Tag: Antonio Banderas

  • Crítica | Dupla Explosiva 2: E a Primeira-Dama do Crime

    Crítica | Dupla Explosiva 2: E a Primeira-Dama do Crime

    Era apenas uma questão de tempo para que Dupla Explosiva, a comédia de ação estrelada por Ryan Reynolds e Samuel L. Jackson que foi sucesso de bilheteria no ano de 2017, ganhasse uma continuação. Porém, enquanto o primeiro filme divertia bastante ainda que possuísse certos problemas, esse aqui erra em praticamente tudo o que tenta.

    Seguindo a cartilha de Hollywood que dita que as sequências devem ser maiores e mais barulhentas que o original, Dupla Explosiva 2 amplifica tudo o que havia no primeiro. Entretanto, a balança se inverte e aqui os defeitos superam as qualidades. Na trama, o guarda-costas Michael Bryce (Reynolds) abandona sua licença sabática para proteger Darius (Jackson) e Sonia (Salma Hayek) depois que ela revela estar sendo perseguida por Aristotle Papadopolous (Antonio Banderas), um louco bilionário que está em poder de uma arma que pode destruir o mundo.

    Chega a ser impressionante um filme com um orçamento de 70 milhões de dólares possuir uma produção tão pobre. O excesso de CGI mal feito chega a ser irritante e compromete demais. Existem cenas que nem são de ação, mas que deixam claro o péssimo uso da tela verde. Ainda no tópico da ação, o diretor Patrick Hughes já havia demonstrado competência na condução de cenas do tipo no primeiro Dupla Explosiva e no terceiro Os Mercenários. Entretanto, aqui não faz nada digno de nota, somente um amontoado de clichês prejudicados por uma edição fraca. O humor do filme é tão pobre quanto, e aposta na repetição de piadas de constrangimento e cunho sexual que parecem ter saído de um derivado ruim de American Pie.

    O trio de protagonistas é enervante. Parece que Jackson e Hayek estão competindo para saber quem grita mais alto. Reynolds, desde que fez sucesso em Deadpool, parece interpretar qualquer personagem de uma só maneira. Ele repete o que fez antes em Esquadrão 6 e o que faria em Alerta Vermelho, com o agravante de emular o personagem mutante e ficar o tempo todo fazendo piadas autorreferentes, além de narrar o que está sentindo e o que está acontecendo na tela para o espectador, numa tentativa velada de quebrar a quarta parede que aqui não funciona, deixando transparecer que o filme não confia na inteligência de quem está o assistindo. Banderas até se salva interpretando seu vilão como se ele fosse um antagonista de Roger Moore nos filmes mais caricatos do agente 007. Porém, a participação de Morgan Freeman é desperdiçada por uma condução ruim que estraga boas piadas em potencial.

    Enfim, Dupla Explosiva 2 é uma experiência cansativa e enervante para o espectador, o que é uma pena. Infelizmente, por melhores que sejam os atores, não dá para apoiar um filme inteiro em carisma. É preciso mais do que isso.

    https://www.youtube.com/watch?v=8I-7eEIWKEQ&ab_channel=Ingresso.com

  • Crítica | A Lavanderia

    Crítica | A Lavanderia

    Steven Soderbergh tem executado uma boa parceria com a Netflix. Seu longa anterior, High Flying Bird foi bem pouco falado, e é uma obra subestimada, pois trata bem sobre os sonhos e frustrações ligados ao basquete e aos esportes em alto rendimento como um todo. A Lavanderia, começa metalinguístico, com dois narradores estranhos, os personagens de Gary Oldman e Antonio Banderas, Jürgen Mossack e Ramón Fonseca, quebrando a quarta parede, elucubrando sobre dinheiro, bem ao estilo de A Grande Aposta, ainda que ao estilo de Soderbergh.

    A trama logo vai para Lake George, em Nova York, mostrando o casal Ellen e Joe Mart, de Meryl Streep e James Cromwell. Os dois sofrem um infortúnio e é nessa parte que se notam as fragilidades orçamentárias do filme. Quando a água toma a embarcação onde eles estão, vem um efeito digital da água que é bem artificial, graças obviamente ao baixo custo da produção. O diretor consegue convencer grandes astros a participar, mas todo o resto dos custos tem que ser bancado, mas aqui ao menos, funciona, dado o caráter satírico do roteiro e abordagem.

    O script mostra pessoas comuns, sendo ludibriadas por outras pessoas, essas bastante instruídas, gente malandreada que não tem qualquer receio em empregar seus golpes e maracutaias nos que pouco tem, e incrivelmente não há um julgamento ultra moralista, ao contrário, há leveza na condução das historias paralelas e assessórias na quantidade de esquemas e propinas mostrados, em especial nos casos de aliciamento, de uso de laranjas e de assassinatos.

