Tag: Zac Efron

  • Crítica | 17 Outra Vez

    Crítica | 17 Outra Vez

    Comédia adolescente com elementos fantásticos, 17 Outra Vez tem uma fórmula curiosa. Utiliza uma premissa semelhante a de Quero Ser Grande e De Repente 30, mas com uma lógica invertida, quase como um remake de Jovem de Novo (filme obscuro para TV protagonizado por Keanu Reeves e lançado pela Disney em 1987). A história dá conta de Mike O’Donell, um garoto que fazia sucesso no colegial como atleta, dançarino e possível prospecto para universidades, que simplesmente decide casar com sua namorada de infância quando descobre que ela está grávida. Com o tempo, ele percebe os equívocos de suas escolhas, em especial graças a crise familiar que vive já na atualidade, e em um passe de mágica, dado por um misterioso zelador idoso de sua antiga escola, ele tem a chance de rejuvenescer 30 anos, voltando a última idade em que foi muito feliz, com o futuro inteiro pela frente.

    A história mira inicialmente o dia de Mike, feito por Zac Efron, no Hayden High School, com ele treinando exaustivamente cestas de três, na quadra de basquete em 1989. Ele dança junto às líderes de torcida, como um verdadeiro showman, se valendo das capacidades físicas que já havia mostrado no seriado musical High School Musical. O sujeito é tão completo que age como animador da torcida e um dos principais jogadores de seu colégio. Ele recebe a notícia que mudaria sua vida exatamente antes de sua grande noite esportiva, e o caminho que ele passa a traçar a partir daí vai na direção contrária do que se esperava dele. Ele se encontra com Scarlett (aqui, feita por Allison Miller quando jovem, e Leslie Mann já no tempo presente) e declara que seguirá uma vida segura ao lado dela e do bebê que viria.

    Mike é vivido por dois atores famosos, na fase adulta ele é Mathew Perry (conhecido pelo papel de Chandler Bing em Friends), e jovem é feito pelo astro Efron do seriado musical. É curioso como ambos interpretes tenham ficado famosos por obras para a televisão, pois apesar do filme de Bur Steers ter sido feito para o cinema, sua premissa é típica dos seriados antigos e das sessões de filmes que passavam a tarde, embora o filme não seja desprezível narrativa e visualmente. Efron aliás se dedicou bastante, inúmeras vezes ligava para Perry para saber como ele falaria, emulava e imitava movimentos dele, e além disso, aprimorou seus dotes de basquete, pois na famosa cena do refeitório, ele faz acrobacias com a bola laranja de basquete sem qualquer intervenção digital.

    17 Outra Vez acerta no alívio cômico por meio de Ned Gold, interpretado por Thomas Lennon, um nerd colecionador de toda sorte de brinquedos, quadrinhos e livros de cultura pop, além de seu melhor amigo desde os tempos de colégio – ainda que possuam personalidades completamente díspares. A luta entre os dois, logo depois que Mike passa por sua transformação, é épica, assim como toda a tentativa dele em encontrar uma razão lógica para essa mutação.

    Lennon concentra a maioria esmagadora das piadas boas (especialmente as baseadas em constrangimento). Sua completa inabilidade social é um prato cheio para a platéia ávida por momentos de vergonha alheia. É incrível como ele subverte a questão dos traumas colegiais de ter sofrido bullying com comentários completamente inapropriados para a diretora, Jane Materston (Melora Hardin). Ele decide se tornar tutor do seu melhor amigo, ajudando-o a se recompor e se tornar (novamente) um menino popular no ensino médio, mesmo com tempos completamente diferentes entre o que era a sua realidade e a nova.

    O roteiro de Jason Filardi varia entre uma certa esperteza ao mostrar os choques de gerações, baseando o cômico nos absurdos dos arquétipos gerais, mas também exagera um pouco no modo de retratar o quanto os adolescentes dos anos 2000-2010 são reféns da tecnologia, até porque quase todas as gerações são assim  atualmente. Além disso, há alguns momentos inspiradores, como quando Mike usa a alcunha de Mark para bater de frente com Stan (Hunter Parish), o bully que maltrata Alex (Sterling Knight), seu filho mais novo. Aos poucos, ele se torna mentor do menino, tendo finalmente uma proximidade considerável com a intimidade de seu herdeiro sanguíneo.

