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  • Crítica | Eternos

    Crítica | Eternos

    Crítica Eternos

    Um grande receio se estabeleceu sobre o futuro da Marvel nos cinemas após Vingadores: Ultimato e da terceira fase de filmes, os rumos das histórias não pareciam (ao menos para o público) ter um norte tão certo e em meio a toda essa confusão, se produzia Eternos, filme de equipe, formada por seres poderosíssimos, que não envelhecem dirigido pela oscarizada Chloé Zhao (Nomadland). A história é simples e adapta para a grande tela os personagens de Jack Kirby  e havia bastante receio por parte dos fãs antigos por mexer com esse cenário estilo escapismo cósmico.

    A história engloba variações no tempo, com momentos antes da criação do planeta Terra, onde os seres supremos chamados Celestiais criaram duas categorias de criaturas poderosíssimas, os Eternos, homens e mulheres de raças diversas super poderosos, e os Deviantes, criaturas fortes, destruidoras e irracionais. O antagonismo entre as partes serve como a desculpa perfeita para que esses seres tão fortes não tenham interferido em questões como a invasão  chitauri em Os Vingadores, as ações do titã louco em Vingadores: Guerra Infinita ou demais eventos cósmicos, pois o celestial que os comandava, Arishem não permitia isso dada sua rigidez.

    Esse possivelmente é o mais diferente dos filmes Marvel desde que James Gunn fez Guardiões das Galáxias, embora no caso dos Eternos haja mais fama em torno do nome de grupo, até por conta de serem uma criação tão elogiada de Kirby. As semelhanças obviamente param no fato de esses não serem personagens do primeiro escalão da editora e de ser uma obra sobre um time, e não um personagem específico, embora Sersi (Gemma Chan) seja claramente uma protagonista.

    Eternos foi bastante criticado antes mesmo da estreia. Uma das maiores reclamações era de que o filme soava genérico, critica que certamente não cabe. Se Homem de Ferro, Doutor Estranho e Homem-Formiga tem o mesmo “esqueleto” de roteiro, não se pode dizer que a origem dos poderosos protagonistas foi tratada da mesma forma. Há espaço para lidar com cada um dos 10 personagens, e mesmo que o foco narrativo seja especialmente em três deles — Sersi, Icaris e Duende. Tanto Gilgamesh, Druig, Makkari, Phastos, Kingo, Ajak e Thena tem ao menos um momento de brilho e protagonismo, pontuado claro pelo bom desempenho de seu elenco.

    As lutas são bem legais, e Zhao ainda permite que boa parte do humor seja referencial aos gibis, afinal, essa é uma adaptação de HQ. Muitos fãs puristas reclamaram por haver menção direta a personagens do panteão da DC. Essa é uma questão tão boba que surpreende que tenha causado tanta espécie em 2021.

    Se a reclamação geral fosse a respeito do arco dramático de Duende, que apresenta um complexo de inferioridade e dificuldade de auto aceitação por ter o corpo de uma criança, até faria sentido criticar. Visto que ela viveu mais de 7 mil anos, incluindo aí eras onde não havia tabu em relações entre homens adultos e crianças, considerando que poucos séculos atrás um homem já grande e senhor de si poderia desposar uma moça de 12, 13 anos, essa não deveria ser uma questão, pois é um tabu de época, e isso se agrava dado que seu poder natural é iludir e mudar de forma. Se a ideia era ser fiel ao conceito pensado por Kirby, não seria difícil dribla-lo, tampouco inédito visto que Thanos nos gibis era um deviante e para justificar a não presença dos personagens nos últimos filmes da  terceira fase, ele claramente não é desta raça.

    Apesar de não ser profundo, o roteiro discute questões pontuais, como obediência cega as ordens superiores, que pode facilmente ser vista como uma crítica a miopia de quem segue rígidos dogmas religiosos. A participação de Salma Hayek nesse ponto serve bem ao propósito de  dar dimensão e importância a essas questões. Outro bom exemplo de bom desenvolvimento são algumas relações não românticas, em especial entre Gilgamesh e Thena, cujo arco fala sobre tolerância, sobre condições de saúde extrema e dá pistas ao público de que algo estranho ocorre, além de dar a Angelina Jolie a oportunidade de apresentar seus  dotes dramáticos, além é claro de fazer um bom dueto com Ma Dong-seok.

