Tag: documentário nacional

  • Crítica | 8 Presidentes e 1 Juramento: A História de um Tempo Presente

    Crítica | 8 Presidentes e 1 Juramento: A História de um Tempo Presente

    Crítica 8 Presidentes e 1 Juramento

    8 Presidentes e 1 Juramento: A História de um Tempo Presente é um documentário em longa-metragem, conduzido pela veterana atriz Carla Camurati, conhecida por dirigir Carlota Joaquina: A Princesa do Brasil, filme marco zero da retomada do cinema nacional pós-queda da Ditadura Militar. O filme narra os eventos da recém-adquirida possibilidade de voto do povo brasileiro até Jair Bolsonaro.

    O ponto inicial do longa é a campanha das Diretas Já, seguido da posse de José Sarney após a morte de Tancredo. É curioso como não há narração, a produção optou pelas imagens contando a história, associando-as à recortes de jornais impressos de época e anúncios de rádio e televisão.

    O filme possui algumas cenas bastante raras e algumas curiosas. Nos tempos de Fernando Henrique Cardoso são mostrados índios protestando. Esse tom pode fazer o espectador acreditar que o tom do governo seria agressivo, mas não é, na verdade, é bastante respeitoso, ao contrário do que se vê ao falar de seu antecessor, Fernando Collor de Mello, flagrado aqui como um político que não conseguia tomar as rédeas da economia do Brasil.

    O filme não se furta em mostrar que o embrião do Bolsa Família foi originado por outros programas de distribuição de renda da época de FHC, assim como explana a mudança de postura que Luiz Inácio Lula da Silva fez para se tornar um candidato viável politicamente. O longa passa pelos escândalos do Mensalão e a participação do ex-deputado Roberto Jefferson, inclusive destacando momentos pitorescos, como a chegada dele com um olho roxo no Congresso. Não há concessões.

    Curiosamente, as partes que mostram a história do Partido dos Trabalhadores na presidência parecem mais breves, o que é até compreensível, visto que há tantos trabalhos em documentário sobre esses processos, como Entreatos, O Processo, Alvorada e tantos outros produtos que abordaram essa época. Há um belo acerto ao mostrar como as manifestações de 2013 influenciaram a queda de popularidade das figuras de Dilma Rousseff e Lula, assim como também é correta a fala de que tais atos não eram compostos exclusivamente pela direita. Ainda assim se fala bastante do crescimento econômico do país e dos escândalos de corrupção.

    A parte mais correta do filme é quando se destaca como a evolução da internet influenciou a democracia no continente americano e no Brasil. Redes sociais e memes são sabiamente apontados como o fiel da balança para os últimos resultados da política nacional, seja no golpe aplicado em Dilma, como também na popularização de Bolsonaro.

    8 Presidentes e 1 Juramento: A História de um Tempo Presente é uma boa forma de introduzir uma pessoa que nada saiba sobre como o caótico cenário sócio político do país chegou a esse 2021, mas ainda assim carece de um ritmo aceitável, suas mais de duas horas são extensas, e isso faz o documentário parecer um especial de TV de final de ano, trocando os últimos 365 dias para todos os anos pós-Constituição.

  • Review | A Corrida das Vacinas

    Review | A Corrida das Vacinas

    A Corrida das Vacinas é uma série produzida pela Globoplay que tenta mostrar como funciona a luta para chegar a vacinação universal contra a pandemia do novo corona vírus. O programa é dirigido e apresentado por Álvaro Pereira Júnior e tem seu conteúdo aberto para não assinantes, mirando, evidentemente, um consumo amplo. Foram 5 episódios e um extra, e no primeiro (Nós Vamos ter essa Vacina) há uma pressa por elucidar o quadro mundial e como o Brasil lida com isso.

