Tag: Sam mendes

  • VortCast 102 | James Bond – 007: A Era Daniel Craig

    VortCast 102 | James Bond – 007: A Era Daniel Craig

    Bem-vindos a bordo. Flávio Vieira (@flaviopvieira | @flaviopvieira) e Mario Abbade (@marioabbade)  se reúnem para comentar sobre o encerramento da era Daniel Craig como James Bond nos cinemas. Quais foram os pontos altos e baixos, as polêmicas e o futuro da franquia.

    Duração: 74 min.
    Edição:
     Flávio Vieira
    Trilha Sonora: Flávio Vieira
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     Bruno Gaspar

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  • Crítica | Beleza Americana

    Crítica | Beleza Americana

    O filme de Sam Mendes, lançado em 1999, abre com um vídeo caseiro. Nele, dois personagens conversam, com um deles focado pela câmera. Um conteúdo dedicado às agruras dos adolescentes dos anos noventa e com a inconformidade do sujeito ordinário. Logo entra a narração de Kevin Spacey, seu personagem Lester Burnham fala a respeito de sua vida monótona e tediosa, poetizando sobre seus últimos momentos.

    Beleza Americana é um filme de linguagem direta. Não é difícil entender seus dramas. Os personagens são realistas apesar de exagerados. Além disso, são ricos em sentimento e psicologicamente complexos, principalmente a família Burnham, que além de Spacey, é representada por Annette Bening e Thora Birch. Lester, Carolyn e Jane vivem no subúrbio e são bastante frustrados com a vida que levam.

    Os Burnham formam o trio perfeito, como uma trindade simbólica do americano médio. Unidos aos coadjuvantes, ainda tem uma infinidade de estereótipos em cena: o militar inseguro sexualmente e enrustido, o casal gay super simpático, o garoto esquisito e bonito que se vale das aparências para lucrar e seguir sua vidinha medíocre, a falsa menina fogosa, etc.

    Todos cooperam para essa mini fábula moderna e cínica sobre a vida do americano comum. O fio condutor dessa trama é Lester, um sujeito fraco de mente, que se deixa levar por qualquer vento e circunstância, alguém volúvel que está cansado de se enxergar um perdedor. Sua atitude disruptora mira quebrar essa bolha de monotonia, e sua jornada passa a ser a do homem simples que tenta sair da letargia e da rotina de jantares enfadonhos e programas sociais em que a falsidade impera. Apesar de ser bastante tolo, parece estar acima dos outros personagens. Ao contrário de sua esposa, Carolyn, ele percebe sua miséria existencial e aparentemente aceita-a.

    O roteiro de Alan Ball sobrevoa o estado letárgico geral, tanto na condição catatônica de Barbara (Allison Janney), como na hipocrisia de seu marido (auto engano como representação da letargia) até chegar no sujeito ordinário cansado de ser servil. A geração baby boomer, segundo a fábula, está fadada a ser estática, enquanto a geração posterior busca ser diferente a todo custo. Mendes conduz bem um mundo de aparências em uma vizinhança pequena, fazendo esse micro universo ser crível principalmente por conta de sua direção de atores.

    Ao passo que o roteiro fala a respeito de observar a vida passivamente, também se discute manipulação entre parentes. O embate de pais e filhos é todo pautado nisso. O embate entre Wes Bentley e Chris Cooper consiste no controle que o garoto tem junto ao pai. O rapaz faz o adulto acreditar que domina seus sentimentos e seu  temor, deliberadamente finge acreditar na disciplina pregada pela figura de autoridade. A brincadeira com a expectativa de terceiros é quase um hobby dos homens, independente da idade ou da postura de cada um dos personagens. Todos eles sofrem desse mal, e o comentário de Ball e Mendes é de que a sociedade americana é torta e essencialmente falsa, viciada nesse tipo de manipulação.

    Perto do final, a casa dos Burnham se torna o centro gravitacional de toda a problemática dos suburbanos, um ímã magnético figurativo que atrai a tragédia. Os personagens se aproximam de Lester e lhe exigem afeto, mesmo os que não têm qualquer laço afetivo. Simples ou medíocre, o personagem central travessa a barreira de ser comum logo após perceber que seu objeto de desejo, a ninfeta que ele tanto desejou, é apenas uma adolescente virginal que projetava mentiras. Sua reação comedida o faz perceber o quanto era bobo e comum a busca pelo objetivo inalcançável, até mesmo isso é um fetiche comum.

