Tag: Léa Seydoux

  • VortCast 102 | James Bond – 007: A Era Daniel Craig

    VortCast 102 | James Bond – 007: A Era Daniel Craig

    Bem-vindos a bordo. Flávio Vieira (@flaviopvieira | @flaviopvieira) e Mario Abbade (@marioabbade)  se reúnem para comentar sobre o encerramento da era Daniel Craig como James Bond nos cinemas. Quais foram os pontos altos e baixos, as polêmicas e o futuro da franquia.

    Duração: 74 min.
    Edição:
     Flávio Vieira
    Trilha Sonora: Flávio Vieira
    Arte do Banner:
     Bruno Gaspar

    Agregadores do Podcast

    Feed Completo
    iTunes
    Spotify

    Contato

    Elogios, Críticas ou Sugestões: [email protected].
    Facebook — Página e Grupo | Twitter Instagram

    Links dos Podcasts

    Agenda Cultural
    Marxismo Cultural
    Anotações na Agenda
    Deviantart | Bruno Gaspar
    Cine Alerta

    Materiais Relacionados

    007: As Canções da Franquia — Parte 1
    007: As Canções da Franquia — Parte 2
    10 atores que poderiam ter sido James Bond
    Estilos e Estilistas: construindo pontes entre a sétima arte e a vida
    Crítica | Everything or Nothing: The Untold Story of 007
    Agenda Cultural 47 | Western, Máfia e Agentes Secretos

    Filmografia 007 — Daniel Craig

    Crítica | 007: Cassino Royale
    Crítica | 007: Quantum of Solace
    Crítica | 007: Operação Skyfall
    Crítica | 007 Contra Spectre
    Crítica | 007: Sem Tempo Para Morrer

    Comentados na Edição

    No Time To Die — Goodbye, Mr. Bond

    Avalie-nos na iTunes Store | Ouça-nos no Spotify.

  • Crítica | 007: Sem Tempo para Morrer

    Crítica | 007: Sem Tempo para Morrer

    Após um grande início adaptando uma obra de Ian Fleming com Cassino Royale; uma sequência sem roteiro devido às greves de roteiristas em Quantum of Solace; uma queda e ascensão dividida entre tradição e o moderno de Operação Skyfall e a retomada da estrutura clássica em 007 Contra Spectre, o longevo personagem James Bond, personificado pela quinta e última vez por Daniel Craig, tem sua missão derradeira em 007: Sem Tempo Para Morrer.

    Finalizando a passagem do britânico pelo personagem, a produção do vigésimo quinto filme de James Bond foi carregada com uma maior expectativa do que suas predecessoras. O último filme com Craig, marco numérico sempre destacado pela mídia, foi marcado por entraves internos e externos à sua produção.

    A princípio, Danny Boyle foi escalado como diretor, mas se justificando com o batido “divergências criativas” abandonou a produção e, em seu lugar, Cary Joji Fukunaga assumiu a cadeira, tornando-se o primeiro americano a dirigir uma produção Bond. Com a mudança, o início das filmagens foi reagendado para abril de 2019 e a estreia programada para abril de 2020. Naturalmente, a necessidade do distanciamento social deixou o lançamento em espera até setembro desse ano quando grande parte do mundo possui uma estrutura mínima para, munidos de vacinas e máscaras, estar no conforto do cinema sem correr risco de vida. O risco, aliás, fica por conta do próprio personagem central.

    O início da nova trama se situa após os acontecimentos de Spectre e resume os elementos que definiram o novo Bond. Aposentado em um lugar idílico, ao lado de Madeleine Swann (Léa Seydoux), dá vazão aos laços sentimentais até o inevitável momento em que o passado retorna, explosivo. A grande cena de ação inicial é intensa, extremamente física, bem equilibrada entre a coreografia e um realismo possível, mantendo vigente a estética fundamentada por A Identidade Bourne e reverenciada pela versão de Craig. A cena intensa demonstra algo que o público da primeira temporada de True Detective já sabe: Fukunaga constrói cenas de ação com habilidade. A cena inicial injeta adrenalina antes da canção que abre o longa, No Time To Die de Billie Eilish.

