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  • Crítica | Dupla Explosiva 2: E a Primeira-Dama do Crime

    Crítica | Dupla Explosiva 2: E a Primeira-Dama do Crime

    Era apenas uma questão de tempo para que Dupla Explosiva, a comédia de ação estrelada por Ryan Reynolds e Samuel L. Jackson que foi sucesso de bilheteria no ano de 2017, ganhasse uma continuação. Porém, enquanto o primeiro filme divertia bastante ainda que possuísse certos problemas, esse aqui erra em praticamente tudo o que tenta.

    Seguindo a cartilha de Hollywood que dita que as sequências devem ser maiores e mais barulhentas que o original, Dupla Explosiva 2 amplifica tudo o que havia no primeiro. Entretanto, a balança se inverte e aqui os defeitos superam as qualidades. Na trama, o guarda-costas Michael Bryce (Reynolds) abandona sua licença sabática para proteger Darius (Jackson) e Sonia (Salma Hayek) depois que ela revela estar sendo perseguida por Aristotle Papadopolous (Antonio Banderas), um louco bilionário que está em poder de uma arma que pode destruir o mundo.

    Chega a ser impressionante um filme com um orçamento de 70 milhões de dólares possuir uma produção tão pobre. O excesso de CGI mal feito chega a ser irritante e compromete demais. Existem cenas que nem são de ação, mas que deixam claro o péssimo uso da tela verde. Ainda no tópico da ação, o diretor Patrick Hughes já havia demonstrado competência na condução de cenas do tipo no primeiro Dupla Explosiva e no terceiro Os Mercenários. Entretanto, aqui não faz nada digno de nota, somente um amontoado de clichês prejudicados por uma edição fraca. O humor do filme é tão pobre quanto, e aposta na repetição de piadas de constrangimento e cunho sexual que parecem ter saído de um derivado ruim de American Pie.

    O trio de protagonistas é enervante. Parece que Jackson e Hayek estão competindo para saber quem grita mais alto. Reynolds, desde que fez sucesso em Deadpool, parece interpretar qualquer personagem de uma só maneira. Ele repete o que fez antes em Esquadrão 6 e o que faria em Alerta Vermelho, com o agravante de emular o personagem mutante e ficar o tempo todo fazendo piadas autorreferentes, além de narrar o que está sentindo e o que está acontecendo na tela para o espectador, numa tentativa velada de quebrar a quarta parede que aqui não funciona, deixando transparecer que o filme não confia na inteligência de quem está o assistindo. Banderas até se salva interpretando seu vilão como se ele fosse um antagonista de Roger Moore nos filmes mais caricatos do agente 007. Porém, a participação de Morgan Freeman é desperdiçada por uma condução ruim que estraga boas piadas em potencial.

    Enfim, Dupla Explosiva 2 é uma experiência cansativa e enervante para o espectador, o que é uma pena. Infelizmente, por melhores que sejam os atores, não dá para apoiar um filme inteiro em carisma. É preciso mais do que isso.

    https://www.youtube.com/watch?v=8I-7eEIWKEQ&ab_channel=Ingresso.com

  • Crítica | Casa Gucci

    Crítica | Casa Gucci

    Crítica Casa Gucci

    Casa Gucci é o filme que traz Ridley Scott de volta as cinebiografias. A obra se baseia no livro Casa Gucci: Uma história de glamour, ganância, loucura e morte de Sara Gay Forden e traz a controversa história do casal formado por Patrizia Reggiani e Maurizio Gucci. A trama se passa ao longo das décadas, e tem por base três períodos distintos, exibindo uma história de amor, ressentimento e ganância.

    O Último Duelo, filme anterior de Scott bastante elogiado, portanto, havia uma grande expectativa em relação à produção de seu novo longa, seja por conta dos bastidores de um império da moda, como pelo elenco, desde o casal de protagonistas composto por Lady Gaga, que vinha de uma atuação elogiadíssima em Nasce Uma Estrela, e o sempre elogiado Adam Driver, como pelos coadjuvantes que incluía Al Pacino, Jeremy Irons, Jared Leto (em outra participação hilária e melancólica), Salma Hayek e Jack Huston.

    Na primeira hora do filme acompanhamos o relacionamento do casal, totalmente baseado no amor, que aparenta ser verdadeiro e completamente puro. Chega a ser estranho, pois até a parcela da família Gucci que compreende Maurizio parece de fato ter uma relação próxima. Em paralelo a isso o mercado da moda é mostrado como algo bastante semelhante à máfia. Com o desenrolar dos anos, acompanhamos uma série de reviravoltas e traições.

    Até se aproximar da metade, o filme é acertado, ainda que existam conveniências de roteiro. Os personagens são erráticos, repletos de tridimensionalidade e carisma. Infelizmente a metade final é bastante irregular. Nos anos finais o que mantém o espectador atento é a curiosidade de como a história se encerrará. Em alguns pontos, o filme parece uma minissérie biográfica com orçamento vultuoso.

    Os momentos finais comprometem bastante os bons momentos do filme. O cineasta repete boa parte dos erros de Todo o Dinheiro do Mundo, embora Casa Gucci tenha um roteiro mais interessante. No final das contas, o longa servirá para tentar angariar uma ou outra indicação ao Oscar e, possivelmente, uma estatueta ou outra para categorias técnicas como maquiagem, figurino e melhor atriz.

  • Crítica | Eternos

    Crítica | Eternos

    Crítica Eternos

    Um grande receio se estabeleceu sobre o futuro da Marvel nos cinemas após Vingadores: Ultimato e da terceira fase de filmes, os rumos das histórias não pareciam (ao menos para o público) ter um norte tão certo e em meio a toda essa confusão, se produzia Eternos, filme de equipe, formada por seres poderosíssimos, que não envelhecem dirigido pela oscarizada Chloé Zhao (Nomadland). A história é simples e adapta para a grande tela os personagens de Jack Kirby  e havia bastante receio por parte dos fãs antigos por mexer com esse cenário estilo escapismo cósmico.

