Tag: Benny Safdie

  • Crítica | Pieces of a Woman

    Crítica | Pieces of a Woman

    Durante um parto doméstico, um bebê falece por causas ainda a serem investigadas. Pai e mãe ficam desesperados e a parteira não sabe o que fazer. Tudo dá errado, e se Deus não está entre nós para ser culpado, alguém precisa ser. Há dois filmes em Pieces of a Woman, dois filmes complementares. O primeiro é sobre os fragmentos internos de um casal depois de um evento desses, e principalmente de uma mulher que vê o sonho de ser mãe acabar bem na sua frente nos primeiros segundos de uma vida tão breve. A segunda história aborda o dia seguinte, a semana seguinte. A vida não para. E o trabalho, e a família, o futuro? Assim, o filme da Netflix (com um elenco fantástico) é sobre juntar os cacos e se amar e o que fazer enquanto a tempestade não cessa – e tudo sem apelar para o melodrama fácil ou maniqueísmos. Feito raro.

    A cineasta Kornél Mundruczó (do fantástico Deus Branco) faz um típico filme europeu nos Estados Unidos, apostando tudo e mais um pouco nas atuações magistrais dos seus atores, muito mais do que em reviravoltas mirabolantes de roteiro ou diálogos espertos em inglês. A problemática que esse jovem casal vivido por Vanessa Kirby (a alma do filme até Ellen Burstyn entrar em cena) e Shia Labeouf (bem longe dos blockbusters milionários) enfrenta durante e depois do parto fracassado é extremamente pesada – o que rende momentos perfeitos para ganhar o Oscar. Momentos de total entrega nas atuações de homens e mulheres aos cacos. Pode-se dizer, portanto, que Kornél dirige algumas cenas com uma força e controle dramáticos extraordinários, muito mais que qualquer cena do recente História de um Casamento, por exemplo. E mesmo assim, sem exageros nas encenações. Trabalho de mestre.

    Por se tratar de um veículo para Kirby e Labeouf brilharem junto de Burstyn (o retorno as premiações) como a avó que quer dar ao quase-neto um funeral decente, Pieces of Woman prende nossa atenção pela tensão presente a cada minuto – filme de suspense mesmo e que começa como um drama bem despretensioso, manipulado a olho nu numa espécie de tour de force sentimental bastante discreto e elegante. A obra cresce, e ao terminar, no tribunal, com a parteira Eva (Molly Parker) sendo finalmente julgada como possível culpada pelo destino do natimorto, temos um arco completo de três mulheres (a mãe, a vó e Eva) que buscam respostas mundanas para a crise existencial que o filme, como um todo, bem representa. Essa é a sensação, afinal, para o espectador: passar por esse abismo emocional junto com essas mulheres e que, no fundo, tentam sair dele ao se agarrar em algo, nem que seja justiça, vingança, alguma coisa! E enquanto os pedaços são colados, a vida teima e continua.

  • VortCast 71 | Diários de Quarentena I

    VortCast 71 | Diários de Quarentena I

    Bem-vindos a bordo. Flávio Vieira (@flaviopvieira), Filipe PereiraJackson Good (@jacksgood) e Rafael Moreira (@_rmc) se reúnem para comentar sobre os seus dias na quarentena em um bate-papo descompromissado sobre reality shows, lives e muito mais.

    Duração: 110 min.
    Edição: Julio Assano Júnior
    Trilha Sonora: Julio Assano Júnior
    Arte do Banner:
     Bruno Gaspar

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  • Crítica | Joias Brutas

    Crítica | Joias Brutas

    Joias Brutas é o novo filme de Benny e Josh Safdie, e tem uma abertura bem ao estilo do longa de David Fincher, Clube da Luta  “poetiza” sobre uma colonoscopia, passeando com a câmera pela parte interna do aparelho digestivo de Adam Sandler, que faz o Howard Ratner, um vendedor de joias cuja moral é duvidosa, que gasta as horas de seus dias entre apostas e outros pecados.

    A musica instrumental vai do prólogo até os primeiros momentos de normalidade e fúria dele. Antes até de mostrar o exame, é visto um cenário árido, em um trabalho de mineração na Etiópia em 2010, variando bem entre um lugar pobre e com condições insalubres de vida, capaz de gerar riquezas como a tal joia que cairia nas mãos de Howard e do ex-astro da NBA (na época, jogando pelo Boston Celtics) Kevin Garnett. Sem qualquer panfletarismo, os irmãos mostram a exploração do povo negro e a mentalidade colonizadora dos estadunidenses, na historia suja que os realizadores pensaram, onde o pior do ser humano é vazado.