    Quando hesita em cena, também expia um pecado que não cometeu. Mesmo se não rompesse a perfeição do chefe de família ideal, ele ainda pareceria um sujeito impuro dentro da fábula cristã. Quando alcança essa compreensão, porém, seu fim é rápido, praticamente indolor. Ressaltado pelas flores vermelhas que povoaram suas fantasias. A riqueza de Beleza Americana mora nesse argumento poético e metalinguístico. O homem apenas deseja o que não lhe cabe, romantizando a vida de maneira tola.

  • VortCast 71 | Diários de Quarentena I

    VortCast 71 | Diários de Quarentena I

    Bem-vindos a bordo. Flávio Vieira (@flaviopvieira), Filipe PereiraJackson Good (@jacksgood) e Rafael Moreira (@_rmc) se reúnem para comentar sobre os seus dias na quarentena em um bate-papo descompromissado sobre reality shows, lives e muito mais.

    Duração: 110 min.
    Edição: Julio Assano Júnior
    Trilha Sonora: Julio Assano Júnior
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  • Os 10 Grandes Beijos do Cinema

    Os 10 Grandes Beijos do Cinema

    Segundo o antropólogo inglês Desmond Morris, foi o costume materno de se mastigar a alimentação antes de passar à boca da prole, em tempos mais ancestrais, que provavelmente derivou o hábito do que, no Brasil, é nome até de doce. Nada romântico, não é mesmo? Mas todo mundo lembra quando foi seu primeiro beijo, talvez até o gosto dela, se rolou um frenesi, ou não. Poucos filmes conseguiram traduzir na tela a sensação desse momento. Listamos alguns que chegaram lá.

    Branca de Neve e os Sete Anões (William Cottrell, David Hand, Wilfred Jackson, Larry Morey, Perce Pearce e Ben Sharpsteen, 1937)

    O beijo que vence a morte, num clássico memorável dos estúdios de Walt Disney além de qualquer relatividade sobre grado ou agrado. Saber que a maioria de nós estará viva para atestar novamente sua qualidade no centenário da obra já seria algo maravilhoso.

    O Demônio das Onze Horas (Jean-Luc Godard,1965)

    O beijo desesperado que vence as guerras, pura poesia convertida em imagens, algo que os cinéfilos mais jovens não tem nem paciência pra experimentar. Uma pena. O Demônio das Onze Horas é um clássico forrado de exuberância e um gosto embriagante de Cinema.

    Meu Primeiro Amor (Howard Zieff, 1991)

    O beijo inocente que começa as guerras. É o beijo que solidifica a infância como fase da descoberta sobre quase tudo o que nos faz ser quem somos. É em Meu Primeiro Amor que o toque labial ganha sentidos tão primordiais e sensíveis que nenhum outro filme americano ou não, até hoje, conseguiu expressar tão bem.

    O Guarda-Costas (Mick Jackson, 1992)

    O beijo da impossibilidade de dois corpos ficarem separados. Beijo cafona e deselegante, caso não fosse o ângulo apropriado e a trilha-sonora composta para um filme mais vendida da história, mas como não sentir a vibração da cantora e do seu segurança correndo, de braços abertos, contra a iminência da separação?

    Ghost: Do Outro Lado da Vida (Jerry Zucker, 1990)

    O beijo de alma. Sam e Molly foram um dos grandes casais dos anos 90, rivalizando talvez com o Jack e a Rose de Titanic, só que nem o icônico beijo abraçado na proa do fatídico transatlântico consegue ser mais simbólico a um esperado amor eterno que o beijo etéreo de dois espíritos, absoluta e infinitamente apaixonados.

    Beleza Americana (Sam Mendes, 1999)

    O beijo da culpa. O beijo do racista branco na negra que o criou, ou, no caso, de um coronel homofóbico na boca do vizinho que almeja e não se permite ter, além da carne, por inúmeros motivos secretos. Beleza Americana busca, sobretudo, a união entre céu e inferno num país dividido em todos os sentidos chamado América.

    Homem-Aranha (Sam Raimi, 2002)

    O beijo da juventude. Uma sessão da tarde frenética interrompida logo após uma cena de ação do herói com bandidos, num beco escuro, salvando a mocinha quando esta lhe tasca um beijo irresistível, de ponta-cabeça. Mais contextual não dá, não só ao herói aracnídeo dos quadrinhos, mas ao próprio revirar hormonal da molecada.

    A Cruz dos Anos (Leo McCarey, 1937)

    O beijo da despedida, por uma vida inteira. Como o próprio cineasta Stanley Kubrick apontou, eis um filme que tira lágrima de pedra, e a cena final na estação de trem com o beijo dos dois idosos é destruidora, incidindo sobre a passagem do tempo, e como aquilo que é verdadeiro resiste diante do fim, diante de tudo.

