Tag: Getúlio Vargas

  • Crítica | O Caso dos Irmãos Naves

    Crítica | O Caso dos Irmãos Naves

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    Começando a partir do frio som do tilintar das máquinas de escrever que faz o registro dos criminosos que lutam contra o Estado, O Caso dos Irmãos Naves é um filme denúncia, que usa o roteiro de Jean-Claude Bernadet e Luis Sérgio Person para apontar os desmandos e abusos da Ditadura Militar, passando pelos censores através do subterfúgio de estar falando sobre o Estado Novo. O longa dirigido por Person conta a trajetória de Sebastião (Juca de Oliveira) e Joaquim Naves (Raul Cortez) acusados de um crime que não cometeram e que sofrem intervenção dos subordinados de Getúlio Vargas, em meio ao seu governo ditatorial.

    A trama se passa em Araguaia, uma cidade interiorana mineira e se utiliza bem da simplicidade do povo do campo. O modo de contar história é moderno e interessante, variando entre as salas do tenente de polícia vivido por Anselmo Duarte, interrogando os envolvidos com os irmãos, e cenas de tortura dos Naves, que apanham e sofrem o castigo dado aos presos políticos, que não tem qualquer informação para repassar aos torturadores.

    Os relatos mostram a mãe dos acusados pedindo ajuda para o advogado Dr Alamy (John Herbert), afirmando que os presos são inocentes. Sem provas, o jurista afirma que ajudará o clã, uma vez que mesmo que se prove a culpa o tratamento aos encarcerados é inumano e humilhante. As cenas mostram em detalhes sórdidos os métodos dos que agem em nome da lei, driblando pudor tanto do cineasta em mostrar os tratos maus, quando dos agressores em impingir terror nos seus supostos opositores, ao ponto de faze-los confessar.

    O processo jurídico é mostrado com o cuidado de exibir a coação do tenente as testemunhas e parentes da família Naves. O juiz, vivido por Henry Higst é delegado ao cargo de julgador, vindo de fora, diante da grande questão de interesse envolvido. Todo o ritual advocatício é levado a partir da supervisão do violento, que se permite coagir os réus e parentes mesmo na frente dos outros agentes da ordem judiciária.

    As cenas pós julgamentos onde os dois irmãos olham fixamente para o tenente mostram um confrontamento sentimental muito interessante, dispondo agressor e agredidos frente a frente, ainda em desigualdade, uma vez que estão os inocentados enclausurados. O Caso dos Irmãos Naves serve como um bom exemplo de retrato histórico e de alegoria ao período turbulento em que era lançado, além de conter um comentário político ousado e palatável para o grande público.

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  • Resenha | O Golpe de 64

    Resenha | O Golpe de 64

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    “Em 31 de março de 1964, as forças militares brasileiras deflagraram um golpe de Estado contra o presidente João Goulart e instalaram no país uma ditadura que duraria décadas.”
    (quarta capa do livro)

    Oscar Pilagallo, jornalista e vencedor do Prêmio Esso em 1993 na categoria de Reportagem Especializada, juntou-se ao quadrinista, cartunista e ilustrador Rafael Campos Rocha, autor de Deus, Essa Gostosa, para transformar as chatíssimas aulas de História do Brasil numa história ilustrada que conta com riqueza de detalhes esse período conturbado da História nacional.

    A narrativa se inicia 10 anos antes, em 1954, com o suicídio de Getúlio Vargas e percorre os anos seguintes discorrendo sobre as origens e os meandros dos acontecimentos que levaram ao golpe. Com conspirações para todo lado, vilões para todos os gostos e reviravoltas mirabolantes, os fatos históricos deveriam ser um prato cheio para uma trama rocambolesca ilustrada.

    Mas infelizmente, o texto de Pilagallo é didático demais na maior parte do tempo. O leitor se sente de volta à sala de aula lendo um daqueles livros de História do Brasil, só que agora em quadrinhos. Talvez não fosse intenção do autor, mas poderia ter explorado mais a verve romanesca, quase burlesca dos eventos. Trabalhar a narrativa como se fosse ficção, aproveitando-se de aspectos e circunstâncias que parecem tirados duma narrativa ficcional (apesar de infelizmente serem reais), teria deixado a leitura bem mais envolvente.

