Crítica | Operação Valquíria
A história universal da humanidade se baseia, na medida do possível, na identificação de fatos e acontecimentos históricos. Conjecturas e possibilidades não se encaixam nesta linha, ainda que certas ações possibilitem a reflexão sobre se os rumos da história se modificariam caso certos planos fossem adequadamente executados.
Operação Valquíria suscita tais questionamentos ao apresentar um plano, de parte dos militares alemães, para assassinar Hitler. Um acontecimento real, dentre os mais de 15 ataques contra a vida do ditador, em uma versão cinematográfica dirigida por Bryan Singer e com Tom Cruise no elenco. A produção talvez seja o filme mais dissonante de Singer. A bilheteria foi aquém do esperado, e o tema, diferente da narrativa usual do diretor. Ainda que as críticas feitas à produção devessem ser reconsideradas.
Em um apoio fiel aos fatos históricos, a trama resgata um momento luminoso na história alemã em um bom thriller de guerra. As primeiras cenas feitas em língua alemã demonstram a intenção de fidelidade histórica. Quando a língua é modificada para o inglês, o público compreende que se trata de uma liberdade cinematográfica devido à origem de seus atores. Uma estratégia interessante que explicita a visão cinematográfica do acontecimento, um fator linguístico que foge das línguas-mãe de cada país e é motivo de reclamações por parte de críticos e público.
A narrativa enfoca o plano de assassinato de Hitler considerando que o público compreende as bases fundamentadas na história da Segunda Guerra Mundial. Os militares perdem a visão uníssona devido a um grupo dissidente contra as ações do Führer , criando uma resistência interna que decide uma maneira radical de encerrar o conflito e reestruturar o país após a morte do líder.
O general Stauffenberg se torna o personagem chave do grupo para desenvolver uma estratégia efetiva para matar Hitler. Vindo do front da África, após uma explosão que lhe custou as mãos e um olho, a personagem interpretada por Tom Cruise reconhece que a condução desta guerra adquiriu contornos exagerados. Apoiando-se em um plano de contingência desenvolvido pelo próprio ditador, surge a Operação Valquíria, uma manobra criada para caso o líder fosse abatido ou surgisse um conflito interno de poder. Mesmo que o público reconheça de antemão que a operação foi um fracasso, e que estendeu por mais nove meses a guerra até o suicídio de Hitler, o roteiro de Christopher McQuarrie e Nathan Alexander sustenta o suspense e a tensão, como se a revelação deste fato não fosse importante, intensificando a conspiração dentro dos frontes internos.
No papel central, Tom Cruise se destaca com um personagem enérgico mas ponderado, demonstrando que brilha como ator fora de seus personagens habituais de galãs. Além de sua participação, o elenco é formado por grandes atores que se sobressaem em poucos papéis principais, como Bill Nighy (perfeitamente caracterizado como Friedrich Olbricht), Tom Wilkinson, Terence Stamp e Kenneth Branagh. A reconstrução de época ajuda a enfatizar um momento da história mundial que boa parte conhece apenas por narrativas. A câmera de Singer abrange o esplendor da visão alemã em câmeras panorâmicas, apresentando toda a pompa pela qual o nacionalismo alemão foi sustentado.
A operação foi o último atentado registrado contra Hitler e dá margem para uma reflexão: se o plano fosse bem-sucedido, mudaria de forma eficiente a transição do pós-guerra? De qualquer maneira, a estratégia demonstra que a visão de uma Alemanha apoiando seu líder de maneira cega é inadequada, destacando um bonito momento histórico de resistência interna de um grupo, considerado traidor e executado como tal, mas hoje símbolo de resistência contra um legado negro da humanidade.