    Como a trama não se leva a sério, Oldman, Banderas e Streep tem espaço para exercerem suas facetas mais caricatas e canastronas possíveis. Em boa parte do filme, o overaction funciona, mas em outros, mais parece um filme ruim de Eddie Murphy. O longa carece de equilíbrio em muitos pontos, e se perde um pouco em meio as muitas tramas paralelas, mas incrivelmente não deixa de ser divertido quase nunca, principalmente por não ter apenas uma historia de guia, e sim várias, indo e voltando ao arco de Ellen.

    A Lavanderia é baseada no livro de Jake Bernstein, Secrecy World: Inside the Panama Papers Investigation of Illicit Money Networks and the Global Elite, que obviamente não é uma obra ficcional, e a forma como o longa aborda as partes reais é um pouco atrapalhada e nada sutil. Toda a questão dos Panama Papers e da Odebrecht soa um pouco rasa, não há muito aprofundamento e o desfecho não é tão potente quanto todo o resto – nos momentos finais, chega a soar um bocado moralista –  mas dado que praticamente nada na obra é encarado com seriedade, faz pouco sentido dar vazão ao azedume ao analisar esta obra, que mesmo soando exagerada, é repleta de bom humor e jocosidade, onde o alvo principal, são os ricos e gananciosos da classe A estadunidense.

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  • Crítica | Grande Hotel

    Crítica | Grande Hotel

    Em 1995 a Miramax do produtor Lawrence Bender resolveu juntar quatro diretores para fazer um filme colaborativo onde Quentin Tarantino, Robert Rodriguez, Alexandre Rockwell e Allison Anders contariam cada um uma história curta, em Grande Hotel. A abertura animada talvez seja o ponto mais memorável do filme, normalmente esquecido por boa parte dos fãs dos cineastas dado seu caráter nada sério. A realidade é que boa parte dos segmentos não são inesquecíveis de fato, compondo assim histórias genéricas em sua maioria.

    The Missing Ingredient tenta soar transgressor, mas não consegue ir além de um humor pastelão misturado a pitadas de sensualidade da parte do elenco feminino que Anders conduz. O outro quadro, Wrong Man, de Rockwell, começa por um pedido de gelo de um dos quartos, que é na verdade feito pelo personagem do produtor, Lawrence Bender, mas acaba em um mal entendido com um casal que tem fantasias em fingir participar de um sequestro. As histórias são chatas e enfadonhas, sendo a segunda ligeiramente melhor.

    The Misbhavers é dirigido por Rodriguez e tem Antonio Banderas fazendo um pai nervoso, que obriga Ted a cuidar de seus dois filhos enquanto ele está fora. Aqui claramente o cineasta mexicano usufrui de alguns dos elementos que poria na franquia Pequenos Espiões, e apesar de alguns absurdos e surpresas do roteiro, não há muito diferencial. A última parte cabe a Tarantino, que estrela, dirige e escreve uma história sobre um cineasta hospedado no hotel que tem muitas exigências. Chester Rush é uma versão do próprio realizador de Pulp Fiction, em uma brincadeira onde ele revela sua vaidade, que o fez tentar durante um bom tempo emplacar uma carreira como ator. O grave problema é que The Man From Holywood é repleto de diálogos, mas nenhum tão inspirado quanto de costume.

    E assim termina Grande Hotel, um filme que pretendia ser uma alternativa despretensiosa a filmografia dos que estão ali envolvidos, mas que é tão desprendida de compromissos com histórias bem desenvolvidas que soa apenas como um pequeno filme onde cineastas famosos podem exercer alguns de seus caprichos em um micro-universo onde os personagens e situações se cruzam, mas que não tem qualquer significado ou qualidade ímpar.

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  • Crítica | Era Uma Vez no Mexico

    Crítica | Era Uma Vez no Mexico

    Era Uma Vez no México começa apresentado um novo personagem, o desconfiado Sands (Johnny Depp). Ele ouve de um homem comum sobre uma lenda envolvendo um casal de assassinos. Logo somos apresentados aos personagens de Antonio Banderas e Salma Hayek em uma cena onde assassinam os homens de Márquez (Gerardo Vigil)..

    Robert Rodríguez não resistiu em transformar o nome do longa em uma homenagem ao clássico de Sergio Leone, e Era Uma Vez no México não copia apenas o nome de Era Uma Vez no Oeste, mas também boa parte da estrutura narrativa, piorando ainda mais a quantidade de mentiras por segundo, em cenas de ação muito inspiradas e constituídas, com boa parte delas ocorrendo após algumas baladas do pistoleiro.

