Tag: Bill Murray

  • Crítica | Os Caça-Fantasmas 2

    Crítica | Os Caça-Fantasmas 2

    Depois do sucesso do primeiro filme, o mundo clamava por uma continuação de Os Caça-Fantasmas. Durante certo tempo, Dan Aykroyd e Harold Ramis, protagonistas e roteiristas do original, resistiram às pressões, principalmente da Columbia Pictures. É compreensível a relutância da dupla, pois o primeiro filme possui uma trama bem fechada e se sustentava sozinha, sem deixar espaço para sequências. Entretanto, em 1989, não só Aykroyd e Ramis voltaram, mas todo o elenco principal composto por Bill Murray, Sigourney Weaver e Ernie Hudson, além do diretor do Ivan Reitman. Entretanto, o resultado da reunião não foi dos melhores.

    O filme teve produção problemática desde o início, com roteiros sendo completamente reescritos devido a ideias consideradas não filmáveis. Além disso, havia problemas de agenda, pois os atores se consagraram ali e se tornaram figuras fáceis em produções nos anos subsequentes. Existiram conflitos criativos entre Ramis, Aykroyd e David Puttnam, então executivo da Columbia Pictures que odiava Bill Murray e pretendia fazer um Caça-Fantasmas 2 na marra. Enfim, o cenário não era nada positivo, mas a dupla de roteiristas finalmente conseguiu entregar um roteiro em 1988. A ideia era até interessante, explorar a força das emoções negativas, como elas agiriam junto ao sobrenatural e uma entidade que retiraria seus poderes dessa combinação, contudo a execução preguiçosa fez desse filme uma pálida imitação de seu antecessor.

    Ainda que tenha passado por revisões ao longo dos anos onde muitos tentam convencer que o filme não é tão ruim como pintam, principalmente se comparado ao original, o fato é que Os Caça-Fantasmas 2 realmente não é bom. Logicamente que existem alguns bons momentos, a maioria deles protagonizados por Bill Murray, mas Rick Moranis e Peter MacNicol se destacam positivamente. Dan Aykroyd e Harold Ramis se apresentam bem, assim como Sigourney Weaver, enquanto Ernie Hudson fica esquecido durante boa parte do filme, o que é um pecado imperdoável.

    O diretor Ivan Reitman até se mostra competente em algumas cenas de ação, principalmente no embate final com o vilão Vigo. Porém, mete os pés pelas mãos quando tenta fazer um humor mais voltado para toda a família, o que faz com que o sarcasmo presente no primeiro filme seja eliminado e ainda se embola ao trabalhar as alegorias e metáforas políticas inseridas no roteiro. Entretanto, acerta no trato que dá ao personagem de Murray, que apesar de não ter continuado seu relacionamento com Dana Barrett, papel de Sigourney Weaver, toma para si a tarefa de proteger o bebê Oscar mesmo ele não sendo seu filho biológico. A prova da maturidade do seu Peter Venkman vem quando ele deseja que ele fosse seu filho biológico e passa agir como alguém que pode ser um verdadeiro companheiro e também um pai. Já nas questões técnicas, os efeitos especiais são de primeira qualidade para a época, tanto os animatrônicos quanto os efeitos de computação gráfica.

    Enfim, este segundo Caça-Fantasmas tem um saldo geral mais negativo que positivo. Porém, ainda tem alguns momentos de charme que merecem ser conferidos e é possível que seu clima família consiga cativar novos espectadores, principalmente do público mais jovem.

  • VortCast 103 | Ghostbusters: Mais Além

    VortCast 103 | Ghostbusters: Mais Além

    Bem-vindos a bordo. Flávio Vieira (@flaviopvieira | @flaviopvieira) e Filipe Pereira (@filipepereiral | @filipepereirareal)  se reúnem para um bate-papo sobre a série de filmes Os Caças-Fantasmas, ou melhor, Ghostbusters, em especial sobre o filme mais recente. Curiosidades dos bastidores da franquia, as polêmicas do filme de 2016 e os principais acertos do novo longa.

    Duração: 64 min.
    Edição:
     Flávio Vieira
    Trilha Sonora: Flávio Vieira
    Arte do Banner:
     Bruno Gaspar

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    Crítica | Ghostbusters: Mais Além

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  • Crítica | Ghostbusters: Mais Além

    Crítica | Ghostbusters: Mais Além

    Crítica Ghostbusters Mais Além

    Ghostbusters: Mais Além é o novo capítulo da saga cinematográfica da franquia de professores que lidavam co eventos paranormais, com alguns bons anos de defasagem após o clássico Os Caça Fantasmas. A obra dirigida pelo queridinho de crítica e cinefilia Jason Reitman ousa bastante na trama, colocando novos protagonistas, baseando-se em uma família formada por Callie (Carrie Coon), uma mãe falida que vai atrás de uma casa velha que lhe foi dada de herança depois que seu pai morreu, e duas crianças, o menino adolescente Trevor (Finn Wolfhard) e a pequena, estudiosa e deslocada Pheebs, de Mckenna Grace. O filme trata de questões familiares pontuais, como o receio da mãe em repetir o distanciamento que ocorreu entre ela e seu pai agora com seus dois filhos, além de desenvolver uma sub trama apocalíptica e urgente.

    Para surpresa geral de quem vinha acompanhando a saga, esse também é protagonizado por uma figura feminina, fato escondido até a exibição do longa, provavelmente graças a rejeição que a incursão  anterior da franquia nos cinemas sofreu. A pouca exposição em matéria de propaganda ou veículos oficiais do filme causou uma boa surpresa, mesmo material de trailer demorou a circular, ainda assim timidamente.

    A aura misteriosa ajudou a não criar grandes expectativas em relação à produção, proporcionando então a Reitman traduzir a versão do filme de seu pai Ivan Reitman (que aqui, assina como produtor) para algo mais semelhante à filmografia do francês Michel Gondry, a exemplo de Rebonine, Por Favor e Micróbio e Gasolina, do que a filmografia do Reitman pai, embora o diretor coloque algumas referências a filmes obscuros, com easter eggs referentes até a Cannibal Girls, um filme de terror B obscuro da carreira de Ivan.

    A partir daqui haverão spoilers a respeito da trama, se o leitor quiser assistir sem saber desses fatos, recomenda-se ler após a estreia.

    Crítica Ghostbusters: Mais Além
    Diretor Jason Reitman com Mckenna Grace em cena com o carro Ecto-1.

    Diferente do visto no Caça-Fantasmas de Paul Feig, esse não é uma refilmagem, e sim uma continuação do clássico. Apesar da tentativa de estabelecer o mistério a respeito de quem seria o pai de Callie, não é difícil de supor que é o físico estudioso Egon Spengler, cujo intérprete Harold Ramis é o único que já não está vivo dentre o elenco original.

    A obra consegue reverenciar bastante o interprete do mais brilhante dos Caça-Fantasmas que, entre outros trabalhos seminais como a direção de O Feitiço do Tempo, também colaborou no roteiro do filme original junto a Dan Akroyd. Tardio ou não as homenagens foram acertadas e bastante justas, para o espectador mais emocional, há momentos que possivelmente causarão choro.

    Se havia receio de que Reitman tornaria o filme em algo “cabeça”, certamente não se cumpriu. O filme é divertido, tem semelhanças com Stranger Things e Cobra Kai, ao passo que também é delicado ao mostrar a busca de identidade da pequena Pheebs. Os coadjuvantes são bons, para além da família. Paul Rudd está muito bem como o professor curioso e desastrado, mas o outro destaque certamente é o jovem Podcast, interpretado pelo pequeno Logan Kim se destaca por fazer uma dupla de aventura cuja química é inegável com Parker.

    Além disso, Pheebs é uma personagem com camadas, deslocada do mundo e excluída, que vê na possibilidade de mudar de cidade a oportunidade não só de se transformar, mas de resgatar a ancestralidade de seus parentes. Nessa busca ela acaba encontrando sua vocação, passa aceitar seus gostos e desejos e até passa a lutar por eles, e diante disso, até alguns retornos que soariam como piegas se justificam, pois, não são só nostálgicos, pois tem uma razão boa para estar ali. Mesmo as obviedades servem bem ao roteiro escrito pelo diretor e por Gil Kenan, simples e direto, mas também profundo nos temas que aborda.

    A escolha de mostrar o legado através da família Spengler faz sentido e dá uma dimensão emocional considerável ao filme. A construção do herói do passado conseguindo sacrificar sua vida pessoal em nome da existência humana ganha força ao mostrar que o legado dele segue vivo, e para Harris, que teve um final de vida complicado, ao sofrer com Mal de Alzheimer, e para sua família, há uma bela reverência.