    Já nas primeiras cenas, os corredores do poder do governo de São Paulo são mostrados. O político João Doria autorizou a equipe a filmar parte da apresentação antes da conversa com a equipe do comitê de negociações para discutir os detalhes de eficiência da CoronaVac. Nesse cenário, o áudio de uma reunião vazou acidentalmente no equipamento da Rede Globo, em um fio que captava o vídeo de uma apresentação do documentário, nele se ouve algumas falas contundentes do governador e até do diretor do Instituto Butantã, Dimas Covas, sobre as dificuldades de conseguir negociar os insumos junto à China.

    O roteiro é didático. Uma pessoa que não saiba nada a respeito do vírus, dos seus efeitos e da politica nacional envolvendo a pandemia será completamente contemplada. Há um bom detalhamento do episódio do paciente da CoronaVac utilizado pelo governo federal de Bolsonaro para servir de espantalho contra o governo de São Paulo e a “vacina do Dória”. Além disso, há destaque a grupos especializados como funcionários da Anvisa, Instituto Butantã, Oxford, além de imunologistas e cientistas de renome.

    A série conversa bem com outras produções do gênero, como Por Um Respiro, especialmente quando mostra o cotidiano de pessoas lamentosas, sem permissão sequer de abrir as portas de suas casas para pessoas mais próximas, sob risco de contágio e morte. O lado emocional é bem demonstrado, e não abusa do sentimentalismo. A questão mais flagrante é o personalismo de Pereira Júnior que se faz personagem frequente nas coletivas de imprensa em São Paulo, além de sua proximidade com as autoridades que estudam a eficácia da primeira vacina feita no Brasil, a CoronaVac. É curioso que, ao perguntar sobre a eficácia e seus resultados, ele se aproxima e faz um ato não recomendado, batendo no ombro de um dos responsáveis pela comunicação. Ainda assim, seus apontamentos e questionamentos são válidos e sua insatisfação com alguns discursos é justa.

    Pereira Júnior viaja para outros cenários, percebe aglomerações em Nova Delhi, na Índia, com o povo não tendo receio de contrair o vírus, fato que dá um tom profético ao documentário, pois a situação estava tranquila na época da gravação e pouco tempos depois o país sofreu com uma segunda onda. Já no que diz respeito a sua visita à Rússia, o apresentador parece bem impaciente, chega a verbalizar que se montam circos midiáticos para ludibriá-los ao lado de outros órgãos da imprensa mundial. A favor dessa desconfiança, há também a percepção popular das pessoas na Rússia com a Sputnik V, mas ainda assim, a postura do diretor é um pouco inexplicável, beirando até a xenofobia no caso de algumas possibilidades de vacinas.

    A série é padrão Globo. Lembra os bons episódios do Profissão Repórter ou Globo Repórter, ainda que tenha uma abordagem mais incisiva, sensível e certeira. Os cinco episódios são boas introduções ao tema, especialmente para quem não lê tanto a respeito da procura pelas vacinas. De acordo com o sexto episódio (extra), possivelmente terão mais momentos. Ainda nesse episódio, temos a presença do imunologista Renato Kfouri, o professor Esper Kallás e a microbiologista Natalia Pasternak, fechando bem esse especial que certamente caberia em uma possível continuação visto os acontecimentos recentes da CPI da Covid.

    https://www.youtube.com/watch?v=nfXLpDusSuU

  • Crítica | Narrativas do Pós

    Crítica | Narrativas do Pós

    Narrativas do Pós é um filme experimental que une clichês de filmes, livros e seriados de Sci-Fi com a problemática da pandemia de Covid-19. O documentário de Graubi Garcia e Jairo Neto busca enxergar como o mundo funcionará após a pandemia do novo coronavírus, e se gaba por todas as entrevistas terem sido gravadas de maneira remota.

    A montagem favorece demais o consumo da produção. Além disso, a trilha repleta de batidas de funk ajuda a fortificar a ideia do formato  ser necessariamente moderno. Os diretores variam o estilo da narrativa, apelando em alguns pontos para as vozes em off de autores de ficção científica como Isaac Asimov, Arthur C. Clarke, Ray Bradbury, além de muitas referencias visuais como Alien: O Oitavo Passageiro, O Sétimo Selo, Enigma de Andrômeda, O Exterminador do Futuro, Ex-Machina e tantos outros. Entre as referências, as mais notáveis são Matadouro Cinco tanto o filme quanto o livro de Kurt Vonnegut, e O Homem do Castelo Alto, série baseada nos livros de Philip K. Dick, que são símbolos de distopias que pareciam distantes em algum ponto da história, mas são assustadoramente reais e tangíveis atualmente, graças ao avanço negacionista e de extrema direita que tomou posse do Brasil e de vários países do mundo.