    Após os créditos de abertura, a trama salta cinco anos no futuro. Como desenhado desde a produção anterior, é a tradição que rege essa aventura final. Se no enredo anterior se descobre que as intrigas foram orquestradas pelo SPECTRE, aqui outro elemento tão poderoso quanto surge em cena, contrabalanceando as forças, mas com objetivos semelhantes: a vingança e a destruição mundial, características comuns da maioria dos vilões megalomaníacos da franquia.

    Se em composições anteriores Bond pareceu um homem sem amarras, o personagem da geração 2000, composto de forma seriada em cinco produções, é formado com maior coesão cronológica e emocional. As perdas são lembradas com sentimento e dor e trazem a evidente constatação de que é necessário desapegar do passado para seguir, embora o passado profissional e as missões anteriores nunca fiquem, de fato, no passado. Entre o equilíbrio pessoal e emocional, e a frieza das missões cumpridas se destaque um personagem central que além da camada de espionagem, dos carros luxuosos, do esnobismo britânico e do diálogo feito de punhos, uma mensagem boba e simples de que os brutos também amam, sim.

    Em entrevista a GQ em 2020, o ator afirmou que elevou o nível do personagem para outros. Sem dúvida, o sucesso da franquia se deve a sua capacidade de manter suas estruturas básicas, mas, na medida do possível, se adaptar a novos formatos narrativos. Sob esse aspecto, talvez a era Craig tenha sido a modificação mais inventiva de Bond. Trouxe não apenas novas camadas trágicas aos personagens como também a possibilidade de quebrar a forma física do agente, pois, lembrem-se, o ator foi criticado no início por seu físico e por ser loiro demais. Foram modificações como essas que permitiram que Lashana Lynch surgisse em cena como a primeira 007.

    Sem Tempo Para Morrer é um falso título porque em um filme cuja missão é ser um desfecho a uma versão de Bond, tudo é uma celebração final. Em tudo há certo tom de morte e despedida como amigos que se desencontram, arqui-inimigos que se vão e, querendo ou não, não há nada de novo nessa narrativa. Mas, sim, uma conclusão natural de uma história iniciada em 2005 e que encerra seus enredos e o legado de Craig no papel.

    O ator e sua modéstia têm razão. O marco deixado em sua passagem será um desafio à execução do próximo Bond. Mas também abriu espaço para que novas facetas sejam exploradas, sem medo de reinvenções e sem o excesso de amarras da tradição. Como um personagem com maior aptidão para se reinventar, os produtores Michael G. Wilson e Barbara Broccoli devem ter algumas cartas na manga para o futuro dessa nova Bond.

  • Crítica | É Apenas o Fim do Mundo

    Crítica | É Apenas o Fim do Mundo

    e-apenas-o-fim-do-mundo

    A carreira meteórica de Xavier Dolan costuma esconder um problema recorrente em sua filmografia, que é a irregularidade geral quanto a qualidade de seus filmes. Após um exercício profundo e interessante em Mommy e cercado por altas expectativas graças a recepção que teve no Festival de Cannes, É Apenas o Fim do Mundo prometia muito, resultando em um produto frívolo e pretensioso, que sub aproveita o belo elenco que tem em mãos.

    A história gira em torno de um personagem sem muitas nuances, o escritor Louis (Gaspard Ulliel), um escritor que vai visitar sua mãe (Nathalie Baye), irmã Suzanne (Léa Seydoux) , irmão Antoine (Vincent Cassel) e cunhada Catherine (Marion Cotillard) a fim de dar uma notícia ruim, de que estaria a beira da morte. A partir deste situação, começa uma discussão em fim entre os familiares, especialmente da parte de Antoine, onde as feridas se abrem e uma fogueira de vaidades toma a tela de assalto.

    Os maneirismos de Dolan funcionaram em Mommy, até pela juventude de seu personagem principal e pela estética cabível, aqui esse artificio soa bobo e desnecessário, nada condizente com uma reunião que deveria ser cara e sentimental. O que se vê é uma verborragia que ocorre via gritaria e uma completa ignorância do personagem mais humano – Antoine – inclusive demonizando seus ciúmes e anseios, enquanto se glorifica a pessoa mais sem carisma da trama, em momento nenhum justificando o endeusamento a Louis.

