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  • Resenha | O Oceano no Fim do Caminho – Neil Gaiman

    Resenha | O Oceano no Fim do Caminho – Neil Gaiman

    “Adultos seguem caminhos. Crianças exploram.”

    Não tem coisa mais fácil, e descartável, que um mero escapismo infantil em forma de livro. A série nacional Vaga-Lume tornou-se célebre justamente por resgatar a aura das aventuras infanto-juvenis clássicas com o dobro de vida e perspicácia que a maioria das histórias para crianças tanto demonstram, publicadas ano após ano, quase subestimando a inteligência dos pequeninos. Já para Neil Gaiman, criador de Coraline e da obra-prima adulta Sandman, chega a ser uma terapia estimulante pôr pra fora sua criança interior com a sabedoria de um escritor sapiente, tecendo epopeias profundas e reflexivas com a intenção principal de reproduzir, o mais fiel possível, a experiência de ser criança e de encarar (ou não) os nossos medos sem entender, de verdade, nada do que está acontecendo. Quando o mundo é o nosso quintal, tudo é possível nele, tudo é fértil, enquanto somos tão felizes de brincadeira, em brincadeira.

    O que impressiona, mesmo, é a habilidade de Gaiman em levar a sério, na medida perfeita, fábulas tão doces quanto arrepiantes, e que provavelmente toda avó conta a seu neto antes de dormir, ao instigar seus sonhos mais secretos. Reinações estas muito parecidas com a deste O Oceano no Fim do Caminho, narrado em primeira pessoa com um forte clima de confissões de diário aberto, e sem o nome do personagem principal a nos guiar pela aventura que viveu, aos sete anos de idade. Aqui, este (para sempre atormentado pela sua infância) retorna a sua cidade natal apenas para ver como tudo está, mais de vinte anos depois de ter lutado contra todo tipo de força do mal que uma criança pode imaginar, e ainda, ter conhecido a doce e poderosa Lettie, na fazenda de sua família. Sem saber que o destino os lançaria a inúmeras armadilhas, a dupla passa a ser atormentada por monstros do submundo recém invocados, após um homem se matar nas redondezas, com eles farejando a morte e sendo atraídos por ela.

    Há um lago na fazenda de Lettie e sua família, e nele há ondas oceânicas que nos levam a reinos muito distantes! Um portal legítimo, cujos mistérios vão muito além da capacidade de um garoto de sete aninhos entender, e como ele é a voz da jornada, Neil Gaiman cozinha esses mistérios através do olhar cândido e inocente do garoto que embarca com a sua melhor amiga num mar de fantasia que, talvez, só possa ser vivenciado e desfrutado mesmo pelas virtudes dos infantes, e dos de bom coração. Há uma frase dita por Gandalf no livro O Hobbit, de J.R.R. Tolkien, que ilustra perfeitamente boa parte do trabalho de Gaiman: “São os simples atos de bondade e amor do dia a dia, que mantém a escuridão afastada.” Em certo momento, a história incorpora essa verdade nos grudando a ela, e mesmo com criaturas das trevas despertadas naquela pacata cidade americana, longe de tudo, é a força da amizade e de uma família, no meio do nada, que impede as várias formas do mal de eclipsar a luz, e governar o lado de cá desse “oceano” em forma de lago.

    Mas e quando os problemas racham as nossas paredes, se infiltram e conseguem invadir a nossa casa, personificados numa governanta que seduz a todos apenas para vigiar, bem de perto, aquele que impede o triunfo do mal? Eis que surge então a sinistra Ursula Monkton, mulher sem passado e que age como elemento de destruição da normalidade, infernizando ainda mais a nossa dupla de aventureiros. O que poderia ser apenas uma alegoria sobre o terror de uma madrasta cruel morando com você, e ver seu pai enfeitiçado por ela indo contra os seus filhos, isso que poderia ser um longo episódio de Coragem, O Cão Covarde vira, nas mãos magistrais de Gaiman, um exercício literário da mais pura e nobre fantasia que surgiu nos anos 2010. Do início ao término (que nunca desejamos chegar), O Oceano no Fim do Caminho é, além de uma ode à imaginação infantil, colorindo e agitando o mundo de boletos e crises dos adultos, uma impagável homenagem a própria obra geral, super criativa e fabulesca, de Gaiman.

    Obras assim nos transportam para longe, muitas vezes para dentro de nós, isso devido sobretudo a sua atmosfera arquitetada em detalhes, e um suspense bom demais para resistir a imersão. Assim como em O Livro do Cemitério, Gaiman consegue nos encantar com a facilidade do vento, e a leveza de um conto de Roald Dahl mais sinistro, como se os Oompa-Loompas tramassem agora um plano bizarro para comandar a fábrica de Willy Wonka, ou se Matilda decidisse se vingar pra valer da diretora do colégio. Tudo na dinâmica de um pequeno grande conto, e com aquele sabor de infância para o público mais crescidinho que, no fundo, sente saudades de embarcar em aventuras epopeicas como as de Lettie e seu amiguinho, um moleque normal que cai de balão nesse mundo de dimensões paralelas e criaturas inacreditáveis, capazes de engolir a nossa realidade – literalmente. Mas vamos ao que interessa: e se Gaiman escrevesse Harry Potter? Esse é o mundo perfeito onde eu quero viver, explorar, e nunca mais voltar dele.

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  • Resenha | Konungar: A Guerra dos Reis

    Resenha | Konungar: A Guerra dos Reis

    Konungar: A Guerra dos Reis retrata uma aventura nórdica, com referenciais à literatura fantástica clássica. Sua história se situa no Reino de Alstavik baseando-se na batalha entre dois irmãos, Rildrig e Sigvald. A narrativa passa basicamente pelo olhar da irmã dos dois, a bela Elfi, que tenta trazer um acordo amistoso entre os dois.