    O documentário é pontual. Não se envolver com ele ao assisti-lo é praticamente impossível. Não se passa incólume por ele, seja ao ter contemplada alguma referência popular ou meramente pela questão sentimental. Os entrevistados são pessoas da arte,  gente do cinema, cientistas políticos e todos tem algo a falar. A forma como esses discursos chegam ao público não é refém do formato, ao contrário, texto e edição conversam bem juntos, gerando informação, discussão. As referências ao futuro e à literatura especulativa é esperta, denuncia as situações tristes pelas quais passa o país e o descaso com as vítimas da pandemia, entre os mortos e os que aguardam a vacina.

    Narrativas do Pós abre possibilidades sobre o futuro, mas também olha para dentro, para o presente e em como é bizarra a banalização da vida e da saúde do povo. O filme faz tal análise apelando para produtos de fácil consumo, para as alternativas possíveis baseado em tudo que já foi escrito, filmado e consumido, para abrir possibilidade de futuro, mesmo que ele não seja cheio de esperanças.

  • Crítica | Boa Noite

    Crítica | Boa Noite

    Clarice Saliby começa seu longa, Boa Noite, colocando Cid Moreira, seu objeto de analise, diante de um desafio que se mostra complexo: configurar a inteligência artificial de um celular para compreendê-lo. Cid tenta conversar com a Siri, a assistente inteligente da Apple. Sem sucesso, o jornalista e principal voz do Jornal Nacional tenta abrir sua vida e intimidade para a câmera, finalmente deixando de noticiar ou narrar os acontecimentos para  se tornar o alvo, tornar-se a própria notícia.

    O biografado é lúcido. Entre os VTs de seus trabalhos de narrador e âncora, mostra as agendas que guardou consigo. Cadernos antigos que davam conta de sua rotina, desde o simples dia a dia com a dieta que pratica, até detalhes diferentes como a frequência de idas ao banheiro. Além do básico, destacando os trabalhos que fez e que ainda faz. Ele narra bem seus dias, desde quando veio do interior paulista de Taubaté até os dias atuais, mais aposentado do que ativo.

    O filme é simples e se vale da boa participação de seu personagem central com a narrativa de sua trajetória, desde os jornais cinematográficos, no especial de esportes que passava na grande tela (o Canal 100  que reunia o tape de esportes populares), até a chegada da televisão com o trabalho na Tv Excelsior e, finalmente,  no Jornal Nacional da Tv Globo em que esteve por  27 anos, entrando para o livro dos Recordes como o mais longevo apresentador de um mesmo jornal diário.

    Boa Noite é emocional, se aventura a falar de questões mais polêmicas, como quando Cid se declara sem lado político, mas não se aprofunda. Como ele próprio, que se diz um mero propagador de palavras escritas por terceiros, o documentário parece apenas apresentar sua trajetória. A obra se torna um louvor a vida, a carreira e a rotina atual de um sujeito midiático que fez parte da maneira como a notícia chegava a casa das pessoas, sobretudo as mais populares do Brasil. Mesmo sem maiores aprofundamentos consegue trazer uma aura simpática ao comunicador veterano, dando lastro até para um possível novo documentário sobre o príncipe dos mistérios, o Mister M, mágico famoso no Brasil pela narração de Cid no Fantástico.

  • Crítica | Mussum: Um Filme do Cacildis

    Crítica | Mussum: Um Filme do Cacildis

    Figura mítica do humor brasileiro, Antonio Carlos Bernardes Gomes, ou Carlinhos,  é a figura principal do novo filme de Susanna Lira, Mussum – Um Filme do Cacildis, que por sua vez, começa através da música, do samba que ele praticava com sua antiga banda, Os Originais do Samba. A maioria dos primeiros entrevistados dizia que ele era um passista fabuloso e parecia talhado para o samba, e de fato, ele era, o que não o impediu de mostrar outras facetas de sua persona artística.