    Ghostbusters: Mais Além consegue atingir a expectativa de afagar o fã antigo, abrindo chance de produzir mais continuações, com um elenco jovem e carismático, só é lamentável a tentativa de mudar o nome da marca internacionalmente, já Caça Fantasmas é um termo que no Brasil causa muitas boas lembranças no público, e apesar de não condizer com toda a qualidade desta produção do gênero aventura sobrenatural, não faz o longa decrescer de qualidade.

  • Crítica | Space Jam: O Jogo do Século

    Crítica | Space Jam: O Jogo do Século

    O inicio do filme de Joe Pytka  se dá com uma conversa entre James Jordan (Thom Barry), o pai de Michael Jordan,  e o pequeno Mike (Brandon Hammond) no quintal de casa onde a família mora, no verão de 1973. O menino não consegue dormir,  então treina arremessos enquanto reflete sobre seu sonho de jogar basquete pela universidade de sua cidade, a Carolina do Norte. Entre as falas positivas vindas de seu pai, fica estabelecida a relação bem íntima entre eles. Mesmo que isso soe bobo como prólogo, era necessário estabelecer essa sensação antes de adentrar a jornada do maior basquetebolista de todos os tempos, que se encontraria nesse Space Jam: O Jogo do Século, com Pernalonga e seus amigos.

    A abertura que  toca a icônica música de Quad City DJ’s (a trilha sonora aliás, é sensacional e vendeu muito na época), repercute alguns dos feitos absurdos de MJ até aquele 1996, como o tricampeonato da NBA, a medalha de ouro com o Dream Team e o desempenho dele no basquete universitário. Isso é importante, pois embora o filme tenha o coelho da Warner, é Michael o verdadeiro protagonista. A trama não demora a ir ao espaço mostrar os opositores, que são os alienígenas pequenos, cabeçudos e fofinhos, chefiados pelo feio e grande senhor Swarckhammer, dublado magistralmente por Danny DeVito. A introdução da historia é tão rápida quando seu ritmo: se estabelece a crise de Jordan tentando jogar baseball para agradar seu falecido pai e mostra os extra-terrestres dominando e ameaçando os Looney Tunes, ao ponto deles terem que recorrer ao ala já “aposentado”.

    Pytka passou por maus bocados durante as filmagens. Coube a ele dirigir as cenas de animação, e o que se fala é que Ivan Reitman acabou interferindo demais nas cenas com atores. Para o diretor foi ate uma surpresa ter sido creditado na direção, com Reitman sendo “apenas” produtor, e a experiência foi tão ruim que e ele se afastou completamente dos holofotes cinematográficos e passou a trabalhar mais em setores de artes plásticas.

    Quanto ao filme, ele apela para um humor bastante infantil, baseado em piadas físicas que tratam Jordan como um bobo alegre, quase imbecil. Mesmo as regras básicas do Baseball ele não entende (e ele chegou a jogar o esporte no colegial). Ainda assim, o fato dele se permitir fazer piada com tudo isso é a prova do quanto ele estava dedicado. Outro fator um tanto quanto negativo é o excesso de piadas físicas com  Wayne Knight, o faz-tudo e auxiliar publicitário de Michael no Birmingham Barons. As piadas de gordo passam do limite, mas na época, funcionaram bem.

    Os personagens animados que co-estrelam o filme com MJ, só aparecem passados mais de dez minutos. Nesta parte há muita criatividade da parte do roteiro. O primeiro confronto dos aliens com Pernalonga se dá após uma viagem pelo Centro da Terra, como se fosse ali outra dimensão onde tudo é possível, inclusive animais e humanos poderem se esticar como  se fossem de borracha. A união de MJ com o coelho da Warner não é inédita, eles já se encontraram em propagandas da  Air Jordan. Essa aliás é outra marca registrada do longa, os merchandisings são tantos ao longo dos 88 minutos que chega a ser engraçado, utilizado até como piada pronta em uma conversa onde Stan (Knight) dispara o nome de quase dez marcas em um minuto.

    O roteiro é bem repetitivo, baseado demais no choque entre personagens burros e espertos, além disso há uma repetição de piadas chatas com o cachorro de Michael, além do que o draminha do filho mais velho do astro com baseball ser expositivo demais como paralelo com a geração anterior. O uso das cores e dos personagens carismáticos aparentemente já é o suficiente para entreter as  crianças, e também são suficientes para vender toda sorte de brinquedos e demais produtos.

    Há um número grande de participações de celebridades do esporte, desde os que tem seus talentos furtados (entre eles, Patrick Ewing e Charles Barkley, grandes adversários de Michael nas finais da NBA), além de Larry Bird, grande amigo seu, e dezenas de outros jogadores. Além disso, a adaptação serviu também para apresentar a musa furry Lola Bunny, a coelhinha que faz Pernalonga se apaixonar, sendo basicamente a unica que tem habilidades no esporte entre os animais antropomorfizados. Ela se tornaria tão popular que estaria em Baby Looney Tunes anos depois e até na nova série do grupo presente no catálogo da HBO Max.

    Até as possíveis fragilidades que moram no fato dos bichinhos engraçados serem na maioria pequenos para o esporte, são aproveitados para inserir o caráter lunático dos personagens, o modo como limpam a quadra por exemplo dá o tom do quão jocosa é a natureza de cada um deles, e ao menos em algum momento dezenas desses personagens aparecem para ter algum brilho. Nada se leva a sério, e isso contamina até o núcleo humano, como na icônica disputa entre Barkley  e uma menina fã dele, ao som do clássico Basketball Jones. Aliás, toda a sequência dos jogadores tentando descobrir o que ocorreu com eles é hilária e repleta de piadas internas e de duplo sentido.

    O filme é sobretudo uma peça de publicidade. Serve  bem para anunciar o retorno de Michael ao basquete profissional e também para vender produtos. Para isso ocorrer, é importante que tudo funcione, especialmente nas animações, e o trabalho de Pytka é impecável nisso. A mistura de 2d com o 3d presente no jogo final é bem fluida, e dá um ar de grandiosidade para a louca disputa em quadra. Mesmo os absurdos são ótimos e as brincadeiras com aspectos Deus Ex Machina dão ainda mais charme a obra. Nem o retorno do personagem central ao campo de Baseball em uma nave é discutido, pois tanto o publico que vê o longa como o que está no estádio já está completamente estasiado com o que MJ é capaz de fazer.

    Apesar dos muito senões, Space Jam é um filme muito divertido e curioso, causa risos nas plateias infantis e ainda serve como epitáfio da carreira de Jordan, que ainda retornaria à NBA, e ganharia mais três títulos. A adaptação consegue fazer fluir bem a mistura entre jogadores e os personagens animados, ainda que o protagonista não tenha nenhum talento dramático, resultando em uma mistura comercial muito rentável e condizente com a mitologia dos personagens envolvidos.

  • Crítica | Mortos Não Morrem

    Crítica | Mortos Não Morrem

    Normalmente quando se pensa em filmes, hqs, livros ou series sobre zumbis, se mostra uma cidade grande e central lidando com a tal praga. Não é o caso de Mortos Não Morrem, novo longa-metragem de Jim Jamursch, que vem nos últimos anos, visitando o gênero terror – em 2013 conduziu o filme de vampiros Amantes Eternos. A localidade é Centerville, um pacato vilarejo vigiado pela dupla de policiais chefe Cliff Robertson e oficial Ronald ‘Ronnie’ Peterson, interpretados por sua vez por Bill Murray e Adam Driver, que começam a perceber uma movimentação estranha no local.

    Nos anos noventa Jamursch dedicou seu esforços a desconstruir alguns gêneros cinematográficos. Em Dead Man discutiu  o Western, enquanto Ghost Dog perverteu os clichês de filmes de samurai, e ele parece querer fazer isso com as obras de George Romero neste, além é claro de referenciar os populares Guerra Mundial Z e The Walking Dead, ainda que aqui haja uma carga de humor não óbvio muito forte, causada pela força das circunstancias, e em uma freqüência de ironia poucas vezes vistas nas parodias recentes.

    A câmera passeia pelo cotidiano bucólico de Centerville, mostrando algumas pessoas comuns, esperando sua comida, destilando preconceitos, se metendo em small talk em mais um dia comum. As pessoas estão tão entretidas com as futilidades comuns a si que não percebem que o mundo está mudando e está ruindo. É como se fosse mais um dia como outro qualquer, como se o fim do mundo não afetasse quem já está isolado do restante da “alta civilização”. Eles só percebem que algo está errado de fato quando os animais começam a sumir, e mesmo em meio a uma cidade de pequena população, há gente ainda mais excluída.