    O Segredo de Brokeback Mountain (Ang Lee, 2005)

    O beijo da saudade, por uma vida inteira – e que quase quebrou o nariz de Heath Ledger. Brokeback Mountain, hoje merecidamente tido por clássico do século XX, é extremamente sutil em sua verdadeira mensagem de seguir o próprio coração mesmo, seguir o instinto natural e ver o que acontece a partir disso. Metáfora sobre os amores incompreendidos.

    A Um Passo da Eternidade (Fred Zinnemann, 1953)

    O beijo cinematográfico definitivo.

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  • Crítica | 007 Contra Spectre

    Crítica | 007 Contra Spectre

    007 Contra Spectre - poster

    Quatro anos após a queda de James Bond e uma audaciosa renovação da personagem, em sincronia com sua época e o estilo de ação formatado nestes anos, o agente britânico retorna às telas para sua 24 ª aventura, demonstrando força desta longeva franquia do cinema. O sucesso de 007 – Operação Skyfall garantiu a Sam Mendes a cadeira da direção, dando continuidade à sua narrativa.

    Como nas demais produções estreladas por Daniel Craig, a obra de Ian Fleming, criador da personagem, se mantém próxima desta nova história, trazendo à tona uma organização criminosa presente em diversos romances do autor. A intenção de promover um recomeço desde Cassino Royale e retornar à base fundamental da obra é coerente. James Bond foi reintroduzido ao público em um formato diferente do habitual.  O cerne da personagem estava presente mas havia uma interpretação mais realista tanto na história como nas cenas de ação, fugindo de outras interpretações anteriores. Um movimento que atingiu o ápice na produção passada com a destruição do universo conhecido.

    007 Contra Spectre é o próximo passo natural que abre um novo momento, realocando a série na tradição de seus filmes após um caminho nunca antes percorrido. A sustentação realista permanece demonstrando que o MI6, e seu projeto de agentes autorizados para matar, pode ser um conceito obsoleto. Sem dúvida, a desconstrução é o cerne deste novo momento, tanto desta franquia quanto de seu parente mais pop, Ethan Hunt, que desde Missão Impossível – Protocolo Fantasma também refletia sobre a importância de atividades de espionagem realizadas em segredo diante de um mundo contemporâneo, conectado e supostamente mais transparente. Ambos são personagens fiéis a uma ordem diferente da atual, que se torna, simultaneamente, obsoleta mas ainda necessária para se manter a ordem.

    A aventura é mais linear e tradicional no quesito espionagem, aproximando-o dos filmes anteriores. É um realocamento das aventuras Bond: ainda na vertente atual, mas inserindo novamente o universo exagerado e charmoso do espião que nunca falha. O senso da realidade dá um passo atrás avisando ao público que estamos diante de uma personagem cujo marco são as cenas impossíveis, o carisma sedutor e um enfoque no qual prevalece a ação.

    Quando o vilão de Christoph Waltz entra em cena, vemos uma composição contrária daquele concebida em Skyfall. O vilão de Javier Bardem era um homem dissonante em uma história realista; nesta Waltz parece um homem real em uma trama com indícios da tradição de Bond. Em pouco tempo em cena junto com o protagonista, sua loucura é expressa pela contenção do ator, motivo pelo qual se projeta o medo. Se novamente compararmos as obras de Craig, a cena de tortura em Cassino Royale e a desta produção têm a mesma base. Porém, enquanto a primeira era brutal e simples, a segunda é elaborada, megalomaníaca, coerente com os grandes vilões que, em maior ou menos grau, desejam dominar o mundo.

    Ao inserir o grupo terrorista SPECTRE, o filme entrelaça suas tramas anteriores, resgatando o necessário para demonstrar que a dinastia de Craig tem uma única e grande história narrada em pontos altos para chegar a este momento. Após a ruptura de Skyfall, os rumos da personagem seriam diferentes se os roteiristas continuassem com queda e crise, talvez descaracterizando James Bond. SPECTRE faz a curva que retorna à pista da tradição da franquia com um vilão megalomaníaco, cênico ao extremo, demonstrando que, realismos à parte, estamos vendo uma obra de ficção.

    Na direção, Sam Mendes compartilha deste preceito e brilha criando cenas que fogem da realidade mas que são um deleite visual, com cenas à meia-luz que intensificam a personagem; contrastes teatrais que trazem poesia à sua história, além de ainda se apoiar em um senso realista nas cenas de ação, pontuais e bem equilibradas.