    Um filme com tantas idas e vindas temporais poderia soar confuso, mas isto não ocorre. O problema de fato é  a batalha final, pois ela existe em uma confusão que faz pouco sentido, e em um combate onde todas as forças que antes eram aliadas, ficam se contendo, para haver um embate equilibrado. A  conclusão não faz muito sentido, soa forçada, com detalhes cuidadosamente pensados para deixar gancho para continuações, mesmo que seja pouco provável que ocorra um Eternos 2.

    Eternos acerta mais do que erra, e possivelmente será o farol e tendência para os novos filmes da Capitã Marvel, do Aranha e demais produtos, voltados para o Team Up como já foi com Viúva Negra e as séries WandaVision e Falcão e Soldado Invernal. O que poderia ser melhor é cuidado com o visual dos Deviantes, que poderiam ser menos parecidos com meras imitações de filmes de fantasia recentes, além da ainda intensa necessidade de plantar eventos para  o futuro dos filmes do estúdio, visto que tal qual a revista de Kirby, esta obra de Zhao se sustenta por si só.

  • Crítica | Malévola: Dona do Mal

    Crítica | Malévola: Dona do Mal

    Malévola foi uma das pedras fundamentais da empreitada de live actions da Disney, e seu sucesso passou principalmente pelo fato de desconstruir as  questões básicas dos contos de fadas. Cinco anos após o filme de Robert Stromberg, entra Joachim Rønning, o mesmo que dirigiu Expedição Kon Tiki e Piratas do Caribe: A Vingança de Salazar para finalmente dar luz  a Malévola: Dona do Mal, um filme que já começa estranho, explicando que a personagem-título se tornou vilã novamente aos olhos dos humanos comuns, entre eles, o reino de Ulstead, onde moram os pais do  príncipe Phillip. Toda essa configuração é estranha, não faz sentido, mas tudo isso é subalterno, graças ao retorno dos personagens e do elenco capitaneado por Angelina Jolie.

    A terra dos Moors (as criaturinhas mágicas, que agora tem algum senso de comunidade) é atacada por homens gananciosos, espantados obviamente pela protetora da floresta, que expõe seus chifres e asas. A música de Geoff Zanelli até dá algum charme a esses momentos, mas tanto as cores saturadas quanto a péssima desculpa para tornar a personagem em uma antagonista dos ditos normais fazem o filme soar artificial e incongruente.

    A personagem de Michelle Pfeifer, a rainha Ingrith é bidimensional, mas ao menos tem  carisma, sua composição é divertida dentro da caricatura que faz. Seus planos são maquiavélicos, preconceituosos e maniqueístas, mas em se tratando de uma historia que emula as animações antigas, faz sentido, uma vez que essa continuação não se preocupa nem com a mitologia antiga estabelecida, nem com as questões políticas antes abordadas no filme de 2014. Ao menos o roteiro registra bem o preconceito e receio da nobreza de Ulstead.

    Os novos conceitos apresentados são apressados. As questões envolvendo o povo de Malévola (os seres das trevas) lançam mão de muitos atalhos narrativos, ao ponto de não haver qualquer complexidade nos personagens de Chiwetel Ejiofor e Ed Skrein, que deveriam prioritariamente serem sedutores além do visual, especialmente na ideologia, mas isso claramente não ocorre.

    A trama trata o espectador como bobo nos momentos finais, fazendo este se assemelhar demais a O Caçador e a A Rainha do Gelo ainda que esse ainda mantenha suas protagonistas. O longa é histriônico e tenta mostrar as heroínas como falíveis, consegue se acovardar até nas medidas drásticas que toma e tem dificuldade em montar uma resolução plausível para si, e apresenta um texto é raso e até risível, contendo com uma paz conveniente e sem sentido, fazendo a rainha má ter semelhanças demais com Diabolin, de Cavalo de Fogo, no pior sentido possível.