    Não há pressa em mostrar o mundo sendo destruído, o registro sobre o bucólico e sobre a vida simples no campo dá o tom no primeiro terço do filme, só ocorrendo o alvorecer dos mortos após o passar da manhã e tarde, possivelmente referenciando o nome do clássico maior de George Romero, A Noite dos Mortos Vivos. As cenas dos primeiros ataques guardam um humor que mistura o não obvio, ao colocar os mortos vivos andando vagarosamente até suas vítimas, diferente do péssimo conceito de zumbis velocistas como em Madrugada dos Mortos, Zumbilândia ou Extermínio, além de fazer troça com a aparência de Iggy Pop, um dos ídolos do diretor e protagonista de seu último longa, Gimme Danger.

    O roteiro também brinca com os fan services e referencias desnecessárias, utilizando uma discussão entre Zoe (Selena Gomez) e seus amigos com o frentista e fanático por filmes de horror b Bobby Wiggins (Caleb Landry Jones), mostrando um Pontiac LeMans, o carro utilizado pelos personagens de Uma Noite dos Mortos Vivos original de 1968. O modo que o filme reverencia as obras clássicas brinca com as obviedade do cinema de referencia e digere sua montanha de menções forma própria e debochada.

    A proximidade do fim faz com que os personagens percebam o obvio, que não há escapatória. Os poucos que ousam ficar vivos se vêem cercados, com pouca ou nenhuma perspectiva de sobrevivência, basicamente esperando a morte chegar, ou os recursos acabarem, ou terem seus domicílios invadidos, no entanto isso não é explorado de maneira melodramática ou seria, e sim fazendo piada, de humor negro, com desdém normalmente, como quando os hipsters de Cleveland são decapitados pelos caipiras de Centerville.

    Jamursch faz uma espécie  de filme resposta ao que Rob Zombie empregou em seu Halloween: O Início – embora a acusação de simplismo e de preconceito com o rural seja discutível – mostrando o cidadão do campo como superior ao urbano, e ainda guarda para seus momentos finais uma intervenção inesperada, que faz com que tudo que foi visto até aquele momento, pudesse ser apenas um despiste. A virada do roteiro é digna dos clássicos de Ed Wood, tão cretina que soa engraçada, como aliás é toda a tônica do longa,

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  • Crítica | Ed Wood

    Crítica | Ed Wood

    Nenhum cineasta que amou de verdade o cinema pode ser o pior dos piores. Todavia, amor não coloca comida na mesa, e as vezes uma certa dose de talento e precisão são necessários para o coração devotado. Entre todos os Tim Burton’s que já tivemos, em mais de quatro décadas de sua carreira,revisitando-se e reafirmando a cada passo dado sua identidade, o Tim Burton pós Alice no País das Maravilhas virou o que muitos profetizaram quando foi divulgado o primeiro trailer da aventura feita sob medida para a Disney: um lego flexível, precificado e que se encaixa fácil, fácil nas diretrizes de um vasto cinemão americano, cheio de intenções e vícios de linguagem. No jogo de Hollywood, e estamos falando especificamente sobre ele, poucos sabem manter casados os fatores qualitativos e identitários a ponto de sua paixão primordial pelo Cinema se manter intacta por todo o caminho, este longo e penoso como sabemos ser para todos os(as) envolvidos(as).

    Olhando para esta pérola, filmada em um belíssimo e invejável preto e branco que lava o mundo das filmografias americanas de tons prata e grafite de forma quase ímpar, o Burton raiz ainda estava vivo, ou melhor, nascendo, no que pode ser chamado seu melhor filme sob a teimosia alucinante dos fãs em eleger Edward Mãos de Tesoura para este pódio. O cineasta ainda foi zeloso o suficiente, após o enorme sucesso de Batman e Batman: O Retorno, para não sobrepor a estética a essência da história por trás da figura amalucada e naturalmente esquisita do “pior cineasta de todos”, Edward Davis Wood Junior, e que por isso mesmo se tornou inesquecível, tal Tommy Wiseau do infame The Room para as audiências modernas, e homenageado em 2017 em O Artista do Desastre. Ed pode ser visto até hoje, e de forma reiterada, como “o alfa e o ômega do subgênero trash”. Filmes que, de tão ruins, ganham uma legião de fãs justamente por seu apelo ridículo, péssimo gosto em todos os sentidos e humor desproposital e insano.

    Sua trajetória na máquina hollywoodiana de sonhos não foi nada engraçada, porém, com Ed experimentado toda a sorte de pesadelos possíveis para realizar suas ‘obras-primas” na Era de Ouro dos grandes estúdios do passado,mas extremamente (no sentido literal da palavra) massacradas e marginalizadas pela crítica especializada e um público que o desprezava, colocando clássicos trash como Glen e Glenda, A Noiva do Monstro, e o mais famoso e ambicioso de todos, Plano 9 do Espaço Sideral (todos disponíveis no YouTube), abaixo de tudo o que se pode imaginar. Amante do macabro e do desconhecido tal qual o seu velho ídolo, Burton viu nos anos 90 a chance perfeita de edificar a cinebiografia do gênio dos anti-sucessos, devotando para isso toda a sua paixão pelos aspectos que o tornaram tão reconhecido, após ter morrido no mais completo e pesado ostracismo nos anos 50, mas não sem antes encontrar sua maior inspiração, um outro gênio da lâmpada, esse sim reconhecido ainda em vida: Orson Welles, o menino prodígio que aos 26 anos rodou Cidadão Kane e reinventou a roda.

    Ironicamente, temos aqui um filme sobre um dos maiores vira-latas de Hollywood em que Burton e Johnny Depp usam de suas charmosas peculiaridades notórias a fim de recriarem, juntos, com toda a elegância e o dinamismo possíveis, uma época onde sonhos ainda eram possíveis e eram mais fortes que tudo, dialogando sobre a própria vontade de produzir esses sonhos de uma maneira tão sólida e bem resolvida que fica difícil encontrar um candidato à altura, desde 1994, dentro ou fora do cinema americano, que nos faça cair inadvertidamente de amores pelo amor de lutar, contra todo um sistema, para se contar história sobre travestis, policiais ou alienígenas – ou tudo junto, misturado, porque não? Depp, um grande ator quando quer ser, e na época mais ator que celebridade, exala a paixão de Ed Wood pela câmera, pela luz, pela ação que movia seus atores; lendas como Bela Lugosi, o primeiro Drácula, do longínquo ano de 1931.

    Wood apenas queria trabalhar, sob o pecado de ser uma criança perdida numa loja de doces – e como ele amava doces, um mais do que o outro. Wood atuava como cineasta de um tempo mais inocente, que Charles Chaplin ainda era um malandro, Walt Disney ainda lutava para ser o mito que é, e tudo não passava de um exercício caro mas unilateral, sem grandes intenções por trás de nada. Cena após cena, Burton e Depp, no auge de ambos, mostram o lado sombrio, ganancioso e duro de se trabalhar na ilusória Hollywood, pois sabiam, após várias experiências, que nos anos 90 o jogo já era outro, completamente oposto ao mundo de sonhos e diversão de um homem que acreditava em seu coração para guiá-lo com suas lentes em um campo cada vez mais tomado por lobos, e que não aceitam ovelhas sentimentais. Ao recriar uma época, Ed Wood recria com força impressionante o espírito de se fazer filmes, sendo um respiro, uma dose de reflexão, e/ou uma ode para qualquer um que sonha em fazer o mesmo, ou que apenas admira os que tem coragem para tanto.

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  • Crítica | Ilha dos Cachorros

    Crítica | Ilha dos Cachorros

    É fácil perceber que se está diante de um filme de Wes Anderson, mas não só pelos motivos “aparentes” e esperados, em especial neste filme de 2018. Incorporando sua identidade rigorosamente meticulosa na elaboração visual de toda a sua mise-en-scène, com a história do garotinho Atari em busca de seu cachorro numa ilha japonesa dominada por raças caninas simpáticas e inteligentíssimas, forma-se uma (tentativa raquítica e apática de) jornada sobre liberdade e amizade e que começa e termina na vã estratégia de ser um Cinema autoral e de entretenimento ao mesmo tempo, algo que Anderson sempre conseguiu, mas que aqui simplesmente não consegue basilar-se nas suas pretensões. Resumindo: Sobra estilo e esquematização, e faltam conflitos e emoções reais em Ilha dos Cachorros, como se isso fosse tudo.

    Wes Anderson não acredita na sua história pois não assume risco algum; fato. Zona de conforto total, e que impressiona dada a mente brilhante que está por trás desse projeto, o filme inteiro parece ser um ato só: Coisas se desenvolvendo com a leveza do vento e sem alcançar patamares significativos em absoluto – nem na filmografia de Anderson, nem no Cinema recente. Mesmo quanto as peculiaridades do cineasta, seus travellings ultra planejados e seu ritmo incessante, ágil e palco para um humor negro irresistível, em A Ilha dos Cachorros tudo torna-se desinteressante pela primeira vez na carreira do cara. E, caso a obra não mereça ser chamada de “desinteressante”, o oposto tampouco atinge na percepção sensorial de quem esperava a regularidade de sempre do autor de Moonrise Kingdom, e de uma das grandes animação dos últimos anos: O Fantástico Sr. Raposo.