    Novamente, observamos um novo ponto de transição de James Bond, um movimento de retorno em que a tradição é resgatada com os conceitos deste novo recomeço, um equilíbrio entre a brutalidade da ação com vilões bizarros e planos elaborados, um caminho que aponta para uma última produção com Craig mais próxima deste conceito, mantendo, novamente, em vertentes variadas, o destaque deste grande personagem da ficção.

  • Resenha | Estrada para a Perdição

    Resenha | Estrada para a Perdição

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    Estrada para a Perdição (Road to Perdition, no original), lançada em três volumes durante 1999, é mais um trabalho do veterano autor de mistério policial Max Allan Collins, só que agora na forma de história em quadrinhos. A parceria com Richard Piers Rayner nos desenhos foi importante para resultar em uma das narrativas mais realistas sobre a lei seca, a máfia americana dos anos 30 e a grande depressão, e que originou o filme dirigido por Sam Mendes e estrelado por Tom Hanks.

    Sinopse: o filho de Michael O’Sullivan, chamado Anjo da Morte, testemunha um crime, e, por causa disso, o chefão da máfia irlandesa o trai e mata toda a sua família. O’Sullivan foge, e, com o filho ao seu lado, orquestra um plano de vingança contra todos que estiverem na sua frente.

    Feita toda em preto e branco, a narrativa se divide em duas: nas memórias diretas do filho Michael O’Sullivan Jr., o narrador da história, e nas matérias e livros de repórteres de crime que retratavam a época. Na primeira, o desenho segue a falta de lembrança concreta da narrativa, portanto as imagens não são tão detalhistas, soam, de fato como memórias. Já no segundo caso, os detalhes são impressionantes, podendo Richard Piers Rayner demonstrar o seu talento e versatilidade.

    Imagem 1 - Estrada Para Perdição Vol. 01 - pag. 057

    O narrador lembra ao leitor que está contando uma história

    Imagem 2 - Estrada Para Perdição Vol. 02 - pag. 007

    Detalhes impressionantes

    Outro grande acerto que faz com que o quadrinho ganhe força vem do roteiro: a narrativa dura, realista, crua. Sem embromação, o autor mostra a realidade complicada da época. Nada na história é gratuito, muito menos a reação dos personagens a tudo que os cercava: as mortes, a ilegalidade dos negócios, a dificuldade gerada pela grande depressão que corrompia grande parte da sociedade.

    Imagem 3 - Estrada Para Perdição Vol. 02 - pag. 079

    Pode-se interpretar aqui que as mortes violentas são uma alusão a própria dificuldade da época que a parte honesta da sociedade lidava: matar um leão por dia para colocar comida na mesa da sua família. Michael O’ Sullivan era um herói de guerra que se corrompeu para prover sustento para a sua família; o apelido Anjo da Morte não é a toa: ele é um anjo quando consegue prover à sua família, porém, a morte suja a sua mão para os fins maquiavélicos que o levam a fazer o necessário.

    Outras interpretações para seu apelido podem ser vistas como uma metáfora: na cultura ocidental, o Anjo da Morte pode ser tanto o Diabo quanto o bode expiatório angelical de Deus que se suja ao fazer o trabalho mandado por Ele. Nos dois casos, quem leva a morte ao seu objetivo se traveste da melhor forma para enganar as suas vítimas. E não é por acaso que O’Sullivan se veste com terno e gravata enquanto mata seus inimigos, traje mais respeitoso possível na sociedade ocidental.

    Diferente do Diabo e de um Anjo da Morte de verdade, que usam da sedução para chegar ao seu objetivo, O’Sullivan subverte esta lógica preferindo o modo direto de confronto, percorrendo justamente os caminhos tortuosos da própria máfia para levar a cabo a sua vingança. Ele não rouba dos pobres, mas sim dos corruptos, ele não mata inocentes, mas sim quem faz parte do esquema. Em resumo, ele continua a sujar as mãos, mas agora com quem merece.

    Imagem 10 - Estrada Para Perdição Vol. 01 - pag. 077

    A valorização da família sob o prisma católico também merece uma reflexão. A hipocrisia da moral religiosa entre os mafiosos é retratada várias vezes ao longo da obra, quando O’Sullivan para em alguma delas para rezar e acender velas para cada pessoa que matava. A máfia sempre se refere a si própria como uma família e precisa da benção católica para se legitimar ao criar e manter seus valores, da mesma forma que a igreja também precisa do dinheiro dos mafiosos para erguer e manter suas instituições.