    Malevola 2  se perde em meio as discussões políticas rasas que propõe, e faz personagens que antes haviam evoluído retornar a estaca zero, em especial a  Aurora de Elle Fanning, que desacredita firmemente sua “Madrinha”. As três fadas aliás, para nada servem, pois nem o vestido que elas fazem é utilizado. , findando a questão com piadinhas tão fracas que fazem perguntar se houve alguma revisão de roteiro antes do produto ser gravado e editado. Nem visualmente o filme funciona, detalhe esse que era bem positivo no primeiro, o que é uma pena, e faz esse se assemelhar a Alice Através do Espelhos no sentido de conseguir denegrir até o que era positivo no original.

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  • Crítica | À Beira Mar

    Crítica | À Beira Mar

    A Beira Mar 1

    De início idílico, se valendo do cenário belo e inspirador da costa francesa, acompanhado de uma filmagem linda que resume emoções conflitantes, À Beira Mar começa promissor, a contar o drama de um casal que se isola, para aos poucos revelar a intimidade e o que ocorre na confusão mental e sentimental que o assola.

    Angelina Jolie – que agora utiliza o nome Pitt ao final – interpreta Vanessa, uma esposa bela, entediada e chorosa, incapaz em todos os momentos de expressar qualquer emoção que não envolva frustração e descontentamento. Seu marido, o autor literário em bloqueio criativo Roland Bertrand (Brad Pitt), tenta, através do retiro que fazem dos Estados Unidos, resgatar a vontade de escrever, além de ensaiar uma reaproximação com seu par, fato que o incomoda e que pouco parece ter importância a ela, visto a completa abstração de sua mulher.

    O retratar do estado depressivo é muito bem exemplificado ao determinar as duas partes do casal em momentos distintos da melancolia, mostrando uma mulher inapta, antissocial e largada ao auto-abandono, e um homem sem estímulos que se sente impotente por não conseguir ajudar seu par. Os moradores e frequentadores da pousada passam a ser elementos de refúgio para o homem, enquanto um casal de vizinhos, Lea (Melanie Laurent) e Pascal (Frédéric Desager), chega e começa aos poucos a capturar a atenção da mulher, que enxerga na paixão de ambos algo há muito perdido em si e em seu par.

    O roteiro de Jolie começa muito bem, tendo ótimas sacadas ao se discutirem questões morais relativas à inveja, traição, desconfiança, ciúmes e voyeurismo. As situações envolvendo a intensa busca por inspiração resultam em momentos cuja comicidade beira o desequilíbrio, resultando em um sucesso estrondoso e improvável. O problema é o preciosismo que ataca os momentos finais das mais de duas horas de duração.

    A razão que move Vanessa a agir de maneira egoísta não é mencionada, e a sugestão ao mistério acrescenta demais à trama, gerando complexidade a sua persona, quase justificando toda a misantropia e recalques psíquicos que a assolavam. Suas atitudes de intrusa e de péssima companheira passam a pesar quando o motivo torna-se óbvio, resultando num sem número de ações mal construídas dentro do roteiro.

    Ao menos a condução de atores é feita de um modo interessante, com momentos para cada um dos três principais personagens – e astros – brilharem em momentos solos, com diálogos e situações inteligentes pulverizadas entre eles, não sendo monopólio nem de Pitt ou Jolie as atenções dramáticas do longa, com momentos de brilho esporádico não só para os análogos mais jovens, como para Niels Arestrup, que faz um mentor estereotipado que funciona em cada momento em que aparece.

    O embate que poderia ser interessante, entre Laurent e Jolie, duas diretoras/atrizes promissoras em cena, se dilui em meio a explicações baratas que fazem eco com as piores manias do cinema mainstream, vistas principalmente em Interestelar e em seus primos. A comparação com Sr. e Sra. Smith, que seria em tom de piada, quase se justifica graças aos tropeços da direção.