    Entre gangues formadas por diversas raças de cães e que lutam pela sobrevivência em um território que dominam, e muito corre-corre vazio, a história grita desesperada por um nível básico digamos de naturalismo que jamais poderia encontrar junto a alguém cuja frontalidade sempre foi orgulhosamente cênica, à beira do artificial. Parece que Anderson quer escapar um pouco do seu estilo e tentar ser mais solto, mais humanizado igual sua cachorrada solta em terreno japonês seguindo Atari. Mas nesse desejo de se expandir, poucas vezes nessa década se viu uma animação tão carente de carisma e tão atolada por uma artificialidade oca; um vai e vem que, se diverte mais ou menos, não chega em lugar algum. Entre um cinismo estrutural e um apoio extremo na beleza e outras virtudes da sua técnica, Ilha dos Cachorros é o típico filme calculado em demasia que não aguenta a essência da sua sensível trama frondosa, e banalmente desenvolvida.

    Neste exemplar do seu gênero, nem a boa trilha-sonora de um Alexandre Desplat ou o fascínio que técnicas de animação promovem não enganam ninguém (pelo menos aqui), e apenas embalam superficialmente a falta de envolvimento de todos os lados com a produção. Anderson apresenta uma mão surpreendentemente pesada na direção, e a trama centrada em amigos inesperados (e uma subtrama política feita às pressas por meio de analogias baratas) tampouco combina com o seu estilo de aventuras hiper organizadas em seu espaço/ tempo tão particular, e sempre tão delicioso – até agora. Estamos falando de um quase filme, de uma ideia que talvez merecia ser contada mas de uma forma muito mais calorosa – o clímax do filme é ordinário. Nem as boas sacadas visuais evitam a apatia e o aborrecimento em meio as tramoias de espécies humanas e caninas, aqui. Parece que todo cineasta precisa ter um mau exemplo da sua visão no currículo, e é uma pena Anderson não ser uma exceção.

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  • Crítica | Os Fantasmas Contra-Atacam

    Crítica | Os Fantasmas Contra-Atacam

    Os Fantasmas Contra-Atacam, filme de Richard Donner, começa com inserções de comerciais natalinos nonsense, com os duendes e papai Noel se armando até os dentes contra opositores, junto ao personagem Lee Majors, de O Homem de Seis Bilhões de Dólares. Em meio a isso, o diretor da rede de televisão Frank Cross (Bill Murray) é apresentado, um homem egocêntrico e com poucos escrúpulos, que só pensa na audiência de sua emissora, não importando o preço a ser cobrado. Logo, ele é visitado pelo espírito de seu amigo morto, Lew Hayward (John Forsythe), que serve de prenúncio para o que virá.

    Por não pensar nos outros e ser frio, a vida e destino do protagonista está fadada a ser destruída, e para isso, três espíritos o visitarão, o do natal passado, natal presente e futuro. Em meio a essas visitas ele viaja pelo tempo e vê alternativas do que seria sua vida, normalmente envolvendo a bela Claire Phillips (Karen Allen, de Caçadores da Arca Perdida) como seu par.

    Essa versão de Um Conto de Natal, de Charles Dickens reúne menções mais modernas a situações de A Felicidade Não se Compra, embora o herói da jornada tenha um caráter bastante diferente do Bailey que James Stewart fazia. O cunho do longa obviamente é outro, a comédia, trabalhando de maneira irônica com alguns elementos referentes a hipocrisia do mundo corporativo e da vida adulta.

    O desfecho é irônico, e se vale muito do carisma de Murray, que estava bastante em alta principalmente por conta de Os Caça-Fantasmas – que inclusive é o motivo do nome brasileiro fazer referencia a fantasmas, e não a Scrooged ou ao conto de Dickens. Entre os coadjuvantes, vale lembrar de Carol Kane, que faz o fantasma do presente, misturando o arquétipo de aparição com o de fada, com uma abordagem bem lisérgica do mito. Sua performance casa à perfeição com a de Murray, e ajuda a engrandecer o escopo de Os Fantasmas Contra-Atacam, tornando-o um filme divertido apesar de seus clichês.

    https://www.youtube.com/watch?v=C3P8u2jXm9U

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  • Crítica | A Very Murray Christmas

    Crítica | A Very Murray Christmas

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    O modelo de comédia americana está cada vez mais falido, a molecada não ri mais de Woody Allen ou Jerry Lewis, nem sabem quem foi Buster Keaton ou Harold Lloyd, já que os padrões de riso e de susto morrem a cada filme lançado, ou melhor, a cada risada ou calafrios desperdiçados! Assustar e emocionar é difícil, sem dúvida, mas rir, provocar risada com a mesma piada para todas as pessoas e culturas do mundo não é algo fácil. Com Borat se oficializou, em 2006, um modo pelo menos temporário de fazer as novas gerações rirem, senão delas mesmas, num espelho anacrônico e, porque não, irônico do mundo real tão contemporâneo, globalizado, ridículo, cheio de memes e comediantes stand-up. Mas tem uma figura que o americano ama mais que black friday, SuperBowl e Amy Poehler juntos!

    Olhando pra Bill Murray, ele é o tipo (em um milhão) que causa empatia simplesmente por se deixar ser simpático, nada mais. Nos almoços de família, ninguém tem coragem de dizer que não curte um tipo assim, até fazer falta quando deixa de aparecer (pelo menos uma vez por ano, e no caso de Murray, mesmo que para um público restrito que razoavelmente sabe o que precisa assistir). Ai chega a Netflix, dona de tudo e mais um pouco hoje em dia e lança A Very Murray Christmas, sem tradução, abraçando a causa Murray e natalina, afinal juntas elas combinam que só, coisa leve e lenitiva aos cético de plantão, nesse espírito mágico, balsâmico da tradição anual.

    O musical mais inofensivo desde Nine, só que Rob Marshall não queria que fosse assim. Aqui, Sofia Coppola acerta o ritmo e compõe uma sinfonia lenitiva a um mundo que não faz parte do palco, com George Clooney, Maya Rudolph (comediante do Saturday Night Live), Chris Rock e Miley Cyrus, cantando “silent night” (“Noite feliz”, em português) com o Paul do David Letterman no piano, sendo a cena um possível clássico americano do humor involuntário, já que Miley não é conhecida por cantar canções sobre Jesus… enfim!

    Passar uma hora com celebridades agradáveis de Hollywood é isso, cantar em sua companhia e degustar em meia-dúzia de cenas síntese do filme, como a noiva triste que após ouvir uma canção de natal, retoma seu casamento como se nada tivesse acontecido. Nem Murray ou Coppola, nem ninguém aqui quer entregar um filme doce demais, dai o comedimento nas canções e o evitar de muitos confetes, sendo A Murray Christmas um especial honesto, chique, econômico na sua graça.

     

    https://www.youtube.com/watch?v=XJP3db3R014

  • Crítica | Mogli: O Menino Lobo (2016)

    Crítica | Mogli: O Menino Lobo (2016)

    mogli-o-menino-loboQuando anunciado pela Disney, que estaria refilmando um de seus clássicos de animação, Mogli – O Menino Lobo, de 1967, em uma versão live-action repleta de efeitos computadorizados e dirigida por Jon Favreau, poucos foram os que não tiveram ressalvas com a decisão do estúdio, afinal a animação clássica permanece bastante viva no imaginário das pessoas como um dos filmes mais queridos do estúdio, além de ser uma das grandes obras do estúdio nos anos 1960 ao lado de 101 Dálmatas – também adaptado em live-action em 1996.

    Convém lembrar que a decisão de refilmar esses clássicos tem sido uma constante do estúdio Disney nos anos de 2010: Cinderela, de Kenneth Branagh, Malévola (releitura de A Bela Adormecida), de Robert Stromberg, e Alice no País das Maravilhas, de Tim Burton. Apesar do sucesso de bilheteria, todos os filmes dividem opiniões da crítica, e por muitos soam como uma tentativa cínica de arrecadar dinheiro à custa da nostalgia de muitos. Mogli: O Menino Lobo, apesar de ter esse objetivo, felizmente é um desses exemplos de obra que, apesar de seus imperativos comerciais, pode ser repleto de originalidade, criatividade e paixão em sua realização.

    A história do longa-metragem é uma adaptação de um dos contos do livro de Rudyard Kipling, O Livro da Selva (compre aqui), que traz a história de Mogli (Neel Sethi), uma criança que tem como protetora a pantera Bagheera (Ben Kingsley) e é criada por uma matilha de lobos após ter seu pai morto nas selvas da Índia. A história ganha novos contornos quando a selva indiana passa por um período de seca e todos os animais se reúnem em um pequeno vale, onde ainda se encontra água. Por conta disso, é evocada uma das leis da selva que obriga uma trégua temporária naquela região onde nenhum animal precisaria temer em se tornar uma presa de outro animal.

