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  • Resenha | Campos de Batalha – Volume 1

    Resenha | Campos de Batalha – Volume 1

    Campos de Batalha – Volume 1 compila duas minisséries escritas por Garth Ennis ambientadas na Segunda Guerra Mundial. O quadrinho publicado pela Editora Mythos (e infelizmente descontinuado devido as baixas vendas) mostram uma faceta bem elogiada do escritor especialista ao mostrar os terrores e meandros do ambiente sujo da guerra, como foi em sua fase à frente do Justiceiro Max, sendo essa edição com foco em mulheres protagonistas, mostrando um lado pouco explorado dentro da estética e atmosfera da guerra.

    A primeira história, Bruxas da Noite, tem três partes e apresenta um grupo de aviadoras russas. O desenhista Russel Braun tem dois aspectos positivos bem pontuados: primeiro, nos combates aéreos e nos detalhes das máquinas voadoras, e segundo (e mais importante) na violência absurda do combate em solo, seja na troca de tiros na terra, ou nas consequências dos disparos aéreos.

    Essa visceralidade dá ao roteiro camadas profundas, pois contrastam bem com a desolação sentimental dos personagens que se veem no meio de um conflito que abreviará (ou desgraçará) a vida de quase todos dali. O grafismo é equilibrado, e a arte é discreta em matéria de corpos e feições humanas. As páginas duplas são esplêndidas, sobretudo nas batalhas de aviões e nos golpes secos de armas brancas entre os nazistas e soviéticos.

    Ao escrever super heróis, Ennis é normalmente associado como um cínico, mas ao tratar de guerra, é natural que os temas espinhosos sejam apresentado com mais equilíbrio como a prática hedionda do estupro, algo que em tempos normais é encarado como crime hediondo mas, em épocas de guerra, é visto como um pecado menor, ainda mais quando a ação ocorre contra o “inimigo” (basta ver outros quadrinhos que retratam o momento como Maus  ou o sul-coreano Grama).Até os momentos mais chocantes são mostrados aqui sem alarde, de maneira pragmática, reiterando a sensação de que a guerra desperta no homem os instintos mais primitivos e cruéis.

    A parte dois, Querido Billy (Batttlefields Dear Billy) se apresenta com uma capa alternativa linda de Garry Leach (alias, as capas das edições internacionais são sensacionais. John Cassaday traz artes deslumbrantes que mostram a sede de sangue dos soldados sanguinários. ). Seu inicio é sem respiros com mulheres sendo dizimadas por fuzilamento em uma praia, mostrando em seguida uma delas sobrevivendo a chacina.

    Os desenhos dessa vez são de Peter Snejberg que tem um talento para desenhar dilacerações como ninguém. As cores de Bob Steen destacam um quadro bonito e melancólico, seja nas paisagens ou na tentativa de uma vingança pessoal. Aqui se percebe que mesmo pessoas de boa índole e intenção tendem a se transformar em monstros com sede de vingança e sangue.

    Snejberg desenha veículos de maneira bem detalhada, especialmente os bombardeiros aéreos. Sua arte combina ainda mais com o texto de Ennis do que Braun. O desfecho da história poetiza o sentimento suicida e revanchista, mostrando o grande lado humano de seus personagens.

    Campos de Batalha ainda possui no final de cada história alguns esboços dos dois desenhistas. É realmente uma pena que a série não tenha feito o sucesso que merecia, talvez com um trabalho de marketing mais acurado e especifico, certamente geraria melhores resultados. As histórias são curtas, fáceis de ler, e por mais que a violência seja um bocado perturbadora, é fácil apreciar este trabalho, que denuncia o caráter totalmente nefasto das guerras modernas.

    Compre: Campos de Batalha.

  • Resenha | Star Wars (2015)

    Resenha | Star Wars (2015)

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    Após a compra da Lucasfilm pela Disney, e o consequente anúncio de novos filmes para o cinema, começou-se um novo Universo Expandido de Star Wars, que serviria de background ao cenário dos filmes e que a priori, teria todos as publicações consideradas canônicas. Os primeiros momentos desse reboot no segmento quadrinhos seriam ainda distantes do tempo visto em O Despertar da Força, e evidentemente deveria explorar as lacunas iniciais da saga, como todo o resto da Nova Marvel fazia com o universo da Casa das Idéias.

    A série regular que leva o nome da franquia começa com um arco que se passa pouco após a Batalha de Yavin, em Uma Nova Esperança. Skywalker Ataca tem roteiros de Jason Aaron (Scalped) e desenhos de John Cassaday (Planetary) e começa com uma estranha transação comercial entre os imperiais e caçadores de recompensa de Jabba the Hutt, evidentemente sendo isto, um ardil da carismática figura de Han Solo.

    Nesta primeira edição existe uma tensão absurda nestas tratativas, com o Império tratando os colaboradores como escória, sem se importar inclusive com os detalhes da recompensa posta sobre a cabeça de Solo. Tal sensação aparentemente bem construída rui muito facilmente após a revelação de quem seria a tripulação do caçador recompensas, com o encarregado Agaadeen cedendo informações vitais ao seu Império após uma ameaça de choque via R2-D2, o que faz perguntar quais os métodos de treinamento do estado tirânico junto aos seus alistados, uma vez que quase todos soam como covardes estúpidos.