    A arte da publicação é estonteante, assinada por Juzhen, em uma edição em capa dura da Editora Mythos, cujo capricho visual faz aumentar ainda mais o caráter épico da abordagem. Cada detalhe visual visa maximizar a luta do povo desse reino escandinavo, para proteger seu “mundo” do ataque dos celtas. É só uma pena que essa edição não possua textos assessórios a respeito dos artistas responsáveis pela obra e suas carreiras.

    A trama de Sylvain Runberg não demora a mostrar as criaturas mágicas típicas da mitologia nórdica e viking. A ação é franca, com embates de flechas, batalhas de espadas onde homens e monstruosidades entram em combates. Essa linha de frente entra em contraste total com as figuras dos castelos, onde a alta nobreza claramente não tem o mesmo contato com o perigo que a plebe, e isso evidentemente gera choques, embora o intuito da história não seja discutir essa disputa ideológica.

    A hierarquia palacial e estratégica em conflito é bem exemplificada, antes mesmo dos conflitos internos familiares entre nobres. As questões envolvendo os monstros e humanoides são bem mostrados. Os centauros parecem ser um bom motivo para uma possível trégua entre o rei e o irmão exilado, pensada por sua vez por Elfi, embora as intenções dos dois não seja tão maniqueísta quanto a premissa da história parece propagar.

    O encontro de domínios põe em combate figuras irracionais contra bestas acéfalos, e incrivelmente, não são os centauros as criaturas mais bárbaras dessa disputa. É curioso como Juzhen consegue ao mesmo tempo apelar para um visual gore bastante gráfico, ao passo que as imagens de dilacerações e desmembramentos não parecem gratuitas. É difícil descrever em palavras, mas há alguma elegância na escolha onde é colocada a violência ao mostrar os cavalos cortados ao meio, jogados em pequenos quadros nas páginas sem um destaque central. A recriação das paisagens também soam absurdas de tão belas, em especial nos cenários comuns, que parecem reais. Ao mesmo tempo que a arte faz predominar tons escuros, não há receio da reconstrução histórica em mostrar cores vivas nos uniformes e bandeiras de guerra.

    Há claros elementos de livros como os clássicos de J.R.R. Tolkien e Marion Zimmer Bradley, além dos quadrinhos do Conan, em especial os de John Buscema e Roy Thomas, baseado nos contos de Robert Howard, existem elementos até de mesmo Pacto com Lobos, filme francês de Christophe Gans bem menos aclamado do que realmente merece. Ao passo que as mulheres no traço de Juzhen, são tão voluptuosas quanto na maioria dos quadrinhos mainstream, ou seja, modelos com corpos esculturais que reproduzem o padrão estético da década atual e não necessariamente à época que retrata, ainda assim, há espaço no roteiro para discutir violência entre quatro paredes, sobretudo nas relações dessa nobreza. O roteiro trabalha bem com todos esses elementos, e mesmo em seus clichês, há uma boa exploração temática. Essa talvez seja a maior riqueza do texto, que é evidentemente mais escapista e fantasioso do que preocupado em abordar politicamente seu mundo.

    A história é repleta de intrigas e traições. O modo como a trama se desenrola faz perguntar se em nome da ética, traições a nação são justificáveis, mesmo vertendo o pensamento ideológico a época e a cultura nórdica. Konungar: A Guerra dos Reis acaba mostrando pessoas corrompidas pelo poder, e que em meio as agruras da guerra, acabam apelando para medidas drásticas, resultando em um trabalho visual diferenciado da dupla Juzhen e Runberg.

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  • Resenha | Odd e os Gigantes de Gelo – Neil Gaiman

    Resenha | Odd e os Gigantes de Gelo – Neil Gaiman

    “Fique assim por muito tempo, e você se tornará o que finge ser.”

    Neil Gaiman tem o talento de encantar todos os públicos com histórias cujos temas não tem um grande apelo universal. Seus contos de aventura geralmente são soturnos e simbólicos, repletos de mistérios muitas vezes sobrenaturais, e uma atração inexorável a uma fantasia macabra, que já lhe é inconfundível. É assim com Coraline, com a obra-prima Sandman, e também com um de seus melhores romances, o subestimado O Livro do Cemitério, no qual, sob uma atmosfera fantasmagórica e sepulcral, se constrói a mais cândida história de amor, e amizade que o autor já ousou nos contar. Gaiman é um esteta do sombrio enigmático, eterno romeu apaixonado pelo brilho das sombras, pela maciez das asas dos anjos da morte, pelos ecos de um desconhecido irresistível.

    E é nesse desconhecido que ele nos embriaga, facilmente, em contos de pura paixão pela literatura e o faz-de-conta que, nas mãos certas, sempre se desdobra em grandes lições de vida, para todas as idades e tipos de leitores. Tão divertido e reflexivo quanto pode ser, Odd e os Gigantes de Gelo é Gaiman e o ilustrador Brett Helquist nos aventurando pelo mundo da mitologia nórdica, com seus deuses e montanhas glaciais, buscando no fantástico a base e a inspiração alegóricas para um menino comum, se tornar Homem. Odd é garoto órfão de pai, e destinado a salvar a mãe solteira do frio que os acomete em sua frágil cabana e seu pequeno vilarejo, Odd enfrenta o frio extremo para buscar a lenha, e o calor que irá salvar a todos de uma literal destruição.

    Manco de uma perna, e mais bravo que metade dos homens bêbados e brigões que deixou para trás, o menino não demora a perceber que a volta para casa irá demorar mais do que ele imaginou, já que o chamado a aventura é bom demais para se negar – ainda mais a uma criança de tão bom coração. Ao se deparar com o próprio Thor, o deus do trovão, Loki, o deus da mentira, e seu pai supremo, Odin, um dilema principal é estabelecido: os três foram amaldiçoados por um terrível gigante de gelo a encarnar as formas animalescas de um urso, uma raposa e uma bela águia, e assim, foram todos exilados do seu reino de Asgard direto para o mundo humano. Presos a outras aparências, e outros instintos, eles logo se tornarão selvagens e esquecerão das divindades que realmente são, e é claro que Odd não pode deixar isso acontecer.