    No entanto, a chegada do tigre Shere Khan (assustadoramente dublado pelo grande Idris Elba) coloca em risco a vida de Mogli, e Bagheera não vê outra escolha a não ser levar o menino de volta a uma aldeia de homens para que ele possa crescer em segurança. A partir de então, o filme ganha contornos de um “road movie“: a jornada de Mogli até a aldeia dos homens. Como nos típicos filmes de estrada, há um ponto de chegada pré-definido, no entanto não definitivo, já que a própria jornada do protagonista se torna mais relevante. A jornada é mais importante que a chegada, e a verdadeira finalidade das personagens.

    mogli - o menino loboEm sua jornada, Mogli se depara com vários animais, e cada um deles oferece ao protagonista um caminho diferente a ser traçado. Bagheera é marcado pela preocupação benevolente, prezando unicamente pela segurança de Mogli e deixá-lo entre os seus; Kaa (Scarlett Johansson) oferece um desfecho rápido através de seus olhos hipnotizantes e sedutores; por sua vez, Baloo (Bill Murray) entrega uma visão de mundo inicialmente escapista, mas que ao longo da trama se mostra repleto de ternura, enquanto o Rei Louie (Christopher Walken) surge como a demonstração da ganância e a ambição humana. Além disso, dentro da matilha de lobos, Akela (Giancarlo Esposito) e Raksha (Lupita Nyong’o) são as representações das figuras paterna e materna de Mogli.

    Os efeitos visuais abrangem quase que exclusivamente não só todos os personagens -exceção feita a Sethi interpretando Mogli – mas também todo o ambiente do longa-metragem. O filme se mostra extremamente bem-sucedido nesse esplendor tecnológico, apesar de, em alguns momentos, o nível cair e deixar um pouco a desejar. O trabalho do diretor de fotografia Bill Pope ao lado de Favreau é consistente, evocando cenas belíssimas e dando um clima mais sombrio se comparado à animação de 1967, mas de maneira alguma deixa de ser um filme bem-humorado.

    Diferente da animação clássica, Mogli: O Menino Lobo, conta apenas com dois números musicais, o já clássico The Bare Necessities, canção de Baloo e interpretado com a leveza de Murray; e I Wan’na Be Like You, em um belo bepop interpretado por Walken em sua personagem Rei Louie; e aos não-adeptos de musicais, importante dizer que ambas as canções interpretadas são dois grandes momentos do filme, não se tratando de casos que retirem o espectador da imersão do filme, mas muito pelo contrário.

    No final das contas, Mogli: O Menino Lobo é um longa repleto de ternura, sensibilidade e intensidade. Curiosamente, um filme praticamente desprovido de seres humanos, mas repleto de humanidade.

  • Crítica | Sob o Mesmo Céu

    Crítica | Sob o Mesmo Céu

    SOB O MESMO CÉU 1

    O começo da nova obra de Cameron Crowe, Sob o Mesmo Céu, remete a cenas gravadas por cinegrafistas amadores, revelando momentos de descontração na ilha do Havaí no descanso de férias, bem como a interação dos nativos com o belo lugar. O efeito seria de comoção e nostalgia, não fosse o tom exageradamente caricato piorado em muitos níveis pela narração intrepidamente óbvia, que discorre sobre a tardia corrida espacial dos anos 2010.

    O roteiro de Crowe apresenta uma quantidade enorme de clichês, desde a construção dos personagens até as situações comuns que vivem. Bradley Cooper vive o oficial Carson Welch, que vive sua rotina medíocre vendendo um estilo de vida essencialmente capitalista, negociando possíveis localidades para testes espaciais e já em uma fase decadente de sua carreira. Designada para “vigiar” Welch, a Capitã Ng (Emma Stone) exibe sua feminilidade jovial, escondida sob uma capa de militarismo poser, falsa em cada mínimo aspecto. Inicia-se, assim, uma interação romântica na qual a falta de química prevalece.

    A chegada à ilha paradisíaca faz lembrar o drama vivido em Os Descendentes, reprisando inclusive a questão da vivência dramática em um lugar onde memórias boas são geradas por turistas. Carson reencontra um grande amor, e se vê em uma posição espinhosa, mas toda a problemática sentimental apresentada é pobre e sem conteúdo, mesmo que a atmosfera construída seja a de um lar de rancores, tristezas, abandonos e ressentimentos. Falta alma e verve ao roteiro, que destoa de todo o panorama mostrado em tela, diferenciando-se até da bela fotografia de Eric Gautier, que consegue ser bela apesar da paleta de cores completamente tresloucada.

    Toda a questão ideológica relacionada ao engano aos nativos e os argumentos pró-armamentistas impulsionados por bilionários ficam em um plano subalterno para explorar o rocambole novelesco do trio (quarteto, se contar a personagem de Stone) entre Carson, Tracy (Rachel McAdams) e o atual marido desta, Woody (John Krasinski). Este último, curiosamente, é a personagem mais bem trabalhada e com nuances: não possuindo muitas falas, sua comunicação quase sempre é realizada através de gestos e olhares. Mesmo com todo o aspecto curioso, as situações são bastante frívolas e sem substância. Uma mensagem democrata barata, que acaba sendo apenas ideologicamente banal. Até se destacam momentos nobres, como a luta contra o avanço imperialista, mas estes se perdem por completo diante da barata tentativa de redenção moral de Sob o Mesmo Céu.

  • Top 10 – Maiores Injustiçados pelo Oscar 2015

    Top 10 – Maiores Injustiçados pelo Oscar 2015

     oscar injustiça

    Quase tradicionalmente, após observar a lista de indicados pela Academia para a maior premiação do cinema comercial, notam-se também injustiças, tanto nas ausências de indicações quanto nas premiações. Filipe Pereira, Marcos Paulo Oliveira e Doug Olive prepararam uma lista especial sobre os filmes que ficaram de fora da festa, com categorias variadas:

    10. Uma Aventura Lego, por Marcos Paulo Oliveira – Melhor Animação

    lego batman

    Tudo é incrível. Assim diz a canção-chiclete que é usada como recurso para nos mostrar o modo de produção e vida da cidade Lego. Sim, tudo realmente parece incrível, mas logo vemos que esta não se trata de uma animação tradicional. Com uma energia capaz de abarcar todo tipo de contexto e metalinguagem, aqui a piada é o único refúgio para o trato de temas eventualmente sérios, eventualmente ridículos, mas igualmente importantes. De tão segura a direção, não faltaram críticas à forma como agimos em nossa sociedade, fruto de uma estrutura rígida e autoritária, quando justamente deveríamos ser livres para o que nos cabe. A temática é ligeiramente parecida com o concorrente Os Boxtrolls, que, apesar de mais estiloso, é bem menos ousado. A despeito disso tudo, qualquer filme que é capaz de estapear uma sociedade que compra café a 20 reais e acha tudo incrível, merece toda a atenção.

    9 . Hobbit A Batalha dos Cinco Exércitos, por Doug Olive – Melhor “Descenso de Carreira”

    O-Hobbit-A-Batalha-dos-Cinco-Exercitos 5

    Peter Jackson conseguiu o impensável: esconjurar toda e qualquer credibilidade que conseguiu no mundo do Cinema, graças à primeira e impecável trilogia do anel, com esta segunda empresa trágica e ridícula no mesmo nível de desconstrução. Um fiasco do início ao fim – sendo O Hobbit: Uma Jornada Inesperada (2011) o melhor exemplar da divisão ambiciosa de um folheto adaptado em três intermináveis filmes -, A Batalha dos Cinco Exércitos é a cereja no bolo de jiló de uma receita fadada ao fracasso por motivos óbvios. Filme de nível morto de represa e merecidamente ignorado nas premiações, mesmo em ordem técnica, algo impensável dez anos atrás, Jackson criou seu iceberg ao construir seu terceiro Titanic, desta vez cheio de falhas, tendo no currículo o mediano King Kong de 2005 e um motivo triplo para nos perguntar: como alguém que adapta a e$cala de O $enhor dos Anéi$ pode de$cer tão baixo?

    8. A 100 Passos de Um Sonho, por Doug Olive – Melhor Fotografia

    THE HUNDRED-FOOT JOURNEY

    Há algo de único neste filme, ainda que desigual quanto à obra como um todo. Não há nada de errado com feel-good movies, e também não há repreensão naquilo que mais se destaca num filme, que neste caso é a fotografia, simplesmente soberba: a obra nos faz sentir, numa simples e esperta aproximação ocular, o cheiro, gosto e textura de determinada comida à nossa frente, quase ao alcance de outros sentidos degustativos, ou o mero prazer de redescobrir o mundo europeu numa ótica indiana mais viva e colorida; tanto faz. Deleite sensorial magnífico que merece reconhecimento do público ao menos, ainda que a história deixe muito a desejar no quesito que mais se esforça para representar: choques culturais. A crítica completa você encontra aqui.