    Um aspecto interessante é a formação do trio Luke, Han e Leia de novo em ação conjunta, o que ajuda a construir a ideia de urgência e precariedade nas fileiras de rebeldes, ao ponto de alistar uma membra da antiga realeza alderaniana como parte de uma tribulação de resgate, bem como um exímio piloto entre as forças de invasão. Apesar de pouco afeito aos desígnios da força, Luke segue intuitivo, e é a espiritualidade que o leva a encontrar os cativos. A ideia de mostrar os imperiais fazendo uso de escravos ajuda a aproximar ainda mais os vilões as figuras dos nazistas alemães, que se valiam das riquezas daqueles que julgava inferior, com a diferença de que os opositores em Star Wars são mais enérgicos, explorando a mais valia dos oprimidos de modo mais taxativo.

    Os graves problemas dessa história começam a partir do ponto massa véio do roteiro, onde se introduz Lord Vader como o negociador dos poderosos. Antes de encarar os rebeldes frente a frente, Chewbacca recebe a ordem direta de Leia para que atirasse nele, exibindo que a necessidade de obliterar um inimigo grande e simbólico. A saída desta situação é que não é propriamente condizente com o visto nos filmes, uma vez que o Darth está com um poder imenso.

    O cúmulo ocorre a partir do final do número 1 e prossegue pelo segundo, onde Vader encara Luke, antecipando um duelo que resultaria somente no próximo filme. Os defeitos deste “conceito” começam pelo fato do lord sith não ter qualquer noção de que o homem a sua frente é o destruidor da Estrela da Morte e claro, seu filho, fatos que lhe seriam relatados mais tarde. A gravidade está no quão genérica é a situação, tendo até uma tentativa esdrúxula de salvar este momento, fazendo referência a morte  de Dooku em Vingança dos Sith, já que o vilão está pronto para matar Luke do mesmo modo.

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    Os desenhos de Cassaday são irregulares, já que ele acerta nas feições de Han Solo e traz um Chewbacca em nada parecido com o original. As cenas de batalha ao menos são bem executadas, tanto na dilaceração de seres, como na destruição de naves e equipamentos. Nem mesmo a arte-final consegue resgatar da mediocridade o trabalho, que no geral, demonstra uma arte  desleixada e pouco inspirada, aquém dos melhores momentos do desenhista.

    O fato de postar a introdução como os letreiros amarelos verticais é um easter egg pequeno e bobo, mas bem significativo, por demonstrar de certa forma toda a reverência aos filmes, semelhante ao que ocorreu em Império do Mal. As referências prosseguem, retornando a Tatooine, com Vader visitando Jabba atrás de suprimentos para o seu império e de informações sobre os rebeldes que de lá saíram, a bordo da Milenium Falcon. É nesse interim que surge um personagem misterioso, de motivação extremamente forçada. A trama também envolve a figura de Boba Fett, que já demonstra uma estreita e clandestina relação com Vader.

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    A procura e os combates no planeta arenoso soam forçados, e pouco condizente com o já estabelecido no canône através do audiovisual, fator comum ao antigo Universo Expandido, mas agravado nesta versão em que todo o material derivado é considerado oficial para a historiografia dos personagens residentes dessa galáxia tão tão distante. A necessidade de tornar Boba Fett em um personagem mais atuante e enérgico segue nesta versão, sendo ele o responsável por tentar descobrir a identidade do homem que disparou o tiro fatal em Yavin 4. O texto parece querer esconder a falta de conteúdo através de um apelo barato ao sensacionalismo, envolvendo os personagens populares todos no mesmo curto espaço de uma história que deveria ser. A apelação em volta de Luke envolve ele sobrevivendo a um ataque direto de Vader, para depois inseri-lo cego, na casa de Obi-Wan, conseguindo revidar um ataque de Boba Fett, fator que faz o bodyhunter mal encarado fortificar sua posição como arquétipo e piada pronta, além é claro de contradizer toda a fanboyzice habitual que costuma idolatrá-lo.

    Há tantos problemas na concepção deste final que torna quase impossível decidir qual é o pior, se é Boba Fett derrubado, a mercê da bondado de um semi jedi incapaz de enxergar, se é o encontro de um diário de Kenobi, fato que evidentemente não faz sentido, já que estava em um lugar que qualquer imperial poderia achar, além do que o fantasma do velho poderia transmitir qualquer fato “novo”; ou a chegada de Sana Solo, que se revela a estranha figura que rondava as edições anteriores. A motivação da mulher era encontrar seu marido foragido, apresentando uma subtrama patética.

    O fechamento do arco é pifio, assemelhando Skywalker Ataca a um prólogo, de algo maior, no entanto, abre precedente para uma espécie de prólogo, protagonizado pelo jovem Obi Wan chegando a Tatooine, retirado de seu diário. Os desenhos de Simone Bianchi (Sete Soldados da Vitória e Pecado Original) funcionam quase a perfeição, captando os detalhes de uma máfia expansioanista, agravada ainda mais pela queda da República. Toda a carga de sentimentos, completamente avulsos no outro arco, tem sua redenção aqui, com o eremita e ex-jedi observando o pequeno Luke , sem poder treiná-lo, graças aos tios, que temem que ele tenha o mesmo destino do pai.

