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  • O Terror Japonês e seus Remakes

    O Terror Japonês e seus Remakes

    Gore Verbinski começou a trilhar um caminho praticamente sem volta para o cinema hollywoodiano, ao aceitar filmar o remake americano de Ringu. Talvez aquela altura o diretor do Tennessee não soubesse o mal que haveria de liberar, uma vez que o estúdio Dreamworks ainda não tinha certeza de que o seu O Chamado seria o sucesso que foi, especialmente por ser lançado em 2002, um ano antes da cinessérie Piratas do Caribe, sucesso máximo da carreira do cineasta.

    É ponto pacífico que Hollywood perdeu grande parte de sua inspiração nas últimas décadas, e é mais notório ainda que haja remakes de produtos estrangeiros para o mercado doméstico. Mesmo Martin Scorsese havia trazido à tona seu Os Infiltrados, uma versão do primeiro filme da trilogia Conflitos Internos, de Siu Fui Mak e Wai Keung-lau. Para entender o fenômeno recente de migração do cinema asiático japonês para o estadunidense, é preciso se debruçar sobre a obra de Hideo Nakata, diretor do primeiro Ringu e dono de um estilo de filmagem próprio, que valoriza o suspense e o mistério, e que se vale muito do sobrenatural e o desconhecido para valorizar sua obra. Foi assim também com Água Negra, que também ganhou adaptação pelo cinema mainstream americano.

    Nakata era um bom diretor, mas não inventou nada sozinho. Sua escola é semelhante a de Kiyoshi Kurosawa, cineasta por trás de Kairo (ou Pulse, na tradução dos EUA), Doppelganger e o recente Creepy, e claro, Takashi Shimizu, de Almas Reencarnadas e Ju-On – O Grito. Ambos se munem de todo o ideário japonês que trata da morte como um evento corriqueiro resultante do processo final da vida, sem necessariamente produzir uma fobia comum ao ocidente. Algo se perdeu nessa tradução, em especial no filme que coube a Verbinski, uma vez que o início de O Chamado não consegue ser nada sutil, mesmo que imite o filme original em praticamente todos os seus aspectos.

    A Duologia “O Chamado”

    A transposição dos filmes americanos além de revelar a falta de ideias por parte dos estúdios, mostra também um desespero tremendo em sua composição. Naomi Watts faz a personagem Rachel Keller, uma jornalista atormentada por uma questão familiar e obcecada para entender o que ocorreu com sua sobrinha recém-falecida, situação idêntica à vista com Reiko Asakawa no filme de Nakata. Watts já era famosa mundialmente, assim como Sara Michelle Gellar, de O Grito, e Jennifer Connelly, em Água Negra.

    Verbinski pouco acrescenta em sua versão da maldição da fita, exceto por algumas cenas conceituais no tal vídeo maldito. Tal paradigma seria também seria repetido não só em versões de filmes do Japão, mas também nos importados da Europa, vide o exemplo de REC/Quarentena e nas duas versões de Martyrs, ambos filmes de terror que fizeram sucesso recentemente e tiveram adaptações para o público americano.

    Três anos depois, os produtores da franquia americana imitariam o ocorrido com O Grito chamando o diretor japonês Hideo Nakata para conduzir a continuação de O Chamado 2, com a função prioritária de não adaptar o texto de sua versão de Ringu 2, já que a continuação citada seria muito diferente do primeiro capítulo do filme original. Ainda que houvesse esse pedido, percebe-se na verdade um resgate de muitos dos conceitos da sequência japonesa, já que todo o mote do roteiro envolve a perseguição da vilã Samara e sua maldição ao menino Aidan (David Dorfman), com Rachel tentando desbaratar a situação.

    Alguns desdobramentos dramáticos até soam criativos, mas a redução da maldição a uma trama de possessão demoníaca é pobre e bem condizente com a mediocridade em que estava inserido o cinema de horror hollywoodiano à época. Outro fator terrível é Nakata se repetindo, ao pôr detalhes de seu outro filme, Água Negra (ou Honogurai mizu no soko kara ), que também ganhou uma versão americana, pelo brasileiro Walter Salles.

    Entre os principais problemas da duologia O Chamado, estão a substituição da sutileza e alto suspense que Nakata fez no fim dos anos noventa em comparação com o uso excessivo de CGI e efeitos especiais pirotécnicos dos filmes americanos. Os personagens são menos humanizados, no caso dos adultos, enquanto as crianças são imbecilizadas. Esses defeitos se repetiriam nos demais filmes deste artigo.

    O Grito: Shimizu e sua transição em dois mercados

    Em 2002, o diretor Takashi Shimizu levou aos cinemas o começo da franquia O Grito (Ju-On no original). Já haviam versões dessa mesma saga dois anos antes, na televisão, mas a popularização do mito de Toshio e Kayako só ocorreu mesmo quando chegou aos cinemas asiáticos. A história, bastante simples em sua abordagem, não perde tempo explicando os estranhos acontecimentos que se encenam em frente às câmeras. Basicamente se conta uma história de ligação via redes, onde a primeira pessoa tem contato com um espírito desencarnado que, quando vivo, sofreu um enorme castigo e retorna do além para perturbar os vivos. Como uma doença, essa condição se espalha e várias pessoas relacionadas a morte anterior também perecem, formando assim uma rede de abusos e mortes que parece não ter fim.