    De posse de sua inocência e pureza, como os maiores poderes que existem, o destemido Odd e seus rebaixados deuses marcham até onde nasce o arco-íris, no mais gélido ambiente da Terra, munidos de uma esperança cega e que, de tão cega, pode se tornar real. Tangível, e útil para que o reino de Asgard seja acessível novamente a uma trinca de deuses que, um dia, dependeram da ajuda de um reles e jovem mortal. Neste breve conto, Gaiman enfatiza o seu poder de contar pequenas grandes histórias, em prol de irradiar a luz, a beleza e a força que podem existir em meio a escuridão, a bizarrice, ou simplesmente, nesse caso, em meio ao inusitado. Odd e os Gigantes de Gelo, da Editora Rocco no Brasil, também não deixa de ser uma solene homenagem à Terra-Média de J.R.R. Tolkien, ou à Nárnia de C.S. Lewis, na crença de que tamanho não é documento para se salvar o próprio mundo, ou o mundo dos outros, quando assim nos é incumbido pelo destino.

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  • Resenha | Contos Inacabados – J.R.R. Tolkien

    Resenha | Contos Inacabados – J.R.R. Tolkien

    Para J.R.R. Tolkien, a fantasia é tangível tal uma imaginação tão nobre, que merece ser palpável aqueles que nela mergulham. Peter Jackson entendeu isso, e fez da Terra-Média nos cinemas algo vivo, e pulsante. Ainda assim, sempre esteve em seus três grandes filmes passos atrás da força literária das experiências imersivas do mestre absoluto da fantasia moderna, tanto em narrativas acabadas e coerentes como as de O Senhor dos Anéis, O Hobbit e O Silmarillion, quanto em outros de seus tratados menos conhecidos. De posse de inúmeros contos incompletos que habitavam apenas a mente multicriativa do autor para servirem de rascunho a algo muito mais ambicioso, uma verdadeira colcha de retalhos sobre o mundo extremamente real que existia na cabeça (e nos dedos) de Tolkien, seu filho Christopher Tolkien tratou de reunir todos os manuscritos originais, sete anos após o falecimento do seu pai, em um único e honorável volume da editora WMF Martins Fontes, no Brasil.

    Assim, a fim de aprofundar o encantamento das obras do mestre, concebeu em quase seiscentas páginas um longo objeto de análise da impagável e inesgotável potência fantasiosa de Tolkien – ainda que não tão empolgante quanto suas outras inserções sem-par no gênero. Longe de transmitir um gosto de esgotamento ou abuso as ideias sem fim do pai, Christopher nos propõe imprimir uma coerência e uma fruição dinâmica entre narrativas inacabadas, apêndices discursivos e notas descritivas a respeito de inúmeros detalhes, e coisas não-ditas e não-escritas que sempre habitaram o pano de fundo de suas populares histórias. Isso nos faz imaginar quais notas enriquecedoras (e obscuras) podem existir, para sempre escondidas, acerca de Dom Quixote, Dom Casmurro e, porque não, as peças de William Shakespeare. O que seus grandes autores também não deixaram de fora dos seus escritos principais? Anotações oriundas de consciências naturalmente privilegiadas.

    Tarefa hercúlea como só, logo na introdução já atestamos as dificuldades da produção de Contos Inacabados, uma vez que cada conto demandou um tratamento diferente, combinando alguns relatos curtos do próprio Tolkien ao longo dos textos, e pedaços de outras citações que o autor foi dando ao longo da vida sobre aspectos complementares à sua gigantesca obra – sempre alimentando e sofisticando a mitologia de suas criações, lendas e entidades tão imortais, quanto as palavras que as descrevem. Aqui, tais “retalhos” são divididos entre a primeira era (que dá cabo de grande parte dos detalhes da fantasia principal de O Silmarillion), uma segunda era (reservada principalmente a exploração da geografia da Terra-Média, e a etimologia de vários nomes que já fazem parte do grande arco do O Senhor dos Anéis, como o sábio Gandalf e a magnífica Galadriel) e uma terceira era, estabelecendo nesta última faixa temporal recortes interessantes de muito do que foi lido (e visto) em A Sociedade do Anel – revelando inclusive que Gollum fugiu para Moria para escapar dos agentes de Sauron, atrás dele devido a certeza de que a criatura sabia onde estava escondido o Um anel.

    É certo que o magnetismo que Tolkien desperta não precisa de um grande acabamento a preencher tudo aquilo que não é descrito em suas narrativas fundamentais. Assim sendo, Contos Inacabados acaba sendo um complemento de luxo aos mais curiosos e ávidos pelos pormenores de uma história quase que interminável (através das gerações que (re)modelaram os destinos da Terra-Média) devido suas proporções realmente majestosas, e repletas de inspiração aos próximos mestres da fantasia – e não um mero escapismo, como muitas vezes é confundida, hoje em dia. Não se deve negar a oportunidade de conhecer o processo criativo dos grandes mestres, por mais tortuoso e nada glamoroso que este possa ser, mas não estar a par de suas minúcias não resume seus efeitos sobre os fãs do material. Se em Silmarillion nós conhecemos as fundações dessa dimensão de dragões e inúmeras formas de poder, Christopher Tolkien nos apresenta a reunião dos blocos de notas do seu pai – extensos o bastante para preencher um tijolo literário enriquecedor ao grande todo, mas um tanto desnecessário, no uso menos cruel possível da palavra.