    O conto, que poderia ter sido mais, soa bobo e infantil, distante do que a premissa previa, sobrando uma fotografia e edição competentes, caindo sobre Angelina Jolie Pitt os mesmos pecados vistos em seu filme anterior, Invencível, ainda que À Beira Mar não seja um produto panfletário e cafona, ao menos não até o seu final, que abraça por completo o segundo adjetivo. Gera sobre o casal de atores a pecha de metalinguagem da crise conjugal, com a teoria de que o incômodo passado em tela reflete de certa forma o drama do casal.

  • Crítica | A Troca

    Crítica | A Troca

    a troca

    A Troca (Changeling, EUA, 2008) acabou sendo um dos filmes mais diferenciados da carreira de Clint Eastwood como diretor por causa da temática progressista dentro de uma absurda história real de uma mãe que tem seu filho sequestrado e a polícia devolve outra criança no lugar.

    A telefonista e mãe solteira Christine Collins tem seu único filho levado por um estranho em 1928 e a polícia de Los Angeles devolve outra criança. Com a ajuda do reverendo Gustav Briegleb, ela entra em uma luta contra toda a polícia e acaba desbancando a corrupção dentro da corporação.

    O roteiro original de J. Michael Straczynski acerta ao seguir cronologicamente os fatos reais. Ao fazer sumir a criança logo no começo e ver que poucos policiais cooperam com o caso, já temos uma ideia do enorme drama que aquela mãe vai enfrentar. Ser apresentada à outra criança pela polícia com o intuito de posar para os jornais só piora a sua psiquê e estabelece o grande dilema ético do filme.

    A teoria de conspiração que começa a permear a sua cabeça faz com que ela seja presa por policiais corruptos e vá parar no sanatório. A não cooperação com o médico da instituição demonstra a qualidade inquebrável da protagonista e é aí onde reside a força do roteiro. A luta incansável da protagonista só revela outros temas relevantes ao filme: ela precisou do auxílio do reverendo Gustav Briegleb para tirá-la do sanatório e ajudar na batalha dentro do tribunal contra o departamento de polícia.

    A atuação de Angelina Jolie é contida em quase a totalidade do filme, conseguindo criar uma mãe arrasada e sem vida, já que está sem seu filho. Ela se sobressai principalmente nas cenas dentro do sanatório, as mais memoráveis e que mais dialogam com a premissa do filme. John Malkovich, por sua vez, dá vida ao reverendo revoltado com a corrupção imoral da polícia de Los Angeles, suas nuances e atuação não comprometem a obra.

    A direção de Clint Eastwood continua sublime na composição do quadro e no posicionamento da câmera. Porém, ele opta pelo tom melodramático na direção geral dos atores, o que faz cair um pouco a qualidade de A Troca.

    A fotografia de Tom Stern (que trabalha com Clint desde Dívida de Sangue) é característica de filme de época, mas não é realista; possui um tom um pouco onírico. A edição de Joel Cox (que começou a trabalhar com o diretor em Rota Suicida) em parceria de Gary Roach (edita seus filmes desde Cartas de Iwo Jima) é invisível na maior parte da narrativa, não há um plano memorável.

    A Troca é dos filmes mais diferenciados de Clint Eastwood por causa da temática, que junto de Invictus e Cartas de Iwo Jima talvez seja a trilogia mais progressista do cineasta ao longo da sua carreira como diretor.

    Texto de autoria de Pablo Grilo.

  • Crítica | Invencível

    Crítica | Invencível

    invencivel 1

    Invencível, novo filme dirigido por Angelina Jolie, adaptado do livro Invencível – Uma História de Sobrevivência, Resistência e Redenção, conta com os irmão Coen no roteiro para dar corpo à vida e à memória do atleta olímpico Louis Zamperini (Jack O’Connor), que após sobreviver 47 dias no mar é feito refém pelos japoneses durante a Segunda Guerra Mundial.

    A literalidade da obra não fica apenas no título, porém. Invencível é um drama clássico, ao menos em teoria, feito aos moldes da Poética de Aristóteles: é a síntese da busca pela catarse através da dor e sofrimento, com o objetivo de nos provocar medo e compaixão, para, em seguida, entregar uma breve purificação como fruto do sofrimento compartilhado.