    Os sustos do filme não são frequentes e não são gratuitos. O macabro se manifesta por meio de monstros que antes eram vítimas, fator que diferencia a história das demais contadas na década de 2000. A aura de mistério e suspense é levada por um conjunto de elementos com cores claras, outro fator diferencial em meio ao horror mais recente, e os efeitos especiais apesar de datados e baratos, causam espanto e pioram a sensação de perigo imediato.

    A cor pálida dos mortos remete obviamente a vida recentemente tirada, mas essa configuração de imagens unidas aos ruídos balbuciantes que eles emitem fazem lembrar os mortos vivos dos filmes de George A. Romero, em especial os de O Despertar dos Mortos e Dia dos Mortos. A movimentação dos amaldiçoados acabou sendo bastante imitada nas versões de Verbinski e Nakata em seus “Chamados”, mas claramente sem o mesmo brilhantismo utilizado aqui.

    As sequências finais são elucidativas e dão um destino digno para cada um dos desafortunados. Não demorou para a Ghosthouse Productions comprar os direitos, e em 2004, com produção de Sam Raimi, O Grito (The Grudge) chegava aos cinemas norte-americanos, também conduzido por Shimizu, e com uma boa parcela do elenco e produção formada por japoneses, uma vez que o próprio diretor não falava inglês.

    Sarah Michelle Gellar é insossa, ao contrário de dos personagens originais – que, vale lembrar, não tem um único protagonista – mas ao menos o filme acerta em reprisar o tom de extremo pessimismo do original, e até pouco explicativo se comparado aos tantos outros remakes americanos discutidos aqui.

    O Grito, como O Chamado tornou-se uma franquia rentável, com uma continuação americana, também conduzida por Shimizu, e um reboot japonês, que inclui um crossover entre Sadako (a Samara da versão japonesa) e Kayako (de Ju-On). Como parte do legado de Ringu há o uso da criança como catalisador do horror, a questão de uma criatura vingativa e injustiçada retornando do mundo dos mortos para assombrar os vivos, além do mesmo aspecto empalidecido. Por ter um único diretor esse se torna o ponto fora da curva em questão de independência artística e criativa, fato que faz até a cinessérie americana ser melhor construída do que seus primos, ainda que prossiga inferior ao material asiático. O maior dos méritos certamente é a tradução não só de cenas, mas também de atmosfera e espírito, ainda que permaneça bizarra a necessidade de se fazer todo um novo filme para dizer exatamente o que já foi dito antes.

    Pulse: Tecnologia, depressão e suicídio no cinema de Kurosawa e seu correspondente americano

    Antes até de Ju-On, o diretor Kiyoshi Kurosawa trazia a luz Kairo, que no resto do mundo ficou conhecido como Pulse. O roteiro, do próprio Kurosawa aborda o mal moderno da ausência de aceitação, usando a questão do suicídio como avatar do sentimento depressivo. Um grupo de jovens encontra um amigo enforcado em sua residência e aparições dele ocorrem nas telas dos computadores. Depois disso uma onda de mortes ocorre, sempre com a mesma característica, jovens se suicidando.

    Kurosawa utiliza muito bem os tons sombrios nos locais onde ocorrem as mortes, deixando o cenário com lascas pretas voando, que se assemelham a resquícios de objetos queimados, além de silhuetas de cor negra, no formato dos corpos nas paredes dos recintos onde estão as vítimas.

    O final de Kairo é dúbio, pois dá esperanças, embora essa esperança seja discutível. O estreante em longa Jim Sonzero capitaneou um remake de Pulse, em 2006, com um elenco repleto de atores teen e famosos, entre eles Kristen Bell, de Veronica Mars e futuramente Heroes, Ian Somerhalder que fez Lost e mais tarde faria The Vampire Diares, e Samm Levine, integrante do carismático Freaks and Geeks.

    O fato do elenco ter vários famosos, assim como em O Chamado, atrapalha a inserção do público no filme, mas o fator mais irritante é sem dúvida a troca do mote de horror, saindo a questão psicológica para restar somente uma perseguição de um monstrengo horrendo, de cor branca e múltiplos braços. Toda a sugestão é transformada em um texto fraco, bobo e óbvio. Uma pena, visto o potencial que essa versão carregava.

    Água Negra: Walter Salles e sua estréia em Hollywood

    Ainda em 2002 estreava no Japão o horror Água Negra (Honogurai Mizu No Soko Kara), também de Hideo Nakata. Nele, acompanhamos uma mulher que se divorciou recentemente – Yoshimi Matsubara (Hitomi Kuroki) – e se muda para um apartamento com sua filha Ikuko (Rio Kanno). Após alguns momentos de suspense gratuito, levados a tela através de uma televisão que registra as imagens de uma câmera de segurança, finalmente começa um drama simples, mostrando mãe e filha incomodadas com uma goteira que provém de uma infiltração já existente no apartamento antes mesmo de se mudarem.