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  • Resenha | Mitologia Nórdica – Neil Gaiman

    Resenha | Mitologia Nórdica – Neil Gaiman

    Neil Gaiman tem seu lugar assegurado em torno da fogueira dos grandes contadores de histórias. Não é de hoje que o autor britânico, erradicado nos Estados Unidos, desvenda os cosmos mitológicos ao redor do globo. Tudo ganhou forma com Sandman, onde ele usou inspirações de várias mitologias para criar uma própria ao redor dos perpétuos e seus reinos; depois, povoou alguns de seus livros, como Os Filhos de Anansi, Deuses Americanos, etc, com os próprios deuses mitológicos; agora, com Mitologia Nórdica, publicação da editora Intrínseca, o autor reivindica o assento dos primeiros poetas da humanidade que compilaram os mitos de seus povos. Neste livro, especificamente, reconta os nórdicos.

    O ponto de partida de Mitologia Nórdica são as diversas traduções da Edda em Prosa, de Snorri Sturluson e Edda Poética, textos com mais de novecentos anos de idade; com esse material e dicionários a mão, Gaiman selecionou as histórias de que dispunha mais informações, em conjunto com certa ordem cronológica dos mitos, e preencheu as lacunas com seu próprio oficio de contador de histórias. O resultado é um livro informativo, coeso, bem estruturado e literariamente agradabilíssimo que apresenta de forma muito honrada os mitos nórdicos aos leitores.

    Quinze mitos povoam o livro e, do primeiro ao último, o material é pródigo por incitar uma ordem no caos mitológico. Decerto, excluindo a criação e o desfecho nórdico (o relembrado Ragnarök), as histórias não aconteceram na sequência proposta pelo autor, contudo, o ordenamento facilita a compreensão do leitor no meio do emaranhado de deuses, gigantes, heróis, encantamentos e maldições perpetuados pelos poetas do passado.

    Escrita afiada, o inglês tece ótimos diálogos com seus personagens. Só para citar os que mais aparecem, Odin, o Pai de Todos nórdico, varia entre momentos de sabedoria (afinal ele deu um olho por isso) e outros de estupefação, sem qualquer descrédito ou perda de qualidade; Tor é um brutamontes que fala sem qualquer zelo, orgulhoso por seus instrumentos de poder; Loki é o instrumento do caos, deus da trapaça e da enganação, sibila para armar conflitos entre os deuses e seus inimigos, e quando é pego, sempre consegue se safar. Outros deuses e variados gigantes compõem o cenário, todos encarnando em diálogos bem feitos os princípios que defendem ou suas vontades e propósitos.

    Diferente de livros do tipo Mitologia para apressados e parecidos, Mitologia Nórdica não entrega pílulas sem sabor traduzidas a esmo, ao contrário, temos um livro muito bem pensado, de leitura fácil e encantadora, que não peca por alguma superficialidade. O grande mérito da obra também reside no fato de não substituir outros livros sobre aquele passado mitológico, mas antes, os atualiza e serve como porta a imaginação dos povos nórdicos. Livro muito recomendado.

    Texto de autoria de José Fontenele.

    Compre: Mitologia Nórdica – Neil Gaiman.

  • Review | Game of Thrones – 7ª Temporada

    Review | Game of Thrones – 7ª Temporada

    Ao término de sua sexta temporada, foi anunciado ao grande público que o desfecho da grande saga criada por George R. R. Martin e que ganhou vida sob os olhos de D. B. Weiss e David Benioff teria somente apenas mais 13 episódios a serem divididos numa penúltima temporada de sete episódios, sendo a temporada derradeira, seis. Os fãs de Game of Thrones receberam a notícia como se fosse um banho de água fria, já que a série é a mais querida e mais assistida da televisão. Afinal, qual seria o real motivo de diminuir a quantidade de episódios logo em sua reta final? Porém, quando os créditos do último episódio desta 7ª temporada começaram a aparecer, teve-se a sensação de que a decisão dos produtores foi acertada.

    Se a ótima 6ª temporada havia sido a melhor de toda a série, sua sucessora tinha a injusta missão de superá-la, ou ao menos, igualá-la. E para isso, Weiss e Benioff tinham em mãos um planejamento certeiro, que acabou por casar a história com a quantidade de episódios a serem distribuídos, sendo que, o que se teve, foi uma temporada com episódios maiores em termos de duração, mas sem nenhuma morosidade, inclusive apresentando certa urgência incomum em seus desenrolares e acontecimentos, deixando um saldo final como a temporada mais regular até aqui em termos de episódios, não cabendo, portanto, espaço para a enrolação tão criticada nas outras temporadas.

    Se logo no começo da 1ª temporada os principais personagens se separaram, mas ainda assim podendo mencioná-los e dividi-los por núcleos (ainda que cada membro de uma determinada casa estivesse um em cada lugar de Westeros), o que se viu aqui foi uma satisfatória mistura recheada de primeiros encontros e vários reencontros. A premissa desta vez foi extremamente simplificada. Enquanto Daenerys Targaryen (Emilia Clarke) cruzou o Mar Estreito pela primeira vez junto dos Dothraki e os Imaculados nos navios fornecidos por Yara (Gemma Whelan) e Theon Greyjoy (Alfie Allen), trazendo consigo sua mão, Tyrion Lannister (Peter Dinklage) e Lorde Varys (Conleth Hill). O Rei do Norte, Jon Snow (Kit Harington), se preocupa em reunir demais aliados ao Norte para a ameaça dos White Walkers, liderados pelo Rei da Noite, que busca atravessar a muralha com seu exército de mortos. Enquanto isso, a nova rainha, Cersei Lannister (Lena Headey), continua estabelecendo suas alianças e se fortalecendo através do terror e da intimidação.