    Apesar de seguir à risca o caminho canônico da tragédia dramática, falta a Jolie e ao roteiro dos Cohen o compartilhamento sobre o real estágio humano de seu protagonista, que em nenhum momento parece saber por que sobreviver. Falta comunicação com o espectador e um fio condutor melhor resolvido do que a frase “se puder suportá-los, pode vencê-los”, a qual Zamperini leva consigo como mantra.

    Datado como obra, Invencível não só é aristotélico como também platônico. Ao trabalhar diversos combates e situações em um plano quase etéreo, eleva seu protagonista aos céus, enquanto seus companheiros – tão sofridos quanto – mantêm-se no plano mundano. Jolie idealiza seu protagonista a ponto de achar que não precisamos de suas motivações, e que sua sobrevivência fala por si. Fora das convenções do cinema, sua fibra moral é óbvia, mas em determinado momento Zamperini deixa de reagir às privações, o que é problemático em termos de dramaturgia.

    Isso influencia no trato dos coadjuvantes, subaproveitados, que poderiam ter dado um pouco mais de sustância ao roteiro se houvesse nisso a tentativa de decodificar Zamperini ao público. A idealização faz sentido, já que o veterano foi vizinho e amigo pessoal de Angelina Jolie, chegando a participar ativamente da produção. Mas ao espectador falta justamente a catarse, da qual temos apenas vislumbres, como na belíssima composição da batalha ideológica do personagem principal e seu algoz, o sargento Watanabe, que perde seu potencial de conquistar até mesmo o mais blasé dos espectadores ao reafirmar a santidade do atleta olímpico e fazendo da cena um bem filmado exercício de futilidade. O resultado são 162 minutos do que seria uma bela história de resiliência filmada como se fosse apenas teimosia da parte de Louis.

    A crítica especializada (sic) diz que, quando uma crítica começa a análise falando bem sobre a fotografia do filme, é porque este não é tão bom, mas sim simpático. Simpático, mas nada empático; bonito, mas carece de poder cinematográfico, pois logo nas primeiras cenas a mão pesada da montagem enfeia todas as incríveis composições da direção de fotografia idealizada por Roger Deakins (Onde os Fracos Não Têm Vez, 007 – Operação Skyfall), e consegue tornar o filme mais insensível do que seu roteiro ao simplesmente não nos permitir contemplar cena alguma por carecer de ritmo. Não há suspiro quando deveria haver, nem tensão quando deveria haver. A tentativa de tensão é feita sem sutileza na transposição das cenas, levando o espectador a perder-se geograficamente mesmo em ações simples.

    Não faltará nem mesmo a tradicional explanação sobre o destino de seus personagens, apenas burocraticamente colocada para arremate. Um trabalho visualmente muito bonito e inspirado que funcionaria melhor em mãos mais delicadas e focadas.

    Texto de autoria de Marcos Paulo Oliveira.

  • Crítica | Malévola

    Crítica | Malévola

    malevola

    Originários da tradição oral, os contos de fadas caracterizam-se um dos gêneros mais antigos da literatura. Histórias consideradas, hoje, como infantis foram, em séculos passados, carregadas de violência e eram transmitidas culturalmente como parte do folclore local, motivo que justifica diversas versões para uma mesma narrativa. Durante os séculos, escritores como Charles Perrault, Jean de La Fontaine e os Irmãos Grimm foram responsáveis por documentar a tradição popular da época em que viveram, modificando as histórias conforme suas particularidades regionais ou alterando suas estruturas, deixando-as mais amenas e familiares.

    Nas telas, o estúdio de Walt Disney produziu diversos clássicos animados com base nestas histórias, originando novas versões narrativas – que muitos consideram definitivas – de contos como Branca de Neve e os Sete AnõesA Pequena Sereia, Cinderela e A Bela Adormecida. Filmes que trouxeram prestígio à empresa e formaram as modelares princesas Disney.

    Seguindo o sucesso de Alice No País das Maravilhas, cuja adaptação cinematográfica em live-action trouxe à produtora um retorno financeiro alto em 2010, a obra A Bela Adormecida, de 1959, ganha uma nova versão. Dessa vez, a história foca o lado da fada Malévola, que amaldiçoa a princesa Aurora.

