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  • Crítica | Filhos da Esperança

    Crítica | Filhos da Esperança

    Um futuro perturbador marcado pela infertilidade da espécie é a ficção que melhor representa o presente.

    Repressão que parte do estado, violência entre a própria população, uso exagerado de drogas, imigrantes presos em jaulas. São assuntos difíceis de tratar e muitas vezes negligenciados, porém, não é preciso muito se atentar a essas situações, ainda que de forma velada em nosso cotidiano. Filhos da Esperança parte dessa ideia.

    No futuro, em 2027, a humanidade está próxima do colapso porque nessa distopia as mulheres não conseguem mais gerar filhos. O controle de imigração também é severo e opressivo. Esse é o cenário em que Theo (Clive Owen), um herói moldado pela ocasião,se encontra.Ele vive inerte a realidade das ruas como empregado do governo e após ser sequestrado por um grupo ativista, reencontra laços com o passado em Julian (Julianne Moore), sua ex-esposa. Theo precisa conduzir a primeira gestante em anos para os cuidados de uma organização interessada no bem-estar e futuro da humanidade. Kee precisa ser cuidada, já que é uma imigrante ilegal e as autoridades se aproveitariam de alguma forma da sua gestação.

    A indiferença do protagonista com o mundo é um ponto determinante para o desenrolar da trama. O título brasileiro do filme entrega a esperança como força motriz da trama, e de fato o é. Não é ocasional que pessoas se aglutinam em torno de veículos midiáticos, nem que o barco do projeto humanista, colocado como destino final para Theo é nomeado “O Amanhã”. Em meio ao caos absoluto, a esperança é o que resta e sua ausência também seria ausência de vida. Sem razão para seguir em frente e uma catástrofe iminente, o fim já está decretado.

    A construção narrativa de Filhos da Esperança se dá pelo estado de desequilíbrio instituído. Há conflitos gerais, mas sobre tudo humanitária. A câmera acompanha Theo, mas constantemente se desloca para revelar a distopia instaurada. São muitas as cenas que lembram os campos de concentração nazistas no constante desejo do diretor de enquadrar o caos e até mesmo a morte.É um trabalho em que Cuarón repete este recurso, já usado antes em E Sua Mãe Também (2001), é um artífice para contrastar a história de seus personagens com o plano de fundo daquele universo. Uma esfera maior.

    Há mais uma razão para a liberdade exercida pela câmera nos enquadramentos do filme.Essas tomadas perfeitamente orquestradas por Jim Klay, Geoffrey Kirkland (Direção de Arte) e Emmanuel Lubezki (Fotografia), levam o espectador à vertigem imposta aos personagens.Isso é essencial para que o público desperte a ideia de que a camada principal é fruto da conjunção angustiante e sufocante em que se segue o entrecho.

    É interessante pensar que treze anos após seu lançamento, Filhos da Esperança esteja em tamanha sintonia com a realidade. A crise humanitária de 2006, poucos anos após o 11 de setembro persiste ainda hoje e ainda centrada na figura do presidente norte-americano. Naquela época a política de imigração se encontrava em estado austero pelas guerras impostas pelos Estados Unidos aos países do centro da Ásia. No atual contexto, é o México onde nasceu Alfonso Cuarón e outros países latino-americanos que estão em debate e no gritos reacionários dos gringos.

    As experiências quais somos submetidos todos os dias no século XXI se fazem claustrofóbicas porque também atravessamos tempos de inquietude e violência. Em confronto com Filhos da Esperança, há que se atentar a luta necessária para manter a sanidade, para prosseguir com a vida mesmo rodeado pelo caos. As circunstâncias dão razões para desconfiança generalizada, nas pessoas, nas instituições e enquanto indivíduo, é muito fácil internalizar esse conflito onipresente e extravasá-lo de maneira bastante perigosa. Em seu filme, Cuarón encontra no próximo, na confiança e cooperação humana a ponte para a esperança. A mensagem do diretor acerta em cheio nosso presente quando aponta nossa falta de humanidade e incapacidade de lidar com a vida.Isso só será reparado quando for entendido que nenhum ser humano é ilegal e que se o respeito para com as pessoas e suas histórias deve reavisto.Essa geração está mesmo comprometida e a esperança nasce todos os dias com uma nova aurora.

    Texto de autoria de Gabriel Caetano.

