uma luva. Por falar em arte, é necessário um parágrafo inteiro para falar sobre a magia presente nos desenhos de Milo Manara.

    Só o Manara poderia fazer as x-girls extremamente gostosas, mas sem ficarem vulgares ou cômicas. O autor é conhecido como o criador do que podemos chamar de softporn e não estou me referindo só aos quadrinhos, logo, o tratamento dado ao time feminino das mutantes não poderia ser diferente. O primeiro traço marcante é que os uniformes são deixados de lado a fim de que as meninas mostrem seus corpos delineados em roupas curtas e que expressem suas essências. Nesse nível Manara vai criando cenas onde a sensualidade possa ser explorada de uma forma totalmente inserida no mesmo conceito de suas obras autorais (Clic e Borgia). O resultado dessa mistura são heroínas lindas e mortais.

    Felizmente encontrei a HQ num dia onde tinha dinheiro no bolso. Acredito que o preço sugerido de 14,50 pode ser “salgado” para algumas pessoas. Pensar que você estará adquirindo uma obra com as ilustrações do Manara, pode ser de grande ajuda e sim, o conteúdo final da revista vale o seu preço e se paga automaticamente no momento da leitura e apreciação das ilustrações.

    A revista foi editada pela Marvel e publicada aqui no Brasil pela Panini, tem 63 páginas de história e um material adicional explicando o processo de criação do roteirista Chris Claremont e do próprio Manara. Um ótimo presente de natal.

    Texto de autoria de Breno C. Souza.