    A história de Malévola utiliza a base do clássico citado, pervertendo-o ao mostrar a visão da antagonista. Malévola é uma pequena fada poderosa que vive em uma floresta encantada situada ao lado de um reino. Em sua infância, conhece o garoto Stefan, com quem mantém a amizade até a adolescência, quando se afastam um do outro.

    Malévola torna-se uma das fadas mais poderosas do reino e guardiã da floresta dos ataques humanos que desejam destruir o local, tido como ameaçador. Após uma dessas batalhas, o Rei, ferido e prestes a morrer, exige o aniquilamento da fada e coloca o trono à disposição de quem matá-la. Almejando o cargo de rei, o outrora menino Stefan reencontra-se com sua antiga amiga e usurpa-lhe as asas.

    Como uma costumeira produção Disney, faltam elementos que explorem a transformação da personagem de maneira adequada. Ao ser traída pelo amigo memorial da infância, não há nenhuma personagem em cena que produza um diálogo com a futura vilã. Ao público, cabe inferir sua transformação na estranha cena em que, caminhando pelo reino outrora brilhante, o local começa a se tornar lúgubre e ameaçador. Até a transformação que alinha a personagem com a história oficial, o roteiro de Linda Woolverton  que também roteirizou a recente adaptação de Alice no País das Maravilhas, e as animações O Rei Leão, A Bela e a Fera, entre outras  parece apressado, apresentando um apanhado ocasional de cenas que não justifica o porquê Malévola foi uma fada injustiçada.

    A personagem acrescenta tonalidades ao costumeiro preto e branco do estúdio. Uma constatação de que os tempos de outrora  com o costumeiro maniqueísmo Bem versus Mal   estão extintos, o que prova que o público não deseja mais ver uma tradicional fábula sobre a princesa que espera o amor perfeito. Sob este aspecto, a Disney luta para evidenciar que reconhece as mudanças da sociedade, modificando o paradigma narrativo e rindo de si mesma  como Encantada —, tornando-se capaz de produzir histórias de princesas que atendam às novas exigências dos espectadores.

    O sentimento de traição que se manifesta em Malévola é o elemento que causa a maldição  sono eterno até que um amor verdadeiro a desperte — à recém-nascida Aurora. Uma das mais grandiosas cenas das animações Disney que a nova versão honra com pompa e mantém a mesma dimensão épica, fato que comprova que Angelina Jolie é a parte mais consistente da produção.

    Ainda que o roteiro seja mediano, sua interpretação passa  nuances necessárias de uma transitória personagem dúbia. Sem exagerar nos trejeitos de vilões  que os deixam caricatos —, a atriz demonstra que entrou em cena para se tornar uma bela encarnação da antagonista.

    Se a fotografia e o ambiente à meia-luz são esteticamente belos a cada fotograma, o contrato feito com o público, em relação à veracidade narrativa, falha na maior parte do roteiro. Tentando enfocar em demasia o lado sombrio de Malévola, outras personagens importantes à trama se tornam simplistas. As três fadas-madrinhas, que criam Aurora até os 16 anos da princesa, parecem despropositadas tanto como personagens quanto com importância à história. O exagero dos efeitos especiais fazem as fadas  vistas na maioria das vezes em tamanho diminuto — parecerem pequenas bonecas voadoras e não seres de um mundo maravilhoso. Um desequilíbrio que lembra o excesso estético e agoniante da Alice no País das Maravilhas, de Tim Burton.

    Quando a personagem Aurora encontra-se com Malévola, não há nenhuma empatia pela mocinha. Em parte porque Ellen Fanning não tem a  mesma presença cênica de Jolie, e também porque nem em cenas solo consegue roubar um pouco de atenção para si.

