Review | Star Trek: Picard – 1ª Temporada
Star Trek: Picard é uma série revival, criada por Akiva Goldsman, Michael Chabon, Kirsten Beyer e Alex Kurtzman, que segue os movimentos de Jornada nas Estrelas: A Nova Geração, além dos filmes de TNG (abreviação de The Next Generations), em especial Jornada nas Estrelas: Nêmesis. O programa, exibido originalmente pela CBS All Acess e passado no serviço de streaming do Prime Video, começa com uma cena entre Jean Luc (Patrick Stewart) e um de seus principais parceiros, o comandante Data (Brent Spinner), na Enterprise E, em uma clara fantasia de que o jogo que disputam, não acabe jamais, e essa sensação saudosista não ocorre só com Picard, mas também com os fãs que buscavam nessa versão um espelho do que ocorria nas outras séries.
Este versão do capitão Picard (agora, almirante, semelhante ao movimento de James Kirk em Jornada nas Estrelas: O Filme), tem peculiaridades. Ao mesmo tempo em que ele lembra o Charles Xavier de Logan, por conta do envelhecimento (tem em torno de 90 anos aqui), ele também fala muito em francês, fato que era um bocado ignorado nos episódios anteriores de sua saga pessoal, já que ele era natural da França. Em sua terceira idade, ele mora com um casal romulano, fruto de uma relação um pouco polemica, a respeito do destino do líder da frota estelar pós filmes. Boa parte desse ínterim é explicado no Short Trek denominado Children of Mars, inclusive boa parte dos desdobramentos políticos da série provém deste especial.
O mote principal dos dez episódios, e que causam no protagonista em sair de sua letargia, envolve um mistério sobre uma forma de vida sintética, ou seja, androides, e isso casa bem com os flashbacks de Data. É introduzida uma personagem vivida por Isa Briones. Pouco tempo depois, são introduzidas outras mulheres feitas pela mesma Briones, entre elas, Soji, uma moça que tem envolvimento com romulanos e depois cai de paraquedas no caminho de Picard.
O começo do seriado registra um bom potencial, já se descarta a possibilidade de B4, que apareceu no último filme ter recebido os dados de Data, se mostra uma base romulana que vive num cubo borg desativado, e há uma preocupação em não resgatar personagens clássicos tão frequentemente, a que mais aparece, é Sete de Nove (Jeri Ryan), e sempre de maneira parcimoniosa, e bem condizente com subtexto borg, além é claro de Hugh (Jonathan Del Arko). O problema maior é a contra partida da fuga desse possível oportunismo, pois praticamente todos os novos personagens mostrados ou são sem carisma, ou não tem muita função narrativa, ou tem momentos puramente desnecessários em tela, quando não tem sua moral dúbia algumas vezes ligada, em outras não, e em outras tantas, justificada por motivos banais.
A justificativa para a Federação não ajuda Picard até faz sentido, mas entra em contradição com as inúmeras vezes em que esse ajuntamento foi simplesmente imperfeito. Eles o acham incapaz e senil, graças a uma entrevista que ele dá a imprensa, mas os próprios mandatários não são tão diferentes do personagem principal.
Além desses problemas, a dinâmica entre a tentativa de fazer algo que não tem costume e a teimosia típica da velhice se desgasta muito facilmente. A maioria dos conceitos novos mostrados ao longo dos episódios – sobretudo do segundo ao sexto – soam genéricos, mesmo com o acréscimo de personagens antes introduzidos. É uma pena que o apuro visual tão belo copie junto boa parte dos defeitos vistos também é Star Trek: Discovery.
De positivo, há a exploração das redondezas da galáxia, mostrando os lugares onde a federação não é tão presente e poderosa. Os bares, cassinos e demais lugares onde a vida boemia e a escória habitam fazem lembrar os lares dos caçadores de recompensa de Star Wars, inclusive remetendo demais ao visto em Uma Nova Esperança, O Ataque dos Clones e mesmo Os Último Jedi.
É um.bocado estranho ver Picard tão idoso lidando com uma equipe hermética e super diferente como essa. Nada ali combina, e por mais que isso até tenha uma justificativa, baseada no fato de serem renegados e excluído formando uma tropa pirata que o acompanha, ainda parece esquisito. De positivo, há as falas pró reabilitados pós domínio Borg, de que por mais que visualmente sejam assustadores, eles são vítimas, e não monstros.
Quase toda a trama dos romulanos é caricata, o personagem de Narek (Harry Treadway) parece um personagem de série juvenil com foco em namoricos e afins. Sua relação com Narissa (Peyton List) beira o incestuoso, e é gratuita demais. Os dois parecem não ter camada nenhuma. Outro personagem terrível é Rios (Santiago Cabrera), que ganha muito tempo de tela, seja ele com seu jeito insuportavelmente gaiato, ou suas replicas holográficas igualmente pedantes.
Os conflitos que vão se estabelecendo nos últimos três episódios seriam facilmente contornados em qualquer série Star Trek dos anos 90. Há muitos subterfúgios convenientes, e apelos para Deus Ex Machina. Ao menos, quando a tripulação encontra o lugar de origem de Soji, há alguma lembrança de que se trata aqui de uma série Jornada nas Estrelas, inclusive com um belo simbolismo, dos habitantes de outra civilização analisando as linhas faciais de Jean Luc como fruto de lembranças e de vivências, sentimentais tais quais Data admirava.
O season finale começa após uma serie de eventos bizarros, entre eles o receio de um povo em ser exposto, apelando para outro, dos quais mal se conhece hábitos, modos e sistema político social. Essa serie de equívocos empobrece essa parte da trama, e piora quando se observa o destino do personagem-título.
O simbolismo da conversa de despedida entre Data e Picard é bonita, mas esbarra nas conveniências do roteiro, seja na redenção dos personagens ou na sobrevivência/subsistência do personagem-título. De positivo, há o paralelo com AI – Inteligencia Artificial de Steven Spielberg, em um momento de despedida bonito, como foi com o David de Haley Joel Osment, em ciclo de referencias cruzadas bastante belo. David tinha muito da curiosidade e vontade de ser humano, como era com o Data de TNG, e aqui o fragmento de memória do Comandante tem seu epitáfio tal qual o pequeno Meca menino.
Os últimos atos são complicados, repleto de situações forçadas, dando vazão a outras possíveis aventuras, mas sem um gancho. O que se espera, é que as próximas duas temporadas já renovadas possam ter menos ingerência de gente graúda na produção, em especial Goldsman que escreveu e dirigiu os últimos dois episódios, fato que dificilmente ocorrerá dado que tem sido ele o responsável por tocar essas novas séries de Star Trek.