    Já produzido pela Troublemaker de Rodriguez, os créditos iniciais, tocados por Banderas, com a música Malagueña Salerosa, que também está presente em Kill Bill embala a fantasia que seguirá, o conto sobre um assassino triste, que não se conforma com suas perdas, mas que é capaz de novamente tocar suas canções. A expectativa do espectador por mais combates e uma história repleta de emoção não demora a ser cumprida.

    Rodriguez traz personagens visualmente icônicos, não só com Depp e seus parceiros de longa data Danny Trejo e Cheech Marin, mas também com Mickey Rourke, que faz Billy, um mafioso que sempre anda com seu pequeno cão a tiracolo (chamado Moco, como o vilão de El Mariachi), e o chefe de cartel Barillo, de Willem Dafoe. As fantasias que Sands usa e os sonhos do Mariachi – chamado pelo primeiro de “El” – são bem legais, e mesmo com o tom irreal, existem momentos muito bonitos, como o casamento do Mariachi com Carolina.

    Incrivelmente esses momentos mais sentimentais se harmonizam com todo tom jocoso e satírico. E este é certamente o filme mais sério da trilogia, e também é o menos engraçado da filmografia recente do diretor, mesmo com toda a suspensão de descrença impressa nos feitos de Banderas e dos outros heróis. Aqui mora um dos problemas do filme, que ocorre nas festividades do Dia dos Mortos. A solução encontrada para pegarem Sands é muito conveniente, assim como a participação de Ajedrez nisso. As conseqüências disso ao menos garantem bons momentos de ação, com o personagem tendo que confiar mais em seus instintos.

    Mas é sobre o Mariachi que repousam os momentos mais épicos, e quando ele tenta proteger o presidente ocorrem assassinatos retirados dos autênticos westerns italianos, onde os corpos dos vilões voam como se a gravidade inexistisse. A vingança do músico finalmente é alcançada, e apesar de alguns acontecimentos violentos, o idílico e ilusório predominam os momentos finais de Era Uma Vez no México, como uma ode de Rodríguez não só aos cinemas que sempre amou mas também a pátria onde nasceu.

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  • Crítica | A Balada do Pistoleiro

    Crítica | A Balada do Pistoleiro

    A Balada do Pistoleiro começa com Steve Buscemi entrando em um bar, sendo atendido por Cheech Marin. Buscemi fala para o bartender e para as demais pessoas que querem ouvir sobre a lenda de um pistoleiro careta, que bebia refrigerante e andava com uma case de violão, sendo como um anjo exterminador, capaz de matar todos que lá estão de maneira tão estilizada que parece ter saído de uma história em quadrinhos.

    O longa não é tão inventivo quanto seu antecessor, mas é carregado de charme e carisma, a começar por seu herói, vivido por Antonio Banderas, que é acompanhado em alguns momentos do primeiro Mariachi, Carlos Gallardo. Esta versão tem sua própria identidade e caráter, que prosseguem canastronas, mas de um jeito diferente. Se Rodriguez lançasse somente esse epílogo como um curta, certamente seria premiado, pois funciona muito bem como exemplar único. Aqui, Rodriguez abusa do poder de introduzir seu herói, mas as sequências iniciais são boas demais para serem descartadas, tendo todas elas o poder em reinventar o mito do pistoleiro musical.

    A história desta parte dois tem muitas semelhanças com a primeira, com Banderas fazendo as vezes do Mariachi e de Azul, as diferenças moram na preparação. O artista transferiu todo o seu talento em fazer música para o ofício de matar, uma vez que sua mão esquerda não mais tem firmeza para segurar as cordas do violão. Sua caixa não pode mais carregar um instrumento que embala a alegria das pessoas, restando espaço apenas para os armamentos. Mesmo com um texto simples, há espaço para a exploração de um lirismo típico das letras das baladas mexicanas, além é claro de semelhanças enormes do enredo com o estilo cinematográfico e teatral dos musicais, sem obviamente, ter as músicas, pois se tocadas, feririam o personagem principal, não só em suas mãos mas também em seu coração.

    A introdução do pistoleiro em ação finalmente acontece após uma cena com Quentin Tarantino, do tempo que o diretor achava que poderia se tornar ator, e é sensacional por não ter qualquer apego a realidade e ser escapista ao extremo, mostrando um Mariachi diferente e evoluído, que esconde suas armas dentro do corpo de um violão e nas mangas do seu terno, finalmente justificando o uso de roupas tão pesadas em um ambiente tão quente. Na jaqueta que o personagem principal usa, há um desenho com cores tão fracas que mal aparecem em sua totalidade. O escorpião lembra muito o do assassino vivido por Ryan Gosling em Drive, de Nicolas Widing Refn, e coincidentemente existe o uso dos mesmos simbolismo.