    Imagem 8 - Estrada Para Perdição Vol. 01 - pag. 071

    Max Allan Collins o tempo todo coloca a disparidade entre os dois lados que a vida mafiosa proporciona: da mesma forma que há uma possibilidade de um futuro promissor na vida criminosa escolhida em uma época difícil, também há dor e incertezas.

    Por último, o nome da obra foi um ótimo acerto. A narrativa de fato leva tanto a cidade de Perdição, onde Michael O’Sullivan Junior deveria ficar sob a proteção dos seus tios maternos, quanto leva a perdição, a ruína, ao desastre daquela família.

    Estrada para a Perdição vale a pena? Sim, por ser considerado um dos retratos mais fiéis de uma época de incertezas e dificuldades que, por causa disso, levantou a poeira do excesso de moralismo para revelar a verdadeira índole de uma sociedade doente e muito mais complexa do que aparentava ser.

    Texto de autoria de Pablo Grilo.

  • Crítica | 007: Operação Skyfall

    Crítica | 007: Operação Skyfall

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    Oficialmente interpretado por seis atores, James Bond mantém-se durante décadas a serviço da Inglaterra, assistindo à derrocada de grandes nações e a crises e revoluções em escala global. Criado há cinquenta anos, parte de sua força como personagem vem da capacidade de compreender o mundo que o cerca, sincronizando e refletindo o contexto global em cada uma de suas histórias. Sendo atemporal.

    Foi preciso que seus produtores retornassem à história primordial de Bond para alinhá-lo ao arquétipo do herói atual: sem vestígios de inocência, com capacidade física apurada e um escopo psicológico que aprofunda a conduta de suas ações. Neste vigésimo terceiro filme da franquia de 007, a mítica deste regresso é destruída para um retorno ainda mais profundo.

    Dirigido por Sam Mendes, a narrativa tem ingredientes bem diferentes daqueles vistos em Cassino Royale. A ação frenética cede espaço para uma história linear de espionagem. O vilão perde o tradicional bizarro físico para se tornar um cidadão normal, camuflado na multidão. A antítese plana entre bem e mal se rompe e, com isso, a história se concentra no próprio James Bond e na sua relação com o MI6 e com a mentora M.

    A queda da personagem, que é tida como morta, é o ponto de início para evidenciar a figura do defensor e da importância de se manter a ordem em um mundo caótico, não mais polarizado pela eficiência de bem ou mal. A trama se desenvolve de maneira dupla em muitas camadas: explora o avanço tecnológico tanto como progresso quanto como uma arma, equipara o novo e o velho, elevando a premissa de que, sem um elemento negativo, não existira o positivo em contraste.

    É uma produção que vai além da personagem autorizada para matar. Deixando as grandiosas cenas de ação de lado, Mendes demonstra competência em criar tensão e silêncio pelos diálogos, no embate entre a figura que deseja destruir aquilo em que o agente secreto acredita. Esqueçam qualquer plano de destruição mundial ou um monólogo que explica o que acontecerá para a reviravolta. Admirando seu passado, a história se molda com nossa atualidade, que almeja por deter significados para compreender o mundo. Justifica a importância da ordem, a origem do caos, a necessidade de saber quem se é, meneado pelo embate do famoso agente e do vilão.

    O vilão de Javier Bardem é um caso à parte. O ator pediu para que todo o roteiro fosse traduzido para o espanhol para que compreendesse suas motivações e psicologia. Mergulhado em uma personalidade afetada, que esconde um interior destruído, ele se transforma em um dos vilões mais carismáticos da franquia, sendo bizarro e assustador pela estranheza de alguém que não tem nada a perder.

    A direção de Mendes mantém a trama sem perder as rédeas. O escopo reflexivo se projeta no público, não no argumento que fundamenta este embate. Suas tomadas são precisas e mostram apenas o necessário, sem deixar de lado o elemento artístico, valendo-se de sombras, luzes e reflexos para gerar atmosfera. A cena de luta entre Bond e um atirador no interior de um prédio em Xangai com um letreiro luminoso de fundo é um destes exemplos de eficiência e beleza, além do desenlace da trama, que ecoa nos duelos de tradição western.

    007 – Operação Skyfall consegue, na queda e no retorno às origens, alinhar a personagem por inteiro, fazendo-a clássica sem se tornar anacrônica. A personagem que, mesmo seduzindo mulheres e preferindo o Martini batido, nunca foge de tempo, seja ele qual for.