    A história engloba variações no tempo, com momentos antes da criação do planeta Terra, onde os seres supremos chamados Celestiais criaram duas categorias de criaturas poderosíssimas, os Eternos, homens e mulheres de raças diversas super poderosos, e os Deviantes, criaturas fortes, destruidoras e irracionais. O antagonismo entre as partes serve como a desculpa perfeita para que esses seres tão fortes não tenham interferido em questões como a invasão  chitauri em Os Vingadores, as ações do titã louco em Vingadores: Guerra Infinita ou demais eventos cósmicos, pois o celestial que os comandava, Arishem não permitia isso dada sua rigidez.

    Esse possivelmente é o mais diferente dos filmes Marvel desde que James Gunn fez Guardiões das Galáxias, embora no caso dos Eternos haja mais fama em torno do nome de grupo, até por conta de serem uma criação tão elogiada de Kirby. As semelhanças obviamente param no fato de esses não serem personagens do primeiro escalão da editora e de ser uma obra sobre um time, e não um personagem específico, embora Sersi (Gemma Chan) seja claramente uma protagonista.

    Eternos foi bastante criticado antes mesmo da estreia. Uma das maiores reclamações era de que o filme soava genérico, critica que certamente não cabe. Se Homem de Ferro, Doutor Estranho e Homem-Formiga tem o mesmo “esqueleto” de roteiro, não se pode dizer que a origem dos poderosos protagonistas foi tratada da mesma forma. Há espaço para lidar com cada um dos 10 personagens, e mesmo que o foco narrativo seja especialmente em três deles — Sersi, Icaris e Duende. Tanto Gilgamesh, Druig, Makkari, Phastos, Kingo, Ajak e Thena tem ao menos um momento de brilho e protagonismo, pontuado claro pelo bom desempenho de seu elenco.

    As lutas são bem legais, e Zhao ainda permite que boa parte do humor seja referencial aos gibis, afinal, essa é uma adaptação de HQ. Muitos fãs puristas reclamaram por haver menção direta a personagens do panteão da DC. Essa é uma questão tão boba que surpreende que tenha causado tanta espécie em 2021.

    Se a reclamação geral fosse a respeito do arco dramático de Duende, que apresenta um complexo de inferioridade e dificuldade de auto aceitação por ter o corpo de uma criança, até faria sentido criticar. Visto que ela viveu mais de 7 mil anos, incluindo aí eras onde não havia tabu em relações entre homens adultos e crianças, considerando que poucos séculos atrás um homem já grande e senhor de si poderia desposar uma moça de 12, 13 anos, essa não deveria ser uma questão, pois é um tabu de época, e isso se agrava dado que seu poder natural é iludir e mudar de forma. Se a ideia era ser fiel ao conceito pensado por Kirby, não seria difícil dribla-lo, tampouco inédito visto que Thanos nos gibis era um deviante e para justificar a não presença dos personagens nos últimos filmes da  terceira fase, ele claramente não é desta raça.

    Apesar de não ser profundo, o roteiro discute questões pontuais, como obediência cega as ordens superiores, que pode facilmente ser vista como uma crítica a miopia de quem segue rígidos dogmas religiosos. A participação de Salma Hayek nesse ponto serve bem ao propósito de  dar dimensão e importância a essas questões. Outro bom exemplo de bom desenvolvimento são algumas relações não românticas, em especial entre Gilgamesh e Thena, cujo arco fala sobre tolerância, sobre condições de saúde extrema e dá pistas ao público de que algo estranho ocorre, além de dar a Angelina Jolie a oportunidade de apresentar seus  dotes dramáticos, além é claro de fazer um bom dueto com Ma Dong-seok.

    Um filme com tantas idas e vindas temporais poderia soar confuso, mas isto não ocorre. O problema de fato é  a batalha final, pois ela existe em uma confusão que faz pouco sentido, e em um combate onde todas as forças que antes eram aliadas, ficam se contendo, para haver um embate equilibrado. A  conclusão não faz muito sentido, soa forçada, com detalhes cuidadosamente pensados para deixar gancho para continuações, mesmo que seja pouco provável que ocorra um Eternos 2.

    Eternos acerta mais do que erra, e possivelmente será o farol e tendência para os novos filmes da Capitã Marvel, do Aranha e demais produtos, voltados para o Team Up como já foi com Viúva Negra e as séries WandaVision e Falcão e Soldado Invernal. O que poderia ser melhor é cuidado com o visual dos Deviantes, que poderiam ser menos parecidos com meras imitações de filmes de fantasia recentes, além da ainda intensa necessidade de plantar eventos para  o futuro dos filmes do estúdio, visto que tal qual a revista de Kirby, esta obra de Zhao se sustenta por si só.

  • Crítica | Gente Grande 2

    Crítica | Gente Grande 2

    Gente Grande 2 começa de maneira bizarra, com um cervo digital (e dos mais fajutos) invadindo o quarto de Lenny Feder (Adam Sandler) e sua esposa Roxane (Salma Hayek), desencadeando uma louca introdução, com o animal digital atravessando a casa, para além de reintroduzir o núcleo familiar como o principal entre os que serão mostrados, ainda ter tempo de já nos primeiros instantes, fazer piada com excrementos, com o bicho urinando nos membros do clã.

    Denis Dugan e Sandler retomam sua parceria cinco anos depois de Gente Grande, e se percebe que os Feder vão enfim morar na mesma cidade de seus amigos e antigos desafetos, então os encontros são bem mais freqüentes.

    Como não é movido por um evento ou reunião, os personagens podem confraternizar com os mesmos com quem tinham rivalidade no primeiro filme, sem maiores problemas ou justificativas, além disso, os filhos dos amigos acabam tendo um entrosamento maior, graças a presença mais presente deles..

    O fato do roteiro ser mais frenético faz aplacar a ausência de Rob Schneider, embora falte alguém que seja o saco de pancadas de piadas, que basicamente, são disseminadas entre  os personagens mais velhos, que sofrem claro algum nível  de bullying de estudantes universitários. Esse conflitos fazem esse ter algumas semelhanças com Vizinhos 2, que seria lançado alguns anos após esse.