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    Em contrapartida, Rocha teve total liberdade para ilustrar a história. Apesar de várias imagens serem ilustrações feitas a partir de fotos de acontecimentos da época, muitas delas pendem para a caricatura, enfatizando a faceta non-sense dos eventos. É o que garante o alívio cômico e certa leveza – se é que é possível – à narrativa. Rocha usa muitas metáforas e alegorias visuais para representar as ideias e conceitos expostos no texto.

    Como livro paradidático, deve funcionar muito bem, já que o apelo visual da história em quadrinhos o torna mais palatável aos alunos. Não é uma HQ de entretenimento, é uma HQ informativa. É uma ótima opção para quem tiver interesse em saber mais sobre esse período e não quiser encarar longos textos analíticos.

    Texto de autoria de Cristine Tellier.

  • Crítica | Getúlio

    Crítica | Getúlio

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    Getúlio Vargas foi um dos maiores nomes da política brasileira e um dos comandantes mais importantes da história do Brasil. O período de quase 20 anos do político no poder transformou radicalmente a face da República brasileira, o que levantou paixões a seu favor e contra, especialmente ao final de sua administração.

    O filme de João Jardim (do excelente Lixo Extraordinário), com roteiro de George Moura, retrata os últimos 19 dias da vida do ex-presidente, quando o governo é acometido por um turbilhão de críticas após o principal rival político de Vargas, o ferrenho anticomunista Carlos Lacerda, sofrer um atentado, descobrindo-se, logo depois, que os mentores do ato eram pessoas intimamente ligadas a Getúlio.

    Contando com fotografia e design de produção excelentes, o filme consegue reproduzir toda a ambientação da época e fazer o espectador se sentir naquela primeira metade da década de 1950. O Palácio do Catete também contribui enormemente nesse sentido, tendo em vista que o local se manteve praticamente inalterado desde os eventos retratados.

    Optando por uma ótica mais intimista e com toques de thriller psicológico, o diretor tenta mostrar o lado humano do presidente, já idoso, sofrendo todas as pressões políticas em um momento diferente do país, pois se na década de 30 Getúlio conseguiu impor seu modelo, já na democracia, durante a ascensão da Guerra Fria e da influência dos EUA  na América Latina, Vargas sofre a oposição dos setores da sociedade alinhados aos interesses americanos, enquanto sua postura nacionalista, outrora tão eficaz, agora atrai cada vez menos adeptos. O enfoque intimista e pessoal por vezes se torna desnecessariamente lento, e o uso da metalinguagem para explicar os pesadelos do personagem também se mostra repetitivo, dando ao filme um certo tom novelístico característico da TV brasileira.

    Essa pressão se manifestava na figura de Carlos Lacerda (Alexandre Borges), governador da Guanabara e principal porta-voz do udenismo. Suas ferozes críticas ao presidente iam desde o moralismo simplista de acusá-lo de causar todos os problemas do país, até o de culpá-lo pela degeneração da democracia e pela explosão endêmica da corrupção, discurso este muito usado até hoje pelos setores herdeiros do udenismo contra governos que não conseguem vencer no jogo democrático.

    A figura de Carlos Lacerda no filme é mostrada de forma distante, com discursos inflamados, transmitidos na televisão, exigindo a renúncia de Vargas  uma escolha estranha, pois naquela época a TV não era utilizada como meio de comunicação em massa, pois havia poucos aparelhos no país. Esse papel era desempenhado pelo rádio. No entanto, uma construção maior desse personagem poderia tornar a trama menos maniqueísta.

    Maniqueísmo este que se manifesta o tempo todo ao focar a figura de Vargas de forma uníssona, em dúvida apenas quanto ao que mostrar em relação a sua honestidade em lidar com o problema. O presidente é retratado como uma pessoa íntegra que desconhecia absolutamente tudo o que se passava com sua guarda pessoal. Ainda que não soubesse sobre o atentado propriamente dito, para alguém tão centralizador como ele, torna-se um fato que, se não impossível, bastante improvável. No final, tendemos a nos simpatizar com Vargas e antagonizar Lacerda de maneira simplista em razão dessa abordagem.