    Bucho, de Joaquim de Almeida é um vilão tão ou mais caricato quanto Moco, mas os capangas e demais assassinos são vilões carismáticos, como o Navajas de Danny Trejo, que tem um fim precoce por conta da covardia dos seus inimigos. No entanto, entre os coadjuvantes, quem rouba a cena é Carolina, feita por Salma Hayek no auge de sua beleza. Com ela e o pistoleiro juntos, acontecem cenas onde o imponderável é a tônica, acrobacias não soam irreais e as fugas das balas não parecem tão inverossímeis.

    As curvas finais tem uma dramaticidade, mas não tão bem construídas quanto as do primeiro filme. Mas no quesito ação Rodriguez evoluiu muito, mostrando a mesma linguagem cinematográfica sofisticada do primeiro filme, com um orçamento mais pomposo, que lhe dá liberdade para prestar reverência a Sam Peckinpah, Don Siegel e Clint Eastwood, alguns cineastas posteriores ao western spaghetti que também fizeram filmes dignos.

    As participações de Albert Michel jr. e Carlos Gallardo também são bem legais e pontuais, celebrando a memória do antigo filme que levou Rodriguez ao estrelato. Os momentos finais não tem tanto apelo quanto a batalha campal anterior, mas tem emoção de sobra, com confronto familiar e um pseudo-abandono da função de justiceiro, A Balada do Pistoleiro faz jus a história original, sendo uma continuação bastante digna, que expande bem o universo de aventura escapista.

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  • Crítica | Os 33

    Crítica | Os 33

    Os 33 1

    Aposta do estúdio Fox para uma história emocionante, Os 33, filme da mexicana Patricia Riggen, adapta a história verídica dos aterrados chilenos, com um elenco estrelado (em ordem de menção na película) por Antonio Banderas, Rodrigo Santoro Juliette Binoche. O que se nota é uma essencial falta de cuidado ao escolher atores não chilenos para realizar um drama recente e muito ligado a identidade conhecida do país.

    A história começa  em uma interação festiva, acompanhando a rotina de Mario Sepúlveda (Banderas) e sua bela família, que comemoram jogando futebol e confraternizando o aniversário de 45 anos de trabalho de um dos mineradores. Aos poucos, os personagens são apresentados, com Maria Segovia (Binoche) vendendo lanches para providenciar sustento para si e para seus parentes, seguida por um montante de personagens que não têm sequer uma fala, além das comemorações que ocorrem. O apelo a dramas comuns acaba se tornando o ponto de partida do filme, gratuito desde o primeiro momento.

    A trama segue pautada na cafonice, usando uma moralidade baixa para dar liga à tentativa de resgate dos mineradores sobreviventes. Além de fazer uso de atores estrangeiros para fazer os papéis importantes dentro do filme, ainda se cai no terrível erro de somente dar uma faceta talentosa para um dos trinta e três mineiros. À exceção de outras celebridades, desde Santoro, que vive Laurence Golborne, até Gabriel Byrne, que faz Andre Sougarret, não há qualquer outro ator que consiga dialogar com Banderas no lugar soterrado.

    Mesmo com os artistas renomados, há uma terrível personificação, primeiro por este drama não significar absolutamente nada para eles – mesmo com toda a comoção mundial e empatia das nações estrangeiras – além de seguir-se uma direção desimportante, que mais aparenta ter a abordagem de um telefilme do que um produto cinematográfico blockbuster.

    Nenhuma das intenções em relação à importância tanto com os soterrados quanto com os que visam libertá-los é bem construída. A proeza que foi a resistência dos chilenos é apresentada sob uma estética pueril e descaracterizada, como a visão de alguém de fora sobre uma situação bastante local, livre de qualquer emoção que poderia fazer do longa algo tocante, o que é uma lástima, considerando o potencial dramatúrgico do drama real dos sobreviventes.

  • Crítica | Woody Allen: Um Documentário

    Crítica | Woody Allen: Um Documentário

    A evolução de um artista se mede pelo catálogo conjurado ao longo de tantos anos. De lá pra cá, uma lista que atesta o gênio de um comediante não pode ser menos que homérica, ou mais digna de ser debatida, filme por filme, num documentário feito sob medida a fãs, estudantes e curiosos sobre a vida (e obra) de Woody Allen, o criador dos monólogos, diálogos e de toda a comédia mais textual que visual de Noivo Neurótico, Noiva Nervosa (seu melhor filme), Memórias e Meia-Noite em Paris. Uma mente a serviço de um gênero que dedicou sua vida a aprimorar, muito além do estilo de comedia americana, das lições de Buster Keaton, Charles Chaplin e os lendários irmãos Marx, a trindade que ainda tanto espira Allen em sua máquina de escrever, de onde saíram seus mais de 50 roteiros, sem exceção ou afetações tecnológicas. Ao costurar a vida de um artista, o jornalista Robert B. Weide, fã do humorista, não escapa do humor leve e afiado de seu ídolo no ritmo de seu filme, e tampouco esquece que ninguém é perfeito.