    7. Força Maior, por Filipe Pereira – Melhor Filme Estrangeiro

    Força Maior

    De história bastante reflexiva, Força MaiorForce Majeure, ou Turist, no resto do mundo – conta o drama de uma família, que, ao passar por uma situação limite, vê em seu pai uma figura irresponsável, uma vez que, diante de uma pequena avalanche, ele abandonou todos, levando consigo somente seu smartphone e outros pertences, enquanto mulher e filho ficaram à própria sorte. A tragédia recai sobre o casal de protagonistas, que em uma reunião de férias deve se reinventar e repensar o papel de cada um na relação. O filme do sueco Ruben Östlund foi indicado ao Globo de Ouro na categoria Filme Estrangeiro, e seria um candidato interessante ao Oscar da mesma categoria, especialmente por ser bem diferente de tudo visto no circuito americano.

    6. Jersey Boys: Em Busca da Música, por Doug Olive – Melhor Direção, Roteiro Adaptado

    Jersey Boys

    A frase “Come back when you’re black!” (“Volte quando for negro!”) é sensacional. Registra todo o espírito e estereótipos além do racial ou tendencioso numa única frase, dita durante uma discussão sobre e entre músicos e produtores. O Oscar não apenas ignorou por injusta causa o melhor musical americano de 2014, como renegou o filme diante do status de ser este o melhor de Clint Eastwood desde Cartas de Iwo Jima, há oito anos. Dos números musicais à leve e crescente disputa entre integrantes de uma banda, com inúmeros sons e identidades que colam na cabeça do público ainda hoje, o filme é divertido pelo vigor que vários e bons diretores prematuros não conseguem passar ao público de forma linear, principalmente no número final, clímax redundante em que até o sério Christopher Walken risca o chão e arrisca um gingado com Oh, What a Night!, clássico do grupo Four Seasons.

    5. O Ano Mais Violento, por Marcos Paulo Oliveira – Melhor Atriz

    O Ano Mais Violento

    O longa se passa na Nova York de 1981, e logo no início já reconhecemos o histórico violento da cidade e seu futuro incerto. Usando Oscar Isaac como astro, é notório que, apesar de seu talento, o ator desaparece cada vez que Jessica Chastain aparece em cena. Isso não é por acaso, pois a direção de J.C. Chandor faz questão de iluminá-la e destacá-la em todas suas aparições, demonstrando todo o magnetismo daquela mulher que, ao contrário do marido, faz o que for necessário. Resquício de uma sociedade gângster, ela se mostra capaz de adaptar-se à sociedade atual, mais civilizada e de sobretudo, mas sem deixar suas garras de lado. Subliminarmente perversa desde o início, Chastain faz um belíssimo papel demonstrando que, como disse Mario Puzo, por trás de toda grande riqueza sempre há um grande crime.

    4. Sob a Pele, por Marcos Paulo Oliveira – Melhor Roteiro Adaptado, Efeitos Visuais

    Sob A Pele

    Porque o filme manipula de forma muito competente sua forma de ver pessoas e paisagens, em uma direção kubrickiana de narrativa não linear, capaz de alcançar desejos e aspirações do público. Um diálogo direto justamente com aqueles que dissecaram Scarlet Jonhanson – em uma atuação acertadamente alienígena, ornando com a direção – durante as primeiras imagens do filme. Uma pena que a maioria não percebeu. Um espelho capaz de tornar paisagens e pessoas reféns de si mesmos.

    3. Dois Dias, Uma Noite, por Filipe Pereira – Melhor Filme Estrangeiro, Roteiro Original

    Dois DIas Uma Noite

    Além da óbvia referência à direção dos irmãos Dardenne – factoide comum da Academia em ignorar indicações a estrangeiros – o drama depressivo e reflexivo teve seu emocionante roteiro esquecido. Apesar da indicação de Marion Cotillard, na sua performance mais inspirada desde que ganhou o Oscar, não há qualquer justificativa para o filme não ter ficado entre os cinco finalistas que concorrem em 22 de fevereiro. Acima de tudo, Dois Dias, Uma Noite trata de uma questão real e imediata, contando de forma implacável o quão prejudicial pode ser a doença que apavora o último século, sem amenidade nenhuma, mostrando o viés do doente e do entorno dele.

    2. O Abutre, por Filipe Pereira – Melhor Ator, Fotografia, Edição de Som

    Abutre

    Dan Gilroy traz em sua estreia na direção um filme curioso e nada sutil. A fotografia obscura é pontual ao retratar a atuação irretocável de Jake Gylenhaal – que já havia apresentado uma performance surpreendente em O Homem Duplicado. A amoralidade presente no modus operandi de seu personagem retrata a realidade abissal de um jornalismo que teima em chocar em detrimento da informação. Possivelmente, o assunto tão aviltante não capturou o ideário da Academia, que sequer lembrou-se do ator, fotografia ou edição sonora da fita.

    1. Garota Exemplar, por Marcos Paulo Oliveira – Melhor Filme, Direção, Roteiro Adaptado

    GONE GIRL, from left: Ben Affleck, Rosamund Pike, 2014. ph: Merrick Morton/TM & copyright ©20th

    O horroroso, divertido e incrível novo filme de David Fincher, Garota Exemplar, conta a história de uma esposa e filha exemplar e adorável que desaparece quase sem deixar vestígios. Adaptação do livro homônimo, vemos todos os elementos para que o estilo sempre instigante de Fincher passeie pela superfície de diversos temas (casamento, mídia manipuladora, a vida de aparências, os medos masculinos) sob uma mesma tese: o poder da imagem. Grande parte do mérito da narrativa impecável está no roteiro, esculpido para ser perfeito, e na direção de Fincher, que faz aqui o Intercine dos Intercines. Sem medo de se render à breguice, ou a gêneros, o cineasta faz uma paródia fortemente marcada por um de seus traços mais marcantes como autor, que é o cinismo mordaz com que trata o espectador. Com tudo tão horrorosamente lindo, o casamento do cínico com o tragicômico é a única união realmente estável desta fita.

    Menções honrosas à atuação de Jennifer Aniston, em Cake, e a Bill Murray em Um Santo Vizinho; Festa no Céu ao prêmio de Melhor Animação; O Segredo das Águas, O Presidente, Blind para Filme Estrangeiro; Tudo Por Justiça, Edição de Som; e Vício Inerente, a inúmeras categorias.

  • Crítica | Um Santo Vizinho

    Crítica | Um Santo Vizinho

    Um Santo Vizinho 1

    Politicamente incorreto, Um Santo Vizinho, do diretor Theodore Melfi, conta a biografia de Vincent de Van Nuys, um veterano de guerra que, habitando um bairro suburbano, vive uma rotina distante da de um comum homem sexagenário. Sua condição financeira precária ajuda a formar a imagem de completa decadência, de espírito, corpo e alma, motivo que justificaria a completa ausência de educação, sensibilidade ou mísero esforço em ser uma pessoa aceitável em comunidade.

    Bill Murray consegue imprimir em seu personagem uma antipatia quase automática. Seu modo de tratar as pessoas é odioso, mas compreensivo, possivelmente fruto de um desprezo constante a sua condição de ex-combatente ignorado pelo governo, a quem serviu. Suas relações não passam da frivolidade. A ausência de seres humanos que o cercam não por obrigação – destacando-se a prostituta Charisse (Naomi Watts) que o satisfaz – o faz ser rude com qualquer ser que o orbita, incluindo sua nova vizinha Maggie (Melissa McCarthy), a qual acaba conhecendo a pior parte do carisma do ancião, após um acidente de mudança.

    Maggie é mãe de Oliver (Jaeden Lieberher), uma criança de infância conturbada, fruto do divórcio de seus pais e da responsabilidade de habitar uma escola nova, em uma cidade nova, sem nenhum conhecimento prévio ou habilidade maior de socialização. Após esquecer as chaves de casa, o menino acaba inconvenientemente invadindo a privacidade do homem velho, que o recebe a contragosto em sua casa, fazendo as vezes de uma nada apropriada babá.

    O roteiro de Melfi explora a multiplicidade de comportamentos, revelando universos completamente distintos de uma família um tanto carente e de um homem que não se importa com ninguém além de própria rabugice. Apesar da premissa repetida, é o carisma – ou a completa falta do sentimento – que faz com que as personagens sejam abraçáveis pelo público. Personas antissociais e com dificuldade de interação tornam-se cada vez mais comuns ao gosto geral, visto que os ditos inapropriados ao convívio diário saíram de suas cavernas, exigindo ser representados em tela, não mais somente por anti-heróis mal encarados, mas também por cidadãos ordinários.