    A intensão de registrar o falatório seria para fazer o espectador ter sua própria conclusão, no entanto, a resignação do personagem não deixa dúvida, Louis acaba sendo o herói porque mesmo prestes a morrer ele não responde as respostas atravessadas de seus parentes. A música noventista da trilha antecipa os sentimentos familiares, quebrando a ideia previa de deixar o público decidir por si e o julgamento bobo sobre o uso de drogas faz o filme soar esquizofrênico e indeciso, variando entre um discurso libertário e absolutamente moralista.

    É Apenas o Fim do Mundo é propositalmente incomodo, tenta emular essa adjetivação ruim através do colapso familiar e de um justificado auto isolamento do personagem, mas ainda assim entrega pouco. Soa covarde tanto por parte do personagem principal quanto do roteiro a escolha por não reagir. Tanto o texto quanto o herói da jornada parecem anestesiados em meio a um mundo caótico e auto destrutivo. Os paralelos com histórias bíblicas, como Caim e Abel sendo o exemplo mais evidente acaba por tornar toda a trama ainda mais boba, o que é uma pena, visto o desperdício em relação a performance dos atores, exceção claro a Cassel, que soa interessante ao menos até o final do filme.

  • Crítica | Minha Irmã

    Crítica | Minha Irmã

    SISTER-poster1

    Dirigido por Ursula Meier, a produção Minha Irmã optou por um caminho não convencional para narrar uma história única. Na trama, Simon, de 12 anos, passa o dia numa estação de ski na Suiçam roubando bens de turistas e usando o dinheiro para poder levar comida para a casa da irmã mais velha onde vive.

    Escrito pela diretora em parceria com três colaboradores, o roteiro enfrenta um problema grave de unidade durante a narrativa, a história incomum precisaria trabalhar melhor o protagonista. Faltam cenas que complementem as ações da subtração dos pertences que Simon nunca irá ter, fazendo alusão a sua infância perdida e ao seu caráter em formação. Focar somente nas cenas em que ele rouba por roubar não contribui muito a obra. Ele e sua irmã são grandes personagens que acabaram sendo desperdiçados por uma narrativa boba.

    Apesar de se manter fiel a esta proposta uma boa parte do filme, nas vezes onde escorrega, a história perde a força que poderia ter. Por mais que opte por menos dramaticidade, as ações pontuais não fazem muito sentido depois da repetição extrema e a falta de ligação entre elas. O roteiro só se salva depois da reviravolta do meio pro final da história, onde a qualidade aumenta bastante e deixa-o muito mais interessante, pena que somente na parte final.

    A direção de Ursula Meier conseguiu se manter coesa dentro da narrativa, porém o filme perde a força que poderia ter tido. Não faz sentido a utilização em excesso dos tempos mortos, eles soam jogados, sem um propósito maior eles não enriquecem, pelo contrário, dá uma noção de que a sua direção tenta emular um realismo que não coube para a história, para tentar uma originalidade que ela não possui. A direção ganha força nas partes do filme onde o protagonista interage com a irmã.

    Kacey Mottet Klein não comprometeu o filme, porém o jovem só contribuiu com alguma qualidade nas cenas com outros atores. Nas poucas vezes em que aparece, Léa Seydoux mantém a boa atuação. Destaque ainda para a curta participação especial de Gillian Anderson.

    A edição é de longe a pior coisa do filme. Nelly Quettier deixou uma narrativa lenta, sem ritmo, enfadonha que pode deixar o espectador sem interesse. Ela só se destaca nas cenas entre Simon e a irmã. A fotografia de Agnés Godard contribui pouco. Mesmo estando em um local paradisíaco como uma estação de ski durante o inverno, os enquadramentos não são bonitos, por mais que tentem metaforizar a vida pobre do protagonista, eles seriam muito mais interessantes se mostrassem o contraste de uma estadia feliz em um local bonito com a sua vida vazia e marginal.

    Minha Irmã só vale a pena para quem quiser assistir um filme diferente que se passa em uma ambiente não usual. No mais, é esquecível.