    Mussum era humorista, aparentemente ele parecia ter nascido para fazer os outros rirem, e um dos maiores acertos que o filme poderia “cometer” é o deixar ele mesmo explicar quem ele era, mostrando sua trajetória por entrevistas  suas, que servem como narração em off ou não de parte de seu passado. Alguns amigos do seu passado dão depoimento também, normalmente aparecendo com uma animação de tv antiga, um artificio meio bobo, mas que não chega a atrapalhar a compreensão da mensagem que  o documentário quer passar.

    Carlinhos tinha receio de entrar no morro, mas depois que foi pela primeira vez, virou sensação. Ele sempre destacou que sua criação o colocou no rum do sucesso, mesmo que a probabilidade de dar errado era enorme, mas ele passou por cima disso sem pensar. Boa parte das passagens da vida do biografado são animadas de modo divertido, com fotos antigas com uma animação bem primária, acompanhadas das palavras de Lázaro Ramos, e é nesse ínterim que se conta o aborrecimento ao ser chamado de Mussum pela primeira vez por Grande Otelo quando faziam um programa de televisão, e de Chico Anysio afirmando que ele deveria ir devagar com o dialeto que o sujeito inventou.

    Também é curioso notar os elogios de gente gabaritada a respeito  dos Originais do Samba, entre elas, Elis Regina, provando que não era essa “apenas” a banda do trapalhão. O filme trata com humor a árvore genealógica de Mussum, com o cúmulo de ter dois Antonio Carlos Junior, batizados assim por conta dele ter esquecido, mas os filhos jamais reclamaram de falta de amor e cuidado do pai. É uma pena que as entrevistas ocorram com o filtro animado já citado, pois em momentos onde a emoção prevalece, como a vez que um dos filhos de Mussum embarga a voz ao cantar uma música de seu pai chama mais atenção pela forma do que pela reação e conteúdo do mesmo. Ainda assim, sobra emoção do documento histórico que Lira conduz.

    O filme também discorre sobre a questão racial e sobre as acusações de Os Trapalhões ser um programa racista, ao mesmo tempo em que ele era um dos poucos negros no horário nobre, um dos primeiros a fazer sucesso na televisão e a se tornar ícone. Em paralelo a isso, os filhos diziam que seu pai os ordenava a não levar desaforo para casa, além de ele também reagir na rua quando xingavam ele ou seus herdeiros por palavras racistas. Curiosamente nesse ponto há boas falas de Joel Zito Araújo, além de uma cena do filme Os Trapalhões no Auto da Compadecida, onde ele fazia Jesus e batia de frente com os preconceitos do povo. A escolha dessas falas dá um bom panorama sobre a postura do mesmo a respeito do preconceito racial. Mussum – Um Filme do Cacildis consegue atingir mais acertos que erros, e  discorre de maneira bem singela e franca sobre a historia de seu biografado e melhor, sem soar enfadonho ou repetitivo, além de acrescentar bons momentos novos a biografia de Mussum como músico, humorista e como o ser humano admirável e  digno de saudades que ele era.

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  • Crítica | Pastor Cláudio

    Crítica | Pastor Cláudio

    Filme de Beth Formaggini, Pastor Claudio começa com um letreiro que traz a memoria um tempo de desesperança, ligado ao Golpe Civil Militar de 1964. Seu filme/entrevista se foca no ministro que dá nome ao longa, sobre a época em que ele funcionário do governo e da pátria, e o sujeito, já idoso, de compleição bonachona e ouve o entrevistador Eduardo Passos (psicólogo e ativista dos direitos humanos) como se os fatos ditos durante o monólogo que descrevia o trabalho dele.