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    A grande seca que assola o planeta ajuda a explicar o envelhecimento avançado de Kenobi, aliado claro a preocupação e culpa que sente por não poder se redimir e por não conseguir resolver a questão da morte de dezenas de habitantes do seu atual lar. Também se nota um completo desprezo do Império dos planetas centrais como este, uma vez que não há preocupação alguma com as necessidades dos nativos por parte das autoridades espaciais. A parceria do infante Luke com Obi Wan funciona a perfeição, bem como a rebeldia do garoto, postura diferencial da aparente apatia e comodismo de quando ele é adulto, fase onde os recalques psíquicos e o medo sobrepujam normalmente a bravura. A mudança de espírito de Luke faz sentido de um modo que não foi igual nos seis números anteriores, justificando até o retorno do herdeiro da Força ao estado de bravura e busca por aventura.

    Aaron claramente se sente melhor escrevendo histórias com tons mais escuros, de tiro curto, que remetem em espírito ao auge de sua carreira, a frente dos volumes de Hellblazer. O segundo arco, Confronto na Lua dos Contrabandistas, começa a partir da onde terminou o número seis. Incrivelmente, as situações envolvendo a esposa e Han Solo rendem discussões engraçadas, desmontando qualquer encanto barato que o pirata lançara sobre a Princesa.

    Os desenhos de Stuart Immonem (Superman: Identidade Secreta e Nova Onda) combinam muito mais com o clima descompromissado de aventura, que segue Luke em sua tentativa de descobrir mais sobre os jedi do passado. Seu caminho é cortado por Grakkus o Hutt, um mafioso que possui uma coleção extraordinária sobre os resquícios dos jedi, tendo em sua posse os holocrons, objetos que armazenam informações sobre os jedi e que somente são abertos por quem tem afinidade com a força.

    O herói é feito prisioneiro, e enquanto cativo, informações interessantes sobre o passado da classe jedi são revelados, incluindo a instrução de uma figura misteriosa, que se assemelha aos instrutores de gladiadores da velho Império Romano. É interessante notar a inabilidade de Luke, bem como sua busca pela sabedoria dos seus antepassados. É neste interim que o paladino descobre que os templos jedi foram destruídos em sua totalidade, o que certamente o inspirou a fazer a busca que o faria “desaparecer” como visto no Episódio VII.

    Chega a ser engraçado notar Chewie como um detetive mal encarado, a procura dos seus amigos. A escolha por não utilizar como vilão os “medalhões” dá espaço para uma maior criatividade do roteiro, que evidentemente melhora muito, acrescentando fatos muito curiosos, dando origem até ao caçador de recompensas Dengar, visto em Império Contra Ataca e explorado pouco em comparação ao bodyhounter clonado mais famoso.

    O fato de ser usado como gladiador aproxima Luke do arquetipo de escravo que o jovem Anakin tinha em Ameaça Fantasma. O acréscimo de “auxiliares” do jedi, como o Mestre dos Jogos, demonstra que a luta contra a tirania não é exclusividade dos rebeldes. A construção desta figura serve também para explicar a habilidade de Finn em O Despertar da Força, quando maneja um sabre de luz sem qualquer afinidade com a força, já que isso já ocorria com outros lutadores exímios.

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    O motim que derruba o mafioso despótico em meio a arena é catártico e significativo, mas não é uma solução fácil ou maniqueíst, ao contrário, já que há algumas reviravoltas com os personagens novos que além de fazerem sentido, traçam um paralelo com a antiga alcunha de Mara Jade em Herdeiro do Império, ainda que o “membro” do imperial seja relacionada a Vader e não ao Imperador.

    A metade final é tão bem construída que quase faz justificar os enormes tropeços do começo dos arcos, e de fato esse reboot se inicia bem tendo em vista o ano como um todo, ainda que a metade destes lançamentos sejam de qualidade muito inferior aos bons momentos da  fase em que a Dark Horse era responsável pelos quadrinhos de Star Wars. A fórmula de unir quadrinistas talentosos não necessariamente garante uma sobriedade as publicações, como o visto no começo da trajetória de Aaron e Cassaday, mas com o tempo, o texto melhorou bastante, assim como a arte se adequou aquele momento histórico, desta nova roupagem do universo Star Wars.

  • Resenha | Capitão América: O Novo Pacto

    Resenha | Capitão América: O Novo Pacto

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    A estrutura do universo Marvel se sustenta como uma projeção paralela da Terra em que super-heróis habitam nosso cotidiano. Direta ou indiretamente, a editora sempre refletiu acontecimentos mundiais como parte de suas narrativas. Quando em 2001, o ataque terrorista em solo americano deflagrou a destruição do World Trade Center, em Nova York,  uma revista em homenagem às vítimas foi lançada. Inserindo os heróis no mutirão de apoio e ajuda como reflexo da sensação americana na época.

    Diante deste fatos, diversas representações artísticas em frontes variáveis surgiram. No cenário realista desenvolvido pelo estúdio, havia a delicada questão de como abordar o tema de maneira plausível para que a existência de heróis mundiais possibilitasse um ataque como este, desenvolvendo a reação de seus personagens sem descaracterizá-los. Coube a John Ney Rieber e John Cassaday realinhar o Capitão América após onze de setembro.