    Texto de autoria de Pablo Grilo.

  • Crítica | 007 Contra Spectre

    Crítica | 007 Contra Spectre

    007 Contra Spectre - poster

    Quatro anos após a queda de James Bond e uma audaciosa renovação da personagem, em sincronia com sua época e o estilo de ação formatado nestes anos, o agente britânico retorna às telas para sua 24 ª aventura, demonstrando força desta longeva franquia do cinema. O sucesso de 007 – Operação Skyfall garantiu a Sam Mendes a cadeira da direção, dando continuidade à sua narrativa.

    Como nas demais produções estreladas por Daniel Craig, a obra de Ian Fleming, criador da personagem, se mantém próxima desta nova história, trazendo à tona uma organização criminosa presente em diversos romances do autor. A intenção de promover um recomeço desde Cassino Royale e retornar à base fundamental da obra é coerente. James Bond foi reintroduzido ao público em um formato diferente do habitual.  O cerne da personagem estava presente mas havia uma interpretação mais realista tanto na história como nas cenas de ação, fugindo de outras interpretações anteriores. Um movimento que atingiu o ápice na produção passada com a destruição do universo conhecido.

    007 Contra Spectre é o próximo passo natural que abre um novo momento, realocando a série na tradição de seus filmes após um caminho nunca antes percorrido. A sustentação realista permanece demonstrando que o MI6, e seu projeto de agentes autorizados para matar, pode ser um conceito obsoleto. Sem dúvida, a desconstrução é o cerne deste novo momento, tanto desta franquia quanto de seu parente mais pop, Ethan Hunt, que desde Missão Impossível – Protocolo Fantasma também refletia sobre a importância de atividades de espionagem realizadas em segredo diante de um mundo contemporâneo, conectado e supostamente mais transparente. Ambos são personagens fiéis a uma ordem diferente da atual, que se torna, simultaneamente, obsoleta mas ainda necessária para se manter a ordem.

    A aventura é mais linear e tradicional no quesito espionagem, aproximando-o dos filmes anteriores. É um realocamento das aventuras Bond: ainda na vertente atual, mas inserindo novamente o universo exagerado e charmoso do espião que nunca falha. O senso da realidade dá um passo atrás avisando ao público que estamos diante de uma personagem cujo marco são as cenas impossíveis, o carisma sedutor e um enfoque no qual prevalece a ação.

    Quando o vilão de Christoph Waltz entra em cena, vemos uma composição contrária daquele concebida em Skyfall. O vilão de Javier Bardem era um homem dissonante em uma história realista; nesta Waltz parece um homem real em uma trama com indícios da tradição de Bond. Em pouco tempo em cena junto com o protagonista, sua loucura é expressa pela contenção do ator, motivo pelo qual se projeta o medo. Se novamente compararmos as obras de Craig, a cena de tortura em Cassino Royale e a desta produção têm a mesma base. Porém, enquanto a primeira era brutal e simples, a segunda é elaborada, megalomaníaca, coerente com os grandes vilões que, em maior ou menos grau, desejam dominar o mundo.

    Ao inserir o grupo terrorista SPECTRE, o filme entrelaça suas tramas anteriores, resgatando o necessário para demonstrar que a dinastia de Craig tem uma única e grande história narrada em pontos altos para chegar a este momento. Após a ruptura de Skyfall, os rumos da personagem seriam diferentes se os roteiristas continuassem com queda e crise, talvez descaracterizando James Bond. SPECTRE faz a curva que retorna à pista da tradição da franquia com um vilão megalomaníaco, cênico ao extremo, demonstrando que, realismos à parte, estamos vendo uma obra de ficção.

    Na direção, Sam Mendes compartilha deste preceito e brilha criando cenas que fogem da realidade mas que são um deleite visual, com cenas à meia-luz que intensificam a personagem; contrastes teatrais que trazem poesia à sua história, além de ainda se apoiar em um senso realista nas cenas de ação, pontuais e bem equilibradas.

    Novamente, observamos um novo ponto de transição de James Bond, um movimento de retorno em que a tradição é resgatada com os conceitos deste novo recomeço, um equilíbrio entre a brutalidade da ação com vilões bizarros e planos elaborados, um caminho que aponta para uma última produção com Craig mais próxima deste conceito, mantendo, novamente, em vertentes variadas, o destaque deste grande personagem da ficção.