    O original tem o ritmo um pouco lento no início, fato que dura até a primeira hora de filme. O ideal tencionado é estabelecer empatia entre espectador e personagem por meio de cenas comuns e corriqueiras, sem grandes alardes ou sustos falsos, mostrando o desespero de uma mãe que vê sua filha sofrendo a ameaça de um ser espiritual.

    O uso da água e da figura fantasmagórica infantil e feminina como elementos de horror já haviam sido vistos em Ringu, mas aqui o paradigma é mais importante e intensificado. O clichê da vilania de crianças é elevado a um nível maior nesta, com uma exposição da criatura em cenas com ângulos bem abertos, que demonstram o quão barata é a produção em especial na confecção do vilão.

    Já na versão estadunidense – dirigido pelo brasileiro Walter Salles – há um abuso do uso de famosos, a começar por Jennifer Connelly, que faz a protagonista, uma mãe também recém-divorciada que, contudo, tem uma sub-trama boba acompanhando a si, uma vez que se gasta muito tempo de tela, e consequentemente da paciência do espectador, com a disputa da guarda de sua filha, junto ao seu ex, vivido por Dougray Scott. Nesse ponto, a trama se distancia ainda mais do livro de Kôji Suzuki – também autor do livro que deu origem a O Chamado – que era mais voltado a trama e menos em conflitos entre os personagens.

    Ainda há participações de Pete Postlethwaite como um zelador de origem estrangeira cujo sotaque estranho é a marca, há também o uso de John C. Reilly em uma participação muito genérica, e de Tim Roth, que faz um advogado que recebe seus clientes em seu carro, soando caricato ao extremo. Nesses personagens, não há trabalho sobre nuances ou características únicas, o diferencial das pessoas entre si não ultrapassa a questão de arquétipos, fato que faz irritar ainda mais a porca imitação que Salles conduz.

    A discussão de questões como a vida da mulher solteira e menções a estupro também soam desrespeitosos, uma vez que só são mencionadas, sem a mínima reflexão sobre os temas. Mas apenas pincelados, fazendo-nos perguntar se o motivo desses assuntos serem abordados é por puro sadismo de roteiristas e produtores.

    A única personagem trabalhada é a Dahlia de Connelly, que é mostrada como uma moça cujo passado esconde um abandono materno. A intenção de tornar grave o background da personagem soa interessante, mas a condução faz todo o trabalho explicativo demais, portanto, desnecessário. Como nas outras versões americanas, se pasteuriza o tema, para tornar mais palatável ao público dos Estados Unidos.

    Uma Chamada Perdida: A violência de Takashi Miike e sua versão ocidental

    Era 2003, portanto, o filme mais antigo da lista. Coube ao prolifico Takashi Miike conduzir Uma Chamada Perdida, ou Chakushin Ari no idioma original. A história é simples, e mostra uma moça que recebe uma mensagem na sua caixa de voz no celular. O conteúdo é apenas de um grito desesperado, e aos poucos ela investiga a origem dessa ligação. Como em O Chamado, Miike se vale da tecnologia que se tornou recentemente popular entre os mais jovens, com o uso de telefones móveis, como catalisador do medo e horror, transmitindo a maldição como se fosse uma doença venérea, apelando então para outro clichê do gênero terror, aqui muito bem empregado.

    Mais uma vez não se explica o porquê do mal que assola os vivos, e a construção da tensão é lenta e gradual, só ocorrendo a exposição de mortes com quase uma hora de tela, mostrando então um nível agressivo de gore, típico do trabalho do cineasta. O diretor posiciona sua câmera de modo estratégico, com closes nos personagens amaldiçoados, que fazem lembrar os ângulos usados no western spaghetti, desde Sergio Leone a Gianfranco Parolini, normalmente escondendo o terror atrás desses personagens, mas sem correr o risco de revelar demais, uma vez que a mostra das criaturas perseguidoras é bem tímida, expondo pouco até o clímax.

    Os mortos são representados com cores acinzentadas, voltadas para tonalidades mais escuras e aspecto úmido. Graficamente, a criatura atemorizante é a melhor construída dentre os cinco exemplares analisados, com um aspecto gore que remete visualmente a literatura clássica, com influências de contos de terror japoneses antigos, passando por H. P. Lovecraft e Mary Shelley.

    Em 2008, era lançada a versão norte americana, dirigida por Eric Valette, o mesmo de Sinais do Mal. Já no começo as manifestações de terror são absolutamente sensacionalistas, e a tal maldição é mostrada através de perseguições a atores jovens, bonitos e que faziam papéis bem pequenos em seriados populares.

    A montagem que remete a um videoclipe e o roteiro raso não conseguem fazer jus ao trabalho de Miike e poucas tentativas de discussão se salvam, como o uso de uma visão crítica sobre os programas pseudo religiosos que abarrotam os canais abertos dos Estados Unidos, equivalentes aos “Fala Que Eu Te Escuto”, ainda que esses tenham um apelo midiático maior que o programa que passa nas madrugadas brasileiras. O problema é que até esse acerto demora a acontecer, visto que Bethe Raymond (Shannyn Sossamon), a mocinha da vez, é completamente incrédula em relação a isso, retardando portanto o contato de outra vítima, Taylor (Ana Claudia Talancón) em aceitar participar do programa. Nessa sequência há o uso das lacraias gigantes – que já apareciam com os mortos que recebiam as ligações mortais – em  imagens e ídolos católicos. O deboche a charlatanice pode ser confundido com desrespeito religioso, ainda que não tenha reprise disso no texto final, e se esse aspecto for invalidado, não há mesmo nada que salve o filme.