    Lançado no país na revista Marvel 2002 na época, e compilado recentemente na Coleção Graphic Novels Marvel da Salvat, O Novo Pacto se divide em dois momentos narrativos. A primeira história apresenta uma análise metafórica sobre os fatos, com Steve Rogers refletindo o acontecimento. De maneira poética, a trama evidencia o Capitão como um homem comum, um cidadão americano como outro qualquer que, heroísmo à parte, compartilha a dor, o luto e o sentimento de impotência perante o fato. Em meio a cores carregadas de tons cinzas, o herói lamenta o acontecimento, explicitando a força de seu ideal como um símbolo de liberdade. Esta primeira parte da história funciona como metáfora para a o mote da trama, envolvendo uma pequena cidade sofrendo um concentrado ataque terrorista.

    A forte vertente realista posiciona a personagem de maneira emocional diante de um cenário que parece repetir o fato real. Expiando a raiva contida, Rogers assume um papel ativo além de seu símbolo, promovendo uma cisão entre Capitão América e o homem por trás desta figura. Como soldado, Rogers falhou em proteger a nação. A dor simbolizada como uma batalha perdida desenvolve a reflexão sobre a necessidade da guerra, pontuando as motivações de ambos os lados. Rogers e o Capitão adquirem ideais divididos. Enquanto o símbolo permanece indelével, o homem se mostra em dúvida sobre sua trajetória.

    O roteiro é preciso ao estabelecer a metáfora sobre a guerra, pontuando que o lado terrorista também possui motivações e uma coerência interna nos atos. Mas falha ao desenvolver uma ação pontual que expande a trama além da reflexão natural. Como primeira história após tais acontecimentos, é uma bonita homenagem mas, a cada edição concentrando-se mais no desenvolvimento de ação, percebe-se um desequilíbrio. A dupla acerta na vertente mais delicada, falha na execução simples de uma boa história com a personagem. Talvez preocupados em excesso em situar o Capitão América neste novo tempo, a trama em si permaneceu em segundo plano.

    O Novo Pacto se mantém como homenagem maior que a narrativa. Marcando uma transição comentada na época mas que, em futuro próximo, tornou-se fundamental à personagem, quando o homem por trás do símbolo adquiria contornos gerais focados na liberdade, sem nenhuma ideologia como bandeira.
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  • Resenha | Fabulosos Vingadores: Ameaça Vermelha

    Resenha | Fabulosos Vingadores: Ameaça Vermelha

    Fabulosos Vingadores - Sombra Vermelha - capa

    O conflito envolvendo as duas grandes super equipes da Marvel Comics, Vingadores e X-Men, promoveu em 2012 uma saga escrita por Brian Michael Bendis, Matt Fraction, Jason Aaron, Ed Brubaker e Jonathan Hickman. Uma narrativa que finalizou conceitualmente uma era do estúdio, abrindo espaço para a Nova Marvel. Em consequência direta a tais acontecimentos, uma nova revista foi lançada unindo heróis de ambas as equipes e apresentando, de maneira eficiente, a unidade entre dois grupos normalmente distintos na editora.

    Pertencentes a um mesmo universo, o projeto editorial das equipes sempre fora distinto. A saga que proporcionou uma batalha entre os heróis se tornou ponto de partida para uma nova postura, em que os heróis se integravam sem precedentes, evidenciando a tônica de uma igualdade super-heroica. Fabulosos Vingadores foi publicado inicialmente no país na revista mensal Avante, Vingadores. Ao lado das revistas Vingadores: Arena surge Assemble Avengers, nova série lançada para atrair novos leitores devido ao filme, sem amarras aparentes com a cronologia. Sendo assim, Fabulosos era o carro-chefe da publicação e motivo que justificava a compra do material. Em um momento em que a Panini Comics tem relançado a Nova Marvel em edições encadernadas, Fabulosos Vingadores: A Sombra Vermelha reúne o primeiro arco formado pelos cinco primeiro números do original.

    Com arte de John Cassaday e roteiro de Rick Remender – o qual foi responsável pela reestruturação da Marvel na mega-saga vindoura Guerras Secretas – a trama dá sequências aos acontecimentos pós Vingadores vs X-Men. Scott Summers está preso em razão do assassinato do Professor Xavier, e um abatido Wolverine se vê obrigado a discursar sobre a morte do mestre e manter seu projeto ativo. Em paralelo, Capitão América reconhece que nunca havia observado a causa mutante com atenção e, prezando pela união e diversidade do mundo heroico, promove esta equipe reunindo mutantes e Vingadores.

    A premissa é a justificativa para unificar leitores que, eventualmente, liam somente uma das vertentes da batalha. Explorar um universo dividido entre Vingadores e X-Men foi um trabalho editorial coeso desta Nova Marvel, desenvolvendo com qualidade uma unidade que privilegia cada equipe e desenvolve uma boa narrativa. Uma maneira encontrada pela editora para aumentar o potencial de suas tramas, unindo ativamente grupos até então estrategicamente separados.

    A possibilidade de unir tais personagens se simboliza no vilão do primeiro arco: Caveira Vermelha. Como boa parte da Marvel sofreu uma espécie de reboot fajuto a partir do conceito da Nova Marvel, há um novo Caveira Vermelha em cena. Um clone criado na época da Segunda Guerra Mundial e congelado para reviver décadas após a guerra. Uma justificativa simples, porém aceitável, para que a personagem retorne e mantenha um plano de transformar a Terra em um novo Reich, como o Caveira inicial da época da guerra.