    Obviamente, a história passa a se converter na urgência maior, obrigando Jon a viajar até Dragonstone, onde Daenerys estabeleceu sua moradia. Sua missão é convencê-la da ameaça dos White Walkers, pedindo para que ela lute ao seu lado e ainda permita que a equipe do Lorde de Winterfell extraia o vidro de dragão, extremamente abundante na ilha e efetivo contra os mortos-vivos. O encontro que foi bastante aguardado, seguindo a tradição de encontros emblemáticos, não sai como esperado, haja vista que a orgulhosa khaleesi ordena que Jon Snow se ajoelhe, jurando servir a Casa Targaryen. O pedido é totalmente negado, mas Snow consegue convencê-la a deixar com que se extraia o mineral.

    Uma das principais deficiências da série sempre foi o fato dos produtores e roteiristas introduzirem sérias ameaças sem justificativa nenhuma, como foi o caso do Alto Pardal de King’s Landing, seus seguidores e dos Filhos da Hárpia, que causaram muitas baixas no exército de Daenerys nas temporadas anteriores. Na atual temporada, o descaso/ameaça da vez é o irritante e cruel Euron Greyjoy (Pilou Asbaek), personagem introduzido na temporada anterior e que consegue tomar para si todo o poder das Ilhas de Ferro. Aliado aos Lannisters e querendo ser casar com Cersei, Euron intercepta pelo mar parte da armada de Daenerys numa sensacional batalha entre navios, sequestrando Yara Greyjoy e as Serpentes de Areia, entregando essas últimas (assassinas da menina, Myrcella) para a rainha de Westeros.

    Um outro ponto que mereceu destaque foi a maneira como os dragões foram utilizados nesta temporada, onde foi deixado de lado seus aparecimentos apenas para salvarem o dia, no melhor estilo Deus Ex Machina, ou “Dragões Ex Machina”, como preferir. Após ser enganada numa bela manobra militar feita por Jaime Lannister (Nicolaj Coster-Waldau), que conseguiu afastar o exército de Imaculados, Daenerys resolve responder de maneira efetiva aos leões, dizimando violentamente parte do exército de Jaime com seus 3 dragões pelo ar e os Dothraki em terra. Jaime que quase não sobrevive e que estava cego pelo seu amor por Cersei, passa a ter lampejos de racionalidade, reconhecendo a supremacia de Daenerys, a força dos Dothraki e o poder dos 3 dragões, demonstrando, por várias vezes, ser contrário aos ideais de sua irmã, dando a entender, ao final da temporada, aparentemente, ter escolhido um caminho a seguir. A batalha em questão teve um escopo maior que a Batalha dos Bastardos, usando mais figurantes, mais cavalos e mais tempo para ser preparada, ainda que, aparentou ter sido filmada com um pouco menos de cuidado em relação ao embate de Jon Snow e Ramsey Bolton na temporada anterior.

    Enquanto tudo isso acontecia, assuntos menores, mas de suma importância desenrolavam em outros pontos de Westeros. Sam (John Bradley), por exemplo, no caminho de se tornar um meistre para ajudar Jon Snow, além de descobrir algumas respostas sobre os White Walkers e sobre o casamento em segredo de Rhaegar Targaryen (Wilf Scolding) e Lyanna Stark (Aislin Franciosi), esbarra, sem querer, numa conveniência de roteiro que levou à Cidadela Sor Jorah Mormont (Iain Glenn), que está num estado degradável com a escamagris tomando boa parte de seu corpo. Enquanto isso, um chato Bran Stark (Isaac Hempsted Wright), agora como o Corvo de Três Olhos, chega a Winterfell que está sendo guardada por sua irmã, Sansa (Sophie Turner), sendo que as reuniões não param por aí, quando a corajosa Arya (Maisie Williams), chega para fazer a maior reunião da Casa Stark, desde o final do 1º episódio da série. Vale destacar que é o cenário perfeito para que o ardiloso Mindinho (Aidan Gillen) continue com seu plano de tomar tudo para si. Acontece que Arya e Sansa não são mais as mesmas garotas de antes e, mesmo que tenhamos uma noção de que apesar de tudo que passaram, elas ainda guardam diferenças e uma certa inveja uma da outra, foi bom poder acompanhar a continuidade do “trabalho” de Mindinho e a maneira como as irmãs Stark lidaram com isso.

    Sem dúvida, o momento mais sensacional de toda a temporada e seguindo a tradição da série do melhor episódio ser sempre o penúltimo, foi quando Jon Snow resolve capturar algum membro do exército de mortos com a finalidade de provar à Cersei que é hora de colocar as divergências de lado em prol do futuro da humanidade. Assim, reúne num só time nada mais, nada menos, que parte dos mais queridos e melhores guerreiros de Westeros, causando furor na internet que, carinhosamente, comparou o time com a Sociedade do Anel, ou com os Vingadores, ou com um nome ainda mais justo: Esquadrão Suicida. Quem se juntou a Snow na empreitada foi o selvagem Tormund Giantsbane (Kristofer Hivju), o Cão, Sandor Clegane (Rory McCanne), Sor Jorah Mormont, completamente curado e novamente integrado à Daenerys, o sumido Gendry (Joe Dempsie), repatriado por Sor Davos (Liam Cunningham), além de Thoros De Myr (Paul Kaye) e Beric Dondarrion (Richard Dormer), a dupla que sobrou da extinta Irmandade Sem Bandeiras. O episódio tem diálogos sensacionais e divertidos, principalmente quando Tormund e Clegane conversam sobre Lady Brienne (Gwendoline Christie). Toda a empreitada teve momentos para prender a respiração e momentos de apresentar baixas significativas, tanto na equipe, quanto no que diz respeito à morte de um dos dragões, demonstrando que o Rei da Noite é muito mais poderoso do que se imagina.

    Além de ter sido o episódio mais tenso de toda a temporada e também foi aquele que bateu recorde de audiência, ainda que a HBO Espanha tenha cometido a irresponsabilidade medonha de passar o episódio dias antes de sua estreia, em vez de passar uma reprise do episódio anterior, fazendo com que tudo fosse disponibilizado na rede muito antes da hora.

