Tag: George Moura

  • Crítica | O Grande Circo Místico

    Crítica | O Grande Circo Místico

    A nevoa envolve o início de O Grande Circo Místico, o último filme de Carlos Cacá Diegues, após um hiato de 12 anos sem fazer ficção. Logo, é mostrada uma família tradicional, que tem contato com uma imperatriz misteriosa, apresentando Fred (Rafael Lozano), um rapaz que não gosta daquela companhias e quer ir até um circo underground, que mais parece um cabaré, ver as atrações belas e volúveis do lugar.

    A inconformidade dele engana.  O filme parece ter uma boa premissa e uma boa historia para contar, logo é mostrado ele extremamente apaixonado por Beatriz (Bruna Linzmeyer), além de dar vazão a uma historia de origem bem pitoresca, fato que lhe dá condições de ter um presente qualquer para si. Sua escolha é a de cumprir o sonho de sua amada, e ele monta um circo, com todo o elenco da casa de shows burlescos.

    Há uma clara tentativa do roteiro de Diegues, George Moura e Jorge de Lima de soar poético, a historia tem grandes saltos temporais, levando sempre em consideração a estética e vocação circense, mas a artificialidade de diálogos, das ações e principalmente do mestre de cerimônias Celavi vivido por Jesuíta Barbosa faz com que toda a fantasia pareça patética e ridícula, uma tentativa de poesia que não dá certo, com números musicais de qualidade  questionável, não pelas músicas, e sim pelo que é mostrado em tela junto a trilha.

    O roteiro passa pelas gerações da família que detém os direitos do circo que dá nome ao filme, mas o lugar não é um personagem, não tem peso na historia, e as historias vão ficando cada vez mais desinteressantes, sem falar no personagem de Jesuíta, que parece ter um envelhecimento retardado, cuja razão desse fato não se fala em nenhum momento, além de não dar importância se ele é um ser místico/mágico ou não.

    Diegues não consegue traduzir em tela a mágica que tencionou para o filme, esbarra numa historia repleta de músicas bonitas na trilha, mas também em uma hiper sexualização das personagens femininas, além de fazer uso de um Chroma Key tão mal encaixado que torna grotescas todas as cenas que usa. Seu final é tão patético na tentativa de parecer poético e esbarra tanto num fracassado esforço no intuito de parecer uma versão brazuca dos filmes de Federico Fellini que faz irritar quem o assiste, tornando a escolha dele para representar o Brasil na disputa do Oscar de melhor filme estrangeiro algo tétrico, para dizer o mínimo.

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  • Crítica | O Nome da Morte

    Crítica | O Nome da Morte

    Conduzido por Henrique Goldman, diretor de Jean Charles, O Nome da Morte é um filme sobre a história real de Julio Santana, baseada no livro homônimo de Klester Cavalcanti, A trama se inicia com o personagem Julio (Marco Pigossi) passando seus dias no interior, até receber a visita de seu querido tio, Cícero (André Mattos), um policial que mora na cidade grande, e o convida para ir conhecer a metrópole.

    O protagonista tem uma mira ótima e se especializou em tiro de longa distância quando morava no campo. Ele guarda um segredo com seu tio, e esse segredo é utilizado contra ele, para subornar o rapaz a fazer o que seu mentor precisa. Assim, ele se torna um assassino de fato, e em um de seus trabalhos, conhece Maria (Fabiula Nascimento), que se uniria a ele no futuro.

    O roteiro de George Moura abusa de clichês. Por mais que seja uma história baseada em fatos conhecidos popularmente falta sutileza na abordagem e em alguns momentos a trama soa tão falsa quanto as piores novelas da TV dos últimos tempos. As cenas ao menos de ação ao menos são bem construídas, e há uma certa tensão quando se toca em situações de perigo iminente, mas não há qualquer aprofundamento com os personagens, falta humanidade.