    Ao estabelecer uma equipe mista entre as duas equipes, a história versa timidamente sobre estes personagens variados como um grupo amplo, demonstrando que a batalha anterior, além do conceito mercadológico de vendas, não foi apenas para atrair leitores, mas para modificar o status quo de antagonismo entre mutantes e outros heróis. A dinâmica entre o grupo apresenta atritos naturais visto em outras formações e, desde já, a batalha contra Caveira Vermelha, um vilão modificado que rouba o cérebro de Charles Xavier integrando-o ao seu, aponta um futuro gancho para um plano maior que será desenvolvido na saga Eixo.

    Fabulosos Vingadores: Ameaça Vermelha abre mais uma fronte diante das possibilidades heroicas da casa em uma história bem desenvolvida e equilibrada, destacando cada personagem em um novo momento de coexistência entre mutantes e demais heróis. Um bom ganho graças à batalha anterior.

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  • Resenha | Batman e Planetary: Edição de Luxo

    Resenha | Batman e Planetary: Edição de Luxo

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    Criado em 1998 pela dupla Warren Ellis e John Cassaday, Planetary surgiu dentro do selo criado por Jim Lee nos anos 1990, Wildstorm, que a princípio integrou as editoras independentes que vieram a formar a Image Comics. Posteriormente, o selo veio a ser adquirido pela DC Comics no final dos anos 1990, e foi ali onde as histórias dos arqueólogos do impossível vieram a ser publicadas e conhecidas ao grande público de quadrinhos.

    Nos idos de 2003, após um longo hiato nas publicações de Planetary, a DC percebeu que seria melhor alguma estratégia comercial e editorial para promover o retorno da série. Para tanto, decidiu utilizar o seu carro-chefe, Batman. O crossover realizado entre o morcego e os arqueólogos se deu em uma edição especial escrita e desenhada por Ellis e Cassaday, respectivamente, e trazia a organização Planetary à caça de um assassino paranormal.

    Com a investigação em curso, Snow, Jakita e Baterista partem para Gotham City em busca do suposto assassino. Ocorre que, na linha temporal da organização, Gotham não possui vigilantes, muito menos um Cavaleiro das Trevas que seja responsável pela segurança da cidade. Contudo, ao se depararem com o assassino, a equipe descobre que ele possui um poder fora de controle de manipular realidades, alterando a linha temporal em curso e os colocando frente a frente com outras versões de Gotham, e claro, do cruzado encapuzado.

    Partindo de um argumento simples, Ellis desenvolve o roteiro numa pequena história envolvendo suas criações e diversas facetas do Batman ao longo de sua história, aliás, são esses “Batmen” de diversas linhas temporais o grande diferencial da trama e a forma como o autor escreve cada uma delas é de admirar. Apesar de poucas páginas, a trama é competente e consegue criar um ótimo crossover que vai além do costumeiro embate entre protagonistas para que depois se unam para enfrentar o verdadeiro antagonista da trama. Logicamente, Batman / Planetary está longe do nível de complexidade empregado pelo autor quando à frente de suas criações, mas entendendo a proposta do material é louvável o que nos é apresentado.

    Se o roteiro de Ellis trabalha muito bem com a simplicidade do argumento que tem em mãos, Cassaday extrapola. Tendo poucas personagens e um cenário mínimo, a história se passa quase que exclusivamente em um beco de Gotham, Cassaday desenha as diversas versões do Batman criadas por diversos artistas, como seu criador, Bob Kane, e também Neal Adams, Frank Miller e até mesmo um versão do seriado da TV dos anos 60, sempre com personalidade própria em cada um desses quadros, personagens e ambientações.

    Longe de ser um caça-níquel típico de crossovers entre heróis, Batman / Planetary traz Ellis num roteiro simples e sem grandes discussões ou divagações, mas bem desenvolvido em um pequeno número de páginas. Além disso, a arte de Cassaday é um dos pontos altos de sua carreira artística.

    Compre aqui: Batman  / Planetary – Edição de Luxo 

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  • Resenha | Surpreendentes X-Men: Superdotados

    Resenha | Surpreendentes X-Men: Superdotados

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    Após a fase de Grant Morrison à frente dos mutantes no gibi Novos X-Men, Joss Whedon e John Cassaday foram responsáveis pelo próximo passo da equipe, em um título que se tornou continuação direta da publicação pelo uso das mesmas personagens na equipe, porém com uma proposta diferente daquela abordada pelo escocês.

    Whedon resgata a vertente aventureira do X-Men como um grupo heroico realizando missões ao redor do globo, e traz de volta o uniforme clássico dos mutantes, modificado para o couro na época da primeira trilogia cinematográfica, um destes recursos para aproximar ambas as artes e demonstrar a influência de uma sobre a outra. Como a maioria de novas revistas ou de equipes criativas, este primeiro arco busca definir as estruturas para as próximas aventuras. Mesmo inserido na cronologia, Superdotados é um bom ponto de início de leitura e não à toa foi o segundo encadernado lançado pela Salvat para a coleção Graphic Novels (A coleção também publicou o arco seguinte, Perigoso e, até o momento, o primeiro da fase de Morrison).

    Kitty Pride retorna ao Instituto Xavier para tornar-se parte do corpo docente. Entre os problemas internos da equipe, Lince incomodada com Emma Frost no comando e Wolverine em brigas com Ciclope, uma geneticista anuncia uma cura mutante e defende o gene não como uma evolução natural do homem, mas sim como uma doença a ser destruída. Além disso, um novo vilão vindo do futuro surge com uma previsão apocalítica de que um mutante destruirá seu planeta natal. São estas as bases que sustentam esta nova fase dos mutantes, mostrando a união do grupo em meio aos meandros sociais de sua raça como um vírus a ser exterminado, enquanto, do lado mais aventureiro, o vilão tenta destruí-los.