    A própria carência narrativa revela uma questão maior que equipara o desfecho dessa produção com o de Frozen – Uma Aventura Congelante. Tal semelhança faz questionar até onde a Disney estaria disposta a modificar sua estrutura narrativa, visto que, em menos de um ano, entregou duas produções com a mesma lição moral que substitui o suposto amor entre príncipe e princesa e faz do sentimento fraternal ou maternal o gatilho que quebra a maldição. Mesmo ciente de que o público atual exige um novo conceito nos filmes de princesas e reinos encantados, a empresa não parece desejar o desenvolvimento de novas saídas que não uma outra fórmula a ser repetida mais de uma vez.

    Com um roteiro fraco diante de um rico material, não há consistência na história que produza um ótimo filme familiar. Pena para Jolie, que entra em cena com vontade de fazer um grande desempenho, mas não encontra o ambiente necessário ao desejo de ser a Malévola definitiva.

  • Crítica | O Colecionador de Ossos

    Crítica | O Colecionador de Ossos

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    Não há mediano no universo de filmes policiais. Ou a trama sustenta-se e consagra-se ou vira história mal contada com elementos de investigação. Atualmente, o cinema preocupa-se muito mais em criar uma atmosfera violenta, pelo choque que causa no público, do que conduzir uma boa investigação, coerente e instigante, mesmo que isso seja sinônimo de uma história mais tradicional.

    O Colecionador de Ossos tornou-se um defensor de um estilo não mais em voga, preocupado em justificar a função de cada assassinato no enredo e nunca tirar de cena um dos elementos primordiais da narrativa de investigação: o detetive. Baseada na obra de Jeffery Deaver, a trama desenvolve a dinâmica de dois policiais díspares que, devido à importância do caso, são obrigados a trabalhar juntos.

    A formulação da parceria entre as personagens é composta de maneira não usual. Promove um brilhante detetive forense, incapacitado por um acidente, e uma novata descontente com o departamento em que trabalha. Juntos, a unidade que a dupla produz se torna eficaz, utilizando a experiência de um homem preso a uma cama e um precoce instinto forense de uma policial novata, ainda não acostumada com a brutalidade dos crimes.

    A interpretação de Denzel Washington impressiona pela limitação da personagem. O ator consegue, utilizando apenas o rosto e o tom da voz, expressar a amargura de um homem limitado fisicamente, ciente de que seu quadro clínico não será melhor, e o brilhantismo de um detetive dedicado, em anos de profissão, a estudar e compreender a difícil ciência forense, tornando-se uma referência no assunto e com vários livros publicados. Enquanto Angelina Jolie, ainda não glamourizada pela beleza ímpar, entrega eficiência entre certa beleza ordinária de uma policial bem composta, com personalidade forte, fundamentando credibilidade à trama.

    O sucesso do filme se deu, em boa parte, pelo fato do público acompanhar com os detetives a evolução das mortes e a investigação do caso. Abstendo-se de revelações surpreendentes ou reviravoltas no roteiro como gancho. Preocupando-se em manter a coerência da história para que ela potencialize o suspense da investigação e a eventual revelação dos culpados.

    Estranhamente, nunca houve uma continuação, embora os romances de Deaver deem sequência à parceria das personagens. O livro que originou esta produção foi o primeiro a apresentá-las e, também com estrutura tradicional, apresenta com excelência seu crime e seus desenlaces, sendo uma recomendação a quem gosta do gênero ou se interessou pelas personagens.

  • Agenda Cultural 16 | Religião, Política e… Hello Kitty?

    Agenda Cultural 16 | Religião, Política e… Hello Kitty?

    Cinema em alta esta semana na sua Agenda Cultural. Me refiro aos convidados Marcos Noriega e Angélica Hellish do site Masmorra Erótica. Teatro está de volta neste edição, que também conta com blues, cinema francês e uma dica literária do fim do mundo!

    Duração: 69 min.
    Edição: Flávio Vieira
    Trilha Sonora: Flávio Vieira

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    Quadrinhos

    Bórgia Vol. 3
    Testamento: Magneto

    Literatura

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    Teatro

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    Stevie Ray Vaughan – Couldnt Stand The Weather (legacy edition)

    Cinema

    Todo poderoso: O filme – 100 anos de Timão
    Um Novo Caminho
    Uma noite em 67
    Salt
    Ponyo – Uma Amizade Que Veio do Mar

    Produto da Semana

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