    O que é muito bem retratado é a relação ambígua com os militares, que já se mostravam descontentes com a democracia e ávidos por terem uma participação maior no poder desde a Era Vargas. Enquanto alguns militares lutavam para manter o legalismo, grande parte se organizava para exigir a renúncia do presidente e preparar o terreno para um golpe militar, o que não seria novidade nem no Brasil, nem na América Latina no período.

    Também merece destaque a atuação de Tony Ramos no papel do presidente. Apesar do exagero do tamanho da barriga e do pouco trabalho com o sotaque gaúcho, o ator transmite ao personagem todo o peso dramático que os eventos narrados impuseram a Vargas.

    O suicídio do ex-presidente no filme também possui parte de seu impacto retirado por não ter sido bem construída a cadeia de eventos que levou a esse fato. Quando a situação se torna insustentável, após Vargas ter abdicado de tomar qualquer posição ofensiva em sua defesa, a única saída possível ao presidente parece ter sido o suicídio, sozinho em seu quarto com seu revólver. O ato, mostrado de forma engrandecedora, oculta os relatos de que, após o tiro, Getúlio sobreviveu ainda por algumas horas. Também oculta, dentre a comoção popular por sua morte, a ira de parte da população que depredou sedes e carros de jornais opositores, caso de O Globo, que teve papel chave na oposição ao governante, ausência essa convenientemente deixada de lado no filme.

    Dessa forma, Getúlio opta conscientemente por construir um personagem que é fruto de escolhas da direção, excluindo algumas informações e exaltando outras. Apesar de ter sucesso em compor um personagem forte mostrando seus dilemas internos e pesadelos, falha em dar a profundidade necessária a seus algozes e aos eventos que levaram a escolha pelo seu suicídio. Talvez por isso, o filme se mostre interessante somente a quem já conheça os fatos e pessoas ali descritos, se mostrando uma experiência não muito agradável ao espectador tradicional.

    Texto de autoria de Fábio Z. Candioto.

  • Crítica | Marighella (2012)

    Crítica | Marighella (2012)

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    O documentário capitaneado por Isa Grinspum Ferraz visa mostrar várias facetas de Carlos Marighella como o de um sujeito pacato e ligado a família, longe demais da imagem pintada pelos mandantes do regime que o pintavam como o pior dos terroristas subversivos e inimigo número um do Estado. A narração da sobrinha de Carlos revela que o filme começou a ser feito de fato após a morte do líder revolucionário.

    No início da fita, são lidas cartas do próprio punho do “anarquista da Sicília”, provindo de uma miscigenada herança entre o italiano Augusto Marighella e da negra Maria Rita, criado em uma casa onde tinha spaghetti e caruru, não havia como crescer sem ser questionador, desde a infância ele não entendia porque o pobre precisava se matar de trabalhar para chegar ao final da vida sem ter absolutamente nada.

    Já muito novo ele se engajaria ao comunismo autodeclarado, levando à Bahia, sua terra, o discurso contra a oligarquia, incitando o povo à revolução. O comunismo baiano dos anos 1930 era contra o integralismo principalmente, e não era alinhado a Karl Marx, até pela dificuldade do acesso, era feitos de mulatos, como Jorge Amado, Edson CarneiroCouto Ferraz, um grupo que vivia a utopia, mas não se desgarravam da realidade marginal baiana. Os intelectuais precisavam sair da neutralidade e se declarar fascistas, comunistas ou liberais, graças ao novo quadro político mundial, aos poucos “os pingos eram postos nos is”. A ida de Marighella ao Rio de Janeiro já culminara numa prisão, acusado pela imprensa à época, de perturbar a paz e não colaborar com a boa ordem do Estado.

    A escolha pelas imagens das paisagens e belezas naturais contrastam com os recortes de jornais, quase sempre explicitando uma luta e perseguição muito violenta ao “cavalheiro Marighella”, que variam entre prisões e comícios. Carlos e outros militantes de bigodes grossos se associavam a Luis Carlos Prestes, sua dificuldade nas manifestações era o de parar de falar e terminar seus discursos. Graças ao Presidente Dutra, o Partido Comunista Brasileiro foi tornado ilegal e Carlos Marighella passou a viver na clandestinidade, seu primeiro filho só viria a conhecê-lo aos sete anos de idade. Em meio a paranoia mundial, eram veiculados comerciais estadunidenses muito engraçados, com “animações desanimadas” mostrando o poderio soviético, explodindo símbolos do capital, como A Estátua da Liberdade.