    As participações especiais seguem com boa parte dos atores e humoristas que orbitam os filmes da Happy Madison, como Nick Swardson, Steve Buscemi, Georgina Engel, Jon Lovitz, e até o ex pivô da NBA Shaquille O’Neal que alias, tem um cabelo raspado dos mais falsos possível, com uma peruca igualmente fajuta.

    Diferente do primeiro filme, esse não se preocupa muito em ter um humor familiar e inocente. Havia sim algumas insinuações sexuais no primeiro episodio da franquia, mas nada tão explicito e torto quanto a apresentação de balé das crianças comandada por April Rose, ao mesmo tempo, o longa trata de sexualizar também os homens, numa cena de lava jato com atores semi famosos, como Andy Samberg, Patrick Schwarzenegger etc. A cena fica tão grotesco que inclui até Peter Dante dando banho em Shaq.

    O final  é apoteótico e quebra um pouco do marasmo que foi quase todo esse Gente Grande 2, a repetição da formula faz a historia sair muito desgastada, mas o carisma de Sandler, David Spade, Kevin James e Chris Rock ajuda a salvar um pouco o todo, especialmente pelo entrosamento entre eles e pela possibilidade de não ficar tão limitado em matéria de cenário e que pode enfim  ser mais generalista.

    https://www.youtube.com/watch?v=wGyjbrMC-Ok

  • Crítica | Dogma

    Crítica | Dogma

    O quarto filme para o cinema dirigido por Kevin Smith como diretor, Dogma começa com um disclaimer, um aviso de que os eventos ali são uma brincadeira, uma paródia e que é preciso ter senso de humor, mesmo ao se falar do Divino, uma vez que Deus teria senso de humor. Antes mesmo da ação começar, já há uma boa localização do que seria explorado pelas próximas duas horas.

    A ação começa com um grupo de meninos agredindo um senhor de idade, em atenção à promessa do livro das Revelações (também chamado de Apocalipse). Enquanto isso, a Igreja Católica, através do Cardeal Glick (George Carlin) tenta soar mais atual, abrindo mão do Jesus Crucificado, para uma figura descolada do Messias, chamada de Cristo Amigo, que é basicamente Jesus apontando para frente, com a mão no coração, piscando, tal qual o meme do “Jesus Maneiro”.

    Enquanto isso, os anjos, Loki (Matt Damon) e Bartleby (Ben Affleck) tentam desenganar fiéis cristãos. Azrael é bem representado por Jason Lee, um demônio nada sutil. Aparentemente, os seres sobrenaturais invadem a terra e interferem no cotidiano dos personagens suburbanos e comuns, e a cena mais medonha  talvez seja Metatron, de Alan Rickman, o anjo que revela sua falta de sexo em um momento perturbador.

    Os serafins e demais anjos transitam na Terra à vontade, como se fossem seus donos, e isso é natural, afinal, estão vivos antes dos homens, e querem aproveitar o pouco que resta desse lugar. Smith faz uma espécie de filme coral, repleto de núcleos e missões divinas, pelo lado dos anjos rebeldes como Loki e Bartleby, e dos anjos bons, que  mesmo sendo justos, também destilam humor ácido e referencial.

    Para quem está acostumado com a carreira do diretor, é estranho ver Jay e Silent Bob como protetores da humanidade/profetas, mas em se tratando de época de crise, qualquer ajuda é válida. O filme não se leva a sério nem sequer quando trata das regras básicas da vida, os soldados de Azrael cortam o ar e se teletransportam do nada, com tacos de hockey, Loki e Bartleby fazem apostas com vidas humanas que cometem pecado, matando pessoas aleatoriamente basicamente porque podem – não sem antes ter um diálogo sensacional, que afirma que um homem casado não beija sua esposa de maneira lasciva – e homens mortos a dois mil anos caem do céu.

    Rufus, o personagem de Chris Rock vem para revelar algumas informações fundamentais, não só para a humanidade, mas também para o grupo de heróis que se reúne, com Jay, Bob e Bethany, e cada um deles tem um detalhe de sua vida revelado. Os personagens  de Jason Mewes, Smith, Linda Fiorentino reagem de maneira diferente um do outro quando confrontados, e para um filme de 1999, este estava bem a frente de seu tempo, principalmente quando demonstra o quão frágil é a perspectiva de vida e masculinidade de Jay, que não consegue aceitar sua orientação sexual gay ou bissexual, e precisa provar ser heterossexual a todo momento. O mundo está em colapso, mas refletir sobre preconceitos segue importante, ao menos pelos que cercam Rufus, que é o apóstolo mais livre de pensamentos retrógrados.

    O escopo de discussão aumenta com a personagem de Salma Hayek, que diz que a Biblia foi mal editada, e replicou preconceitos contra mulheres que não correspondiam a realidade. A musa, Serendipity inverte o arquétipo do orelha, explica mais do que os personagens querem saber, mas levanta boas dúvidas a respeito de como o mundo foi feito e como seu Criador foi transformado em uma figura misógina, quando na verdade sua face real era uma mulher.

    O terço final não é tão legal e divertido quanto os outros dois, a forma como os personagens bons derrotam os maus contém algumas boas piadas, mas não tão legais quanto o auge do filme, mas mesmo nesses momentos, se  reflete sobre a condição dos anjos, que não podem resolver suas ânsias sequer com masturbação, dado que não tem sexo, e esse seria um dos motivos da revolta, o não gozo, a inadimplência com o orgasmo, e essa castidade os volta para a violência, diferente do personagem de Rickman, que não age como um incel violento e frustrado por saber bem o seu papel nesse xadrez divino.

    Dogma acaba violento, com a  Terra em estado péssimo, mas com alguma esperança de sobrevida, tal qual quase todos os eventos catastróficos da Bíblia, ainda conta com todo o elenco que Kevin Smith tornou famoso na fase de sua filmografia de Nova Jersey, trazendo seus amigos para uma produção que pôde ser vista por um público maior que os de nicho nerds que sempre acompanharam sua filmografia, e além de tudo, ainda reflete bem sobre a função do mortal diante dos desígnios divinos, embora obviamente não leve nada a sério, nem a mitologia cristã judaica, nem o próprio enredo.