    As mortes ocorrem de maneira criativa, imitando a franquia Premonição, e não há aura de suspense, ou atmosfera de terror, soando portanto como um produto genérico, que pega emprestado alguns elementos do original, como as ligações, e ainda insere um aspecto bobo, que são pequenos doces vermelhos, que lembram pedras semipreciosas, que por sua vez caem da boca dos que perecem. A versão apela para aparições de fantasmas, que lembrariam em excesso o vindouro Sobrenatural, de James Wan, também há menções a crianças macabras, mostrando que a produção americana atira para qualquer estereótipo de terror.

    Conclusão

    O terror japonês e asiático é incrivelmente bem construído há tempos, vide o exemplo de Hausu, filme de Nobuhiko Ôbayashi, que em 1977 já antecipava todo o horror de Poltergeist – O Fenômeno e Amityville, além também da coletânea Kwaidan – As Quatro Faces do Medo, de Masaki Kobayashi, que em 1964 já juntava pequenas histórias de terror em um único filme. De Onibaba – O Sexo Diabólico a Tetsuo: O Homem de Ferro, há influências do cinema de horror e ficção-científica japonesa sobre o mainstream hollywoodiano, mas não de maneira tão literal quanto esse período do começo dos anos 2000.

    A maioria dos filmes analisados não tiveram grandes continuações, tampouco se tornaram franquias, exceção claro a Uma Chamada Perdida, que teve continuações de sucesso moderado, e claro, O Grito e O Chamado, que já sofreram reboots no Japão, transformados em espécimes mais explícitos e que fazem um uso terrível de CGI e demais efeitos de computação, retomando para si a influência do terror americano, perdendo a aura de suspense e de sustos por meio da atmosfera. A fórmula se desgastou, ao ponto de ter um evento recente de crossover, batizado de Sadako vs Kayako, ou Chamado vs O Grito, ao pior melhor (ou pior…) estilo Freddy vs Jason e Alien vs Predador.

    A fonte não secou, uma vez que Takashi Miike ainda faz bons filmes de terror, em meio aos milhares de exploitation que homenageia em sua filmografia, Kurosawa fez o já citado Creepy, enquanto Shimizu e Nakata tentam reprisar os bons momentos de seus cinemas, mas é fato que o terror americano conseguiu superar a entre-safra, produzido boas coisas, desde os produtos de James Wan – que é malaio – como Sobrenatural e Invocação do Mal, e outros como Corrente do Mal, A Bruxa entre outros. Ainda há um uso exacerbado de refilmagens de grande franquias americanas, mas a reserva moral para produtos autorais tem um bom destaque, superada finalmente essa onda de versões de produtos asiáticos, ao menos por enquanto. Talvez o único serviço indiscutivelmente bom que os cinco objetos analisados fizeram foi atrair a atenção do publico ocidental sobre o horror oriental, não tão popular quanto deveria, dada sua qualidade indiscutível.

  • TOP 10 | Diretores Pé Frio ou que acabaram na geladeira

    TOP 10 | Diretores Pé Frio ou que acabaram na geladeira

    Você provavelmente já ouviu antes o termo “na geladeira”. Se refere a diretores ou produtores que cairam num ostracismo coletivo na indústria do cinema. Geralmente eles também conseguiram trabalhos muito bem recebidos pela crítica mas que o público ignorou nas bilheterias, e as vezes até pior, desastres de público que os deixaram mal vistos pelos estúdios. E o mais frustante sobre diretores que acabam virando pé frios ou acabam na geladeira é que na maioria dos casos todos são realizadores muito mais talentosos do que a produção que acabou amaldiçoando suas carreiras. Estranhamente, existem também talentosos diretores que apesar da crítica conseguem com filmes pequenos de baixo orçamento marcar sua presença na indústria e quando conseguem um trabalho num grande estúdio parece que o talento desaparece.

    O Diretor M. Night Shayamalan novamente retorna a direção com um thriller estrelando James McAvoy e esse foi o estopim para essa lista. Segue o Trailer de seu mais novo filme, The Split:

    Então apesar dos pesares dessa indústria, segue a lista aqui a lista de diretores pé frio ou que entraram na geladeira.