    Cláudio apesar da idade avançada fala abertamente sobre algumas pessoas que ele executou, entre as vítimas algumas que foram incineradas. Em alguns pontos, o enquadro esconde o rosto através das sombras provenientes do projetor que colocava fotos dos presos políticos “recebidos” pelo religioso.

    Claudio é bem lúcido, fala bem e abertamente sobre seus serviços prestados e sobre sua vida particular em Minas Gerais, onde passou a dever favores a policia local, graças a terem permitido que ele executasse um desafeto, e esses favores foram cobrados. Sua convocação aconteceu sobre o pretexto de que a esquerda e os comunistas se levantavam e precisavam ser freados. A partir daí ele transitaria entre Minas, Viória-ES e Campos dos Goytacazes -RJ.

    Entre o detalhamento das operações e da chegada das pessoas ao lugar em Vitoria onde ocorriam sessões de tortura e onde Claudio Guerra era administrador, se notam dois fatores primordiais, o primeiro é que ele não tem pudor em falar dos mortos que carregava ou que tinha contato direto, no entanto ele dizia durante os depoimentos ele fala que não assistia as sessões de tortura, mas sabia que ocorria ali. O segundo fator são os nomes das vitimas que saltam a tela, repetidamente e esse artifício pode parecer redundante, mas a ideia de mostrar ao espectador quem sofreu naquelas ações é importante, visto que uma lista com dezenas de nomes não teria síntese para dar nome a um filme, livro ou qualquer obra de registro, e o documentário apesar de ter o nome do entrevistado, serve de biografia dos mortos e do processo triste que sofriam, inclusive no processo -igualmente massificado no filme- incinerar os corpos.

    Em todo momento ele dizia ser frio nas execuções, não havia emoção, ao mesmo tempo que recebia benesses pelos atos que praticava. Ele parecia saber detalhes também de presos famosos, como o caso de Zuzu Angel, que segundo ele era bem incomoda e inconveniente aos poderosos, assim como Vladimir Vlado Herzog, inclusive verbalizando que a morte do jornalista foi um tiro no pé. Segundo os comentários que ouviu houve um exagero por parte dos torturadores, que supostamente não tinham intenção de matar Herzog.

    Guerra diz se arrepender do que fez, sobretudo pela questão de ter se associado ao poder nesta época, uma vez que lideranças mundanas seriam naturalmente pecaminosas segundo os preceitos de sua atual religião. Ele considera seus atos como errados mas a frieza com que fala segue impressionante, e ele culpa a falta de punição por ainda existir tortura no país, falando abertamente que elas ainda existem, nas favelas e cadeias, com os pobres, pretos e qualquer pessoa confundido com infratores da lei, e sua leitura da atualidade é bem sóbria, pois tudo o que diz condiz com o real, é um sujeito que viveu muito, que fez parte de uma pagina nefasta da historia brasileira e que tem consciência disso tudo.

    O apoiador confesso de processos de tortura tem um medo, receio de ser pego pelo grupo que ele chama de Irmandade, e ainda que não detalhe muito as operações do grupo, se nota o quanto ele respeita a tal organização. Passos é um belíssimo entrevistador, consegue permanecer impassível a qualquer sentimento e sensações, pois é dele a função de fazer ele falar, e mesmo que não consiga desenvolver muito este assunto em especifico todo o depoimentos de Claudio é esclarecedor e aterrador, fazendo de Pastor Claudio um belo exemplar de um cinema jornalistico preocupado com a historia e também com o futuro, uma vez que em 2019 quando ele chega ao circuito o governo federal seja formado por simpatizantes do Coronel Ustra e outros tantos torturadores e apologistas da Ditadura Militar.

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  • Entrevista | Álvaro Campos, diretor de Tá Rindo de Quê?

    Entrevista | Álvaro Campos, diretor de Tá Rindo de Quê?