    Mark é um sujeito muito articulado, mais do que todas as suas contrapartes sempre foram. Ele tem ótimas sacadas no sentido de proteger os flagelados do sistema escolar e tem ótimas falas a respeito de uma juventude abstêmia, mas o personagem é bem construído o suficiente para mostrá-lo agindo de maneira impulsiva, pulando em cima do sujeito que fazia insinuações sexuais com sua filha Maggie (Michelle Trachtenberg). A trama juvenil é bem encaixada, por mais simples que seja, e ajuda a fortificar a ideia de valores familiares, por mais que em alguns pontos seja claramente bem conservadora em sua análise de mundo. Afinal, o filme se passa sob o olhar de um homem de meia idade que volta a ser menor de idade.

    O fim do filme mira uma condição quase poética, baseada nas reflexões que Mark tem, acreditando que seu mundo seria melhor sem que Mike vivesse. Além das óbvias referencias aos filmes de transformação de idade dos protagonistas, há um pouco do mito dos fantasmas de Scrooge e as tantas versões natalinas no cinema, televisão etc. Por mais simples que seja o filme de Steers, sua mensagem é bem passada (excluindo é claro a hiper moralidade do protagonista), resultando em um filme bem resolvido, romântico, com uma boa participação de Efron, Mann e Lennon, além de terminar com um resgate ao passado, mostrando fotos dos membros da produção na época do colegial, dando inclusive uma ideia de legado familiar no basquete, uma vez que Alex utiliza a mesma camisa que seu pai usou quando novo, com o número zero estampado, dando ideia de que o filho poderia seguir os sonhos do pai, caso quisesse.

  • Crítica | O Rei do Show

    Crítica | O Rei do Show

    A principal pergunta a respeito de P.T. Barnum é se ele é um trambiqueiro ou um visionário. O Rei do Show se dedica a responder essas perguntas além de fazer uma ode à arte circense, baseando-se na história por trás do homem que aparentemente criou o conceito de show business. O personagem principal é mostrado ainda novo, em uma infância humilde, se apaixonando pela moça que seria a mãe de seus filhos. Na idade adulta, Barnum passa a ser interpretado por Hugh Jackman – novamente muito inspirado -, enquanto sua esposa, Charity Barnum, tem como intérprete Michelle Williams.

    O musical do diretor estreante Michael Gracey, valoriza o consumo de arte popular através da jornada de Barnum rumo ao autoconhecimento e ao estrelato, primeiro mostrando sua busca por pessoas incomuns para o seu show, depois ao revelar seu desprezo pela crítica especializada, que sempre considera seus números de mal gosto, basicamente por aparentarem vulgaridade.

    O roteiro e as músicas remetem a uma inclusão do diferente e quase todos os personagens exalam isso, mesmo os “bem-nascidos”, como Phillip Carlyle, de Zac Effron, um garoto de família tradicional que se junta ao tal circo, ainda que sua reputação esteja a beira da falência ao aceitar tal coisa. Nesse ponto a história é esquemática, mas mesmo nessas apelações ela acerta em tons de drama, especialmente no que tange a participação de Zendaya, como a acrobata Anne Wheeler, sendo ela a responsável pelo melhor desempenho físico do filme inteiro.

    Talvez a questão mais discutível do filme inteiro seja as curvas que Barnum. Ele se aventura por outras formas de shows, ao lado da cantora de ópera Jenny Lind (Rebecca Ferguson), basicamente por que vê nela uma oportunidade de ascensão. Após alguns fracassos, ele volta arrependido e não há reprimenda, isso soa um pouco inverossímil. O protagonista precisa passar por vários clichês de fracasso e redenção para perceber que a felicidade estava ali ao lado.