    1 – Todd Field

    Maior Realização: Entre Quatro Paredes (2001)

    Filme que iniciou seus problemas na indústria: Pecados Íntimos (2006)

    O que aconteceu: Após um relativo sucesso como ator na Tv e no Cinema, ele conseguiu respaldo na cena como roteirista e diretor de Entre Quatro Paredes que conseguiu 5 indicações ao Oscar incluindo melhor filme. A bilheteria rendeu consideravelmente bem totalizando 42 milhões nos EUA, sendo uma produção de apenas $1.7. Field seguiu essa mesma pretensão em Pecados Íntimos, outra produção aclamada pela crítica que rendeu três indicações ao Oscar incluindo seu segundo em roteiro adaptado. Infelizmente esse último não rendeu um bom retorno para sua produtora, a New Line, conseguindo apenas 14 milhões, sendo que custou $26. Diretores muito piores já perderam muito mais dinheiro em Hollywood e já estavam com outro projeto logo em seguida para dirigir mas não foi o caso de Field, que passou os 10 anos seguintes procurando desenvolver seu próximo projeto, só que na televisão. O canal Showtime bancou a adaptação de 20 horas do romance Purity, de Jonathan Frazen estrelando Daniel Craig. Field está dirigindo pelo menos 2 episódios.

    2 – Julian Schnabel

    Maior Realização: O Escafandro e a Borboleta (2007)

    Filme que iniciou seus problemas na indústria: Miral (2011)

    O que aconteceu:  Reconhecido como pintor, Schnabel fez três grandes filmes: Basquiat (1996), Antes do Anoitecer (2000) e o Escafandro e a Borboleta. Antes do Anoitecer foi um dos mais aclamados filmes daquele ano e concedeu a Javier Bardem sua primeira indicação ao Oscar. Escafandro conseguiu quatro indicações incluindo melhor diretor para Schnabel. O drama quase alcançou a premiação de melhor filme e mesmo assim quase que nem se pagou mesmo com os lucros de mídia física. Seu filme seguinte, Miral, não foi muito bem recebido e financeiramente foi pior ainda. Em teoria Schnabel pode estar pesquisando para seu próximo filme, mas ele também pode estar na geladeira do cinema por falta de financiamento pelos seus últimos dois trabalhos.

    3 – Frank Darabont

    Maior Realização: Sonho de Liberdade (1994)

    Filme que iniciou seus problemas na indústria: Cine Majestic (2001)

    O que aconteceu: A vida de Darabont em Hollywood vai piorando a cada filme que o diretor lançou. O outrora roteirista do Jovem Indiana Jones alavancou sua carreira como diretor em 1994 com o que hoje é indiscutivelmente considerado um clássico, Um Sonho de Liberdade. Na época o filme foi um grande sucesso, sua segunda produção, A Espera de um milagre, o colocou na lista” A” de diretores da época. Ele não foi apenas um sucesso de critica como de público ($286 milhões mundialmente) além de ter rendido quatro Oscars incluindo melhor filme.

    Infelizmente, Darabont foi quase ridicularizado pelo seu projeto seguinte, Cine Majestic, com Jim Carrey e Laurie Holden. O Filme realmente não é bom, mas a péssima bilheteria foi motivo para colocar Darabont na geladeira. Na verdade, seu próximo filme foi lançado apenas 6 anos depois, novamente uma adaptação de Stephen King, O Nevoeiro, filme que o diretor já tinha interesse de produzir por décadas, com um orçamento ridiculamente pequeno em relação aos seus trabalhos anteriores. E felizmente, O Nevoeiro na verdade fez dinheiro, mas Darabont mesmo assim não saiu da geladeira. Seu próximo projeto foi The Walking Dead, que acabou com a emissora o demitindo durante a pré-produção da segunda temporada (e só fica pior quando você percebe que logo nesse ano a série se tornou a segunda série mais popular no mundo). Ele contribuiu para o roteiro de Godzilla, e largou alguns projetos como Código de Conduta e O Caçador e a Rainha do Gelo por divergências criativas.

    4 – Tamara Jenkins

    Maior Realização: A Família Savage (2007)

    Filme que iniciou seus problemas na indústria: A Família Savage (2007)

    O que aconteceu:  O que teria acontecido com Tamara Jenkins? A diretora/roteirista que tinha dois impressionantes filmes no currículo: O Outro Lado de Beverly Hills e A Família Savage. O ultimo conseguiu duas indicações ao Oscar incluindo melhor roteiro original para a própria Jenkins. Desde de então ele ficou fora dos holofotes. E não é como se ela tivesse saído de hollywood; Seu marido é Jim Taylor, produtor ganhador do Oscar (Sideways). Ela recentemente escreveu o roteiro do filme Juliet Naked, projeto feito com seu marido para Jesse Peretz dirigir. Mas o filme não parece estar nem em fase de produção. Considerando a falta de espaço de mulheres por trás das câmeras e o talento da diretora, não é ao menos curioso sua situação atual!?

    5 – Debra Granik

    Maior Realização: Inverno da Alma (2010)

    Filme que iniciou seus problemas na indústria: Não é claro.

    O que aconteceu:  Assim como Jenkins é no minimo muito estranho que não tenhamos ouvido nada sobre Granik desde Inverno da Alma. A sensação do festival de Sundance que mostrou o rosto de Jennifer Lawrence pro mundo e entregou duas indicações para mulheres no Oscar daquele ano torna a história muito curiosa. Vale lembrar que o filme custou apenas 2 milhões, rendendo $13.7 e foi o longa responsável por colocar a distribuidora Roadside Attractions no mapa. Em 2014, Granik lançou seu documentário Stray Dogs e esta rodando mais um drama chamado My Abandonment que tem lançamento previsto para o próximo ano. Dito tudo isso, como ela não conseguiu mais atenção dos grandes estúdios? Em 2012 ela desenvolveu uma série piloto para HBO que não saiu do papel em 6 anos.