    O artigo mais inteligente de O Nome da Morte certamente é a sensação de inevitabilidade do destino e repetição de ciclo que essa pecha carrega, apesar de também ser um clichê, algo já bastante utilizado em outros filmes por meio da parábola do Escorpião e o Sapo. Goldman entrega um filme feito para atingir um público menos exigente e afeito a histórias misteriosas típicas dos filmes hollywoodianos, mas que em essência, quase não tem identidade dramática.

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  • Crítica | Redemoinho

    Crítica | Redemoinho

    redemoinho

    Filme de José Luiz Villamarim, Redemoinho mistura a tendência de cinema contemplativo muito famosa em meio a diretores de Recife e região, junto a uma estética mais normativa e global. Estreia em longas metragens do diretor, a história enfoca dois espectros, sendo o primeiro a intimidade da cidade do interior de Minas Gerais Cataguases, além da amizade antiga e há muito perdida de Luzimar (Irandhir Santos) e Gildo (Júlio Andrade), que se mudou para São Paulo anos antes do drama registrado.

    Os fatos ocorrem na véspera do Natal, onde as famílias se reúnem, servindo esse dia também para um confronto com o passado. Apesar de conter alguns momentos de comicidade, o roteiro se debruça sobre questões dramáticas, utilizando a contemplação já citada para mostrar que algo está muito errado, apesar das conversas descompromissadas dos dois amigos antigos. O problema é que essa exploração mostra que o argumento de George Moura é frágil e irregular, não conseguindo disfarçar essa falta de qualidade nem com os múltiplos diálogos e nem com o uso extensivo do som como elemento narrativo, quase sempre sufocando as palavras e sentimentos dos personagens.

    As performances que mais impressionam são das atrizes. Dira Paes, Cássia Kiss Magro e Cyria Coentro têm cada uma um tempo reduzido de tela, em especial Coentro, mas quando são exigidas, o trio apresenta um conjunto de nuances que é muito mais rico que todo o cansativo mistério explorado no plot principal. As mulheres sofrem pelos erros dos homens e certamente o filme teria mais sucesso em emocionar se enfocasse mais nelas.

    Redemoinho é uma tentativa de fugir do espectro televisivo, uma vez que Villamarim é bastante conhecido por seu trabalho em mini-séries como Justiça e Rebu. Sua linguagem é de cinema e a fotografia de Walter Carvalho é belíssima, mas até esse aspecto positivo ajuda a demonstrar que o filme é muita forma com um conteúdo deficitário em comparação com esta. A elucubração sobre emigração e sobre as maldições do lugar soam pueris na maior parte do tempo, resultando em um desperdício de potencial tremendo.

  • Crítica | Getúlio

    Crítica | Getúlio

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    Getúlio Vargas foi um dos maiores nomes da política brasileira e um dos comandantes mais importantes da história do Brasil. O período de quase 20 anos do político no poder transformou radicalmente a face da República brasileira, o que levantou paixões a seu favor e contra, especialmente ao final de sua administração.

    O filme de João Jardim (do excelente Lixo Extraordinário), com roteiro de George Moura, retrata os últimos 19 dias da vida do ex-presidente, quando o governo é acometido por um turbilhão de críticas após o principal rival político de Vargas, o ferrenho anticomunista Carlos Lacerda, sofrer um atentado, descobrindo-se, logo depois, que os mentores do ato eram pessoas intimamente ligadas a Getúlio.

    Contando com fotografia e design de produção excelentes, o filme consegue reproduzir toda a ambientação da época e fazer o espectador se sentir naquela primeira metade da década de 1950. O Palácio do Catete também contribui enormemente nesse sentido, tendo em vista que o local se manteve praticamente inalterado desde os eventos retratados.