    Ratner é deplorável, o papel foi pensado para Sandler, que mais de dez anos antes recusou o mesmo. O roteiro passou por muitas versões e cortes. Howard sofre o diabo, é enquadrado pelos que tem dívida consigo, penhora bens de clientes, quase morre, sua vida é agitadíssima. Há alguns momentos que lembram Bom Comportamento, filme anterior da dupla, especialmente nos momentos de desespero. O mergulho na parte escura da alma dos homens é mostrado de uma maneira visceral e pesada

    A maior parte do tempo o que impera é gritaria e desespero, e isso passa obviamente pela personalidade repelente de qualquer aspecto positivo que Howard tem, o sujeito consegue ter pessoas que o querem bem, ao passo de que não há ninguém ali que não tenha sido destratado ao menos uma vez por ele, ou que tenha sido tapeado (ou ao menos tentado) por suas mentiras e dissimulações. Sandler ultrapassa a barreira do aceitável para um anti heroi, compõe um papel execrável até dentro desse arquétipo e mesmo seus parentes sofrem com a sua desumanidade.

    Garnett desempenha bem seu papel, ainda que ali seja apenas uma versão de si um bocado mais vaidosa e crédula. A forma como o roteiro amarra seu esforço e desempenho contra o Philadelphia 76ers com o potencial da pedra que veio da Etiopia é incrível, porque além de contar com os préstimos do ex jogador, ainda há um sem numero de situações limites que se encavalam e que contam com a entrega não só dos astros (Garnett e Sandler) mas de todo o elenco de atores iniciantes e figurantes.

    O fato de Howard ser tão asqueroso quanto boa parte de seus papéis nos filmes da Happy Madison faz toda a odisseia de fracassos fazer mais sentido, ainda que este sujeito não contenha o carisma dos heróis comuns ao humorista e ator. Não há magnetismo pessoal como nos protagonistas de O Paizão, Click ou Como Se Fosse a Primeira Vez, e sim algo repelente, nem há fantasia de redenção ou reflexão sobre seus atos.  Howard esgotou todas as chances, queimou todas suas fontes e seus possíveis credores, não há ninguém que possa dar a chance dele ser o idiota útil, que no fundo é uma boa pessoa apesar do baixo caráter  pois, até porque nem se mergulhar fundo em sua alma, se acha algo bom em suas intenções.

    Mesmo com uma montanha russa de emoções, dissabores e desespero, o destino ainda sorri para o anti herói da jornada, há alguma fortuna, como se o acaso tivesse afeição pelos idiotas e dignos de pena. O que se vê no final é algo inacreditável, como um mini thriller dentro de um longa bem diferente disso, Joias Brutas captura bem como a vida funciona, entre tristezas e alegrias, é voraz e prima por uma verdade visceral, não só por conta de ter um conjunto de atores iniciantes  mas também pela entrega dos veteranos, tudo com uma intensidade enorme e sem condições de parar em qualquer momento.

  • Crítica | Bom Comportamento

    Crítica | Bom Comportamento

    O drama de desajustados Bom Comportamento é o novo longa metragem dos irmãos Benny e Josh Safdie. Os condutores de Amor, Drogas e Nova York trazem um filme que envolve temas polêmicos, relacionando família, roubo e depredação do bem particular e outras tantas questões espinhosas.

    Na trama, acompanhamos a história dos irmãos Connie (Robert Pattinson), um sujeito trambiqueiro que já tem passagens anteriores pela polícia, e Nick (Benny Safdie), um jovem com condições especiais. A primeira cena já demonstra qual a tônica da relação dos dois, com Connie tirando Nick de um teste psicotécnico, por acreditar que aquilo possa prejudicar o bem estar de seu irmão.

    Connie executa um assalto a banco, ainda que não exista nenhuma cena que explicite como se deu esse planejamento. A dupla de parentes utilizam máscaras para encobrir as verdadeiras identidades e se comunicam por meio de recados de papel com a caixa da agência financeira. Não há sequer um sussurro, quanto mais tiros.