    6 – Walter Salles

    Maior Realização: Diários de Motocicleta (2004)

    Filme que iniciou seus problemas na indústria: Na Estrada (2012)

    O que aconteceu:  Salles, que se tornou o proeminente diretor do conhecido mundialmente Central do Brasil (1998). Um incrível drama com a talentosa Fernanda Montenegro, foi indicado ao Oscar em melhor filme estrangeiro, além de ter rendido cinco milhões apenas nos EUA. Sua produção seguinte, Diarios de Motocicleta é talvez seu melhor longa e ganhou melhor canção original em 2005. Porém o problema de Salles com Hollywood começou com a refilmagem do horror japonês, Água Negra, estrelado por Jennifer Connelly. O filme teria caido na onda de refilmagens de terror asiático como O Chamado e O Grito. O filme não foi apenas ruim mas péssimo em bilheteria,  não conseguindo nem pagar seus 30 milhões de orçamento. Salles não fez outro filme em inglês até a adaptação da obra máxima de Jack KerouacNa Estrada. Com um elenco estelar incluindo Kristen Stewart, Amy Adams, Viggo Mortensen, Kristen Dunst e Elisabeth Moss (Aquela que estava em Mad Men, uma das maiores produções de TV da década). Infelizmente o filme não foi um sucesso, dividindo a crítica e rendendo apenas 8 milhões de uma produção com custo em $25. Até esse ponto,  Salles provavelmente vai precisar de mais um novo pequeno filme que vai tira-lo da geladeira novamente.

    7 – Marc Foster

    Maior Realização: Em Busca da Terra do Nunca (2004)

    Filme que iniciou seus problemas na indústria: Quantum of Solace (2007), Redenção (2011), Guerra mundial Z (2013)

    O que aconteceu: Diretor superestimado ou autor subestimado? Ou os dois? Essa é a maior questão nas discussões sobre a carreira desse diretor. Que entregou obras muito interessantes como Em Busca da Terra do Nunca e a Última Ceia mas também parecia muito fora da sua qualidade quando trabalhou em grandes franquias como 007 – Quantum of Solace (considerando também que o derrame do roteirista na época também não favoreceu em nada na produção) e Guerra Mundial Z (Um filme que foi um desastre homérico dentro dos bastidores e até hoje não é claro a quem culpar) Forster tentou voltar as suas rotas independentes com o lançamento desse ano All I See Is You, que foi premiado no festival de Toronto desse ano, mas também dividiu a crítica além de não ter conseguido um distribuidor oficial nos EUA. Existem incontaveis exemplos de diretores que assim que entraram num grande estúdio simplesmente não conseguem fazer nada dar certo. Infelizmente Foster aparentemente está nesse balaio.

    8 – Josh Trank

    Maior Realização: Poder Sem Limites (2012)

    Filme que iniciou seus problemas na indústria: Quarteto Fantástico (2015)

    O que aconteceu: O que dizer que já não foi dito ainda? Ele demonstrou um enorme talento no seu Found Footage, mas se tornou o motivo de tudo ter se tornado um desastre na refilmagem do reboot do Quarteto Fantástico. Pior ainda que isso, Trank se tornou persona non grata por seus tweets culpando os problemas da produção por interferência do próprio estúdio. Isso não vai queimar sua reputação em todos os estúdio de Hollywood, mas a situação parece mais feia quando ele recentemente foi descartado de um spin-of de Star Wars em pré produção meses antes do lançamento do filme do Quarteto. O Comportamento do diretor no set e 100 mil dólares numa casa alugada durante a produção do Quarteto Fantástico fizeram sua fama de diretor prepotente e completamente impaciente. Ninguém esta dizendo que ele não é talentoso, a questão é que mesmo que ele encontre novamente um produtor que banque um novo projeto, é dificil pensar o que pode vir após seu último trabalho. Apesar de que ele já tem um filme do Al Capone em produção com o nome de Tom Hardy confirmado.

    9 – Richard Kelly

    Maior Realização: Donnie Darko (2001)

    Filme que iniciou seus problemas na indústria:  Southland Tales (2006)

    O que aconteceu: Richard E. Kelly é muito talentoso. Muitos cinéfilos estão convencidos disso. Mesmo que não tenha um segundo grande filme, Donnie Darko é um filme criticado e discutido até hoje pela sua incrível capacidade de instigar dúvidas a cada transição de capitulo. Fez a primeira grande interpretação de Jake Gyllenhaal. Seu próximo filme Southland Tales, foi um desastre de proporções épicas. Lucrando miseros $374,743 mil dólares nos EUA mas custou $17 milhões para ser feito. De alguma maneira Kelly conseguiu outra chance com a Warner para dirigir um longa baseado no curta de Richard Mattheson “Button, Button”, mais conhecido no Brasil como A Caixa. Esse foi tudo o que Southland não foi: Bem dirigido, bem atuado e intrigante. Os críticos apesar de tudo não viram isso e o longa nunca recuperou seus 30 milhões de produção. Além disso Kelly tem essa má sorte; Ele perdeu a chance de fazer seu filme Amicus, que o protagonista seria o já falecido James Gandolfini,  e até então não escreveu ou dirigiu nada em sete anos.