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  • Crítica | Era Uma Vez no Mexico

    Crítica | Era Uma Vez no Mexico

    Era Uma Vez no México começa apresentado um novo personagem, o desconfiado Sands (Johnny Depp). Ele ouve de um homem comum sobre uma lenda envolvendo um casal de assassinos. Logo somos apresentados aos personagens de Antonio Banderas e Salma Hayek em uma cena onde assassinam os homens de Márquez (Gerardo Vigil)..

    Robert Rodríguez não resistiu em transformar o nome do longa em uma homenagem ao clássico de Sergio Leone, e Era Uma Vez no México não copia apenas o nome de Era Uma Vez no Oeste, mas também boa parte da estrutura narrativa, piorando ainda mais a quantidade de mentiras por segundo, em cenas de ação muito inspiradas e constituídas, com boa parte delas ocorrendo após algumas baladas do pistoleiro.

    Já produzido pela Troublemaker de Rodriguez, os créditos iniciais, tocados por Banderas, com a música Malagueña Salerosa, que também está presente em Kill Bill embala a fantasia que seguirá, o conto sobre um assassino triste, que não se conforma com suas perdas, mas que é capaz de novamente tocar suas canções. A expectativa do espectador por mais combates e uma história repleta de emoção não demora a ser cumprida.

    Rodriguez traz personagens visualmente icônicos, não só com Depp e seus parceiros de longa data Danny Trejo e Cheech Marin, mas também com Mickey Rourke, que faz Billy, um mafioso que sempre anda com seu pequeno cão a tiracolo (chamado Moco, como o vilão de El Mariachi), e o chefe de cartel Barillo, de Willem Dafoe. As fantasias que Sands usa e os sonhos do Mariachi – chamado pelo primeiro de “El” – são bem legais, e mesmo com o tom irreal, existem momentos muito bonitos, como o casamento do Mariachi com Carolina.

    Incrivelmente esses momentos mais sentimentais se harmonizam com todo tom jocoso e satírico. E este é certamente o filme mais sério da trilogia, e também é o menos engraçado da filmografia recente do diretor, mesmo com toda a suspensão de descrença impressa nos feitos de Banderas e dos outros heróis. Aqui mora um dos problemas do filme, que ocorre nas festividades do Dia dos Mortos. A solução encontrada para pegarem Sands é muito conveniente, assim como a participação de Ajedrez nisso. As conseqüências disso ao menos garantem bons momentos de ação, com o personagem tendo que confiar mais em seus instintos.

    Mas é sobre o Mariachi que repousam os momentos mais épicos, e quando ele tenta proteger o presidente ocorrem assassinatos retirados dos autênticos westerns italianos, onde os corpos dos vilões voam como se a gravidade inexistisse. A vingança do músico finalmente é alcançada, e apesar de alguns acontecimentos violentos, o idílico e ilusório predominam os momentos finais de Era Uma Vez no México, como uma ode de Rodríguez não só aos cinemas que sempre amou mas também a pátria onde nasceu.

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  • Crítica | A Balada do Pistoleiro

    Crítica | A Balada do Pistoleiro

    A Balada do Pistoleiro começa com Steve Buscemi entrando em um bar, sendo atendido por Cheech Marin. Buscemi fala para o bartender e para as demais pessoas que querem ouvir sobre a lenda de um pistoleiro careta, que bebia refrigerante e andava com uma case de violão, sendo como um anjo exterminador, capaz de matar todos que lá estão de maneira tão estilizada que parece ter saído de uma história em quadrinhos.

    O longa não é tão inventivo quanto seu antecessor, mas é carregado de charme e carisma, a começar por seu herói, vivido por Antonio Banderas, que é acompanhado em alguns momentos do primeiro Mariachi, Carlos Gallardo. Esta versão tem sua própria identidade e caráter, que prosseguem canastronas, mas de um jeito diferente. Se Rodriguez lançasse somente esse epílogo como um curta, certamente seria premiado, pois funciona muito bem como exemplar único. Aqui, Rodriguez abusa do poder de introduzir seu herói, mas as sequências iniciais são boas demais para serem descartadas, tendo todas elas o poder em reinventar o mito do pistoleiro musical.

    A história desta parte dois tem muitas semelhanças com a primeira, com Banderas fazendo as vezes do Mariachi e de Azul, as diferenças moram na preparação. O artista transferiu todo o seu talento em fazer música para o ofício de matar, uma vez que sua mão esquerda não mais tem firmeza para segurar as cordas do violão. Sua caixa não pode mais carregar um instrumento que embala a alegria das pessoas, restando espaço apenas para os armamentos. Mesmo com um texto simples, há espaço para a exploração de um lirismo típico das letras das baladas mexicanas, além é claro de semelhanças enormes do enredo com o estilo cinematográfico e teatral dos musicais, sem obviamente, ter as músicas, pois se tocadas, feririam o personagem principal, não só em suas mãos mas também em seu coração.

    A introdução do pistoleiro em ação finalmente acontece após uma cena com Quentin Tarantino, do tempo que o diretor achava que poderia se tornar ator, e é sensacional por não ter qualquer apego a realidade e ser escapista ao extremo, mostrando um Mariachi diferente e evoluído, que esconde suas armas dentro do corpo de um violão e nas mangas do seu terno, finalmente justificando o uso de roupas tão pesadas em um ambiente tão quente. Na jaqueta que o personagem principal usa, há um desenho com cores tão fracas que mal aparecem em sua totalidade. O escorpião lembra muito o do assassino vivido por Ryan Gosling em Drive, de Nicolas Widing Refn, e coincidentemente existe o uso dos mesmos simbolismo.

    Bucho, de Joaquim de Almeida é um vilão tão ou mais caricato quanto Moco, mas os capangas e demais assassinos são vilões carismáticos, como o Navajas de Danny Trejo, que tem um fim precoce por conta da covardia dos seus inimigos. No entanto, entre os coadjuvantes, quem rouba a cena é Carolina, feita por Salma Hayek no auge de sua beleza. Com ela e o pistoleiro juntos, acontecem cenas onde o imponderável é a tônica, acrobacias não soam irreais e as fugas das balas não parecem tão inverossímeis.