    Na última quinta-feira (28/02), estreou nos cinemas o documentário Tá Rindo de Quê?, que se propõe a discutir o humor nos tempos da Ditadura. Para saber um pouco mais sobre o filme, conversamos com um dos diretores, Álvaro Campos. O documentário passou em alguns festivais, e agora correrá o circuito comercial. A conversa exclusiva você lê abaixo:

    Vortex Cultural: Desde quando surgiu a ideia do filme e como foi conduzir um longa-metragem a seis mãos (o documentário foi realizado em parceria por Campos, Claudio Manoel e Alê Braga)?

    Álvaro Campos: O filme surgiu de vontade de documentar a evolução do humor nacional na história. Há muito pouco produzido nesse sentido, e a reação excepcional do público jovem ao filme nos mostra que era um trabalho necessário. E sobre a condução, somos os três muito diferentes, em todos os sentidos. Negociar constantemente pra atender ao filme nos ajudou a contar e respeitar um registro plural da época, em que vozes dissonantes de personagens muito diferentes podiam co-existir, revelando de forma potente o espírito da época e suas múltiplas dimensões.

    Vortex Cultural: Duas falas me surpreenderam: Carlos Alberto de Nóbrega, no sentido de ter um asco enorme da repressão e tortura sobretudo pela época em que o documentário se debruça; e Roberto Guilherme (Sargento Pincel, do programa Os Trapalhões), que achava que na época da ditadura militar havia respeito. Curiosamente, esse último é um dos poucos que não condena o período. Foi difícil selecionar as falas dos entrevistados, deixar material de fora e encontrar o contraponto à visão negativa dos militares?

    Álvaro Campos: A gente partiu de uma lista de setenta entrevistados que pra gente formava o pilar da classe na época. E a partir das vozes deles – e não das nossas teses ou opiniões – o roteiro do filme nasceu. É lógico que imparcialidade absoluta não existe, afinal escolhemos as imagens, mas não cabia a nós buscar essa ou aquela opinião em busca do que nós pessoalmente consideraríamos contrapontos. Nos cabia criar um atmosfera em que as personagens falassem livremente e a partir de seus encontros e contrastes, revelar as sensações desses comediantes sobre esse tempo que, obviamente, não foram poucas. Nenhum de nós tinha a pretensão de esgotar o tema no filme gerando uma ideia de completude. E nem seria possível. São vinte anos de história. E cortar sempre é difícil, principalmente quando você tem a fala dos gênios do porte que tínhamos.

    Vortex Cultural: No final do filme existe um aperitivo sobre o novo documentário de vocês (Rindo à Toa). Existe alguma ligação entre os filmes? Qual a previsão de estreia para ele?

    Álvaro Campos: Sim, os filmes foram gravados juntos. O Rindo à Toa chega aos cinemas entre maio e junho. O objetivo é buscar uma trilogia que documente uma certa genealogia do humor brasileiro desde os anos 60. (Tá Rindo de Quê? vai de 60 a 80, Rindo à Toa vai de 80 a 2000). Assim mostraríamos que nenhuma voz daquelas é uma expressão independente, por maior que sejam seus nomes. Que todos aqueles mitos foram influenciados e influenciaram outros comediantes. E ao montar isso mapearíamos, mesmo que à grande distância, a evolução da classe e desse gênero artístico tão poderoso e popular. E que muitas vezes é muito menos creditado do que deveria em relação à contribuição que deu (e dá) à nossa cultura nacional.

    Vortex Cultural: Em atenção ao governo que subiu ao planalto, cujos principais nomes são bastante simpáticos ao período militar, e levando em conta que seu filme estuda as formas de humor brasileiro do passado, como você acreditaria que seria uma versão de Tá Rindo de Que? a respeito das comédias atuais?

    Álvaro Campos: Esse é um dos possíveis motes do que pode ser o terceiro filme da trilogia. Esperemos, até porque o objeto do filme está em plena atuação.

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  • Crítica | Fevereiros

    Crítica | Fevereiros

    Até mesmo no documentário que se dedica a destrinchar sua personalidade, a cantora e interprete Maria Bethânia consegue soar poética. Os primeiros 8 minutos são acompanhados de pequenos relatos da própria, de parentes – entre eles seu irmão Caetano Veloso – e de pessoas próximos, acompanhando é claro da marcante voz dela. Fevereiros consegue já no início estabelecer um espírito parecido com a sua personagem investigada.