    A tarefa de mistificar Woody Allen e ser justo, ao mesmo tempo, com os altos e baixos da carreira de quem faz praticamente um filme por ano, há quase oito décadas, nunca seria fácil. Reunindo velhos amigos como Diane Keaton e Mia Farrow, as duas musas do judeu inseguro e inquieto, tal qual Penélope Cruz e Scarlett Johansson, um pouco de sangue novo, entrevistas inspiradas pretendem mais revelar que comentar, expondo a arte mais nobre dos documentários a favor da reflexão: levar o fato ao público e deixá-lo ruminar, sem condicionar o rebanho a uma única opinião. E igual nossa relação de amor e ódio com os loucos e normais personagens criados pelo artista, aos poucos vamos descobrindo segredos e resgatando fatos, interessantes o bastante para merecer o registro, de uma vida tão polêmica quanto produtiva, ainda que parcial aos talentos e desejos de Woody. O próprio Martin Scorsese, colega desde os anos 70 (Taxi Driver e Noivo Neurótico, Noiva Nervosa são clássicos da mesma época), admite que poucos têm tanto a dizer quanto a mente por trás de A Rosa Púrpura do Cairo, Zelig e A Era do Rádio.

    Das mãos de onde saíram tantas reinvenções de um gênero que não se limita mais, também pela contribuição inteligente do cineasta, a provocar apenas aquela risada fácil, Woody Allen: Um Documentário nos remete a lições extraídas dos filmes, dos livros e da carreira que postula e converge numa vida curiosa, voltada à análise das emoções humanas, das traições entre casais, dos laços familiares, das fugas ao passado, do desejo pelas mulheres, das paranoias de viver em sociedade, universos inevitáveis nas histórias do autor. Elevar ao hall das lendas esses aspectos é tarefa de fã, o que certamente torna mais doce o desafio, ainda que incompleto, de emoldurar carreiras tão prolíficas numa obra que vai do jazz à psicologia, sendo divertido e deliciosamente previsível, como pede o figurino. Imagine um documentário sobre Scorsese (o que já está na hora de acontecer): o culto a diversidade cultural e a violência qualificada seriam omitidas? Resposta óbvia.

    Seria loucura afirmar que o documentário de Robert Weide não tem lugar entre os livros sobre o artista, em especial o hilário e amplamente pessoal Conversas com Woody Allen, da editora Cosac Naify, livro-chave para conhecer mais a fundo o que move e mantém na ativa a ostra octogenária que, com suas pérolas, nunca subestimou a inteligência do público. Um documentário quase à altura das fases do ídolo, se não a falta de precisão entre a arte da pessoa, e a pessoa da arte. Se o homem vale mais que o mito, ou vice-versa, o filme não se dá o direito de concluir essa questão, à margem de nosso juízo a partir dessa pendência, dessa falta de postura e coerência. Destaque, mesmo, ao equilíbrio entre o que é lendário na carreira de Allen e o simplório, tal seu platônico amor por sua eterna parceira: uma clarineta.

  • Crítica | Bob Esponja: Um Herói Fora D’Água

    Crítica | Bob Esponja: Um Herói Fora D’Água

    Bob Esponja Um Herói Fora Dagua 1

    A animação Bob Esponja: Um Herói Fora d’Água é a segunda incursão, na grande tela, de Bob Esponja Calça Quadrada, série produzida pela Nickelodeon e criada pelo biólogo marinho Stephen Hillenburg originalmente como um programa educativo sobre os oceanos.

    Diferente do modesto primeiro longa de 2004, desta vez os diretores Mike Mitchell e Paul Tibbitt aproveitam-se do recurso 3D e da animação CGI para extrair todo o potencial comercial deste personagem, que conta inclusive com um clipe de Pharrel Willians como peça promocional. O resultado é uma bilheteria astronômica que foi capaz de desbancar o fenômeno Sniper Americano em solo americano.

    Sucesso desde sempre, a série é sobrevivente de uma outra época das animações por manter-se convicta de seu carisma e apelo cultural, e não à toa é produzida desde 1997. Nada muda. Não possui arcos ou desenvolvimento de personagens: é apenas uma comédia bem moldada nas bases do humor físico de caráter ingenuamente “vergonha alheia”.

    Um herói que deve consertar seu erro ingênuo é ingrediente essencial em qualquer aventura, porém na comédia o herói não aprende com seus erros, mas sim os repete à exaustão. Neste aspecto, as aventuras de Bob Esponja são precursoras do meme ao trabalhar aspectos recorrentes e esgarçar a piada no limite do incômodo, porém com a inserção de gags que trabalham a quebra da lógica, criando o efeito humorístico. Não seria diferente então nos cinemas. Aqui, vemos as mesmas piadas de sempre, com o Planck tentando roubar a fórmula do hambúrguer de siri  ̶  que é basicamente a sinopse do filme  ̶ , adicionada a uma excelente justificativa do porquê ninguém decorou essa fórmula ainda.