    Se o sexto episódio foi um dos top 3 de toda a série e detentor de recordes, o último episódio acabou por superar o recorde antigo no que diz respeito à audiência. Nele, pudemos acompanhar a maior reunião de personagens numa única cena. Junto de Cersei e alguns soldados da guarda real, estavam Jaime, Qyburn (Anton Lesser), Euron Greyjoy e a Montanha, Gregor Clegane (Hafþór Júlíus Björnsson). Do lado de Daenerys, estavam Tyrion, Jon Snow, Davos, Varys, o Cão, Sandor Clegane, Brienne, que foi representar Sansa Stark; Missandei (Nathalie Emmanuel), Theon, Jorah Mormont e alguns Dothraki. A importância dessa reunião foi enorme, tanto para o seguimento da história, quanto para os fãs que aguardaram anos para ver concretizada. Jon Snow, pela primeira vez, desde o primeiro episódio da série confronta os assassinos de Ned Stark. Brienne reecontra Jaime e o Cão que foi derrotado por ela, sendo que o respeito mútuo entre os dois chega a ser louvável. O Cão confronta seu irmão, deixando claro que a história entre os dois, o chamado Clegane Bowl está perto do fim. E por último, Daenerys tendo seu primeiro contato com o reino e a rainha de King´s Landing.

    O episódio, que foi o mais longo de toda a série, teve uma pegada bem cadenciada, mas longe de ser chata, ou cansativa. Contudo, pudemos experimentar detalhes importantes para a trama, primeiro no que diz respeito a Jon Snow, onde todas as teorias a seu respeito foram confirmadas com um adendo especial: seu nome, que poderá, inclusive delimitar o seu destino na trama. Um outro ponto foi a conversa secreta que Tyrion teve com Cersei. O que será que o anão fez para convencer a rainha a apoia-los na batalha contra os White Walkers? E o que a fez desistir tão facilmente do acordo a ponto de Jaime tomar as decisões que tomou? E Tyrion que se demonstrou extremamente desconfortável ao ver Jon Snow entrando no quarto de Daenerys? Essas perguntas só serão respondidas na derradeira temporada da série.

    Afinal, a sensação é que não restará muita coisa, assim como parte da grande muralha, destruída por Viserion, o dragão de Daenerys, ora derrotado e revivido pelo Rei da Noite. O inverno que já havia chegado ao Norte, chegou inclusive na Capital. E na história de Westeros, neve na Capital não é sinal de bons ventos. A previsão é de um longo e tenebroso inverno, porém curto o bastante para os espectadores.

    Texto de autoria de David Matheus Nunes.

  • Resenha | Nimona

    Resenha | Nimona

    Nimona, quadrinho com roteiro e arte de Noelle Stenvenson, é o gibi com o qual as pessoas facilmente se identificam e gostam. Não sei como explicar, algo lhe chama a atenção e você já começa a gostar antes mesmo de ler. Como dito em podcasts por aqui: fácil de ver (ler), fácil de gostar e fácil de esquecer. Com a diferença que você não vai se esquecer com facilidade desta obra.

    O enredo consiste na chegada de Nimona, uma metamorfa com poderes absurdos, que quer se unir ao vilão daquele mundo, Ballister Coração Negro, no combate ao herói, Ouropelvis (isso mesmo) e a instituição que ele representa. O gibi como um todo surpreende, pois aparentemente se trata de uma história cômica, e realmente o humor é uma de suas principais características, mas vai muito além disso.

    Neste sentido o mais interessante é a quantidade de vezes que a autora nos mostra um aparente clichê e o desenvolve até desconstruí-lo. O primeiro é a própria ambientação, um cenário de fantasia medieval com cavaleiros e uma personagem que pode se transformar em animais mitológicos. Porém, o ambiente de fantasia medieval é repleto de ciência e alta tecnologia. Então, nos deparamos com castelos medievais com capacidade de comunicação parecido com skype ou mesmo com laboratórios de cientistas malucos no subsolo, um dos protagonistas possui um braço mecânico.

    Os personagens também compõe bem a ideia de clichê, que não são na verdade. O vilão, sempre de cabelo preto e com planos diabólicos, o herói louro e bonitão que sempre aparece em horas de necessidade e a própria Nimona, no papel da adolescente incompreendida e rebelde. Mas tudo se trata apenas de fachada, todos os personagens são muito mais do que apenas esses estereótipos, são mais profundos e tornam a história mais complexa e interessante.

    Aliás, a própria história de herói e vilão é bastante questionada, sempre se pensa em pessoas como vilões, talvez o gibi nos mostre que organizações e complexos podem ser mais perigosos. Claro que essas organizações são criadas e geridas por pessoas, mas muitas das vezes a estrutura se impõe sobre a pessoa. Enfim, nos faz pensar em situações bem mais profundas do que a capa do gibi nos faz pensar.

    E, não podemos nos esquecer da grande protagonista, Nimona. Uma personagem interessante e carismática desde as suas características assassinas até o seu complicado psicológico, que vai muito além da tradicional rebeldia adolescente. A arte cartunesca cai como uma luva para o gibi e sua proposta. Novamente o clichê, com esse estilo de desenho se espera algo somente leve e engraçado, e nos é apresentado algo bem maior e melhor.

    Compre: Nimona – Noelle Stevenson

    Texto de autoria de Douglas Biagio Puglia.