    A forma que o diretor Marcio Debellian conduz o longa é bem simples, toma como base o samba enredo da Mangueira, que homenageou a cantora baiana. O curioso do filme é que ele serve de certa forma como um estudo não só sobre Bethania, mas também de parte da origem da Estação Primeira de Mangueira e um bocado sobre o Candomblé, uma vez que a biografada é bastante religiosa e, por mais que não seja adepta da religião candomblecista, utiliza de muitos dos seus elementos em suas música e nas suas performances no palco.

    O mergulho que Debellian faz na alma do brasileiro é muito bonito e lírico, a alma do cidadão da Bahia e do Rio de Janeiro são muito bem capturadas através não só da exploração da música da biografada mas também na ode que Fevereiros faz do culto as religiões afro-brasileiros. O ritmo do filme é assustadoramente fluído, ele já tem uma duração bem curta, de 75 minutos, mas ele é tão fluído e naturalista em suas análises que não se nota o tempo passar e isso é algo bem raro em um produto documental.

    Debellian já tinha experiência com analises de artistas, em 2014 fez O Vento Lá Fora, sobre Fernando Pessoa, mas aqui ele alcança um cinema bastante maduro, e que faz perguntar se seu filme soa mágico por conta de sua sensibilidade enquanto realizador e pelas ótimas escolhas que faz ao explicar a jornada da heroína que escolheu, ou se é por conta da trajetória de Bethânia enquanto artista e enquanto pessoa física. Documentários de bandas, músicos e musicistas tendem a cair em formulas quadradas e registros caretas e chapa branca, e todas essas características definitivamente não habitam Fevereiros, que segue como um filme sucinto e emocionante em cada momento particular, servindo muito bem na função de ode a arte e ao artista.

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  • Crítica | Lembro Mais dos Corvos

    Crítica | Lembro Mais dos Corvos

    Julia acorda e começa a falar com Gustavo, que está atrás da câmera. Ela declara que detesta ter insônia e ela sequer sabe que gravam. Ela é Julia Katharine, uma mulher trans que é o centro das atenções do filme de Gustavo Vinagre, e Lembro Mais dos Corvos é basicamente sobre Julia, que é a dona da história e sua narradora.

    O tempo inteiro a biografada pergunta o motivo do filme, e o que o diretor queria com as falas dela. Aos poucos ela se abre, e fala sobre sua intimidade. Julia se descobriu cedo, aos 8 anos, e com seu tio avô que tinha 55. Ao mesmo tempo em que ele era o herói de sua mãe, ele era o único que a tratava como mulher, e os dois começaram a ter uma relação. O namoro dos dois era escondido e ao menos na intimidade eles se davam muito bem. Julia não sabia que estava sendo abusada, só chegou a essa conclusão na terapia quando já era adulta e a relação acabou de repente, basicamente porque ela cresceu.

    Aos poucos ela revela detalhes de seu gosto por filmes tristes, e diz que segundo a sua mãe, ela tenta reproduzir seus filmes preferidos o tempo inteiro, mirando uma poesia no cotidiano, como uma Drama Queen normalmente é. A câmera é nervosa, e Gustavo claramente tem problemas com o foco, e isso de certa forma conversa com o ideal da vida, que também é imperfeito.

    Em alguns pontos, o filme não soa tão interessante, por serem problemas meio usuais os que Julia tem como boa parte da humanidade e apesar dela ter um lado muito positivo, as confissões passam por problemas sérios, como com a sua mãe, que a culpa por estar afastada do restante da família, basicamente porque resolveu se assumir mulher trans.

    Julia conversa muito bem, é espontânea e uma mulher muito inteligente, em suma é uma personagem muito rica e muito bem enquadrada por seu diretor e amigo. Seus questionamentos a respeito do porquê do filme simplesmente não fazem sentido, pois ela transborda o suficiente para encher este e outros tantos. No final, ela mostra o amanhecer da cidade, uma das poucas coisas boas de se ter insônia e isso funciona para si como terapia, assim como consumir e fazer cinema.