    Com esta história de apresentação, Whedon desenvolve as bases necessárias para fundamentar sua visão narrativa sobre os mutantes ao mesmo tempo que produz um bom argumento aventureiro, criando um novo vilão para a equipe. Conhecido por realizar bons diálogos que trazem cenas cômicas e irônicas, o roteirista também pontua com precisão boas cenas de luta, tanto as com o vilão Ord, líder do Grimamundo, vindo do futuro, quanto as relativas a eventuais discussões acaloradas entre membros mutantes, em traços bem desenhados por Cassiday.

    A abordagem científica retoma o questionamento social, que desde a origem do grupo está presente nas histórias. Demonstra a intolerância mundial diante do diferente e, sem uma definição completa do que é o gene mutante, ora trata-o como uma evolução, ora como vírus ou doença, dilemas próximos da realidade vista no cotidiano mundial.

    Superdotados apresenta uma boa elogiada fase dos mutantes, que manteve por 24 edições a parceria entre Whedon e Cassiday até Warren Ellis e Phil Jimenez assumirem a criação.

    Compre aqui:

    Surpreendentes X-Men (Panini Comics) (Reunindo as edições #1 a #12)

    Astonishing X-Men Omnibus (edição gringa com toda a fase de Whedon /Cassiday)

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  • Resenha | Planetary: Deixando O Século 20 – Vol. 3

    Resenha | Planetary: Deixando O Século 20 – Vol. 3

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    Deixando de lado a introspecção de Snow, vista na última edição de O Quarto Homem e voltando, logo no início, para uma diferente linha temporal, Planetary em seu terceiro volume mergulha numa referência aos crossovers que ficaram famosos pelas mãos de Alan Moore em Liga Extraordinária. A Alemanha de 1919 contém referências de Fritz Lang a Bram Stoker e demais cientistas loucos, desde Frankenstein até Médico e Monstro, com humanoides de aparência grotesca que atacam o protagonista centenário.

    Assim como o clima da Era Vitoriana, o barroco e gótico se misturam na arquitetura da mansão invadida, ecos vindos através do mitológico personagem encarado pelo grisalho homem. O novo século foi cruel com o velho detetive. Sherlock Holmes apresenta seu semblante cadavérico, uma sombra do homem que já foi, mas em momento algum demonstra ser subestimável, apesar da necessidade, a pedido de seus sócios, de ter consigo um guarda-costas sobrenatural, sendo esta uma figura das mais inconvenientes.

    A experiência de Holmes serviu para que Snow conseguisse seu objetivo em esmerar-se no ofício detetivesco, bebendo direto na fonte, consultando o maior membro da classe. O quarto homem prosseguiu ao lado de Sherlock até que seus olhos se fechassem, até que a velhice desse seu último golpe, encerrando a existência do bravo homem, que tinha desgosto de perceber o sotaque do seu pupilo, mas que teve seu testamento vivo nas atitudes do seu último aluno.

    Ambrose, Jakita e Batera são mostrados em ação em flashs, que contemplam suas ações além de uma invasão à base do Planetary. Os lapsos referem-se às sinapses da confusa mente de Snow, exibindo momentos na mesa de cirurgia do Dr. Dowling no momento em que a mente do líder seria apagada. As bravatas de Snow eram enormes, com ameaças violentas ao grupo de que eles encontrariam a morte caso ele voltasse a ter suas lembranças. Partes do segredo vão aos poucos sendo revelados. A ordem de não permitir que os “desgraçados vençam” demonstra todo o temor que acomete o imaginário e o planejamento do misterioso mentor do quarteto.

    Os motivos da censura à própria mente não são revelados de modos instantâneo, pelo contrário, os elementos exibidos somente confundem mais o leitor, especialmente os que lembram artefatos mágicos e armas semelhantes às usadas por divindades místicas. Elijah assemelha-se aos imortais não somente por sua idade avançada, mas também por todo o misticismo que envolve sua persona.

    Ainda resgatando as lembranças, a parada que Snow e Wagner fazem é na viúva de Ambrose, que busca dar qualidades financeiras para tentar aplacar a dor da perda de seu antigo subalterno, prestando homenagens ao falecido agente, declarando a sua parentela todo o seu caráter heroico. Após isto, ele encontra-se com Alex Brass sem nenhum motivo aparente a não ser a vontade em se inspirar antes de entrar em ação novamente. Elijah buscava em suas figuras de exemplo a força que não encontrava em si, uma vez que sua identidade ainda permanecia incógnita.

    A inspiração no desbravador Carlton Marvell aumenta a sensação de carência no protagonista, que fazia até de um desconhecido o impulso e estímulo para lutar contra as figuras dantescas e milenares.

    O trabalho artístico de Cassaday continua como um dos pontos mais altos da publicação, variando de estilo com uma facilidade atroz, especialmente nas referências visuais a diferentes partes do globo. As cores de Planetary fazem eco com a realidade e com a contemporaneidade; aquarelas belíssimas que também dão um tom de clássico, condizente com todo o resgate de objetos canônicos da cultura pop que Warren Ellis sempre tenciona mencionar.