  • Crítica | Saint Laurent

    Crítica | Saint Laurent

    SaintLaurent_poster

    É possível sentir o cheiro dos bastidores de um teatro, de um camarim, da sala dos objetos de cena, do estoque de cheiros concentrados e misturados, assistindo este filme. Aqui, tudo parece ter cheiro, gosto, tamanha a fidelidade e realismo do charme de uma época tão bem reconstruída, tal cena de crime, todavia, e como dificilmente deixaria de ser, com uma grande liberdade ao estigma de ficção, para que o amor possa à arte, assim, integrar a obra e vida do estilista título; figura corrompida pela própria visão de mundo que ostentava, e que o filme usa em sua identidade visual, feito manifesto inter-contextual que se orgulha de ser, em resumo.

    Um fashion film autêntico, de cabo a rabo, aberto a quem não entende ou codifica o universo dos tecidos, produzido a algo mais do que impressionar aqueles que saem de casa com a primeira camisa à vista, mas não indo muito além que denunciar as “traças” que se escondem debaixo dos panos, sem cinismo ou crítica irônica, afinal, descer do salto não é o caminho. Um trem de carga leve em trilhos de porcelana: um milímetro pra fora e tudo se espatifa em louça branca. Saint Laurent, a cinebiografia, é Cinema frágil e que tenta achar um sentido mais profundo no próprio visual, a despeito de ser uma tentativa abaixo da capacidade de quem comanda o desfile.

    O esforço por colocar um coração no robô aponta semelhança com outras biografias recentes, cada uma com seu tema, é claro: A Dama de Ferro, Sete Dias Com Marilyn, Jobs, Getúlio, Versos de Um Crime, projetos incompletos que buscam no poder de suas atuações principais um gancho e uma âncora para o que nós podemos chamar de “inesquecível”. Pura falácia desonesta, injusta e, portanto, incompleta. É por não ser assim que A Rede Social, de David Fincher, merece ser um parâmetro bem-vindo e expandido a partir de suas qualidades.

    É inusitado notar como Saint Laurent, filme logo adotado nas palavras de André Bazin, antigo e famoso crítico de cinema, tem seus tímidos arcos de história de segundo plano gravitando ao redor da concepção ambulante que é o estilista, mais homem que artista, num desequilíbrio proposital de roteiro e narrativa, na pele de um inquieto Gaspard Ulliel, bom ator, empolgado e que esconde nos olhos a ânsia de ser tão grande quanto sua moda o denuncia ser. Tudo parece tão teatral, casinha de boneca, cinema britânico de tão certinho que o conjunto é, mas ainda assim, pulsante graças a um equipo à base de soro convencional. Dosagem excessiva de eficientes atuações, novamente dando o tom sensorial na projeção.

    É belo como um plano pode ser o clímax de um filme: o criador admirando sua criatura no topo da escada, ai se esconde a sutileza, o valor, o prestígio de um filme como esse, dedicado a galgar os próprios detalhes, feito a manga abotoada de uma camisa sob um terno na altura do pulso. E é chato, contudo, como o que poderia ser mais explícito acaba sendo uma gravata escondida; escondida à promessa de mais camadas de luz a favor do marco que o filme poderia ser, não apenas “mais um”, o que não reflete a posição de destaque de quem transformou a indústria da moda.

    E com a palavra, André Bazin, que por sua vez revolucionou a crítica de cinema: “É uma tarefa ingrata, mas também a única chance do Cinema, a de tentar agradar um público vasto. Ao passo que todas as artes evoluíram desde o Renascimento para fórmulas reservadas a uma minguada elite privilegiada, o Cinema é coisa destinada às massas do mundo inteiro. Portanto, toda pesquisa estética fundada numa restrição de seu público é, acima de tudo, um erro histórico fadado ao fracasso. Um beco sem saída“.