    A posição de Marighella era diferente da de Brizola, Goulart e outros tantos pensadores. Ele viajou para a China, para a União Soviética a fim de conseguir instrução sobre o estado totalitário socialista. Um momento emocionante é quando sua esposa Clara Charf, declara que ele não sabia falar chinês e que ele havia feito um dicionário desenhado do idioma, mas que o livro foi tomado pelas autoridades, numa das invasões da polícia a sua residência. O “mulatão” cada vez se precavia mais e alertava seus colegas de que eles não resistiriam a caça após o Golpe Militar. Seu argumento era de fuga, mesmo após as falas de Jango de que o vice, uma vez empossado presidente, teria uma resposta rápida a ação dos militares. Ele era muitíssimo bem informado, parecia prever as artimanhas e a movimentação dos homens de farda.

    Sua postura se tornaria ainda mais extremista, rompendo com o partido após a sua prisão e a ida a Cuba, em uma viagem clandestina. Se declarara um revolucionário, ligado às massas e inconforme à maneira cordata com que a esquerda se portava de forma muito inocente e submissa aos caprichos militares, e até essas reprimendas são publicadas carregadas de um conteúdo poetizado. Para ele, o revide devia ser na mesma força e medida, era inspirador, de confiança e admiração, e sobretudo era uma figura simples, ao mesmo tempo que estudiosa e muito inteligente.

    Apesar de sua afeição ao modo de revolução chinês, Marighella queria um comunismo genuinamente nacional, com samba, futebol e cores tão caracteristicamente brasileiros. Ele não era um teórico, participava dos assaltos de forma ativa e veemente. Suas ações não eram freadas pela possibilidade de perecer ou do sacrifício de vidas alheias, das dos seus, em ações de guerrilha que os adeptos já tinham conhecimento e claro, dos seus opositores.

    O modo como a realizadora apresenta a morte do guerrilheiro é sem muito apuro do modo como ocorreu o assassinato, tal artifício emula tanto a forma sem respostas do Regime ao assassinar o seu opositor e também a não necessidade de ser lógico, e claro que o próprio Marighella usava em seus poemas, ainda que nestes escritos ele não retire os seus pés do chão. Carlos Marighella era o libertário utópico, munido da informação, mas que prestou a sua imagem para inspirar o ideal da liberdade do país, o que Isa Grinspum Ferraz fez é uma homenagem muito competente a sua figura, sem ser chapa branca, destacando até seus erros, mas focando a aura do contestador imberbe que ele era, dando à revolução um nome estrangeiro, de difícil dicção e de fácil identificação.

  • Crítica | Brizola: Tempos de Luta

    Crítica | Brizola: Tempos de Luta

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    Tabajara Ruas é o responsável por contar o relato biográfico do político e ativista gaúcho Leonel Brizola. Desde a infância muito humilde, passando pela obsessão de sua mãe pela educação e instrução do filho, e também grafando o passado de lutas do povo gaúcho, Leonel também levantou-se como ativista. Sempre esteve muito presente em eventos de contestação, mas sem se descuidar do trabalho, visto que precisava dele para garantir o seu sustento. A narrativa é linear e muito parecida com a estética do cinema clássico americano, reunindo muitos depoimento do próprio Brizola e de muitos de seus colegas, como Antônio de Pádua, Flávio Tavares, Vieira de Cunha, etc.

    A reunião com estudantes interessados em política, já no Rio de Janeiro, mostrava o biografado como um dos mais atuantes nos grupos de discussão, além da fundação do PTB (Partido Trabalhista Brasileiro). Ele foi eleito deputado estadual com quase quatro mil votos. Nesses grupos ativistas conheceu Neusa Duarte, a Dona Neusa, sua companheira para toda a vida e amada esposa e namorada, que segundo o próprio, apesar da aparente fraqueza, sempre foi muito forte.