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  • Crítica | Sin City: A Cidade do Pecado – Versão Estendida

    Crítica | Sin City: A Cidade do Pecado – Versão Estendida

    A versão estendida do filme codirigido pelo mexicano Robert Rodriguez e o roteirista de quadrinhos Frank Miller começa com a história do Bastardo Amarelo, narrada em primeira pessoa pelo policial Hartigan, de Bruce Willis, característica que remete à obra original de Miller e os típicos policiais noir. Hartigan é o herói falido, o homem capaz de morrer a qualquer momento, graças a velhice e seu problema cardíaco que se agrava. Constantemente ele tem que convencer a si mesmo que é capaz de superar seus problemas.

    A historia é violenta, mas tem um lirismo impar. A escolha da dupla de diretores pela filmagem que destaca o preto e branco, com pequenas notas coloridas – em especial o vermelho, seja do sangue, do batom das beldades ou dos vestidos. Por sua vez, no decorrer do longa, alguns personagens também ganham cores. O simbolismo indica de maneira sentimental quem é especial e quem é descartável. Dos filmes que Rodriguez dirigiu ate então, esse pode não ser aquele que possui o melhor roteiro (difícil ignorar a trilogia Mariachi e seu tom épico), mas certamente é o mais prosaico e filosófico. Incrível como uma história urbana e moderna, localizada em uma cidade imunda e repleta de pecados poderia falar tanto sobre os detalhes da intimidade do homem e da dificuldade dele em envelhecer e perceber que é falível. Tal qual as peças de Shakespeare, o amor, seja sexual ou paternal é acompanhado de dois fatores: a violência, vista não só neste tomo com Hartigan, mas em todos os outros capítulos, assim como o segundo fator, a tragédia, que recai sobre o protagonista.

    Em O Cliente Tem Sempre Razão existe a cena que antes abria o filme, com o personagem de Josh Hartnett, assassinando as duas mulheres interpretadas por Marley Shelton (The Customer) e Alexis Bledel (Becky). Um exterminador de anjos. Essas duas cenas foram as que mais perderam, pois fora do contexto em que eram apresentadas, elas não fazem sentido, em uma perdendo a força e na outra antecipa boa parte da história que virá.

    O Difícil Adeus tem Marv, de Mickey Rourke, como protagonista. O ogro, que só tinha relações sexuais por dinheiro tem em suas mãos Goldie (Jaime King) , uma mulher que se entrega e ainda é uma deusa para seus olhos. De novo as cores determinam o que é especial, a colcha onde o amor se estabeleceu, os cabelos ruivos da musa e sua pele, ainda que morta. A obsessão de Marv é só uma: encontrar o responsável pelo assassinato de Goldie. Marv se vê entorpecido pelos fantasmas de sua própria mente.

    A Grande Matança tem um início despretensioso, com Shellie (Brittany Murphy) discutindo com seu ex, Jackie Boy (Benicio Del Toro), onde o sujeito era violento com a garota, que agora está acompanhada de Dwight (Clive Owen). Em comum com as outras histórias, existe a questão do herói se deparar com um vilão bobo, mas influente, fato que só vai ser revelado mais tarde, após introduzir à Cidade Velha e suas habitantes, as meninas de Gail (Rosario Dawson). A figura esquisita de Jackie faz lembrar um monstro dos filmes de horror do expressionismo alemão.

    Jackie Boy é morto por um golpe de espada. Na cidade antiga a guerra se instalaria e na ânsia por resolver o problema que ele mesmo trouxe, Dwight tenta em vão solucionar o problema sozinho, mesmo que existam evidências suficientes para provar seu fracasso. No caminho, ele demonstra uma predileção para a insanidade ou para mediunidade, conversando com um detetive morto. Após esses eventos, o justiceira revela suas tendências suicidas, mas ele ainda tem missões a cumprir.

    O amontoado de cenas de ação no final causa frisson, o ritmo que se acelera deixa o público com expectativa por mais violência gráfica e mortes plasticamente belas. O torpor das belas mulheres é compartilhado com quem assiste, e é uma sensação ruim perceber que o longa acaba, mesmo com 140 minutos de história, pois caberia mais historia e mais episódios como esses, que não encontraram na continuação, Sin City 2: A Dama Fatal um filme que fizesse jus ao original.