    Ao final se percebe que as condições de trambiqueiro e visionário não se anulam, ao contrário, se complementam para formar de fato a figura de um sujeito que enxerga muito além do entretenimento atual, alguém que está à frente do seu tempo e que ainda assim tem muitíssimas falhas. As histórias adocicadas e otimistas são as mais fáceis de digerir e de se apresentar e nem por isso são mais pobres, e até na defesa desse tipo de conto, O Rei do Show acerta em cheio, por ser carregado de significados, repleto de nuances e discussões adultas.

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  • Crítica | Baywatch

    Crítica | Baywatch

    Uma das estreias mais curiosas de 2017, Baywatch chegou aos cinemas com a missão de criar uma franquia nos cinemas baseados na popular série de TV dos anos 90.

    Os guarda-costas da praia aceitam novos recrutas indisciplinados enquanto lutam contra traficantes de drogas. O roteiro escrito por Damian Shannon e Mark Swift, com a história de Jay Scherick, David Ronn, Thomas Lennon e Robert Ben Garant, tem como maior mérito a simplicidade da narrativa. Desde a apresentação dos personagens, o conflito com os traficantes de drogas se passando como donos de um clube, às mais variadas situações, tudo é muito claro ao espectador.

    A premissa gira em torno da maturidade de Matt Brody (Zac Efron), ex-campeão olímpico que precisa aprender a trabalhar em equipe, o que por si reflete no líder dos salva-vidas, Mitch Buchannon (Dwayne Johnson). A mensagem é simples: um guarda costas precisa saber se salvar antes de poder salvar os outros.

    O elenco está muito confortável fazendo as atuações mais canastronas possíveis que o filme exige. The Rock mostra porque tem presença e força em Hollywood. A direção de Seth Gordon achou o tom certo de comédia, outro acerto é a falta de pretensão, o filme não se leva a sério em nenhum momento. A fotografia de Eric Steelberg e a edição de Peres S Eliott cumprem o seu papel, deixando uma fotografia naturalista e um ritmo fluido.

    Baywatch deve agradar aos fãs da série como também quem aprecia uma comédia descerebrada.

    Texto de autoria de Pablo Grilo.

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  • Crítica | Tirando o Atraso

    Crítica | Tirando o Atraso

    Após uma abertura repleta de estilo, onde é demonstrada uma relação bastante íntima entre avô e neto, o drama de Tirando o Atraso se estabelece, através de uma comédia rasgada e sem escrúpulos. O parente mais novo é Jason Kelly (Zac Effron), um jovem advogado em vias de se casar e que desde cedo optou por uma vida mais pacata e tediosa. A marcação de seu casamento visa exatamente estabelecer essa maturidade pregada por si, enquanto, seu avô o General Richard Dick Kelly (Robert DeNiro) está claramente depressivo, graças a morte de sua companheira, vitimada por um câncer que durou dez anos. Ambos tem que fazer uma viagem até Boca Raton, na Florida, para exorcizar os demônios de ambos.

    No meio do caminho, em meio a reprimendas dos familiares e da esposa que espera pelo neto, a dupla de parentes passa por flertes com universitárias bonitas, se hospedam perto da praia e circundam uma festa de uma faculdade, tudo a fim de permitir que o idoso possa ter finalmente um intervalo em sua vida sexual inativa, já que nada ocorre consigo a mais de 15 anos.

    O que se vê é uma odisseia de farra e inconsequência, como se aquela viagem não fizesse parte da vida dos que a vivem, tendo este paradigma evidentemente invertido durante o decorrer da história. O diretor Dan Mazer está acostumado a trabalhar com Sacha Baron Cohen, tanto em Borat como em Ali G Indahouse há colaboração do mesmo nos roteiros, fato que ajuda a explicar um pouco da escatologia sem noção do filme.

    A jornada de reaproximação é tão íntima que o chefe de família chega a fazer comparações entre os pênis dos parentes, elogiando seu neto por ter um instrumento parecido com o seu próprio. Este pequeno trecho já demonstra o quanto politicamente incorreto é o caráter do filme e o quão despreocupado ele é com normas e regras sociais, fator que o fez ser encarado como exemplo do que é um cinema execrável.