    As curvas finais tem uma dramaticidade, mas não tão bem construídas quanto as do primeiro filme. Mas no quesito ação Rodriguez evoluiu muito, mostrando a mesma linguagem cinematográfica sofisticada do primeiro filme, com um orçamento mais pomposo, que lhe dá liberdade para prestar reverência a Sam Peckinpah, Don Siegel e Clint Eastwood, alguns cineastas posteriores ao western spaghetti que também fizeram filmes dignos.

    As participações de Albert Michel jr. e Carlos Gallardo também são bem legais e pontuais, celebrando a memória do antigo filme que levou Rodriguez ao estrelato. Os momentos finais não tem tanto apelo quanto a batalha campal anterior, mas tem emoção de sobra, com confronto familiar e um pseudo-abandono da função de justiceiro, A Balada do Pistoleiro faz jus a história original, sendo uma continuação bastante digna, que expande bem o universo de aventura escapista.

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  • Crítica | Um Drink no Inferno

    Crítica | Um Drink no Inferno

    Uma viagem de loucos pelo deserto, cuja estrada por onde passam predomina o sangue das vítimas desses dos irmãos Gecko. Esse é o tom inicial de Um Drink no Inferno. De certa forma, a loucura em que se metem Seth e Richard tem eco na antiga parceria entre o diretor Robert RodriguezQuentin Tarantino, que adaptou um roteiro a partir do argumento de Robert Kurtzman, um sujeito muito mais acostumado a trabalhar no setor de maquiagem e efeitos especiais do que com roteiros.

    A primeira sequência do filme é inacreditável, mostrando o confronto dos personagens de Tarantino e George Clooney com o dono de um armazém/loja de conveniência. Em poucos minutos o espectador vê o assassinato de um policial, por meio de um assassino sangue frio e com claros distúrbios mentais. No caminho, os dois andam em um carro surrado pela areia, com uma mulher de meia-idade no porta-malas, ao som do clássico Dark Knight tocada por The Blaster, de certa forma prevendo o que ocorreria com os dois, no Titty Twist mais tarde.

    É impossível não pensar neste filme e não lembrar da Miramax, estúdio que ajudou a reunir Tarantino e Rodriguez. A realidade é que mesmo com os sucessos de Pulp Fiction, Cães de Aluguel, A Balada do Pistoleiro e El Mariachi, essa história envolvendo desajustados não teria sido finalizada e comercializada, já que o filme apesar de se pagar, não foi muito alem disso. O longa se tornou um dos muitos fenômenos de locadoras, sendo redescoberto no mercado de vídeo, só então ganhando o status de cult, além do trash que muitos já amputavam a si.

    Há dois dramas familiares na história, que na maioria das vezes não são explorados de maneira séria, mas que não deixam de soarem pesados. Pelos Geckos, há a preocupação de Seth com a sede assassina do caçula, feito por sua vez por um Tarantino que representa um completo desequilibrado. Da outra parte, existe a fé falida de Jacob Fuller, que viaja com seus filhos, Kate e Scott, a procura de se distrair após a morte da mãe da família. Harvey Keitel faz um ex-presbítero que diz não acreditar mais em Deus, pela perda que teve e ainda tem que lidar com a criação de dois adolescentes, sendo um deles interpretados por Juliette Lewis no auge da beleza, claramente sem idade para interpretar uma pessoa na puberdade.

    Há também duas ideias de moralidade bem distintas, uma adormecida, em Jacob que diante da situação limite de quase morte, não permite que seus filhos façam algumas coisas pequenas como beber em um bar latino de strip-tease, e outra a de Seth, que agride seu irmão após o mesmo estuprar e matar a senhora que era sua refém. Ainda que seja um ladrão, Seth tem alguns limites morais e éticos e é uma decepção que seu irmão não compartilhe desse pensamento. Obviamente que esse pensamento ético não o impede de fazer dos Fuller seus reféns, inclusive deixando a jovem Kate a mercê das fantasias e assédios de seu irmão.

    É curioso como o roteiro trata dessas questões de maneira leve, mas sem deixar de julgar tais fantasias e loucuras como algo nefasto. A questão do retardo de Richard deixa de ser uma opção teórica para se demonstrar factual, quando o irmão mais velho manda ele colocar seu aparelho dental, ele é um sujeito capaz de matar alguém mas não se lembra de cuidar de seus dentes, e precisa de outro “adulto” para tal. Dos 108 minutos de duração, quarenta e poucos são para construir a ideia de um filme policial clichê com dois bandidos inconsequentes em fuga.

    O grito do mestre de cerimônias, que é um dos três personagens de Cheech Marin é o resumo básico de como funciona o Titty Twister, um lugar onde as pessoas agem de forma libertina, e onde acontecem coisas tão bizarras que sequer parecem reais. Uma caricatura, onde mexicanos, americanos, motoqueiros e caminhoneiros brigam, bebem enquanto são servidos por mulheres seminuas. Além de acontecerem algumas brigas e um quase conflito entre Seth e os funcionários do bar, há um sem número de personagens engraçados e carismáticos, a banda Tito e Tarantula fazendo eles mesmos, o mestre de efeitos especiais Tom Savini fazendo o canastrão Sex Machine, o personagem de Fred Williamson Frost, que não tem seu nome citado nem por si e nem por ninguém, e claro, Satanio Pandemonium a dançarina que Salma Hayek encarna, que carrega o nome de um filme mexicano de horror de 1975, também conhecido como  Sexorcista, de Gilberto Martinez Solares, que foi lançado na esteira de O Exorcista.

    Tudo ocorre na mais perfeita ordem, até um trio de funcionários atacar Richard, agravando o ferimento de sua mão. Esta parte tem um mise-en-scène muito bem trabalhado. Os detalhes que Rodriguez utiliza neste momento são sutis inicialmente, para dali em diante se tornar ponto de virada onde até as poucas amarras com a realidade tangível são largadas para tornar-se este uma completa fantasia com momentos dignos das comedias pastelão.