    O viés político que influenciou Brizola era ligado a Vargas, com quem teve estreitas relações e dividia ideologias: o trabalhismo. Após a morte de Getúlio Vargas, haveria dois ilustres herdeiros, o próprio Leonel, que seria consagrado prefeito de Porto Alegre e conhecido por fortes investimentos em educação, e claro, João Goulart, vice-presidente dos tempos de Juscelino Kubitschek. Entre os feitos mais notáveis de Brizola era a apropriação e nacionalização da empresa de telefonia do Rio Grande do Sul, ação dita como de vanguarda contra o monopólio americano no Brasil pela ainda não presidente Dilma Rousseff.

    O debate político aumentou devido a Guerra Fria, a ocupação cubana de Fidel Castro e a corrida espacial. Mesmo que Brizola dissesse que entendia que a propriedade privada era importante para a nação, seu discurso era acusado de ser associado aos ideais de Karl Marx, muito graças ao seu alinhamento com o argentino Ernesto Che Guevara. A proximidade de Che com Jango traria consequências graves em um futuro próximo.

    A renúncia de Jânio Quadros surpreendeu o político gaúcho, por Jânio ser um presidente proativo e rápido. A possibilidade de João Goulart assumir causou o furdunço que se concretizou no maior exemplo de paranoia militar. O estado de perplexidade tomou o país e Leonel declarou que ficaria no país para lutar. Uma república parlamentarista seria articulada sem a presunção de ter Goulart dentro do país. Brizola queria o retorno de Jango ao poder, mas era uma voz solitária na resistência. A subida dos militares para o poder marcou o político gaúcho, que até tentou ficar no país, variando de lugar a lugar por um mês e meio, até que teve de ir em definitivo para o Uruguai. O exílio deixou-o muito triste, mas sua postura ainda era a de resistir, apoiando os ativistas para treinar os militantes no esquema de guerrilhas.

    Aos poucos, o nacionalismo do político seria acompanhado pelo socialismo. O retorno de Brizola ao país calharia com o rompimento com o PTB e fundação do PDT (Partido Democrático Trabalhista), além de sua reinvenção na política, candidatando-se a governador do estado do Rio de Janeiro e vencendo uma tentativa de fraude e manipulação de votos. Construiu os Cieps, que teria o intuito de alocar as crianças oito horas por dia na escola, focando a educação e fazendo essas obras sem o apoio financeiro e político do governo federal. Outro episódio interessante foi a construção do sambódromo e o imbróglio com a Rede Globo, que se recusou a transmitir o carnaval. A manobra do governador foi a de entrar em contato com Arnaldo Bloch, presidente da Manchete, que ultrapassou a Globo em audiência no período. A campanha de Diretas Já foi muito motivada por ele, assim como a primeira eleição direta, em 1989, na qual se candidatava ao cargo máximo do executivo, com discursos inflamados e muito bem construídos. Por muito pouco ele não passou para o segundo turno, mas manifestaria seu apoio a Lula no segundo, obviamente tendo perdido. No ano seguinte, seria reeleito governador do Rio, mostrando sua inabalável força política.

    Os entraves entre o político e a Rede Globo ganharam capítulos de intensa batalha, difamações e toda sorte de troca de farpas, inclusive ganhando um direito de resposta em rede nacional, no horário nobre, com narração de Cid Moreira no Jornal Nacional. O conteúdo do manifesto é deveras corajoso e não poupa seus declarados inimigos.

    Pouco antes do fim de sua vida, ele se lançou em mais uma eleição, como vice-presidente da chapa de Lula, muito mais como figura simbólica do que como candidato de fato. Sua despedida teve muito apelo popular e a presença maciça do povo. Brizola se despediria da vida ovacionado pelo eleitorado e pelo homem comum, e até por alguns de seus antigos rivais políticos. Seu discurso poderia não ser completamente compreendido pelo povo, mas seu trabalho foi reconhecido por seus iguais, pela população. O trabalho de Ruas e Sergio Gonzalez em homenagear o político é muito belo e afetuoso, e apesar de deixar de lado muitos dos defeitos do biografado, ainda é um bom retrato da figura do velho e sempre inconformado caudilho.