    De fato, há um número elevado de piadas de cunho tanto homofóbico quanto racista, mas é deixado claro dentro do roteiro de John Phillips que aquela é uma atitude isolada, por parte de um personagem que reproduz toda sorte de preconceitos de sua época, mas que ainda tenta conviver com o diferente, por mais que isto o assuste. A direção de Mazer não faz de Dick um pobre coitado e injustiçado, ao contrário, só dá carisma a um sujeito que é inconsequente, mas que diante de situações limite, percebe os próprios erros e tenta realizar um mea culpa.

    Tirando o Atraso está longe de ser uma comédia perfeita, mas sua intenção não é sequer a de entrar nesse mérito, e sim de ser mais um filme humorístico despreocupado e descerebrado, que causa riso exatamente por sua falta de noção e seu descompromisso com o status quo. As acusações de misoginia extrema e demais perseguições parecem partir de uma vontade coletiva de se eleger um exemplar de ódio mútuo do que um argumento de unanimidade por parte do público cinéfilo, fato que chega a ser até irritante, não tanto por denegrir a real intenção do filme, mas sim porque atitudes como essa ajudam a mascarar outros produtos da cultura pop que pregam de fato uma segregação de minorias.

  • Crítica | Os Caça-Noivas

    Crítica | Os Caça-Noivas

    Após o fim de High School Musical, o ator Zac Efron tem se esforçado para tirar de si a impressão de somente fazer papéis de bons moços. Sua filmografia recente inclui filmes densos como Obsessão e comédias adultas como Vizinhos e Tirando o Atraso. Os Caça-Noivas se encaixa na segunda categoria, sendo uma comédia rasgada dirigida por Jake Szymanski que conta a historia de dois irmãos Strengle, Dave (Efron) e Mike (Adam DeVine) que são obrigados a arrumarem acompanhantes para o casamento de uma parente, a fim de que não estraguem festa de cerimônia, como normalmente fazem.

    O mote do roteiro faz lembrar uma versão repaginada de Penetras Bons de Bico, ainda que haja uma preocupação maior da parte dos protagonistas masculinos em se adequar a uma realidade mais normativa e menos baladeira. A busca por parceiras de casamento vai mal, ao ponto dos dois irem a televisão fazer um apelo, que é atendido por Tatiana (Aubrey Plaza) e Alice (Anna Kendrick), duas meninas tão tresloucadas quanto a dupla masculina.

    A viagem rumo ao enlace no Hawaii produz algumas surpresas no público, como a inversão de expectativa relativa ao humor. A comédia parecia pender para um lado mais machista e de exposição de corpos femininos subverte isso. As acompanhantes não são presas fáceis para os homens e a exploração de sexualidade são todas pró mulheres, seja através da personagem prima de ambos Terry (Alice Wetterlund), que flerta com uma das moças, ou nas piadas com o orgasmo feminino. De certa forma, o filme acerta onde Missão Madrinha de Casamento falhou, em ser um escracho repleto de estrogênio que soa tão oportunista quanto o filme de Paul Feig, que bebia da fonte de Se Beber Não Case.

    O terço final é ligeiramente mais reflexivo e nele, os futuros noivos Jeanie (Sugar Lyn Beard) e Eric (Sam Richardson) tem um choque de realidade, que os faz reavaliar todo os sentimentos que tem um pelo outro, e reconsiderar os votos de casamento. O choque de culturas tão diferentes produz um desfecho de história adocicado e clichê, que é salvo da completa mediocridade graças ao carisma das personagens femininas, tendo atenção especial as atuações de Kendrick e Plaza, que possuem uma química interessante e apresentar nuances mesmo em personagens estereotipados.

  • Crítica | Vizinhos 2

    Crítica | Vizinhos 2

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    Sororidade é um conceito do feminismo sobre mulheres tratando-se como irmãs. É a aliança entre mulheres, buscando companheirismo e apoio. É também um paralelo com as tais fraternidades, as repúblicas americanas tradicionais e formadas por meninos. A definição de fraternidade nos EUA é bastante poderosa, chegando a ser forte influenciadora na vida acadêmica e profissional dos seus moradores. Suas festas também são conhecidas por trotes violentos e situações de abuso.