    Começa uma guerra campal, onde corpos são guitarras e onde os monstros atacam e se alimentam das pessoas. Cabeças decepadas rodam pelo assoalho, e há milhares de móveis que podem imediatamente se tornarem armas contra essas criaturas da noite. O fato das regras inteligentes dos filmes de vampiro serem completamente ignoradas combinam perfeitamente com a aura irônica do longa, a prudência dos mortos-vivos inexiste, a dos vivos também, seja nas travadas de Satanico, que se gaba em frente a Seth, ou do próprio personagem de Clooney, que quase permite que seu irmão ande, mesmo já não tendo alma.

    Rodriguez resgata a aura dos filmes de monstros da Universal, e as perverte completamente, adicionando a isto a estética dos filmes de zumbi de George Romero com o gore dos giallos que Mario Bava e Dario Argento faziam na Itália. Uma marca de Tarantino no filme é a conversa entre sobreviventes que falam sobre teorias de como matar os vampiros, de suas fragilidades e das fraquezas que a cultura pop amputou a esse segmento, linhas de diálogos essas que jamais ocorreriam se não fizessem parte de um conto fantasioso com participação do próprio.

    Apesar de brincar com crenças sérias e de aludir ao cristianismo como fonte segura de defesa contra o mal, a graça de Um Drink no Inferno reside no total desprendimento da realidade ou das normas de um bom filme de gênero, ele é uma mistura de muitos elementos e uma ode ao cinema de Wes Craven, Tobe Hooper, John Carpenter e até alguns cineastas menores como Tom Holland (Brinquedo Assassino) e Mick Garris, temperado é claro com toda a iconografia do cinema e cultura do México aludindo a um oeste de Alejandro Jodorowsky e as comédias de humor negro, em uma mistura que tinha tudo para dar errado, mas que acertou em tom e que certamente entrou para história do cinema como um clássico do cinema escapista da década de noventa.

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  • Crítica | Dupla Explosiva

    Crítica | Dupla Explosiva

    O nome Dupla Explosiva não é lá tão inédito nos cinemas. Aliás, tornou-se uma espécie de saída fácil para filmes de ação com dois protagonistas. Além desse, tivemos um Dupla Explosiva em 2010 estrelado por John Travolta e Jonathan Rhys-Meyers, um em 2002 estrelado por Antonio Banderas e Lucy Liu e um em 1974 com os ícones Terence Hill e Bud Spencer.

    Na trama encabeçada por Ryan “Deadpool” Reynolds e Samuel L. “Muthafucking Nick Fury” Jackson, Reynolds interpreta um ex-agente da CIA chamado Michael Bryce que possui um renomado serviço de segurança e escolta. Porém, durante um serviço, um contratante acaba sendo morto e Bryce acaba caindo em desgraça. Jackson interpreta Darius Kincaid, um assassino profissional que está sendo transportado pela agente Amelia Roussel, ex-namorada de Michael e operativa da Interpol vivida por Élodie Yung, para testemunhar contra um ex-ditador vivido por Gary Oldman, mas durante o transporte, o comboio é atacado, obrigando Darius e Amelia a fugirem e se esconderem. Desconfiada de uma traição dentro da agência, Amelia contrata Bryce pra que ele escolte Kincaid até o tribunal internacional em Amsterdam.

    Dupla Explosiva poderia dar muito certo. PODERIA, mas não deu. Não que o filme seja ruim, muito pelo contrário. É uma excelente diversão. Entretanto, é um filme extremamente irregular. A química entre os dois protagonistas é incrível, Reynolds e Sam Jackson combinam demais. Em algumas cenas, fica a impressão de que o diretor simplesmente os deixou improvisar durante o tempo todo, tamanho os absurdos proferidos de parte à parte. Existem diálogos impagáveis e a comicidade dos dois atores é muito bem explorada.

    O bicho pega quando se analisa o roteiro e direção. Tudo é muito genérico. Desde os personagens coadjuvantes à trama principal, passando por subplots e outros plot twists. As circunstâncias são genéricas e telegrafadas à milhas de distância. Outro problema é a forma do diretor Patrick Hughes filmar as cenas de ação. O seu trabalho aqui é um pouco superior ao de Os Mercenários 3, mas o diretor filma de forma pasteurizada a maioria das cenas de ação. Ainda que em certos momentos ele imprima uma estética quase cartunesca, durante a maior parte do tempo as cenas são sem graça e sem a menor inventividade. O filme teve classificação R nos Estados Unidos, o que equivale aqui no Brasil a uma classificação para maiores de 16 anos, e isso não foi aproveitado pras cenas de ação – com exceção de uma ótima cena feita quase em plano sequência já no final do filme. Infelizmente,  nada do que vem antes é digno de nota, seja por ser praticamente reprise de outros filmes ou por faltar algo mais anárquico e condizente com o humor do longa.

    No que tange às atuações, novamente tenho que elogiar Reynolds e Jackson. Os dois sabem arrancar risadas dos espectadores, seja se aproveitando dos diálogos escritos ou mesmo pela dinâmica da dupla. Com uma química maravilhosa, os dois sustentam todo o filme, uma vez que o elenco de coadjuvantes não é lá dos mais inspirados. Gary Oldman pouco aparece, mas atua em piloto automático (ainda que o piloto automático dele seja melhor que muitos atores trabalhando a sério) interpretando um ditador que vai a julgamento por crimes contra a humanidade; Élodie Yung se esforça e até defende bem seu papel em alguns momentos, mas no geral é um tanto sem sal; Joaquim de Almeida até tem um papel de destaque, mas que não lhe permite grande atuação (e parece que ele nem faz questão disso); e por fim, Salma Hayek é o ponto fraco do elenco com sua latina afetada e desbocada. Ela repete o que fez durante grande parte de sua carreira, mas de forma exagerada e forçada. Talvez o papel ficasse melhor com Sofia Vergara, atriz que encaixaria melhor na dinâmica e no tom de galhofa do filme.

    Enfim, como filme de comédia, Dupla Explosiva é bastante divertido. Já como filme de ação, é só mais um entre tantos que são lançados todos os anos, mas que mesmo assim vale ser conferido.