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  • Crítica | Anon

    Crítica | Anon

    Para compreender o que Anon é, é primeiro preciso compreender quem é Andrew Niccol, seu realizador. Roteirista e diretor de filmes como, O Show De Truman (Roteirista e produtor), Gattaca (Roteirista e diretor), O Terminal (roteirista), e Senhor das Armas (Roteirista e Diretor), Niccol demonstra, primeiro, seu tino para contar histórias envolventes e reflexivas sobre o futuro da humanidade e das pessoas, e segundo, sua preocupação constante com a vigilância e os rumos da tecnologia ao tomar conta de nossas vidas como uma entidade onipresente e onisciente.

    Em Gattaca sua preocupação era a engenharia genética e nossa autoimagem como senhores da natureza. Em O Show de Truman, sua preocupação foi nosso crescente interesse em ver a vida através de uma tela, profeticamente (O filme é de 1998, quando mal havia internet) antecipando as relações intermediadas através de likes e views que se percebe hoje com facilidade em qualquer rede social. Em Senhor das Armas, vemos suas preocupações com as relações comerciais e as redes de criminalidade a partir do tráfico de armas. Em O Terminal, seu roteiro fala de forma interessante e divertida sobre as pessoas e as conexões (De aviões e entre as pessoas).

    O resumo é que Andrew Niccol sabe ser inteligente, e não apenas soar como inteligente, e sabe contar uma boa história, demonstrando particular interesse na humanidade como uma rede interligada e intermediada pela tecnologia, mas onde a real substância dessas relações se encontra na transposição de nosso egoísmo e no compartilhamento da nossas características mais mundanas. Mas em algum momento de sua carreira, o interesse virou cacoete, e já se podia observar isso no esquisito S1m0ne (Com Al Pacino), mas que ficou evidente nos terríveis O Preço do Amanhã e A Hospedeira, quando demonstrou muito menos brilho e sagacidade do que o habitual, falando dos mesmos assuntos que o consagraram, mas agora de maneira rasa e banal. Anon (Netflix) não chega a ser ruim, mas é um filme pálido e incomodamente desinteressado em si mesmo.

    Na trama, Sal (Clive Owen) é um detetive em um mundo onde o governo tem acesso à tudo aquilo que já vivemos e sentimos, e ao ver alguém na rua, sabemos exatamente seu nome, idade e informações pessoais. Conversas são traduzidas instantaneamente entre pessoas e boa parte das relações são intermediadas de modo online ,bem como as conversas. Crimes ainda são realizados, mas com acesso à tudo aquilo que já passou pelos nossos olhos, são todos solucionados em cerca de minutos. É possível acessar a visão de qualquer pessoa e fazer download de diversas informações, e mesmo assim, por algum motivo, as pessoas ainda se mostram surpresas ao serem rapidamente descobertas. Eis que em algum momento surge uma fantasma no sistema. Uma pessoa não identificada começa uma onda de assassinatos não identificados, e o hackeamento da rede e de seus usuários coloca em xeque toda a estrutura social deste mundo. A partir disto, toda a polícia se debruça sobre encontrar a principal suspeita: uma mulher não identificada que o personagem de Owen viu sem querer logo na primeira cena do filme.

    O maior incômodo, talvez, seja a forma apática com que o filme é dirigido e interpretado, bem como a forma com que o roteiro tenta desenlaçar seus nós. Lá pelo terceiro ato, a impressão que se tem é que o roteiro simplesmente se desencantou da história que havia começado a contar, e jogou uma série de resoluções que se dão de forma incompleta e apressada, inserindo personagens cruciais para o desenvolvimento do enredo de modo tão displicente e coadjuvante que no momento dos plot twists, que seriam essenciais para o arrebatamento que toda ficção científica se propõem, as revelações perdem a força por ser difícil de identificar quem é aquele personagem tão importante tratado de forma tão desimportante. O que se identifica é que Anon considera seu argumento tão importante que todo o resto se tornou desimportante, mas se tal postura não se sustenta nem com grandes ideias, ela desaba quando o assunto já foi tantas vezes melhor escrito e gravado há 20 anos atrás.

    Texto de autoria de Marcos Paulo Oliveira.

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  • Review | The Knick – 1ª Temporada

    Review | The Knick – 1ª Temporada

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    Pense num circulo preto no centro de uma folha de papel branca. Considere uma folha de papel branca com um círculo preto no centro também e depois inverta a ordem da cores. A mudança desses fatores altera a percepção de como o todo funciona sob seu ponto de vista. Mas e se ao seu redor todos tivessem essas mesmas duas folhas, com as mesmas considerações sobre elas, só que chegando a percepções completamente diferentes? Esse é talvez o prisma de The Knick, dirigida por Steven Soderbergh, transparecendo ao longo de suas quase dez horas divididas em pequenos dez episódios que parecem maiores do que são, e que exibem mais do que aparentam e tornam essa história iniciada em 2014 uma das mais incríveis jóias das recentes produções de TV.