    É irônico iniciar a análise de um filme escrito e protagonizado por Seth Rogen com uma nota informativa, mas Vizinhos 2 (leia nossa crítica sobre Vizinhos) é uma comédia tipicamente maconheira e incorreta que tem muito a informar.

    Próximo de ganhar seu segundo filho, o casal Mac (Seth Rogen) e Kelly Radner (Rose Byrne) precisa enfrentar novamente um grupo de adolescentes na vizinhança, e colocar-se novamente como os velhos responsáveis, especialistas em evitar que adolescentes se divirtam, mesmo que a contragosto. Desta vez, uma república feminina. Uma sororidade, liderada por Shelby (Chloë Grace Moretz), disposta a provar e livrar-se das amarras de suas vidas anteriores, em que era sempre e sempre incentivada a ter como membros moças comportadas. Diante do desafio, convoca Teddy (Zac Efron), que está da mesma forma como foi deixado no filme anterior, de futuro incerto, visto como velho do alto dos seus 25 anos e angustiado por ver-se incapaz de progredir na vida.

    A passagem da adolescência para a vida adulta tem fronteiras que são difíceis de mapear, ainda mais para a geração Y, que tem a oportunidade de alargar todo tipo de fronteira tradicional. Com a falta de um rito de passagem pré-estabelecido, é possível ver uma grande parcela dos jovens perdidos sobre seu lugar no mundo. O casamento e paternidade/maternidade não são mais rituais tão significativos ou tão cheios de certezas.

    Com um humor ainda baseado em maconha, intestino solto e consolos gigantes, o filme continua tão afiado quanto seu anterior, sofrendo, porém, com a falta do excelente Dave Franco para adicionar sua ingenuidade caótica (tal qual seu irmão) ao delivery de piadas feito pelo elenco. Às vezes o resultado é um pouco mais histriônico do que deveria, além de não contar com piadas do nível da “Festa à fantasia dos De Niros” do primeiro filme, suficiente para fazer alguém rir por até três dias. Ainda assim, o resultado é prioritariamente positivo e bastante engraçado.

    Sempre atento aos temas que busca, o filme demonstra ser eficiente ao elencar os temores adolescentes e adultos, inclusive do mundo feminino, tirando o ar de clube do bolinha dos filmes de Seth Rogen, Nicholas Stoller e companhia, e abrindo espaço para as meninas se exporem como força humorística. Vem delas as mesmas piadas de intestino solto e maconha, além da reflexão sobre a necessidade que todos temos de demonstrar que não precisamos de babás ou tutores. Ao final, valem como experiência os tropeços da vida.

    Texto de autoria de Marcos Paulo Oliveira.

  • Crítica | Vizinhos

    Crítica | Vizinhos

    A complicada relação entre vizinhos já rendeu vários filmes ao longo da história do cinema. Desde filmes de suspense, passando por dramas bastante pesados e algumas comédias rasgadas, como o caso de Meus Vizinhos São um Terror, dirigido por Joe Dante e estrelado pelo grande Tom Hanks. Se formos puxar na memória, chega a impressionar a quantidade de filmes que tem como pano de fundo essa relação cotidiana que caminha na tênue linha do amor e do ódio.

    Dirigido por Nicholas Stoller, diretor de Ressaca de Amor e O Pior Trabalho do Mundo, este Vizinhos é uma divertida comédia sobre um casal (Seth Rogen e Rose Byrne) que vive em uma pacata vizinhança com sua filhinha de poucos meses de vida. Os dois vivem uma vida sem grandes emoções, até que tudo é virado de cabeça para baixo quando a fraternidade Delta Psi Beta, lendária por suas festas de arromba e liderada pelos alucinados Teddy (Zac Efron) e Pete (Dave Franco, o irmão mais novo de James Franco), muda-se para a casa ao lado.