    Kevin Sack, um dos alteregos de Elijah, investigava uma área florestal nos anos 1930 quando encontrou o aventureiro descamisado Lord Blackstock. Opark-Re é uma vila futurista, composta por negros de tecnologia muitíssimo avançada, cuja economia era baseada nos mandamentos de Marx e Engels. O Fantasma do Século XX é marcado de modo emocional, cuja lembrança precisa ser revisitada em virtude do apagão de sua psiquê, o que ajudaria ainda mais a esconder a origem de outra personagem, além de referenciar a catástrofe de inúmeras civilizações perdidas, como Atlântida.

    Após ter um encontro com John Stone, Elijah recebe a notícia de que seu nêmese está por perto, e ele poderia enfim ter sua vingança, mas, para isso, precisaria se livrar de seu orgulho e aceitar a ajuda de seus parceiros. O Dr. Randall Dowling é vencido com uma grande facilidade. O foco de interesse na última edição fica por conta do romance Da Terra à Lua, obra em que Julio Verne teria fantasiado toda uma expedição interespacial do Clube da Arma Americana, cujo final foi trágico, diferente demais do desfecho literário e semelhantes aos análogos reais da cruel existência do homem na Terra.

  • Resenha | Planetary: O Quarto Homem – Vol. 2

    Resenha | Planetary: O Quarto Homem – Vol. 2

    Planetary - Volume 2

    O volume 2 de Planetary, lançado pela Panini, compreende os números 7 a 12 do título original. A primeira história, denominada A Morte de Jack Carter, é um pequeno conto que mostra um pouco do passado amoroso de Jakita. Os poderes do personagem falecido não são totalmente explicitados, mas nota-se, por meio do depoimento de um inimigo de proporções sobre-humanas que o perseguia, que Carter despertou a homossexualidade latente do personagem e a escancarou, além de mostrar a si sua origem como fruto de uma bizarra experiência criada por Hitler — tais elementos evidenciam a falta de escrúpulos do ditador, e esse background curioso cai por terra diante de sua iminente morte e do retorno de Jack, que reúne em torno de si um estereótipo ligado a John Constantine e, depois, à figura não definida entre Spider Jerusalem, o protagonista de Transmetropolitan, e o escritor Grant Morrison, amigo e grande referência de Warren Ellis.

    A partir do número 8, John Cassaday passa a ter mais liberdade como criador e não decepciona, apresentando uma arte estupenda e exuberante. Mais uma vez, Ellis apela para o cinema dos anos 50 com Atomic Horror e animais gigantes, que mantinham-se escondidos desde dos anos 60, década em que este tipo de cinema perdeu muita popularidade. A Cidade Zero, cenário da aventura, era um campo de concentração para americanos dissidentes, onde os capturados eram submetidos a experiências terríveis pós-morte. A paranoia anticomunista ganha ares de teoria da conspiração transformada em realidade, e é elevada a um ponto incomensurável, mostrando a maldade inerente ao homem de uma forma absolutamente cruel. Allison, a narradora da história e um dos experimentos, só se vê livre para despedir-se da vida após comunicar ao Planetary o seu epitáfio.

    O mistério do Quarto Homem seria revelado neste encadernado  como o nome da publicação deixa claro —, e a introdução de Ambrose Chase, antecessor de Snow, serve para revelar algumas pistas relacionadas ao grande e grave mistério. Há alusão ao incógnito patrão, enquanto a história trabalha recursos metalinguísticos como o mote e o cerne da aventura. O vilão William Leather volta a aparecer, e dessa vez com o objetivo de “apagar” um alienígena superpoderoso vindo de um planeta condenado. Além deste, é destruída uma amazona, vinda de uma sociedade super evoluída, e que finalmente se revela aos homens um ser de outro planeta, afirmando-se parte de uma equipe militar — paralelos claros ao Superman, Mulher-Maravilha e Lanterna Verde. Reduzindo estas analogias a seres genéricos, mostra-se que os seres mais poderosos do universo DC não funcionariam necessariamente no universo Wildstorm  lição que, invertida, poderia ser aprendida pelos editores dos Novos 52.

    Na quinta história o Planetary passa a interagir com alguns personagens secundários do outro produto escrito por EllisStormwatch/Autorithy. Snow tem contato pela primeira vez com John Stone  um misto de James Bond com Nick Fury  com o qual se reencontra algum tempo depois no Cazaquistão, onde discutem sobre William Lether. O mundo estava diferente, logo o título da trama evidencia isso: Cold World, uma referência ao fim da Guerra Fria, que ao invés de ser deixada para trás, teria se ampliado e conquistado ares globais.

    Aos poucos, os mistérios envolvendo o centenário alvo vão se desenrolando, assim como as memórias reprimidas pelo “grupo secreto” também de desbaratam. Elijah Snow volta a ter acesso a suas memórias antes “apagadas” e descobre muitas coisas, entre elas a identidade do quarto homem de Planetary, juntando as peças que faltavam para explicitar o que para o leitor já era claro há tempos. No entanto, o motivo que o fez reprimir tais lembranças ainda era vago e só seria exposto nos últimos números do título. As atitudes do personagem mudam a partir daí, obviamente levando-o  a perseguir as lacunas que faltam ser preenchidas.