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  • Crítica | Harry Potter e a Câmara Secreta

    Crítica | Harry Potter e a Câmara Secreta

    Eis o mais interessante dos Potter, e por muitos motivos ligados ou não ao filme; primeiro sua própria pegada, mais sombria do que nunca, sendo que parece uma obrigação toda sequência ser sombria, séria, dark desde O Império Contra-Ataca, coisa que às vezes dá certo (O Cavaleiro das Trevas), e outras vez não. Tipo aqui. A Câmara Secreta é um filme de suspense adolescente feito para criança, consumado para ser mais adulto até que alguém aparentemente gritou: “Ei, mas esse é um filme para crianças, esqueceram?”. A sensação é sempre essa, enquanto o sangue corre pelas paredes e vítimas de bruxaria das trevas aparecem aos montes nos corredores de Hogwarts, entre crianças curiosas e fantasmas da escola. Chris Columbus volta a dirigir a aventura, muito mais cético e pessimista ao potencial do mundo de J.K. Rowling que antes, afinal a mensagem é clara: Harry Potter está crescendo, e com isso a ambição de quem financia suas travessuras e vê Cinema pela ótica do dinheiro, jamais da magia. Além da história e a pressão dos produtores, existe outra explicação para a Câmara Secreta ser o mais fraco da saga?

    Numa cena, Harry, Rony, Hermione e cia. precisam desenterrar Mandrágoras, plantas vivas de alguns vasos numa aula interativa de herbologia, bem no meio do filme. Bingo! Essa é a chave para entender o filme todo, já que toda obra (artística ou civil) tem AQUELA parte que resume o todo, fazendo seus modeladores perderem suas horas de sono, mas é inevitável sentir o toque macabro e satírico da situação quando assistimos batatas assassinas guinchando fora do vaso. A gente ri, com nojo mas ri, sendo essa a única cena d’A Câmara Secreta cujo equilíbrio de sensações que o filme tenta passar é consumado, antes ou depois jamais atingido ao longo da projeção (mesmo na cena dos diabretes da cornualha onde o humor é bobo e fácil). Se no livro há uma especulação mais refinada sobre o que esconde essa misteriosa câmara, o filme parece estar mais do que ansioso à nos mostrar logo o que existe, lá, inseguro se mergulha de cabeça na investigação do lado negro da magia, ou se mantém o lado doce de antes. Em resumo: Uma antítese agridoce ao filme anterior.

    E nem o quadribol salva os momentos mais divertidos de um filme com muitos interesses em jogo, o que só azeda o gosto do bolo: Manter ou ampliar o descomunal sucesso de A Pedra Filosofal, capturar com mais fidelidade esse universo de magia e prestar atenção no que os fãs querem assistir, sendo qualquer um dos filmes de Potter, mesmo o ótimo Prisioneiro de Askaban, produtos de fantasia feito quase que exclusivamente para o agrado dos fãs de Rowling. Se com De Volta Para o Futuro ou a primeira trilogia de Star Wars seus realizadores se preocuparam em elevar o nível do cinema de ficção-científica, Potter em oito filmes nunca se interessou em fazer parte do hall dos grandes filmes de fantasia, nunca pensou em maneiras criativas de explorar as narrativas do surreal, algo que os filmes de Nárnia até tentaram, mas falharam de forma não tão grande quanto este desnutrido e deslocado segundo filme do menino-bruxo. Pois o que salva tudo é seu carisma, afinal, e claro, a presença de Dobby, um dos melhores personagens deste universo.

  • Crítica | Marujos do Amor

    Crítica | Marujos do Amor

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    A era de ouro… Quando Hollywood era mais Hollywood, os filmes mais Cinema e menos como a linha de montagem exibida em Tempos Modernos; tudo na América era digno de celebração e orgulho, e a sociedade do espetáculo crescia. O próprio americano confiava mais em seu país e nos valores da nação do que hoje em dia. Se hoje os EUA ainda ostentam a imagem de grande pátria, são filmes como Marujos do Amor a chave para essa reputação de país heroico e impávido colosso. A glória tinha mais pompa: As cores, mais vibrantes; tudo parecia ser mais original (o que, a bem da verdade, não era tanto assim) e os filmes de estúdio, rodados em grandes cenários, começavam a ganhar o mundo. Foi nos triunfos de John Ford e companhia que Hollywood se sabotou, aos poucos, com seu próprio estilo faraônico do fazer cinema consumindo suas eras, suas divas, seus astros e seus valores. O entretenimento era mais puro, e a inocência na tela, como muitos diálogos de Marujos nos faz lembrar, era aquilo que comandava o show.

    O gênero musical é a síntese dos anos trinta ao cinquenta, afinal o cinema tinha que alegrar o mundo enquanto a 2º Guerra explodia. As moças ainda não usavam jeans e os homens não tiravam seus chapéus nem se fosse pra dançar. Também era comum os musicais apresentarem uma metalinguagem simples, (um filme dentro de outro) ainda sem se aprofundar no subtema. Nunca, e repito: nunca o cinema soube marcar tão bem uma época, ainda refém dos costumes do século 19, estilizando (com uma grande liberdade artística de expressão) figurinos e ambientes inesquecíveis. Nem mesmo Fellini resistiu a moda dos grandes cenários e rodou em 1973 seu Amarcord, uma das melhores comédias da história, numa cidade de mentirinha. A própria composição visual do filme de 1945, de George Sidney, é de cair o queixo. As cores fazendo jus a fama da época, remetendo a paleta usada anos depois nos filmes de Nicholas Ray e Michael Powell, outros dos argonautas das naus do passado.

    Em Marujos do Amor até a luz da lua parecia mais brilhante, como quando os três principais personagens se encontram, numa sala de visitas, e as cortinas laranjas são cortadas por um luar azulado, no clássico estilo homenageado com primor em 2011 em A Invenção de Hugo Cabret. Nos idos que o país defendia suas forças armadas, um garoto quer entrar para a marinha, custe o que custar. E cabe a dois marujos, vividos por Sinatra e Gene Kelly, levar o garoto a mãe. A partir dai, os dois mulherengos e a dona de casa se envolvem em torno de temas apresentados com uma naturalidade deliciosa, irreverente, mas com números musicais pouco inspirados e que, apesar da técnica, não chegam aos pés dos pés de Kelly e da diva Jean Hagen, em Cantando na Chuva (1952).