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  • Crítica | Parque Oeste

    Crítica | Parque Oeste

    Documentário de Fabiana Assis que fala sobre a condição de moradia no estado de Goiás e o espinhoso assunto relacionado as ocupações, Parque Oeste começa com um vídeo institucional sobre a capital Goiânia, uma cidade cuidadosamente organizada, ao menos é o que diz na propaganda. A diretora utiliza da ironia para quebrar a quarta parede e aliviar um pouco as tensões antes de começar a se aprofundar mais nas questões nevrálgicas de seu filme.

    O documentário é conduzido e narrado por uma mulher chamada Eronilde Nascimento que foi moradora do antigo parque oeste, que anda tranquilamente pelas ruas da cidade como uma autêntica filha da terra anda sobre seu lugar de origem. A conversa com o restante do povo é bastante franca e toda gente que passa por ela é tão simples quanto a própria. Por mais natural que essa movimentação possa parecer nesse momento, houve uma época que não era exatamente deste jeito.

    Segundo as pessoas entrevistadas, o Parque Oeste servia para desova de corpos e desmanche de carros antes de se tornar o lar de tantas famílias, não mais do que de repente muitas barracas começaram a aparecer, e aquelas terras foram sendo habitadas por milhares de famílias, em um movimento muito parecido com a favelização que tomou algumas das capitais do Brasil. Para muito além de qualquer discussão demográfica o que o filme de Assis tenta estabelecer é o óbvio, mostrando que o que tinha nesses espaço eram vidas habitando o lugar, mas esse entendimento básico não parecia estar no pensamento das autoridades.

    Há uma gravação do então governador Marconi Perillo, intercedendo para que se apressasse a desapropriação dos terrenos, e que essa fosse executada pela Prefeitura. A fala de Perillo faz notar alguns fatos, primeiro o óbvio e total descaso com que ali morava e segundo o complexo de Pôncio Pilatos que tinha, pois queria lavar as mãos e deixar a violência política ocorrer através do poder municipal e não em sua alçada. A discussão que o filme propõe a respeito da moradia como função social se estende para além da teoria e se torna prática.

    As cenas de tiroteio registradas por câmeras amadoras não são tão boas, basicamente por serem gravadas por pessoas sem técnica, no entanto, elas garantem uma veracidade absurda, pois são eventos reais registrados por quem sofre com as ações truculentas. As cenas são dignas dos fronts de guerra, e onde a qualidade das imagens peca em mostrar o mal agouro, seja por falta de qualidade ou por medo do cinegrafista, o som preenche o restante do imaginário de quem assiste e é simplesmente assustador, especialmente porque uma das “cenas” ocorreu às oito da manhã, com boa parte das treze mil pessoas que ali habitavam despertando do sono.

    Os moradores se abrigavam em barricadas, para se proteger do lançamento de bombas, e mais tarde, um ônibus transportava os despejados. Esses eventos formam uma sequência tragicômica e quase teatral, apesar do pragmatismo hiper-realista das ações de garantia da lei e da ordem. Os policias batiam nas mulheres sem qualquer pudor e essa era só uma das muitas violências que ocorreram. Em torno de 3500 moradias  foram derrubadas, com os tratores passando por cima das casas. Os desabrigados e despejados ficavam tão mal que cediam a paranoia e desconfiança até com as marmitas que recebiam do governo, temendo que essas estivessem envenenadas.

    Algumas partes do longa-metragem já foram utilizadas em outro filme de Assis, Real Conquista, um belo curta também de cunho político. Parque Oeste serve não só como continuação dele, mas também como expansão da discussão e temática, tão emocionante quanto outro, causando e ampliando as discussões a respeito de moradia e o direito de ir e vir. Apesar de ter alguns problemas de ritmo, que dispersam um pouco do público, o desfecho é muito bem pontuado por um rap que fala da realidade das desocupações e do povo que sofreu na pele, morrendo, sendo despejado e destituído do direito à moradia.

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