  • Crítica | O Grande Hotel Budapeste

    Crítica | O Grande Hotel Budapeste

    o grande hotel budapeste

    O Cinema de Wes Anderson, sendo a arte antes do artista, é claro, é um corredor de pinturas, uma ida ao museu numa tarde chuvosa onde não há mais nada a se fazer senão apreciar a viagem histórica. O cineasta tem a preferência de centralizar seus mundos enquanto expande os significados deles através de uma simbologia única em nível de identificação universal. Mundos onde todos os personagens são totalmente imprescindíveis à história ao mesmo tempo em que são totalmente desnecessários à narrativa em retalhos: substituíveis e relevantes ao mesmo tempo. O Grande Hotel Budapeste é o Cinema de Jacques Tati e Stanley Kubrick feito para todas as idades e mentalidades. Lindo, matemático, extremamente planejado em planos cênicos milimétricos, mas não é superficial em toda a sua estilização, afinal de contas, apenas por denunciar a beleza existencial do mundo a partir dos valores humanos de cada vida vinculada à teia apresentada.

    Até porque Anderson tem olho clínico e confiança de chamar atores do mais alto nível, assim como semi-desconhecidos, para interpretar figuras icônicas que pertencem a mentes de pessoas como Alan Moore, genial escritor inglês e famoso por sua excentricidade. Logo no começo de Budapeste, percebemos os traços marcantes da filmografia do diretor de Moonrise Kingdom, seja na (ótima) direção de arte, seja na atmosfera visual ou na musicalidade inocente e eclética de sempre. Enfim, temos, ao longo de uma hora e meia de projeção, a desconfiança da releitura artística que o filme vem a ser, na real, muito antes do clímax esperado.

    Releitura devido ao ponto alto da carreira que o cineasta já conseguiu alcançar “por acaso” é onde repousa seu belo e extravagante hotel. Um cume no qual não carece mais provar seus talentos e visão pessoal a mais ninguém, vide a falta de pretensão, de autoestima, e de altos e baixos de uma energia linear e constante ou mesmo de alguma dose de seriedade da história de corre-corre e de amizades inesperadas pelos caminhos. Veredas a partir e muito além dos corredores e escadas sinuosas do edifício homônimo.

    A fusão entre realidade e realidade particular pode ser uma das explicações para definir a arte de cada um; o Cinema, inclusive, o qual muitos chamam de “a arte completa” por ser justamente a fusão da maioria delas. Seja como for, e sem mais delongas, Anderson e seu elenco espetacular – Tilda Swinton aparece 5 minutos depois do início do filme, durante 60 segundos apenas, e é tão impressionante sua participação que a projeção poderia terminar com sua saída e tudo seria maravilhoso do mesmo jeito – defendem a teoria que abre este último parágrafo na aurora de uma realidade particular, a que todos nós aprendemos a amar, cada um à sua maneira, e que muito completa a verdadeira realidade das coisas.

  • Crítica | Grand Central

    Crítica | Grand Central

    grand central

    Rebecca Zlotowski está à frente da controversa produção francesa Grand Central. A diretora já havia abordado temas espinhosos em seu primeiro filme, Belle Epine, em que falava sobre temas ligados à delinquência juvenil. Na fita de 2013 ela foca sua história em Gary (Tahar Rahim), um inconstante rapaz que transitou entre muitas atividades sem jamais se firmar profissionalmente em nenhuma delas. Finalmente consegue o seu intento ao ingressar numa empresa que trabalha material radiativo, e nela consegue o que tanto procurava: estabilidade, segurança no trabalho e um salário decente, apesar das queixas alheias por não ter uma formação das mais versáteis.

    Gary se aproxima do colega de trabalho Toni (Denis Menochet, o Monsieur LaPadite de Bastardos Inglórios), a princípio para conseguir dinheiro emprestado. Ao chegar à casa do companheiro, Gary analisa os cômodos, especialmente o quarto, flagrando com olhos curiosos e desejosos a cama, por fazer, dele e de sua companheira. O cotidiano de Gary é bagunçado, sua vida parece um desalinho enorme. Além de muita desorganização, sua família está aos pedaços e algo fora desta realidade já seria um enorme suspiro de alívio para sua triste existência. Por meio de uma jocosa armadilha, ele se permite levar por uma tentação e pelo desejo pelo proibido.