    Apesar de se afeiçoar ao menino, claro, de modo lento, os problemas de Vincent não somem automaticamente: ele continua em sua jornada rumo ao suicídio gradativo, qualidade negativa que se assemelha ao drama de Maggie em tentar manter a guarda de seu filho, mesmo com seus crescentes problemas financeiros. Na prática, os dois personagens adultos têm a mesma característica, que é a carência de espírito, manifestada em Maggie como o medo de perder seu motivo de viver, tendo no comportamento odioso a parte de Vincent. O menino, peça inocente na equação, também guarda enormes problemas de aceitação, semelhança que cada vez mais une o incompreendido trio.

    A ternura da fita é presente em avatares estranhos. Enquanto a relação entre um velho misantrópico e um menino inocente é carregada de brandura e doçura, o papel da igreja e religião é discutido além da crença comum no Divino, com o cuidado do texto em não vilanizar a instituição enquanto a critica.

    Ao contrário do que a trajetória do herói normalmente revela, a evolução do quadro em Um Santo Vizinho não tem nada de edificadora, especialmente em relação ao julgamento da custódia de Oliver. Ao descobrir os lugares onde Vinny levava o garoto, ela o confronta, em uma cena que visualmente distingue ambas rotinas, com a câmera posicionada em plano aberto, onde seu meio divide as propriedades dos vizinhos, exibindo uma cerca de arame que separa o quintal árido do sexagenário e o verde lar da enfermeira cuidadosa. Dois lugares distintos, cuja interseção humana – Oliver – une-os de maneira inexorável.

    A falida moralidade é fortemente reprovada, assim como a individualidade exacerbada dos que não têm qualquer crença maior, como é o caso de Vincent. A paralisia na fala, que o personagem sofre na metade final do filme, ajuda a retratar o quão retrógrado é seu modo de vida e o quanto isso faz mal a todos à sua volta, especialmente a ele próprio, num modo de existir absolutamente triste.

    A beatificação do personagem título ocorre a despeito de todas as trapaças que ele cometeu ao longo de sua existência, numa mostra de que a redenção pode chegar mesmo após longos anos de completo desdém geral. Oliver se esforça para produzir um belo discurso que glorifica os feitos do passado e do presente de Vincent, destacando suas qualidades, indo na contramão do que a opinião pública diria. A possibilidade de queda por motivo de depressão é concluída com maestria pelo pequeno rapaz, que, mesmo em sua ingenuidade infantil, consegue enxergar além das óbvias aparências. O modo leve com que a fita é levada contradiz a postura de seu protagonista, mas condiz com cada aspecto sensível do texto dramático, exibindo um final surpreendente para a jornada do rabugento vizinho, que segue sua existência sem ser complacente com o conservadorismo ou com o politicamente correto, mas conseguindo, ao seu modo, se aproximar da felicidade.

  • Crítica | Os Caça-Fantasmas

    Crítica | Os Caça-Fantasmas

    Já se passaram 30 anos desde que esse clássico da comédia fez sua estreia nos cinemas. Fenômeno de crítica e bilheteria, Os Caça-Fantasmas é um filme que está presente na memória afetiva da maioria dos marmanjos nascidos na década de 80.

    Em uma época povoada por comédias direcionadas especificamente para adolescentes, a película dirigida por Ivan Reitman conseguiu atingir diretamente o coração de todos os públicos. A premissa do filme, simples e muitíssimo bem amarrada, retrata três parapsicólogos fracassados que, após serem demitidos da universidade onde trabalhavam, resolvem montar uma agência de caçadores de fantasmas, tal qual uma dedetizadora. Quando um ser sobrenatural chamado Zull abre um portal para invadir nosso planeta, Os Caça-Fantasmas tornam-se a nossa única esperança.

    Roteirizado pelos também protagonistas Dan Aykroyd e Harold Ramis, e dirigido por Ivan Reitman, o filme tem um ritmo ágil e empolgante. Duas sequências merecem um destaque especial: a da abertura na biblioteca, feita no melhor estilo dos filmes de suspense, com a câmera acompanhando a bibliotecária e com a tensão aumentando até a conclusão da cena; e a do hotel de luxo assombrado pelo “Geleia”. Reitman filma o despreparo da equipe sem fazer com que eles caiam no ridículo. Outro ponto merecedor de destaque é a agilidade dos diálogos, que além de espirituosos em vários momentos, são extremamente naturais.

    Inicialmente, os roteiristas queriam Eddie Murphy, John Belushi e John Candy para compor o elenco. Porém, devido à morte de Belushi e outros fatores que impediram que Candy e Murphy estivessem no filme, a equipe acabou sendo formada por Bill Murray, Ernie Hudson, Dan Aykroyd e Harold Ramis. Provavelmente, esse foi o grande acerto do filme. A química entre eles é sensacional, ainda que Hudson aparente estar um pouco deslocado em cena. Isso torna a interpretação dele bem interessante, uma vez que seu personagem só se junta ao time pelo salário. Aykroyd e Ramis estão bastante à vontade em cena e suas performances são ótimas. O contraponto do exagero do primeiro com a face sempre contida do segundo é bem engraçada. Porém, o grande show é de Bill Murray. Seu Peter Venkman é simplesmente genial. Completamente confortável no papel, o ator age naturalmente e nunca parece que está atuando. Fica a impressão de que ele está constantemente improvisando e que não possuía nenhum texto decorado. Um verdadeiro espetáculo. Sigourney Weaver, que faz a mulher assombrada por Zull e por quem Venkman é interessado, defende seu papel com competência e Rick Moranis arranca gargalhadas como seu apatetado e estranho vizinho.

    A trilha sonora de Elmer Bernstein é muito boa e ajuda a construir a atmosfera do filme. A música-tema, composta por Ray Parker Jr., marcou época e não aparenta ter a idade que possui. Quanto à cenografia, tudo é muito bem feito e os cenários são muito bem filmados pelo diretor Ivan Reitman. Entretanto, o Palácio de Gozer, apesar de ser visualmente interessante, acaba entregando um pouco a idade do filme. O mesmo acontece com algumas criaturas geradas por efeitos especiais e com a batalha final, quando a personificação de Zull tem uma aparência que remete um pouco à de David Bowie quando ele se apresentava como Ziggy Stardust. A fumaça de gelo seco no cenário ajuda a piorar um pouco a situação. Já o boneco Stay Puft não ficou velho e funciona bem em cena até hoje.

    Ainda que pareça datado em alguns momentos, principalmente quando faz grande uso de efeitos visuais em cena, Os Caça-Fantasmas ainda é um filmaço, e 30 anos depois, ainda é garantia de diversão. Não à toa, sempre figura nas listas das melhores comédias de todos os tempos.

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  • Crítica | O Grande Hotel Budapeste

    Crítica | O Grande Hotel Budapeste

    o grande hotel budapeste

    O Cinema de Wes Anderson, sendo a arte antes do artista, é claro, é um corredor de pinturas, uma ida ao museu numa tarde chuvosa onde não há mais nada a se fazer senão apreciar a viagem histórica. O cineasta tem a preferência de centralizar seus mundos enquanto expande os significados deles através de uma simbologia única em nível de identificação universal. Mundos onde todos os personagens são totalmente imprescindíveis à história ao mesmo tempo em que são totalmente desnecessários à narrativa em retalhos: substituíveis e relevantes ao mesmo tempo. O Grande Hotel Budapeste é o Cinema de Jacques Tati e Stanley Kubrick feito para todas as idades e mentalidades. Lindo, matemático, extremamente planejado em planos cênicos milimétricos, mas não é superficial em toda a sua estilização, afinal de contas, apenas por denunciar a beleza existencial do mundo a partir dos valores humanos de cada vida vinculada à teia apresentada.

    Até porque Anderson tem olho clínico e confiança de chamar atores do mais alto nível, assim como semi-desconhecidos, para interpretar figuras icônicas que pertencem a mentes de pessoas como Alan Moore, genial escritor inglês e famoso por sua excentricidade. Logo no começo de Budapeste, percebemos os traços marcantes da filmografia do diretor de Moonrise Kingdom, seja na (ótima) direção de arte, seja na atmosfera visual ou na musicalidade inocente e eclética de sempre. Enfim, temos, ao longo de uma hora e meia de projeção, a desconfiança da releitura artística que o filme vem a ser, na real, muito antes do clímax esperado.

    Releitura devido ao ponto alto da carreira que o cineasta já conseguiu alcançar “por acaso” é onde repousa seu belo e extravagante hotel. Um cume no qual não carece mais provar seus talentos e visão pessoal a mais ninguém, vide a falta de pretensão, de autoestima, e de altos e baixos de uma energia linear e constante ou mesmo de alguma dose de seriedade da história de corre-corre e de amizades inesperadas pelos caminhos. Veredas a partir e muito além dos corredores e escadas sinuosas do edifício homônimo.