    Com um desenrolar mais lento que o de costume, os diretores conseguem acelerar o ritmo para o padrão alucinado que as animações têm hoje em dia ao fazer a troca periódica da ação e cenários como quem estivesse submetido a um metrônomo, e assim manter as crianças filhas da Ritalina entretidas.

    O resultado, porém, é um filme enfadonho em diversos momentos, por ser bem menos ousado que sua versão televisiva e pela necessidade de prender a atenção do público por mais tempo do que o tempo de piada, o que diminui a malemolência de sua comédia perante a imposição de um ritmo bem mais rígido que retira o prazer da surpresa e da subversão costumeira.

    Com bons momentos, como a participação do primo do Fliper na obra e uma ou outra piada, mas sem conseguir potencializar o que já conhecemos, Bob Esponja: Um Herói Fora d’Água é uma adaptação competente, mas bem distante de seu “verdadeiro eu” da TV. Há algum espaço para deixar claro que Bob esponja vem de outra mídia, tanto que, ao ir para o mundo real, a animação muda de técnica e tira sarro do melodrama heroico, daquilo que é nativo do cinema. Neste ponto, o filme mostra realmente a que veio, mas aí ele já está quase no final.

    Texto de autoria de Marcos Paulo Oliveira.

  • Crítica | Os Mercenários 3

    Crítica | Os Mercenários 3

    Expendables 3

    Simbolicamente – e claro, a exemplo dos dois episódios anteriores – Os Mercenários 3 já começa em meio a ação, mostrando Barney Ross (Sylvester Stallone) e seu grupo de dispensáveis brucutus invadindo um trem em movimento, no intuito de resgatar o preso e antigo amigo do membro do grupo Surgeon, que é vivido por Wesley Snipes, que apesar de ser resgatado, permanece arredio. A quantidade de referências à vida pessoal do intérprete (este ficou um tempo longe dos holofotes por estar encarcerado) só não é maior que o paralelo feito com o retorno aos sucessos que cada um dos antigos heróis de ação teve após o primeiro filme de Sly e companhia.

    No entanto, uma mudança é notada logo de início. Apesar do conteúdo da fita permanecer agressivo, a faixa etária da classificação indicativa diminuiu drasticamente, o que impede a câmera do novato Patrick Hughes de exibir a quantidade colossal de sangue e dilacerações que permeavam os filmes anteriores. O retorno de Surgeon, além de causar uma marola na relação dos Mercenários (com uma referência, claro, a este como alcunha do clube) por este, como Christmas (Jason Statham) ser especialista em facas, reabre algumas feridas, como com as mostras das tags dos antigos companheiros mortos e claro, com a descoberta da sobrevivência de Conrad Stonebanks, encarnado por um bombadíssimo Mel Gibson.

    Além de guardar o ódio de seus antigos colegas, Stonebanks alveja Caesar (Terry Crews), e o põe em um perigo de vida imenso, o que faz Barney pensar mais seriamente em uma aposentadoria, não por si, mas por seus companheiros. A caçada do herói passa a ser solo, resgatando mais algumas figuras de seu passado, cortando a estrada em busca do que deu errado, e do porquê de Conrad ainda estar vivo. Nesse ínterim, ele é apresentado a uma nova gama de personagens, entre eles o novo encarregado da CIA vivido por Harrison Ford, Drummer – que consegue ser um trocadilho até pior que Church – o selecionador de novos talentos Bonaparte (Kelsey Grammer) e o acrobata cinquentenário Galgo (Antonio Banderas) e alguns outros meninos novos, com disposição e com todos os dentes na boca, que deveriam substituir os trabalhos de seus antigos colegas.

    Refugados por seu antigo líder, Lee e os outros veem a força tarefa da nova geração embarcar junto a Barney e Trench (Arnold Schwarzenegger), repleta de rostos bonitos, sorrisos encantadores, remetendo visualmente às séries consumidas pelos adolescentes atuais, em mais uma artimanha de Stallone em alcançar o público juvenil. A dura realidade de estar novamente relegado a um papel secundário, em um campo onde antes reinavam, acomete Lee, Gunnar (Dolph Lundgren), Toll Road (Randy Couture) e Surgeon, e até o que poderia ser um defeito do guião acaba sendo uma boa anedota, a banalização da figura do brucutu serve como uma excelente motivação dentro da proposta.

