Crítica | A Serpente
Adaptado a partir da obra de Nelson Rodrigues, e tendo seu elenco capitaneado pela mesma Lucélia Santos que anos antes havia feito Engraçadinha e Bonitinha Mas Ordinária ou Otto Lara Rezende, ambos de 1981, o filme de Jura Capela procura uma versão mais lírica da peça A Serpente, inclusive pegando emprestado sua estrutura narrativa.
O longa de pouco mais de 70 minutos é todo registrado em preto e branco, o que busca captar a poesia e o lirismo da obra de Rodrigues. O cenário de início é hermético e contém elementos de uma linha do tempo bastante confusa entre passado e presente, ainda que as roupas e o estilo que procuram contar sua trama remetam claramente ao pretérito. Ademais, as paisagens demonstram uma intimidade enorme com a natureza e uma decadência moral vista nas ferrugens e na destruição que envolve os personagens.
A trilha de rock faz diferenciar o filme de outras tantas adaptações de Rodrigues, jogando-o em uma esfera de modernidade poucas vezes vista neste tipo de exploitation. Os personagens Paulo (Matheus Nachtergaele) e as gêmeas Guida e Lígia (ambas vividas por Lucélia) protagonizam os arquétipos típicos rodriguianos, envolvendo em suas relações o incesto, relações proibidas, frigidez sexual e não rigidez em relação ao compromisso matrimonial.
O filme proporciona em quem é aficionado pela carreira de Nachtergaele, e em especial de Santos, uma sensação de nostalgia e alegria pela boa performance de ambos, visto que Lucélia é pouco vista no audiovisual atualmente. Sua forma e talento seguem intactos e o desempenho da atriz é simplesmente magnético. Apesar de ser uma produção muito barata e de conter mais elementos teatrais do que cinematográficos, a direção de Capela soa inventiva e inteligente, conseguindo marcar em seus poucos minutos de tela todo o conjunto de sentimentos presente na obra original, reunindo ciúme, tragédia, amor e descontentamento sexual de forma harmoniosa, causando em quem assiste a curiosidade para futuras obras de seu realizador.
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