    Essa falta de planejamento pode ser uma simples escolha narrativa, obviamente, mas também há a possibilidade dessa ser a primeira mostra do quão fracassada é a mente e o método do protagonista em planejar as ações que toma para sua vida e para a vida do irmão. A ganância e avidez por conseguir mais dinheiro para si e sua companheira, Corey (Jennifer Lason Leigh), o faz falhar no roubo e após uma perseguição frenética. O destino de Nick é ser capturado, graças a um descuido na tentativa de fuga. O dinheiro roubado passa a ser utilizado como uma tentativa de se pagar a fiança do irmão.

    Nesse meio tempo, todo o cenário social dos Nikas é mostrada em detalhes sórdidos, seja na reunião familiar ou nas condições precárias em que a família se encontra. Em meio a incertezas sobre a liberdade de seu irmão e a culpa que o corrói, há uma nova ação de Connie, a fim de tentar salva-lo no hospital onde se recupera. Mais uma vez ocorre um equívoco e ele se vê com uma nova gama de problemas para resolver e esse importe de erros resulta na demonstração clara de que essa história é sobre um ciclo de fracassos de pessoas desafortunadas.

    A cadeia de eventos drásticos que ocorrem nos pouco mais de cem minutos se torna uma odisseia tragicômica. O ritmo absurdamente bem empregado pelos diretores Safdie transforma os momentos mais surreais em verossímeis. A performance do elenco é mais do que acertada, sobretudo Pattinson, que consegue transparecer e transpirar todo o desespero do dia de cão que vivencia, fazendo desse Bom Comportamento um episódio grave e forte na vida de um sujeito desafortunado e à margem da sociedade.

    https://www.youtube.com/watch?v=4UQYwPHXOUk

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  • Crítica | Amor, Drogas e Nova York

    Crítica | Amor, Drogas e Nova York

    Amor, Drogas e Nova york - poster

    Sintetizadores dominam as saídas de áudio enquanto dois jovens sujos se beijam no chão da rua. A garota segura o cigarro. Traga, beija. Surge então um choro que chama atenção para um momento futuro, mas ele não importa. Pelo menos não agora. Não há motivo para pensar adiante. A vida é efêmera, sem esperança. Aproveite enquanto dura. Assim é o cotidiano dos personagens de Amor, Drogas e Nova York. E é importante entender que é só sobre isso que o filme quer tratar.

    Ben Safdie e Joshua Safdie (Go Get Some Rosemary) dirigem o filme com roteiro de Joshua Safdie e Ronald Bronstein e baseado no livro autobiográfico de Arielle Holmes, que também é a atriz principal. Escrito a pedido dos irmãos Safdie, depois de a encontrarem na rua e sentirem interesse em sua história, o filme acompanha Haley (Holmes) em seu cotidiano; como lida com sua realidade e os parceiros de sua vida, em especial Ilya, por quem tem um vício no mesmo nível da heroína.

    Arielle transpõe sem glamour ou romantização sua vida. É crua. Tão visceral quanto a dos outros personagens, que são também, alguns, colegas de sua vida nas ruas. Sua personagem não apresenta amor próprio, independência. Guia-se pelos outros, trocando de acompanhante para acompanhante em uma desesperada busca por algo que a mantenha ativa. E, assim como outros, não apresenta um arco narrativo de desenvolvimento tradicional, nem deveria. Segue sem pretensão e sem brilho além do produto de seu vício. A obra, por sua vez, não se preocupa em explicar como foram parar ali, quem são os culpados, como melhorar. Não é algo inovador, mas nem por isso se deve deixar de perceber como a presença de alguém que realmente viveu o retratado torna mais coerente e coeso o que ocorre em tela.

    A fotografia, portanto, segue um estilo documental de handy-cam e movimentos bruscos. Às vezes afastada e observadora, às vezes muito próxima dos personagens. Próxima o suficiente para que, em tons puxando para cinza, deixe escapar o vazio de cada um dos que observa. Em poucos momentos há realmente cor em tela, mas são eles os mais danosos. Assim como a presença da trilha sonora reminiscente dos anos 80, que foi tratada por Paul Grimstad e Ariel Pink. Ela enche os espaços por entre as massas de realidade. Assim como nos energiza de forma a continuar até a próxima ilha de banalidade.

    Apesar de tentar, de certa forma, criar um final satisfatório para os médios 90 minutos de filme, não há fim. Assim como não houve começo. Há somente frações de vidas. Não há lição didática para aprender; epifanias de personagens, ou público. O círculo da vida dos marginalizados é o mesmo sob o sol de Nova York ou de qualquer outro lugar do mundo. É assim. Só Deus sabe o resto.

    Texto de autoria de Leonardo Amaral.