    O legado que Ross tenta deixar é o de proteger os que lhe são caros, mesmo que isso signifique tirar da ação aqueles que sempre foram fiéis, o que faz o embate com seu antigo parceiro ser ainda mais aviltante, uma vez que Conrad considera que ambos são iguais. O antagonista não vê diferença nas posturas tomadas pelos sexagenários mercenários, e em meio a uma troca de papéis nos arquétipos de gato e rato, Stonebanks rapta a nova equipe de Barney, o que faz com que o dream team retorne das cinzas, em mais uma manobra redentora típica dos filmes que Sly dirigia nos anos 80.

    O modo como Hughes conduz a câmera é competente em sua proposta, uma vez que, ao contrário dos outros filmes onde se fazia um pastiche dos filmes de ação oitentistas, esse serve para mergulhar na mente e na operação de seus protagonistas. A fita é repleta de humor, especialmente nas figuras de Galgo, mas o viés de reflexão é mais sobre a obsolescência do que qualquer outra coisa, não que haja alguma inteligência maior do que nos outros momentos da franquia, mas a emoção é muito mais elevada, a busca é em comover a audiência através do drama de seus heróis.

    Nas cenas finais, é a velha guarda que toma as rédeas da situação, protagonizando as partes mais interessantes do embate, que infelizmente usa e abusa dos efeitos em CGI. Um dos diferenciais da franquia até então eram os combates filmados in loco, com técnicas que podem ser vistas como rudimentares pelo expectador novato, mas que garantiam às fitas mais veracidade e textura.

    No entanto, os erros de concepção ficam ainda mais evidentes. O vilão poderia ter sido melhor construído, ele não é nem tão digno de ódio quanto Villain era em Os Mercenários 2. Falta sentir apuro pelos personagens principais, a todo momento parece que os velhacos se safarão sem arranhões, são raros os embates físicos, que até são precedidos por frases feitas de cunho excelente, mas pouco mostram, ainda que a breve luta de Stonebanks e Ross seja interessante. O grave problema deste Os Mercenários 3 é ser bem menos divertido do que as fases pretéritas, deixando espaço para enxergar seus defeitos.

    A mensagem deixada em seu final vai de encontro a tudo o que foi mostrado na carreira de Stallone e também nesta franquia. O modo como Barney olha para aqueles que seriam os seus alunos, trinta anos mais jovens fazendo tudo o que ele cansou de fazer em tela dá a tônica de como funciona atualmente a mente e a intimidade do ator, diretor e cineasta, talvez até antevendo uma possível aposentadoria, se não da carreira de cineasta, ao menos do filão de filmes de ação. Esse subtexto acaba sendo mais rico que toda a arquitetura, pirotecnia e atitude bad ass que sempre preconizaram as ações de Barney e seus asseclas.

  • Crítica | Machete Mata

    Crítica | Machete Mata

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    A nova vida do personagem-título já é modificada logo no início da trama. Mais uma vez lançando-o numa caçada de vingança sem muita enrolação, a narrativa mostra-se tão louca e desvairada quanto a do primeiro filme. Machete prossegue com suas execuções, munido de lâminas gigantescas e dilacerando corpos como se fossem de papel, tornando-se um herói ainda mais imune a dor e coisas letais e uma figura imortal enquanto tiver uma missão.

    A abertura com um toque de psicodelismo e silhuetas femininas lembra as sessões de matinê, além de remeter obviamente aos preâmbulos de 007. O herói é obviamente um super agente à maneira mexicana. Nesse mundo exagerado, o presidente americano não poderia ser Obama, mas sim um branquelo, farpador, beberrão e drogado. Carlos Estevez o interpreta muito bem, especialmente quando narra o esdrúxulo plano contra o vilão latino: o discurso contém meia dúzia de frases de efeito, mas ainda assim sensibiliza o paladino xicano.

    O sorriso do Senador John McLaughlin no final do primeiro episódio é justificado. O elevado muro que planejou foi enfim construído, o que ocasionou um aumento substancial da violência nas ruas mexicanas, aumentando o poder dos cartéis. Mendez (Demian Bichir) é um justiceiro/soberano com desvios de comportamento e múltiplas personalidades, que, apesar de seus atos inconsequentes, busca uma alternativa justa para o seu país. O passado do personagem esconde motivações parecidas com as de Machete. Rodriguez usa toda a bagunça visual e os clichês de action movies para mostrar uma triste situação com sua pátria-mãe, e eleva ainda mais o herói mexicano em detrimento dos americanos motherfuckers. A crítica política aos americanos não envolve somente o menosprezo dos estadunidenses perante os mexicanos, contempla também a paranoia de não mais existir nenhum opositor demoníaco desde Bin Laden.