    Não é novidade na televisão trazer um profissional competente e renomado de uma área próxima como o cinema e com possibilidade de utilizar muitos recursos graças a seu nome e peso. Não admira, então, que toda a experiência e habilidade sejam um acréscimo para tornar a trama uma narrativa única. Sem abertura formal, apenas uma visão em blur de um objeto, de um par de botas brancas de um cirurgião num prostíbulo chinês e a data de 1900 em seu rosto, a série apresenta o Dr. John Thackery (Clive Owen), após uma operação de placenta prévia, levado ao cargo de cirurgião chefe do Knickerboxer em Nova Iorque, ao mesmo tempo que tem de receber na sua equipe o Dr. Algenor Edwards, um cirurgião negro.

    É estranho perceber que uma série de época passada no ano de 1900 tenha uma trilha composta exclusivamente de música eletrônica. Porém, a trilha é coerente tanto no ritmo frenético quanto ao ar futurístico que o seriado apresenta dentro das condições em que a medicina era praticada. Estranho, frenético e constantemente limpo.  Não é difícil perceber a quantidade de pequenos planos sequência em simples diálogos expositores. A câmera se contorce procurando um ângulo para tentar se encaixar naquela situação, ressaltando a teatralidade e liberdade que os próprios atores devem possuir durante as gravações. Não estamos falando de um House, M.D  do século XIX, ou um E.R – Plantão Médico rústico. Trata-se de um The Wire explorando a psique de uma sociedade, de um vício, de uma profissão muito perigosa e de todo um universo envolto em mudanças que não conseguimos acompanhar, recheado de procedimentos cirúrgicos que são incrivelmente difíceis de distinguir da realidade, principalmente pela montagem sempre funcional. Ainda que os episódios enfoquem muitas personagens, é possível observar diversos ciclos se fechando em pequenos gestos de loucura, genialidade e dor humana realizada de alguma forma.

    O esforço se amplia como um todo, a ponto de não existir um momento específico ao qual esperamos chegar no fim definitivo A série se sustenta construindo um mundo através da perspectiva referencial de cada um de seus personagens. O esmero visual de cada enquadramento proporciona para a narrativa uma miragem bem realizada que esconde a sujeira que circula entre o mundo cercando as personagens. O preto e o branco retornam novamente na fotografia do próprio Soderbergh (que também assina a direção). A sala de operação (além de ser um anfiteatro para exibir cirurgias), é certamente o exemplo mais gritante de todos por sua plasticidade. Porém, é possível ver que todos os protagonistas exibem as cores preta ou branca em algum momento específico de cada episódio e, em cada um deles, intensificando o contraste com objetos e outros atores. Além de cenários que, principalmente dentro do hospital, possuem um sépia sombrio lembrando o efeito da cor preto em luz amarela. Esses elementos tornam The Knick uma pintura em alta definição em constante movimento. Porém, deixa muitas vezes em segundo plano temas abordados pela própria série, uma lacuna proposital para o público. Assim como Thackery no início do primeiro episódio, basta ficar com as pernas estendidas e assistir ao circo funcionando.

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    Texto de autoria de Halan Everson.

  • Crítica | Sin City 2: A Dama Fatal

    Crítica | Sin City 2: A Dama Fatal

    O começo, repleto de cortes rápidos, é seguido por uma cena em que Frank Miller faz uma aparição típica de Stan Lee nos filmes da Marvel, aproveitando-se das benesses de ser um criador e também realizador do longa. O início, excessivamente escapista, faz mais referência ao último filme de Miller (The Spirit: O Filme) do que ao Machete de Rodriguez, o que faz acreditar que o criador do texto original teria maior ingerência na direção compartilhada, a despeito de toda a boataria que envolveu a produção do primeiro episódio.

    O preâmbulo é feito por Marv, personagem, vivido por Mickey Rourke, que, curiosamente, morreu no episódio anterior. Mais uma vez, uma bela apresentação dos créditos estilizada. Na história paralela de Johnny (Joseph Gordon Levitt), são resgatados plots que envolvem personagens cujo destino já havia sido decidido outrora, envolvendo-os em outros pecados, outros vícios tão torpes quantos os que preconizaram a primeira fita. Sin City parece ser um lugar tão escuso que até mesmo os que não vivem mais no mundo dos vivos costumam visitar a cidade. A pendenga de Johnny com Roark (Powers Boothe) é de cunho pessoal e familiar.