    O filme tem um ritmo e uma dinâmica muito interessantes. Em vez de simplesmente odiarem os novos vizinhos logo de início, os personagens de Rogen e Byrne tentam inicialmente conquistar a simpatia dos membros da fraternidade com o intuito de tentar controlá-los. Essa tentativa rende um momento engraçadíssimo com os dois tentando pateticamente parecer mais jovens. Tal situação fica mais absurda quando os dois resolvem comparecer à festa inaugural da fraternidade. Seth Rogen e Zac Efron protagonizam uma discussão surreal sobre quem é o melhor Batman de todos os tempos enquanto Rose Byrne tenta se enturmar com as meninas que lá estão.

    O diretor Stoller dirigiu e escreveu somente comédias em sua carreira. Por isso consegue filmar com bastante competência essa película. As gags nunca parecem gratuitas e o filme ganha em comicidade à medida que a disputa entre os vizinhos se intensifica. As artimanhas usadas pelo casal e pela fraternidade são hilárias, ainda que em alguns momentos rendam momentos absurdos. Méritos também para os roteiristas Andrew J. Cohen e Brendan O’Brien, que conferiram profundidade aos personagens principais e povoaram a tela com coadjuvantes engraçados que acrescentam bastante ao filme, em vez de simplesmente desfilarem em cena.

    Seth Rogen está habitualmente engraçado, ainda que interprete um personagem bem semelhante aos anteriores de sua carreira. A australiana Rose Byrne também está muito bem e os dois formam um casal de boa química. Incrivelmente, o maior destaque do filme é Zac Efron. O galã-dançarino que apareceu para o grande público em High School Musical mostra que tem bastante talento e protagoniza algumas das melhores piadas do filme. Além disso, entrega uma interpretação alucinada para um personagem que chega a beirar o sadismo em alguns momentos e forma uma excelente dobradinha com Dave Franco, que também está ótimo em cena. O “bromance” dos dois é muito engraçado. Os coadjuvantes Carla Gallo e Ike Barinholtz estão ótimos, especialmente o último. Seu personagem, Jimmy, protagoniza alguns momentos de pura insanidade. A breve participação de Lisa Kudrow como reitora da universidade também é hilariante.

    Ainda que peque por apresentar um final de certa forma redentor, indo de encontro ao tom anárquico da fita, Vizinhos é diversão de primeira qualidade, que não apela para a escatologia e rende boas risadas.

  • Crítica | Obsessão

    Crítica | Obsessão

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    Um pouco distante da temática que o fez ganhar notoriedade – ligada e muito à questão racial e sempre pelo olhar do negro, citando Preciosa e O Mordomo da Casa BrancaLee Daniels aborda questões de interesse público e privado, sob uma estética bastante semelhante às andanças de Jack Kerouac e aos poemas de Allen Ginsberg. O roteiro de Obsessão é baseado no livro de Pete Dexter, lançado no Brasil como Paperboy – Não Existem Homens Íntegros (compre aqui). É interessante como tanto o subtítulo do romance quanto a tradução do nome do filme expressam bastante o espírito da película, resumindo algumas das questões apresentadas no roteiro do autor e do realizador da obra.

    A imoralidade contrastava com o ambiente rural dos white trash, um lugar tradicional que remete normalmente a momentos de extremo conservadorismo. A escolha do diretor ao contar a história começando com uma filmagem documental é um enorme acerto, pois dá à película um aspecto de veracidade, o que obviamente faz toda a efervescência de insanidade presente na história fazer sentido dentro do universo proposto. A escolha do bom menino Zac Efron para interpretar Jack aumenta ainda mais o escopo de cinismo do filme, assim como a opção pela figura de musa para Nicole Kidman (Charlotte Bless), cinquentenária, decadente, entupida de botox, mas ainda assim, sensualíssima. A dupla formada por Matthew McConaughey (Ward Jansen, irmão mais velho de Jack) e David Oyeleywo (Yardley Acheman) é uma perversão do ideal mostrado em Todos os Homens do Presidente  por Hoffman e Redford obviamente levando em consideração a tensão racial e os conflitos que a interação entre ele e o mundo poderiam ocasionar.