    A fusão entre realidade e realidade particular pode ser uma das explicações para definir a arte de cada um; o Cinema, inclusive, o qual muitos chamam de “a arte completa” por ser justamente a fusão da maioria delas. Seja como for, e sem mais delongas, Anderson e seu elenco espetacular – Tilda Swinton aparece 5 minutos depois do início do filme, durante 60 segundos apenas, e é tão impressionante sua participação que a projeção poderia terminar com sua saída e tudo seria maravilhoso do mesmo jeito – defendem a teoria que abre este último parágrafo na aurora de uma realidade particular, a que todos nós aprendemos a amar, cada um à sua maneira, e que muito completa a verdadeira realidade das coisas.

  • Crítica | Caçadores de Obras-Primas

    Crítica | Caçadores de Obras-Primas

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    Depois do excelente Tudo pelo Poder, de 2011, a expectativa pelo novo filme dirigido por George Clooney era grande. Com uma temática interessante e um elenco carismático, poucos afirmariam que o filme fosse um fracasso. E aqueles que afirmaram, acertaram.

    Caçadores de Obras-Primas se passa no final da 2ª Guerra Mundial, quando um especialista em arte chamado Frank Stokes (Clooney) convence o então presidente Roosevelt a enviar uma força-tarefa para a Europa com o objetivo de evitar o saque, comandado por Hitler, de obras de arte guardadas em museus europeus. Para isso, ele conta com a ajuda de alguns amigos também especialistas nos mais variados ramos da arte, como James Granger (Matt Damon), Richard Campbell (Bill Murray), Walter Garfield (John Goodman), Jean Claude Clermont (Jean Dujardin), Donald Jeffries (Hugh Bonneville), Preston Savitz (Bob Balaban) e o tradutor de alemão Sam Epstein (Dimitri Leonidas). Também está presente a especialista francesa em arte Claire Simone (Cate Blanchett).

    Tentando trabalhar com grande sensibilidade um tema sobre a importância da arte em meio à guerra, o filme se utiliza de discursos em vários momentos, com músicas enaltecedoras de fundo a fim de dar um clima heroico aos personagens; isso causa embaraço no espectador, pois a função de resguardar a arte é um sentimento além de heroísmos baratos tão comuns em filmes que retratam o militarismo americano – que também recebe carta branca em relação aos tempos atuais ao mostrar como o exército dos EUA salvou o planeta dos nazistas.

    Também rasa é a construção dos personagens, todos retratados em situações cômicas e munidos de frases feitas fora de contexto, aparentando terem saído de um programa de TV da época retratada no filme.  Desta forma, torna-se dúbia a mensagem séria que a narrativa tenta impor, visto que é quebrada com piadas em toda a película.

    O retrato feito dos russos lembra os filmes de James Bond do auge da Guerra Fria, com seus vilões caricatos de cara amarrada, dando a entender que os soviéticos não foram os reais responsáveis por conter a máquina de guerra alemã. São tratados como estorvo no caminho americano de libertação e sua participação é citada apenas como um  “eles perderam vinte milhões de pessoas”, em uma afirmação também estranha de se fazer antes de terminar a guerra, quando esses cálculos só foram divulgados com certeza alguns anos depois do final do conflito. O russo retratado no filme tem tamanha importância dramática que não diz uma única palavra.

    No final, o que sobra do filme é uma ode à importância da arte como memória coletiva dos avanços da humanidade, mostrando como o papel desses homens foi importante para salvar essas obras do confinamento nazista, evitando-se uma destruição muito maior – já que, ainda assim, muitos trabalhos artísticos foram destruídos, em especial os de arte moderna e de artistas judeus. Porém, esse grupo de soldados corajosos merecia uma homenagem melhor do que esse pastiche transfigurado de drama.

    Texto de autoria de Fábio Z. Candioto.

  • Crítica | Moonrise Kingdom

    Crítica | Moonrise Kingdom

    Wes Anderson é conhecido por seus personagens estranhos e histórias um tanto surreais que, ao serem embaladas em uma direção de arte cuidadosa, constroem universos que parecem funcionar no limite entre a realidade e uma espécie de conto de fadas. Em Moonrise Kingdom, seu filme mais recente, essas características aparecem com clareza e montam um filme leve, divertido e extremamente autoral.

    O filme se passa em uma minúscula ilha na costa leste dos Estados Unidos, nos anos 60, onde vivem Suzy e Sam, uma “menina problema” e um garoto órfão. Os dois se conhecem por acaso, iniciam uma correspondência e planejam uma fuga através de uma trilha indígena famosa na região.

    Suzy e Sam se encontram por serem desajustados. Ele é órfão e detestado por seus colegas do grupo de escoteiro, ela é a filha problema de uma família “perfeita”, famosa pelas brigas violentas na escola para meninas. No entanto, conforme o filme avança vemos que todos os personagens, dos pais de Suzy ao chefe dos escoteiros, são igualmente desorientados em relação a vida e aos seus papeis no mundo e é Anderson ironiza com precisão esse desajuste entre as expectativas infantis e a desorientação dos adultos.

    Em vários momentos Moonrise Kingdom faz versões em miniaturas de filmes grandiosos: a uma sequência construída exatamente como um filme de guerra, a perseguição com motos de brinquedo a própria fuga que lembra clássicos como Bonnie e Clyde e Monika e o Desejo. Mas Anderson transforma os soldados em escoteiros e um casal de ladrões em duas crianças fugindo de casa, ele fala de pessoas comuns, pequenas e perdidas e do ridículo que as cerca.

    A paleta de cores do filme é toda construída com cores primárias ou pasteis e retoma os mesmos toms que o diretor vem usando desde seus primeiros filmes. Essa escolha, aliada a fotografia lavada, com cara de polaroid, ajudam a deslocar o filme para uma época e um lugar fora do tempo, tornando-o esse conto de fadas torto. O Narrador e a montagem evocam ainda os filmes da Nouvelle Vague, clara referência de Wes Anderson com sua simpatia por anti-heróis e desajustados, mas sempre de forma mais simples e infantil, como se o próprio cinema não merecesse ser levado a sério.

    Dessa forma, Wes Anderson articula os elementos recorrentes de seu cinema com um elenco notável e uma protagonista adorável e carismática para criar um filme que fala de um tema possivelmente dolorido, mas que o faz de forma leve, divertida e irônica. Moonrise Kingdom é irônico em cada imagem e finalmente faz jus ao humor ácido de Wes Anderson, além de ser seu melhor filme desde Os Excêntricos Tenenbaums.

    Texto de autoria de Isadora Sinay.

  • Crítica | Zumbilândia

    Crítica | Zumbilândia

    zumbilandia

    George Romero, considerado o pai do gênero, imortalizou o que conhecemos como filmes de zumbis. Desde então, não temos nos deparado com grandes novidades depois de toda a invasão de zumbis na cultura pop, salvo raras exceções. Apesar da ideia velha, Ruben Fleischer dá uma nova roupagem e tenta mesclar terror com muito bom humor. OK, isso não é novidade, vide o ótimo Todo Mundo Quase morto, mas Zumbilândia vem com a proposta de um humor mais escrachado, mais ‘americano’.

    A história é simples, Columbus (Jesse Eisenberg), personagem central da história nos apresenta o mundo de Zumbilândia, revelando algumas regras que ele diz ser fundamental para sobreviver nesse mundo, tudo isso de maneira hilária. Apesar de ser um jovem medroso, Columbus decide cruzar os EUA para encontrar seus pais, mas no meio do caminho encontra Tallahassee (Woody Harrelson), um caçador de zumbi, e decide acompanhá-lo para chegar em segurança no seu destino mais facilmente.

    Durante a jornada dos dois, duas irmãs se juntam à eles, a mais jovem Little Rock (Abigail Breslin) e Wichitta (Emma Stone), o que acaba colaborando ainda mais na construção da história e trazendo ótimas risadas ao telespectador, como em dado momento onde decidem se esconder na mansão do um ator conhecido de Hollywood e o encontram se passando por um zumbi para se misturar a multidão de mortos-vivos.

    Não tenho o que falar do elenco, apesar de ser um filme que não exige grandes atuações, todos estão muito bem. Woody Harrelson está incrível bancando o maluco depressivo, Jesse Eisenberg interpreta o nerd loser magistralmente, Emma Stone continua lindíssima e esbanjando talento, o mesmo vale para Abigail Breslin. O ponto forte é a participação especial do tal ator hollywoodiano, o que só vem a enriquecer ainda mais o filme.

    Enfim, se ainda não tiveram a oportunidade de conferir, assistam sem medo. Apesar de não ter grandes novidades para o universo dos mortos-vivos, com certeza te fará rir bastante.