    10 – Mimi Leder

    Maior Realização: Impacto Profundo (1998)

    Filme que iniciou seus problemas na indústria: Corrente do Bem (2000)

    O que aconteceu: Um dos mais claros exemplos da maneira como Hollywood trata suas diretoras mulheres é o caso de Mimi Leder. Ela fez seu nome primeramente dirigindo E.R, e ganhando um Emmy por essa direção.  Após tal realização a pressão dos estúdios foi consideravelmente substancial: O Pacificador, com George Clooney e Nicole Kidman recebeu críticas sólidas e conseguiu de volta seus 50 milhões de dólares que gastou durante a produção. Depois disso a Paramount e DreamWorks a contrataram para dirigir Impacto Profundo, o filme em contrapartida ao anteriormente lançado Armageddon de Michael Bay. Infelizmente o filme não fez tanto sucesso quanto o já citado, mas conseguiu um retorno muito mais positvo em críticas e foi um Blockbuster de $348 milhões no mundo inteiro. A verdade é que Leder fez história sendo a primeira diretora mulher a realizar um legitimo Blockbuster de Hollywood. Depois disso a diretora trabalhou num pequeno projeto no ano 2000 com  Kevin Spacey e Helen Hunt, Corrente do Bem. Infelizmente, o filme só conseguiu críticas negativas, mas recebeu retorno do público. Leder entrou na geladeira mas o seu Corrente do Bem conseguiu se pagar e render algum dinheiro numa produção de 40 milhões que rendeu 55. Hoje Leder voltou para a TV, trabalhando e tendo seu trabalho reconhecido dirigindo episódios de The West Wing e The Leftovers, e outras séries.

    O Guillermo Del Toro poderia ter entrado nessa lista, pelo menos pé frio ele é…

    Texto de autoria de Halan Everson.

  • Crítica | Crítico

    Crítica | Crítico

    Crítico 1

    Trabalhando com o equilíbrio entre a análise fílmica e a superestimação da opinião própria e alheia, Kléber Mendonça Filho – crítico e cineasta – usa argumentos metafóricos, imagens essencialmente pautadas no estudo da visão, para fomentar as falas dos depoimentos colhidos, entre estrangeiros e brasileiros. Escrutinar o apreço à arte e ao mensuramento da qualidade dos objetos analisados é uma árdua tarefa, além de ter em seu exercício a tendência de supervalorização, tanto do trabalho do realizador cinematográfico quanto da relevância que uma resenha tem, sendo associada comumente – e quase sempre erradamente – à prática de uma arte por si só.

    A busca por isolar o gosto ou expectativas da experiência em assistir a um filme é custosa: quase sempre esbarra em falas que podem ser interpretadas como azedas, amargas ou ressentidas, mas que, a priori, somente buscam elucubrar sobre algo óbvio aos olhos analíticos. Numa das entrevistas, João Moreira Salles argumenta que o papel do crítico é refém dos filmes por ele analisado, e que se o cenário artístico for completo somente por espécimes medíocres, de nada adiantaria todos os seus esforços.

    Por mais que teoricamente o papel do resenhista seja o de se eximir de seus próprios gostos pessoais, o ofício do julgamento é volátil, pois a quantidade de conhecimento que se adquire com o decorrer de seus dias muda constantemente o seu ideário e repertório. Pode-se, no ato de atribuir notas à obra analisada, cometer injustiças, já que, em pouco tempo, tudo poderia mudar, especialmente em quantas estrelas a película poderia merecer.

    Cláudio Assis, diretor de Amarelo Manga destaca que, uma vez o filme lançado, é preciso ter noção de que o produto será analisado e sofrerá ameaças à qualidade da produção, e que é preciso ter elegância para aceitar as falas ruins, pois isto faz parte do jogo. Já Bianchi não tem uma certeza sobre qual o ideal na crítica, se é somente informar as pessoas ou também reinterpretar artisticamente a obra avalizada.

    O modo como Mendonça conduz a câmera visa mostrar a dualidade, não só entre a necessidade e  a supervalorização da “crítica”, mas também a importância do diálogo entre o cineasta e o crítico. A fala de Walter Salles sobre isso é pródiga, destacando a Carrieri du Cinema, onde dois escritores teorizavam sobre o que deveria ser a Novelle Vague e dali começaram a praticar o que seria um movimento imortal do cinema, além de incitar dois dos realizadores mais marcantes da indústria e da arte – Truffaut e Godard. Os ecos disso seguem até hoje, com relatos de cineastas contemporâneos, como Bertrand Bonello e tantos outros.

    Os depoimentos dos artistas do cinema também são interessantes por exibirem uma passionalidade ímpar, desde os diretores que não conseguem ler todo o texto – como com Babenco – até os obsessivos, que não conseguem parar de ler, mesmo quando lhes dói, a exemplo de Bruno Barreto. Há também uma parcela de astros que execram alguns dos estilos, como a erudição desmedida e uma subjetividade que não é necessária.