    Karole (Emma Seydoux) é esposa de Toni; tão debochada e fingida quanto o marido, ela instiga Gary através de um gesto sexual nada sério, e se insinua para ele na frente de todos. Sua brincadeira é acompanhada de risos gerais, inclusive de seu esposo, o que a livraria de qualquer complexo de culpa, assim como resguardaria sua imagem de suspeitas de indiscrição. Ela também trabalha na multinacional e enfrenta as mesmas situações complicadas e perigosas que acometem o protagonista. As condições de exposição à radiação são analisadas constantemente para que os funcionários não corram tanto risco de contaminação.

    O primeiro contato da dupla fora do ambiente controlado e sem a presença de Toni é de conflito. Os dois se seguram para não demonstrar desejos carnais. As faíscas saem e a proximidade do contato epitelial é sufocante. As coxas de Emma Seydoux parecem chamar a presença do protagonista, assim como seus seios. Ela não está tão sensual como em Azul é a Cor Mais Quente, mas ainda assim é muitíssimo sexual e voluptuosa. E o inevitável finalmente tomou forma. A dupla de infiéis tem dificuldade em reincidir a relação, mas não deixam de ter o desejo mútuo de repeti-la, apesar dos pesares.

    O medo não é o de serem pegos, mas sim a culpa devido ao pecado que ambos cometem. O roteiro é bastante verossímil na abordagem da dúvida, tendo em si muita veracidade e coerência, mostrando que, apesar de a infidelidade ter sido gerada por movimentos impulsivos, os envolvidos tentam manter ao máximo o controle de suas atitudes, temendo ser descobertos e usando sempre o mesmo local para a prática ilícita de amor. O envolvimento emocional os faz serem imprudentes, como se vivessem uma paixão adolescente totalmente sem fronteiras ou restrições. A evolução sentimental os faz sentirem-se como se andassem sobre as nuvens, em uma atmosfera leve e sem julgamentos.

    A dupla vida que leva mexe com a psiquê de Gary, e ele pensa duas vezes antes de socorrer o marido de sua amada, numa ação que poderia dar fim não só a vida do acidentado, mas também a sua. Karole classifica esta ação como uma tentativa dele de bancar o herói, situação que se agrava com a notícia de sua gravidez — piorada e muito pela incapacidade de Toni em gerar filhos. As intenções de Gary parecem ser claras em relação a ficar com ela, já Karole não é completamente clara quanto às suas vontades, trazendo uma versão para cada um de seus parceiros. Logo o temor de Gary se cumpre, e ela escolhe o affair mais antigo. Sensações de solidão e de ter sido usado predominam em seu ser. A sucessão de eventos o prejudica demais e o faz perder tudo que considerava importante: seu emprego, seu lugar na comunidade e, principalmente, sua musa. Não fica difícil para ele perder a cabeça e agir sem raciocinar, e numa desesperadora tentativa de reaver o que tinha perdido, comete os piores atos possíveis para si mesmo e para aqueles a quem jurava amor, quase pondo fim à própria vida depois da desilusão. Sua última cartada faz efeito, pelo menos a priori, e surte um efeito o qual tinha poucas esperanças de conseguir.

    O roteiro de Zlotowski e Gaelle Mace aborda não só a grave questão da infidelidade nas relações amorosas e profissionais, como também expõe uma problemática muitíssimo discutível do ponto de vista da ética do trabalho junto às precárias condições e da exploração da mais valia por indivíduos sem muitas oportunidades. A grande questão nas duas proposições é até onde é justa a corrida para se fazer o que deixaria o indivíduo (individual) feliz e plenamente satisfeito, mesmo que às custas do sofrimento alheio.

  • Crítica | Azul é a Cor Mais Quente

    Crítica | Azul é a Cor Mais Quente

    Azul é a Cor Mais Quente

    A adolescência é possivelmente a fase mais indefinida na vida do indivíduo, quase nenhuma certeza é concreta. O roteiro linear de Ghalia Lacroix e Abdellatif Kechiche (baseado nos quadrinhos de Julie Maroh) é pródigo em mostrar isso já no prelúdio. La Vie d’Adèle começa sem circunlóquios, mostrando o cotidiano de Adèle e discutindo algo básico ao que se tornaria a sua vida. Tal assunto é tratado por seus semelhantes como motivo de chacota, descaso e indiferença – para os mais jovens, é difícil definir algo tão abstrato quanto o amor.