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  • Crítica | O Conto dos Contos

    Crítica | O Conto dos Contos

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    É sempre peculiar assistir como o mitológico, o lendário, é reciclado e moldado nas possibilidades pictóricas dos estilos de Cinema que resgatam reinações, hábitos e exercícios em prol de uma experiência cada vez mais refinada, na melhor das hipóteses, numa arte secular, palco de larga miríade de contos, crônicas e tantos outros compêndios narrativos.

    O Conto dos Contos não carrega o estigma de clássico imediato, isso só o tempo para afirmar. Tampouco carrega uma exasperante mise-en scène ou outros atributos de milhões de dólares, e muito menos o hype europeu e o preciosismo visual de outra fábula recente, A Assassina, o mais sublime dos catetos de Hsiao-Hsien Hou. Mas talvez seja esse “menos” que permita que o filme seja tão bom quanto poderia ser. Quando um rei e uma rainha desejam cegamente um filho, no seu reino de bobos-da-corte, um gatilho emocional e tão ligado às necessidades de uma família real, o diretor Matteo Garrone (Reality: A Grande IlusãoGomorra) convoca seus exageros e vaidades, e então a história começa a perder fôlego, fazendo o filme ostentar constante e humildemente uma vitalidade, mitologia e identidade próprias, e certamente, do começo ao fim das histórias interligadas, acima do lugar-comum.

    Um repertório de esmeros e elegantes encenações, elevando a perspectiva cármica dos tediosos contos de Cinema que apenas galgam a superfície de suas dimensões, seus potenciais às vezes desperdiçados, como por exemplo a decepcionante trilogia das Mil e uma Noites de Miguel Gomes, em sua versão autônoma e desalmada dos clássicos ramo-sírios contados por Xerazade. O Conto dos Contos comporta, senão luxo em sua produção, o respeito mais nobre e satisfatório pela tradição de se contar uma história, simples assim, e nos apresentar, economicamente, pouco mais do que precisa para ser um ótimo filme, de grandes inspirações e atores (Salma Hayek, destruidora).

    Um filme-primavera, desses que nascem para trazer respiro a um subgênero mais interessado em mostrar, do que saber contar. Garrone sabe onde pisa, e não se explica através do que filma, mas filma para poder explicar, no caso a confiança que possui e alimenta enquanto cineasta, melhor a cada obra. Um filme com um frescor criativo que Terry Gilliam e outros veem como ode e desculpa para traduzir suas bizarrices e besteiras de carnaval. O infortúnio em O Conto dos Contos (filme que de pretensioso tem só o título), no âmbito do uso de sua mitologia criada para o filme não existe, e, se o há, há senão no gosto de cada um de nós, críticos por natureza. Garrone apenas abre um leque tangencial para o deleite dos públicos mais diversos, e exigentes, num conto de situações e condições das mais empáticas possíveis – em especial, se comparado com outras produções de hoje em dia.

  • Crítica | Muppets 2: Procurados e Amados

    Crítica | Muppets 2: Procurados e Amados

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    Quando um filme hollywoodiano faz sucesso, é natural que ele se torne uma franquia, com repetições do que deu certo no primeiro episódio, com mais exagero, convites a celebridades e roteiros sofríveis de repertório pobre e sem ineditismo. A introdução musical de Muppets 2, de James Bobin – o mesmo diretor do filme de 2011 -, brinca com essa questão, usando o artifício como recurso metalinguístico. Na verdade, isso é um pretexto para, como diriam os textos de Monty Python, ir para algo totalmente diferente. Os fantoches que estão de volta à ativa resolvem, aconselhados por Dominic Badguy (Ricky Gervais), partir em turnê mundial para aproveitar a fama recém-adquirida, mesmo sob os protestos de Walter, único remanescente dos protagonistas criados em 2011.

    Logo de início, percebe-se que as intenções de Badguy não são boazinhas e que algo ruim se aproxima da trupe de animais e criaturas de feltro cantantes. Aos poucos, Dominic assume o papel de liderança que sempre foi de Caco, O Sapo (ou Kermit para os americanos). Sua confiança é abalada, e a voz de comando vai decaindo com o tempo. Até o seu bom senso é avariado, assim como a autoestima do personagem. Em Berlim ele cai em uma cilada, onde é confundido com um bandido chamado Constantine, que toma o seu lugar sem levantar maiores suspeitas – a não ser em Animal e Walter – e que demonstra ter uma egocentrismo desnecessário, fazendo sempre questão de demonstrar estar acima de Dominic, a quem chama de Número 2.

    O espetáculo feito no teatro de Berlim serve de fachada para acobertar o roubo das peças de arte de um dos museus. A partir daí, a Interpol e a Cia se envolvem nas investigações lideradas por Jean Pierre Napoleon (Ty Burrell), pelo lado europeu, e por Sam, a Águia, ocasionalmente medindo forças e tamanhos distintos, unicamente para achincalhar a xenofobia dos estadunidenses e reforçar as diferenças de lidar com crimes entre ambas as culturas. A competição é sempre estimulada no roteiro de Nicholas Stoller e Bobin.

    A trama acaba se dividindo em núcleos, mas eles não se rivalizam em importância, uma vez que continuam interessantes por toda a extensão da fita, especialmente quando servem de reflexão ao mostrar mundos ideais, como quando as duas partes do Sapo têm de fingir ser quem não são. Constantine se torna o par ideal para Miss Pig, respondendo positivamente, pela primeira vez, à possibilidade de casamento – ainda que não a engane totalmente -, enquanto Caco tem de se se virar em uma prisão na Sibéria, onde tem contato com Nadya (Tina Fey), que, aos poucos, faz o Sapo ter sua confiança de volta para realizar um número musical – as partes cantadas continuam impressionantes do ponto de vista técnico.

    Walter finalmente descobre o ardil dos malfeitores e comunica o problema a Fozie, o Urso, mas é tarde, pois logo é descoberto por Dominic e Constantine e jogado no frio da Sibéria para morrer à míngua. Antes do grande roubo, o falso Sapo decide pedir Miss Piggy em casamento, em pleno show, para ter o álibi perfeito. É brilhante o modo como os ladrões conseguem elogios da crítica, usando anedoticamente a prática de suborno a profissionais de comunicação para conseguir páginas positivas. O humor é uma boa maneira de fazer críticas, mas sem ser necessariamente ácido.