    Os subplots se misturam, compartilhando a mesma linha temporal, variante nos núcleos e nos múltiplos amoralismos. A plataforma plural claramente revela momentos mais interessantes com histórias menos apetecedoras. A trama envolvendo Dwight (Josh Brolin) demonstra isto exemplarmente, mesmo que suas cenas sejam de um grafismo agressivo ímpar tanto nos atos violentos quanto no torpor sexual, que causa no personagem um complexo de submissão quase automática à sua musa, Ava (Eva Mendez). Ao menos é nesse período em que é mostrada a cena mais gore e trash do filme, tão digna de nota quanto de gargalhadas.

    A sedução típica da dama fatal envolve os personagens e, claro, o espectador, não só pela nudez bem fotografada por Rodriguez, mas também pelo trabalho sonoro, praticamente perfeito, seja na montagem, seja na voz rouca de Green. As curvas femininas continuam obviamente sendo um dos pontos altos do filme, no entanto têm de conviver com constrangedoras cenas em que as belas mulheres se submetem a show-offs e exibições toscas de poderio armamentista, enquanto são reapresentadas às mulheres de Old Town. As soluções sensuais, fora as da personagem-título, são demasiadamente fáceis, apresentando uma desnecessária aura de pastiche, não condizente até mesmo com o universo milleriano. O tremor da perigosa relação entre Ava e Dwight finalmente se cumpre, e de um modo até surpreendente se comparado com o que o roteiro apresentou até então.

    A banca continua a aceitar as apostas de Johnny, mesmo após sua quase completa destruição. A designação da disputa quase edipiana termina anticlimática, mas é ramificada, abrindo a chance de Nancy Callahan (Jessica Alba) dar vazão a sua raiva e ao seu desejo de vingança. Em alguns momentos, a atriz até demonstra um pouco mais de dramaticidade se comparada a sua habitual filmografia, mas nada que fuja do ordinário e lugar comum de pautar toda a sua apresentação apenas em sua bela aparência. A cena em que sua personagem chora, à frente da TV, transita entre a empatia do público junto à carismática personagem esbarrando na dificuldade da sua intérprete em passar emoção.

    Por mais que o primeiro filme tenha tido um impacto enorme entre os fãs de quadrinhos e do cinema blockbuster violentíssimo, a sensação deixada por este Sin City 2 é o de um filme datado, que deveria ter sido lançado logo após o episódio um, se valendo do hype, mas que não o foi. Tudo na abordagem da película faz pensar que o projeto não era a prioridade de Robert Rodriguez, dado seus outros produtos autorais para a televisão e cinema, além da óbvia demora na produção deste filme. Tudo piorado pela sensação de A Dama Fatal ser um produto requentado, sem muito alma e substância, coisas que sobraram no filme exibido há nove anos.

  • 5 Filmes Essenciais Sobre Cassino

    O cinema sempre nos fez pressupor que cassinos são formados por luzes de halogênio, acesas o tempo todo, homens bem vestidos e mulheres sedutoras. Não que tais máximas não sejam verdadeiras. Porém, diante de tantas maneiras de apostar e conquistar o público com boas histórias, selecionamos cinco obras essenciais.

     

    Onze Homens e Um Segredo (Ocean´s Eleven, 2001)

    Baseada na produção de 1960, com Frank Sinatra, Dean Martin, Sammy Davis Jr., Peter Lawford e Joey Bishop, Onze Homens e Um Segredo trouxe novamente o cassino às tramas hollywoodianas e foi o responsável pela realização de diversos filmes com temáticas parecidas, que faziam de um assalto excêntrico e ousado o elemento central da ação.

    Neste remake, dirigido por Steven Soderbergh e estrelado por George Clooney, Brad Pitt, Matt Damon, Julia Roberts e Andy Garcia, o equilíbrio entre estilo, bom humor e um plano de assalto mirabolante é composto com perfeição. Formado por estereótipos bem delineados – o galante, o braço direito, o engenhoso, o habilidoso, o esquivo, a mulher fatal, o vilão –, o enfoque da narrativa é produzir uma história para o grande público. Diante deste espetáculo, a trama não poderia ser mais óbvia: um homem apaixonado que faz de tudo para reconquistar a ex-mulher.