    A câmera, por múltiplas vezes, registra os personagens de uma vista aérea, distante fisicamente deles, no intuito de se fazer notar a diferença entre o pensamento comum e a insana psiquê de cada um dos obcecados personagens. Charlotte é uma tiete de marginais; Jack tem uma séria necessidade sentimental pela senhorita Bless, fantasiando o seu status conjugal de noiva; Ward e Acheman querem chegar ao cerne do personagem investigado  o assassino encarcerado Hillary Van Wetter, interpretado por um desfigurado John Cusack. Dos insanos, ele obviamente é o pior, vide o repertório que o fez ser preso: pelos idos de 28/29 minutos de exibição, ele dá mostras de um pouco de sua insanidade pessoal, pondo em prática seus diálogos sujos que troca com Charlotte através de cartas, e consegue se sujar sem sequer tocar na mulher.

    O script é cortado por disfunções comportamentais protagonizadas por quase todos os personagens principais. O eterno desejo de Jack não se concretiza, apesar de ele desejar desfrutar das curvas de sua musa, sem se mostrar um predador sexual em momento algum. O auge do platonismo na relação, e que mais se aproxima do seu tencionado alvo, é o momento em que ele é obrigado a sofrer com uma chuva dourada dela em plena praia, em uma situação no mínimo inesperada.

    O clã Wetter, ligado a Hillary, é formado por caipiras de aspecto visual degradante, todas figuras esquisitíssimas, maltrapilhas e de aparência asquerosa ou desleixada. Uma das moças, grávida, é mostrada sem camisa ou roupa de baixo, exibindo sua barriga e partes íntimas no pântano. A possibilidade de anomalia mental parece ser algo que abrange as famílias, tanto os Wetter quanto os Jansen.

    As figuras de inspiração de Jack vão caindo diante dele, a começar por seu pai, até o seu irmão, pego em uma situação constrangedora. Quem estende a mão a ele é Charlotte, que está no lugar e momento certos para aliviar as tensões do rapaz. O caçula guarda seus sentimentos e não se entristece com o irmão, graças às suas “preferências”, mas não contém a mágoa por ele ter escondido o segredo de si.

    A fotografia de Roberto Schaefer é um primor e a câmera nervosa de Daniels consegue emular as sensações dúbias das conversas após a revelação de Ward. As relações vão ruindo na medida em que o interesse acaba, ligado, é claro, à solução do caso graças ao artigo publicado. Dali em diante, as situações tornam-se ainda mais loucas e doentias. As cenas de “amor” entre Hillary e Charlotte revezam-se entre o violento coito e flagrantes de animais no pântano. Cusack consegue fazer uma das mais demoníacas figuras do cinema atual sem precisar apelar para clichês, e sua insanidade é justificada e plausível graças a toda sua caracterização.

    Jack era um menino solitário, sem a presença do irmão que sempre trabalhou fora e com a presença da figura opressora da madrasta. Só se afeiçoaria por Anitta (Macy Gray), a doméstica negra que serviu como para-raio de sua solidão e que por muito tempo foi a única pessoa em quem confiou. No seu pensamento irreal, Charlotte era a princesa encantada, a protagonista do conto de fadas, quem ele imaginava ter uma vida perfeita. Saber que ela estava com o asqueroso psicopata o enojava, o que pioraria evidentemente após saber o destino de sua amada. Na fúria elevada pelo ciúme, Jack se mostra um macho viril, mas tal estado ilusório logo cede com a queda do irmão, sua figura de exemplo. O instinto de sobrevivência rivaliza com a aspiração assassina do facínora e este, após perder tudo, finalmente tem sua primeira vitória sobre o inimigo baseada no único comportamento que conhecia: a covardia.

    A película faz apologia ao bizarro e constitui um dos melhores exemplares de filmes que usam o homem como figura monstruosa, tecendo uma possibilidade de futuro nada otimista. O curioso é que o jovem motorista não é tão diferente da nêmese, especialmente no que envolve o nível de isolamento destes do mundo real: enquanto um volta suas atenções para a fria psicopatia sem limites, o outro torna-se um criador de histórias, provavelmente de cunho tão grotesco quanto o que foi narrado em tela.