    Diversas são as formas como Kechiche registra as cenas de sexo. Adèle (Adèle Exarchopoulos) fantasia uma transa com um parceiro completamente diferente ao que todos à sua volta sugerem a ela. Quando finalmente cede às pressões, se decepciona, seu gozo passa longe de ser alcançado e se frustra – as lágrimas após o rompimento com esta máxima são mais que simbólicas, são reais.

    Em um protesto, seu grito é grave, masculinizado. Sua persona atrai outras garotas com este desejo em comum. A câmera registra o constrangimento de Adéle de modo belo e tocante. A garota só volta a se sentir (ligeiramente) à vontade em uma festa onde praticamente só há gays masculinos, porém ainda há uma sensação de não pertencimento àquele mundo, sentimento de inadequação. Aos poucos, ela adentra no mundo underground, mergulha em sua própria consciência e libera-se para novas experiências, mudança esta representada pelo bar temático.

    Emma (Léa Seydoux) é extremamente gentil e compreensiva com a protagonista, cumpre um papel fundamental na psiquê de Adèle. Faz bem a ela, lentamente a descontrai – como o Id, desreprimindo o Ego – ao contrário de outras moças “pilotas de caminhão” (estereotipadas e sem receio de serem assim), que afastam Adèle do que Freud chamava de Ideal do Ego – uma superação do Ego, que chega ao ápice do que este deveria ser, sem os recalques primários e secundários. A reação de suas antigas amigas à primeira aparição pública de Emma justifica plenamente os receios de Adèle, e reacende a discussão do que é ou não natural a respeito da sexualidade, e do disfarce das ações mentais secundárias e primárias em originárias.

    Em determinado momento, Adèle passa a usar muito jeans cor índigo, remetendo à tonalidade de sua “musa”. Após 71 minutos, o clímax da relação é posto em realidade numa cena de aproximadamente 7 “ternos” minutos. A predileção de Adèle pelo magistério diz muito sobre sua personalidade. Ela afirma que na escola aprendeu muito, demasiados conteúdos não passados por seus pais – não nominados – e por seus amigos. A segurança do emprego a empurra a fazer essa escolha, ela prefere não arriscar. A apresentação de Emma aos pais da personagem principal é tímida e um pouco constrangedora – a distância entre as duas casas das moças é abissal. Até mesmo no entendimento da arte como trabalho, demonstrando o quanto os adjetivos acompanham e se atrelam ao conservadorismo como também quão artificial é o comportamento destes, especialmente se comparados às ações de Emma, uma pessoa desprendida aos olhos da protagonista.

    A macarronada (prato no qual o “pai” se especializou) é um signo para a inadequação de Adèle em diferentes momentos de sua vida. As cenas tórridas são pontuadas por sua forte respiração, expressando alívio, ocorrendo somente na intimidade, momentos em que nada precisa fingir. A decadência da relação é executada cruamente, assim como a tentativa de se socializar após o fim. As reações retratadas são muito verossímeis e realistas, além, é claro, sexual e emocionante. No entanto, no auge de seu desespero, Adèle rompe com o medo de se demonstrar, se rendendo aos excessos que a carne exige.

    Soma-se a isso uma fotografia com perícia, uma direção de arte das mais caprichadas, direção de atores competente ao extremo, e um roteiro não complacente em momento algum. Os nus são magistralmente registrados e são palatáveis até para espectadores de conservadorismo não tão extremo. Emma representa para Adèle a libertação, e para o filme, um instrumento de metalinguagem, pois ela costura de forma leve suas impressões sobre a arte. Kechiche usa esse capítulo da biografia para demonstrar a arte do corpo e da alma feminina, apelando para lugares comuns, sem se descuidar das nuances inerentes a cada indivíduo de singularidade latente. O filme é belo, real, tocante e feminino, sem medo de expor sua história com o máximo de sinceridade possível.