    A riqueza em referências permanece presente e as histórias dentro das histórias ganham um acréscimo considerável, dando um grande salto qualitativo numa trama que já se apresentava muitíssimo bem urdida. Planetary pode não ser a produção mais elogiada pelos fãs de Warren Ellis, mas certamente é uma das mais inspiradas.

  • Resenha | Planetary: Pelo Mundo Todo e Outras Histórias – Vol. 1

    Resenha | Planetary: Pelo Mundo Todo e Outras Histórias – Vol. 1

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    Em 1999, Warren Ellis, que já havia publicado Stormwatch e estava em vias de lançar os primeiros números de Authority pela Wildstorm, se juntaria a John Cassaday, que até então não havia alcançado notoriedade, para lançar Planetary, uma série que mostrava um grupo disfuncional formado por um trio de personagens completamente diferentes entre si e que tinham função curiosa: recolher informações sobre artefatos místicos, investigar eventos inverossímeis e catalogar pessoas extraordinárias que antes eram anônimas.

    Conhecidos como os Arqueólogos do Impossível, o conjunto pretendia escavar os últimos cem anos da era heroica. A priori, era formado por três membros: Jakita Wagner, que resumia-se em liderança, o Baterista, um sujeito que se comunica com qualquer aparelho mecânico, e o centenário personagem Elijah Snow, um sujeito misterioso e que concentra a maior parte dos mistérios presentes neste arco. A equipe é bancada pelo 4° elemento do grupo, um multimilionário de identidade desconhecida até então.

    As histórias são fechadas em suas próprias edições, ainda que corra uma trama por trás delas. A ideia de Warren Ellis em fazer o universo “fantástico” baseado numa amálgama que seria a soma de cinema, quadrinhos, literatura e o que mais sobrar da cultura pop é ótima, além de ser respeitosas as figuras que homenageiam e reverenciam na abordagem escolhida.

    Elijah passou sua vida inteira no século XX, e pela sua experiência é recrutado por Jakita Wagner para se juntar ao esquete, com a prerrogativa de que ele recebesse uma gorda remuneração caso aceitasse o emprego, mas aos poucos o grisalho homem percebe outras vantagens no oficio recém-apresentado, especialmente em relação à investigação, pois além de mapear as atividades de pessoas sobre-humanas, o ofício ajuda Elijah a adentrar em uma jornada de autoconhecimento, usando, claro, os análogos de heróis como avatares de seus próprios medos e anseios, colaborando para entender o seu passado e suas próprias habilidades.

    No primeiro número é mostrada uma sociedade secreta de super-humanos que descobre um portal dimensional inexplorado. O vórtice permanece incógnito por décadas, sendo a porta para um Multiverso. O roteiro faz alusão aos fatos ocorridos na mega saga Crise Nas Infinitas Terras e os personagens que formam a força-tarefa é composta por análogos dos heróis da era pulp: Doc Brass é uma homenagem a Doc Savage, herói de quadrinhos populares das décadas de 30/40; há menções também a TarzanSpiderFu Man ChuTenente Swift (da série de livros de Howard Garis – sob o pseudônimo Victor Appleton), James Christopher ( o agente #5, precursor de James Bond),  e o aviador inspetor G-8. A referência visual, os seres mais poderosos em volta de uma enorme mesa redonda, lembra muito a Sociedade da Justiça da América, que teve de se aposentar após a 2ª Guerra Mundial, além de ter um caráter semelhante a Liga Estraordinária de Alan Moore e Kevin O’Neill.

    A segunda história envolve uma ilha com animais e monstruosidades gigantescas que é invadida por um grupo de arqueólogos japoneses liderados por um Mishima (expoente literário japonês que seguia a risco o código dos samurais e ativista político). Os monstros que destruíam Tóquio foram homenageados, especialmente GodzillaGhidorah, Mohtrah, Rodan, além das criaturas gigantes antagonistas aos heróis tokusatsus, também citados, além de mostrar a ilha em que eles eram concebidos.

    John Cassaday tem muito talento em registrar visualmente a violência, pois os assassinatos são prodigiosamente bem construídos. O roteiro, apesar de simples, reproduz perfeitamente o clima presente nos filmes de ação de Hong Kong, na terceira edição, além de explorar bem o conceito de pistoleiro espectral, clichê muito utilizado nos filmes asiáticos. A quarta edição conta com a história de um ser humano que tem contato com uma superior raça alienígena e é uma viagem escapista a uma invenção, distópica, tecnológica e perfeita, clara analogia ao Capitão Marvel, em que Ellis mostra toda a sua admiração pelo personagem. Já na edição zero, Ellis brinca com o mito do Hulk, através do cientista David Paine que sofre um acidente, torna-se uma monstruosidade e é abandonado, deixado para morrer numa vala comum.

    Doc Brass e Snow nasceram em 1° de Janeiro de 1900, e há algo ainda nebuloso sobre a questão: a edição cinco é toda uma conversa entre os dois, cortadas pelas lembranças dos áureos tempos do doutor. As cores de Laura Depuy e David Baron fazem com que a já excepcional arte de Cassaday torne-se magnânima.  Ao final da edição, uma figura poderosa que se auto-intitula William Lether tem a oportunidade de enfrentar Elijah Snow, mas deixa o embate para depois e vai embora sem um enfrentamento na conclusão. O encadernado compreende as primeiras seis edições de Planetary, e é apenas o tímido começo para uma das melhores e mais competentes obras de Warren Ellis.

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