    A direção de Soderbergh, que já havia misturado humor e ação em Irresistível Paixão, adaptação do livro de Elmore Leonard, traz maior requinte à história. Um roubo que se aproxima de uma obra de arte.

    Cassino (Casino, 1995)

    Martin Scorsese retorna ao submundo – depois de Cabo do Medo e Época da Inocência – nesta produção épica que carrega tudo o que há de melhor em seu estilo. Uma produção longa, brutal, em que nenhuma saída dramática é fácil. A trama se baseia na história de Frank Rosenthal, um judeu que assumiu grandes cassinos para a máfia na década de 70.

    Com Robert De Niro e Joe Pesci, com quem já havia trabalhado em outra obra mafiosa do diretor – Os Bons CompanheirosScorsese está à vontade em seu habitat natural e, como novidade, apresenta uma Sharon Stone como mulher linda, loira e fatal. Além da violência excessiva, a narrativa feita em off e os espaços temporais entrecortados comprovam a genuína marca de Scorsese.

    Até hoje, o diretor nunca deixou que as imposições de estúdios impedissem a metragem de suas produções, propositadamente longas, narrando com detalhes as jornadas de seus personagens. Um dos grandes filmes do diretor, sem dúvida.

    Cassino Royale (Cassino Royale, 2006)

    A obra primordial de Ian Fleming, finalmente gravada em 2006 e com um novo James Bond (Daniel Craig), foi capaz de promover uma bem-sucedida trinca: consagrou o novo Bond em um tipo diferente dos vistos até então, trouxe a um novo público um clássico personagem e soube ser fiel à obra original sem perder seu estilo.

    Na versão, o bacará do original cede espaço ao poker, um dos jogos mais populares até mesmo no espaço virtual. Envolvendo o jogo de espionagem, o agente com licença para matar deve competir nas mesas contra Le Chifre (Mads Mikkelsen), um banqueiro com investimentos no submundo. A trama dirigida por Martin Campbell produz um dos jogos de poker mais aflitivos do cinema, em parte devido às boas interpretações de Craig e Mikkelsen.

    Além deste impasse, as cenas de ação apresentam um estilo diferenciado, fundamentando um conceito de realidade que a trilogia Bourne ajudou a criar: um estilo de luta menos coreografado e mais brutal, longe do balé da década de 90. Muitas grandes cenas da produção – como a perseguição de carros e a tortura sofrida por Bond – vieram diretamente da obra de Flemming. Um clássico que não envelheceu.

    Crupiê – A Vida em Jogo (Croupier, 1998)

    Após anos distante do cinema, Mike Hodges (Carter – O Vingador, Flash Gordon) retorna com este drama sobre um escritor falido, que retorna à sua antiga profissão de crupiê graças ao um pedido do pai. Conduzido com uma parcela de um thriller de mistério, foi graças a este papel de Clive Owen, no papel central de crupiê, que seu talento foi evidenciado com atenção suficiente para estrelar produções como Rei Arthur e Closer – Perto Demais.

    O rosto sisudo e o olhar penetrante do ator adequavam-se à vida desencantada de um homem incapaz de galgar sucesso na profissão desejada. Seu papel como crupiê é melancólico, uma mera subsistência banal. Um símbolo de uma vida paralisada, que parece não se importar com as ações – criminosas ou não – as quais pode cometer. É um drama cuja análise concentra-se na existência do próprio ser e suas motivações pessoais, sem nenhum arroubo de violência explícita ou glamour.

    Maverick (Maverick, 1994)

    Mel Gibson ainda era cool e Richard Donner, diretor de filmes significativos quando Maverick, adaptado da série homônima de 50, estreou nos cinemas. A trama apresentava dois elementos-fetiche que sempre encantaram uma grande parcela do público: o ambiente western e jogos de aposta. Uma história que parecia impossível dar errado.

    Sem perder o tom aventuresco, o roteiro de William Goldman (Todos Os Homens do Presidente, Uma Ponte Longe Demais, Louca Obsessão e Butch Cassidy) apoia-se no humor para apresentar a história do malandro Maverick, que junta o dinheiro necessário para um jogo de apostas em um barco do Mississipi e acredita ser capaz de sentir as energias das cartas antes de tirá-las – uma das cenas mais divertidas da produção.

    Se hoje o gênero Western é pontuado pelo lançamento anual de poucos filmes, ainda na década de 90 grandes obras foram relevantes, tanto as que se apoiaram no drama, caso de Os Imperdoáveis, quanto nesta comédia aventureira, bem realizada e que não envelheceu.