    Optando por uma ótica mais intimista e com toques de thriller psicológico, o diretor tenta mostrar o lado humano do presidente, já idoso, sofrendo todas as pressões políticas em um momento diferente do país, pois se na década de 30 Getúlio conseguiu impor seu modelo, já na democracia, durante a ascensão da Guerra Fria e da influência dos EUA  na América Latina, Vargas sofre a oposição dos setores da sociedade alinhados aos interesses americanos, enquanto sua postura nacionalista, outrora tão eficaz, agora atrai cada vez menos adeptos. O enfoque intimista e pessoal por vezes se torna desnecessariamente lento, e o uso da metalinguagem para explicar os pesadelos do personagem também se mostra repetitivo, dando ao filme um certo tom novelístico característico da TV brasileira.

    Essa pressão se manifestava na figura de Carlos Lacerda (Alexandre Borges), governador da Guanabara e principal porta-voz do udenismo. Suas ferozes críticas ao presidente iam desde o moralismo simplista de acusá-lo de causar todos os problemas do país, até o de culpá-lo pela degeneração da democracia e pela explosão endêmica da corrupção, discurso este muito usado até hoje pelos setores herdeiros do udenismo contra governos que não conseguem vencer no jogo democrático.

    A figura de Carlos Lacerda no filme é mostrada de forma distante, com discursos inflamados, transmitidos na televisão, exigindo a renúncia de Vargas  uma escolha estranha, pois naquela época a TV não era utilizada como meio de comunicação em massa, pois havia poucos aparelhos no país. Esse papel era desempenhado pelo rádio. No entanto, uma construção maior desse personagem poderia tornar a trama menos maniqueísta.

    Maniqueísmo este que se manifesta o tempo todo ao focar a figura de Vargas de forma uníssona, em dúvida apenas quanto ao que mostrar em relação a sua honestidade em lidar com o problema. O presidente é retratado como uma pessoa íntegra que desconhecia absolutamente tudo o que se passava com sua guarda pessoal. Ainda que não soubesse sobre o atentado propriamente dito, para alguém tão centralizador como ele, torna-se um fato que, se não impossível, bastante improvável. No final, tendemos a nos simpatizar com Vargas e antagonizar Lacerda de maneira simplista em razão dessa abordagem.

    O que é muito bem retratado é a relação ambígua com os militares, que já se mostravam descontentes com a democracia e ávidos por terem uma participação maior no poder desde a Era Vargas. Enquanto alguns militares lutavam para manter o legalismo, grande parte se organizava para exigir a renúncia do presidente e preparar o terreno para um golpe militar, o que não seria novidade nem no Brasil, nem na América Latina no período.

    Também merece destaque a atuação de Tony Ramos no papel do presidente. Apesar do exagero do tamanho da barriga e do pouco trabalho com o sotaque gaúcho, o ator transmite ao personagem todo o peso dramático que os eventos narrados impuseram a Vargas.

    O suicídio do ex-presidente no filme também possui parte de seu impacto retirado por não ter sido bem construída a cadeia de eventos que levou a esse fato. Quando a situação se torna insustentável, após Vargas ter abdicado de tomar qualquer posição ofensiva em sua defesa, a única saída possível ao presidente parece ter sido o suicídio, sozinho em seu quarto com seu revólver. O ato, mostrado de forma engrandecedora, oculta os relatos de que, após o tiro, Getúlio sobreviveu ainda por algumas horas. Também oculta, dentre a comoção popular por sua morte, a ira de parte da população que depredou sedes e carros de jornais opositores, caso de O Globo, que teve papel chave na oposição ao governante, ausência essa convenientemente deixada de lado no filme.

    Dessa forma, Getúlio opta conscientemente por construir um personagem que é fruto de escolhas da direção, excluindo algumas informações e exaltando outras. Apesar de ter sucesso em compor um personagem forte mostrando seus dilemas internos e pesadelos, falha em dar a profundidade necessária a seus algozes e aos eventos que levaram a escolha pelo seu suicídio. Talvez por isso, o filme se mostre interessante somente a quem já conheça os fatos e pessoas ali descritos, se mostrando uma experiência não muito agradável ao espectador tradicional.

    Texto de autoria de Fábio Z. Candioto.