    O último ato guarda surpresas tremendas, com elementos de filmes de assalto, de superespião e, claro, muito romance. Mesmo uma questão conflitante, como o casamento arruinado entre o Sapo e sua amada, é tratada como um momento edificante dentro da jornada de Caco pela sua restauração enquanto figura artística. Alguns twists são ensaiados próximos ao final, mas nenhum deles se conclui.

    Se a mensagem do filme anterior, estrelado por Jason Segel, era de ressurreição de mitos, este de 2014 fala basicamente do quão valorosa é a união entre os iguais e o quão indispensável é uma amizade verdadeira. Comparando os dois roteiros, este é bem menos incisivo e crítico do que o primeiro, o que reafirma as sentenças ditas logo no início. Apesar de possuir um pouco mais de alma do que as continuações caça-níquéis comuns, Muppets 2 – Procurados e Amados sofre muito sem o carisma de Segel. Sua falta é muitíssimo sentida e faz deste um espécime ordinário na filmografia dos famosos e infames fantoches.

  • Crítica | Pergunte Ao Pó

    Crítica | Pergunte Ao Pó

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    Após realizar roteiros de filmes clássicos, como Uma Rajada de Balas e Chinatown, Robert Towne ganhou notoriedade e passou a dirigir filmes sem o mesmo sucesso que tinha como escritor, evidentemente. Após uma parceria com Tom Cruise em três obras  A Firma, Missão: Impossível e Missão: Impossível 2 ­ , o ator o ajudou como produtor executivo do longa metragem, capitaneado por Towne e baseado no laureado romance Pergunte ao Pó, de John Fante.

    A direção de arte e a fotografia fazem da película uma fita demasiadamente leve, muito diferente do clima arenoso e enevoado do texto original. A iluminação chapada não ajuda a captar as variações das ações individualistas de Arturo Bandini, que pioram de situação graças à atuação de seus intérpretes. No auge da canastrice, Colin Farrel faz o escritor/narrador da história, e desde o início parece um pastiche, um deboche do alterego de Fante. Nem mesmo as suas interações com o seu oikos são interessantes, uma vez que são todas mecânicas.

    Camilla Lopez é feita pela voluptuosa Salma Hayek, que seria uma boa escolha para o papel se não atraísse os olhos dos homens ávidos de modo tão óbvio e latente. A beleza que era anunciada no livro como exótica, em tela é exuberante e nada sutil, o que claramente fere a essência da personagem. Tal conjectura não seria um grave problema de adaptação caso o entorno da personagem compensasse, especialmente pelo ambiente meio depressivo, mas isto não ocorre. Nem a nudez da atriz é valorizada de maneira plena, uma vez que ela é feita em meio à neblina. Um desperdício lastimável.

    Não há muito espaço para nuances ou foco necessário para explicitar a degradação do ethos do escritor vaidoso. O roteiro e as ações prescritas nele foram mal trabalhadas e executadas de modo sistemático e rotineiro, parecendo algo genérico, tão vazio e sem substância quantos os piores produtos para os cinemas dos anos 50.

    A duração de sua exibição é deveras prolongada, as tomadas se repetem uma a uma, e a sensação de quem vê o filme é de que há absoluta redundância nos dramas tratados em tela. Ao menos as divagações de Bandini, ao felicitar a si mesmo por seus feitos, chega perto do pedantismo típico do personagem, sendo este o ponto mais próximo do espírito da obra original. Farrell é um ator limitado, de trabalhos irregulares, que até consegue impor alguns poucos arquétipos em seu trabalho de atuação, mas tem dificuldades sérias em representar pessoas com interesses conflitantes, quanto mais um sujeito que tem claras dificuldades em manter a psiquê saudável, caso de Arturo Bandini. A inabilidade de Towne em conduzir a película também não coopera para que o ator mostre-se à vontade no papel.

    Os últimos 40 minutos contém uma virada de cunho açucarado na história, com Bandini finalmente tomando coragem e levando sua amada para morar com ele. No entanto, ao invés de dar vazão aos conflitos presentes em seu espírito arredio, ele pratica ações melodramáticas, como em uma autêntica comédia romântica, onde o “felizes para sempre” predomina, ainda que de modo efêmero, mostrando que a eternidade da máxima não é real. As falhas de Arturo que eram um dos pontos bons da história  são deixadas de lado para mostrar um romance insípido e de tom sentimental, nada condizente com o resto da história.

    A ideia de Towne de impor uma tentativa de alívio na existência sofrida de Camilla e Bandini seria interessante se o roteiro desse continuidade a ela, mas isto não ocorre. A tentativa de redenção do protagonista é falha e tão tosca que em certos momentos ela parece ter sido realizada por outra pessoa. Até a narração é interrompida de modo esquizofrênico: a história é contada sem ela durante grande parte da fita, para, enfim, voltar próximo do anúncio dos créditos.

    O filme não funciona, não sabe escolher um lado, também não é uma adaptação boa e tampouco atinge o objetivo de ser um romance água com açúcar; pelo contrário, é penoso e pesaroso de assistir a ele, mesmo para as duas parcelas do público que tenta alcançar. A separação do casal acontece de modo diferente do original, menos simbólico e mais literal, quase que explicando para o incauto espectador o que ele precisa entender: que as almas aflitas dos dois amantes não podem ficar juntas graças ao destino.

    Mais uma vez Towne cai no erro de mudar o foco de um modo que não combina com a proposta que ele mesmo impôs, uma vez que o cerne de Bandini parece completamente modificado, não só em relação à essência do romance, como também à lógica proposta no roteiro. John Fante merecia melhor sorte na adaptação de sua obra, algo minimamente condizente com a qualidade de seu texto, mas este Pergunte Ao Pó não apresenta aspectos necessários para tanto, sendo fraco e  vazio em todos os pontos que procura abordar.