    Outro argumento rebatido – especialmente por Daniel Burman e Fernando Meirelles – é o do “filme ideal”, onde o analisador, munido de seu conhecimento prévio e de uma expectativa preconcebida do que deveria ser a fita exibida, começa a apontar os momentos que deveriam mudar, as sequências de quadro e montagem editorial do produto, para que tornasse, dessa forma, uma obra perfeita. A frivolidade de tencionar que algo siga a escola preferida do observador somente revela uma pretensão de proporções dantescas.

    Crítico faz justiça também ao exibir os reclames dos comunicólogos, que não aceitam de bom grado algumas das demandas da indústria. Luiz Zanim destaca uma experiência que teve em Cannes, ao cobrir o evento para um jornal. Ao chegar em terras francesas, ele teria uma bateria de entrevistas com diretores e produtores e as quais jamais havia marcado. Ao retornar ao Brasil, recebeu uma correspondência pedindo que ele redigisse uma carta bilíngue com as desculpas por não ter feito todo o conteúdo programado pela representante dos filmes que não a da pauta do jornal. Zanim obviamente não o fez, fortalecendo a fala de que, para a indústria, o ideal é que o crítico se torne um assessor de seus filmes, que somente propague releases e informações, como se fizesse parte do seu jogo comercial.

    A reflexão causada pelo roteiro passa por diversos trabalhadores da indústria e pelos olhos e falas de artistas cooptados nos oito anos usados para que o filme de Mendonça fosse rodado. O estudo trata basicamente de sentimentos e sensações, conseguindo inserir muita informação num período de tempo curtíssimo  pouco mais de uma hora , e que, ao mesmo tempo que exaure seu receptor com as variações de fala e com a câmera tão próxima de seus entrevistados, exibe, a partir desse viés, uma forçada intimidade, quase desnudando os que depõem, obrigando a quem termina de assistir a Crítico a ter uma reflexão, especialmente sobre a adjetivação de obras pertencentes ao público.

  • Agenda Cultural 43 | Sandman, Clint Eastwood e Homem-Aranha

    Agenda Cultural 43 | Sandman, Clint Eastwood e Homem-Aranha

    Bem vindos à bordo. Flávio Vieira (@flaviopvieira), Rafael Moreira (@_rmc), Pedro Lobato (@pedrolobato), Amilton Brandão (@amiltonsena), Carlos Brito e Isadora Sinay (@isasinay) comentam do que rolou no circuito cultural nas últimas semanas. (mais…)

  • Crítica | Na Estrada

    Crítica | Na Estrada

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    Walter Salles é um diretor que gosta de road movies: Central do Brasil e Diários de Motocicleta, seus dois filmes mais conhecidos, se passam quase inteiros na estrada. Foi provavelmente o sucesso na biografia de Che Guevara que fez com que Francis Ford Coppola (detentor dos direitos do romance e produtor executivo de Na Estrada) desse a Salles a direção de um filme que parecia impossível de ser feito (Gus Van Sant e Joel Schumacher já haviam desistido da adaptação).

    Salles prova que sim, Na Estrada era um livro adaptável e inclusive bastante cinematográfico, mas talvez sua vontade de ser fiel ao romance impeça o filme de ser extraordinário.

    Na Estrada é um bom filme e, principalmente, uma boa adaptação: é fiel ao espírito do livro e a maior parte de sua trama, bem atuado, com fotografia impecável, edição eficiente e bons planos na maior parte. Mas é um filme que poderia ser excelente.

    Salles constrói bons contrastes: entre Sal e Dean; Marylou e Camille; Nova Iorque e a Califórnia; entre planos fechados, cheios, quase claustrofóbicos e enormes paisagens abertas; a linguagem direta, simples e apressada de Jack Kerouac e as frases longas e pomposas de Proust (Sal carrega No Caminho de Swann por quase todo o filme). Mas tudo isso não parece se achar no filme que não explora a fundo as contradições e os personagens que tem na mão. Da mesma forma a beleza da fotografia acaba servindo apenas pra isso, não tem função narrativa, não ajuda na construção de uma ideia, o que é uma pena vindo do diretor de Abril Despedaçado.

    Em diversos momentos o diretor faz mais literatura do que cinema, se apoia mais em diálogos e na narração em off do que nas imagens que possui e na boa atuação dos protagonistas. Aliás, um dos grandes méritos do filme é o trabalho dos atores, com um destaque surpreendente para Kristen Stewart, que  equilibra bem o apelo e a fragilidade de Marylou e consegue não ficar apagada perto do trabalho Kirsten Dunst.

    A impressão final é de um diretor com medo de seu material original: um medo de se distanciar do livro, que faz com que o filme perca em linguagem, e medo de cortar passagens, o que o torna um pouco longo e cansativo. Não é um filme ruim, mas não é o filme que Walter Salles poderia fazer, há um encantamento e um frescor em Diários de Motocicleta que deveriam estar presentes aqui, mas não estão.

    Texto de autoria de Isadora Sinay.