    O desenvolvimento da trama é qualquer coisa. Ao fazer um paralelo com Jack Bauer e 24 Horas, inverte o lado da paranoia terrorista de forma jocosa. Rodriguez não tem receio de abandonar as ideias do primeiro filme e mudar o gênero. Como é prazeroso reassistir Mel Gibson em um papel canastrão por essência, sem que este esteja produzindo/dirigindo um filme. Luther Voz tem o cinismo do Doctor Evil, os olhares e carisma de Martin Riggs, e claro, protagoniza cenas homenageando seus filmes, inclusive dirigindo um carro enferrujado com close nos olhos, à la Road Warrior.

    O ambiente, supostamente hermético onde há a batalha final, é tosco, assim como as produções sci-fi dos anos 50/60. As lutas referenciam Jornada nas Estrelas: A Nova Geração, Era Uma Vez no México, Kill Bill e até Império Contra-Ataca. Rodriguez põe pra fora todo o seu lado nerd e não se preocupa em ser taxado de presunçoso, em razão de toda a jocosidade do roteiro.

    O fim abre uma brecha enorme para o 3° episódio, uma Space Opera, e é absolutamente condizente com o resto do filme. Apesar do subtexto ser bem menos contestador, Machete Kills cumpre perfeitamente a função de ser uma anedota de um action movie exploitation, com latinos mordedores e clichês milMachete Mata é, sem dúvida, um dos melhores exemplares de ação do ano. Detalhes para todo o carisma de Danny Trejo, para o trailer no começo da exibição e para as cenas pós-créditos com pouco sentido.

  • Crítica | Ruby Sparks: A Namorada Perfeita

    Crítica | Ruby Sparks: A Namorada Perfeita

    Ruby Sparks

    A comédia romântica não é um gênero conhecido pela imprevisibilidade ou pelas inovações: o roteiro segue uma espécie de fórmula e é preciso fazer um filme simpático e divertido, mas todos os espectadores sabem que um casal se conhece, se desentende e fica junto no final. Sendo assim, o sucesso desses filmes se baseia no carisma e na química dos protagonistas, e também na parcela de “comédia” que torna agradável todo o caminho até um final já esperado.

    Ruby Sparks acerta exatamente em fazer um filme que trabalha muito bem a maior parte dos clichês do gênero, mas ainda assim inova o suficiente para se destacar do mar de filmes bonitinhos existentes.

    O roteiro escrito por Zoe Kazan (que também é a protagonista-título e neta do lendário diretor Elia Kazan) se foca em Calvin, um escritor prodígio que, dez anos depois do sucesso de seu romance de estreia, está em crise e com bloqueio criativo. Calvin não tem mais amigos e não interage com ninguém exceto seu irmão e psicanalista, até que um dia a protagonista do romance que ele afinal começou a escrever se materializa em sua cozinha e afirma ser sua namorada.

    Aqui está a maior originalidade do filme: Ruby Sparks não acaba quando os protagonistas finalmente ficam juntos. Ele começa aí, e sua trama não é composta das desventuras enfrentadas até que um descubra o amor do outro, mas justamente das dificuldades em se manter um relacionamento depois que o primeiro momento já passou. Ruby surgiu na mente de Calvin, logo, ela é a namorada perfeita, sua garota dos sonhos; mas, conforme ela vai vivendo no mundo real, sua personalidade ganha nuances. O que a torna encantadora também a faz inconstante, e a maior questão de Calvin vai ser aprender a lidar com algo que escapa completamente ao seu controle, mas que ele também não quer viver sem.

    Kazan acerta na construção de seus personagens: ambos são multi-dimensionais, parecidos com pessoas de verdade e parecem fazer sentido juntos. Mas, mais do que isso, Ruby é uma espécie de crítica ao estereótipo da menina problemática-mas-espontânea-e-adorável que vem proliferando nos últimos tempos. Sim, ela é adorável e também irritante, divertidamente espontânea, mas capaz de acabar de lingerie na piscina de uma festa cheia de gente importante. A visão da roteirista sobre essa legião de meninas “desajustadamente perfeitas” parece  estar expressa em uma fala do irmão de Calvin: “Mulheres esquisitas e bagunçadas, cujos problemas apenas as tornam mais adoráveis, não são reais.” E é justamente esse abismo entre a ideia na cabeça de Calvin e a menina de verdade à sua frente o assunto do filme.

    Ruby Sparks não açucara excessivamente seu tema: em alguns momentos a relação de Ruby e Calvin beira o doentio, e o final do filme traz uma cena bastante violenta. Ainda assim, o clima geral é alegre, romântico e otimista. Kazan e os diretores Jonathan Dayton e Valerie Faris (responsáveis por Pequena Miss Sunshine) conseguem resgatar um gênero que definhava visivelmente e inserir inteligência e reflexões válidas, sem perder o charme das comédias românticas tradicionais. Não é uma obra-prima do cinema, mas é um filme inteligente, divertido e a melhor comédia romântica em muito tempo.

    Texto de autoria de Isadora Sinay.