    Quer dançar? Quer dizer… eu gostaria se você quisesse, também.

    O filme acaba sendo um ensaio para um musical muito menor, mas melhor: Um Dia em Nova York, onde Kelly e Sinatra se juntam, de novo, para fazer quem não gosta do gênero, passar a gostar. Todavia, é no inofensivo e romântico Marujos do Mar, com um forte pano de fundo político para os mais atentos, aonde as cores têm mais tons, são mais quentes, mais vivas, e o visual exala um equilíbrio, uma leveza e um frescor despretensioso que os romances perderam ao longo do tempo. Ficou na memória, ou melhor: gravado em celuloide. Mas tudo se torna irresistível a medida que Gene Kelly, a lenda da dança, permeia um número ao lado de Jerry, o ratinho, e outros desenhos animados. Uma cena fantástica que resume a essência (e a magia) do filme inteiro.

    Fato é que a música, sendo a alma de um filme, torna-o um delírio, uma representação aumentada da realidade, e também nos faz amá-lo mais rápido, como bem canta Sinatra num solo de piano. Divertidíssimo, e simpático, o filme, marco de uma época, é a típica obra de estúdio que tenta agradar a todos, como quando os dois marinheiros, orgulhosos por serem quem são, tentam afastar um pretendente da mãe do garoto para preservar a mulher e competir apenas entre si por ela. Incrível como, antes, homens procurando por damas sob o luar não significava sexo, mas beijos, cantoria, jantares à luz de vela e romance – talvez até uma serenata, com sapateado completando a proposta divertida dos musicais; os musicais de era de ouro! Um charme incontestável.

  • Carta Aberta à Literatura Fantástica

    Carta Aberta à Literatura Fantástica

    ideias-no-vortice

    Existem muitos gêneros literários. A internet brasileira – sua podos e blogosfera pop, principalmente – tem confundido e defendido a confusão entre fantasia, ficção científica e literatura fantástica. Literatura fantástica, dizem, é a grande mãe dentro da qual estão fantasia, ficção científica e horror.

    Mas não, e explico o motivo: no Brasil, na nossa tradição acadêmica que estuda narrativas, é quase ponto pacífico que fantasia/ficção científica é uma coisa, fantástico é outra. Simples assim, porque temos uma tradição de estudar as estruturas narrativas a partir de referências que, muitos e muitos anos atrás, definiram assim as dinâmicas de narrar.

    Fantasia/ficção científica – assim mesmo, juntas, sendo quase a mesma coisa – não dizem respeito ao cenário em que se passa a história. Esses gêneros dizem respeito à estrutura que dá vida ao que é narrado. Literalmente, estruturas narrativas. A sequência da confusão diz que fantasia/fc são fantástico porque tratam de coisas que não podem/poderiam acontecer em nosso mundo (neste aqui, na vida do dia a dia). Mas isso é só mais uma confusão: essas estruturas narrativas apresentam cenários que, sim, não correspondem à nossa realidade, mas são construídas a partir de uma lógica interna, uma coerência ficcional que organiza e dispõe a realidade dentro do cenário. Assim, por exemplo, existe uma lógica perfeitamente compreensível na magia dos elfos em Senhor dos Anéis (mesmo que essa magia “não exista em nosso mundo”), e é perfeitamente lógico, dentro do universo ficcional de Star Trek, que Capitão Kirk e Spock sejam desmaterializados na Enterprise e reapareçam, inteiros, na superfície do planeta vermelho gasoso de belas mulheres verdes.

    O fantástico, por outro lado, não é assim. Fantástica é aquela estrutura narrativa que deixa em suspenso a comprovação lógica de algo. Se um elfo de Tolkien de repente fosse esmagado por um elmo gigante caído dos céus, sem qualquer explicação lógica, essa estrutura narrativa estaria usando um artifício gótico (do Castelo de Otranto, para ser mais exato), um dos pais desse tal fantástico. Outro dos pais desse fantástico gótico, por exemplo, é o bem conhecido Frankenstein, de Mary Shelley.

    Mas fantástico ainda tem outra estrutura, que é a que mais usamos quando pensamos sobre isso no Brasil: é a estrutura do Gato Preto, de Edgar Allan Poe (que o Zé do Caixão pronunciava “po-ê”). Se vocês bem se lembram [spoiler alert], o personagem é aterrorizado durante o conto pelos miados do gato que, pensa, o está acusando de ter matado sua esposa. Não fica claro se o gato de fato estava sobrenaturalmente acusando o personagem, se sua quase-materialização no porão foi algo sobrenatural, ou se tudo não passava da mente distorcida do personagem [/spoiler alert]. ISSO é fantástico. O balanço entre um ponto e outro da lógica narrativa, da estrutura que faz o leitor e o texto passarem da “certeza de que era o capiroto” para o “mas acho que, no fim, o cara era apenas doido”.

    E alguns parágrafos acima eu frisei a tradição que nós, no Brasil, costumamos adotar, e disse que ela é “quase” ponto pacífico. Quase porque é claro que outras referências e filiações literárias e críticas podem dar outras compreensões dessa divisão. Em Portugal, por exemplo, com a crítica influenciada pela tradição francesa do fantastique, as distinções entre fantasia/fc e fantástico são, de fato, menos claras. Em nosso caso brasileiro, por outro lado, com as tradições russa e anglo-saxônica, especialmente, temos a tal da distinção de estrutura narrativa, e não de cenário.

    Fora da academia, entre o público nerd (orgulhosamente, eu incluso) que consome cultura pop, não há maiores problemas em confundir nariz de porco com tomada. O que não podemos fazer (porque somos nerds, ora, e o que nos define é o interesse pelas coisas) é simplesmente ignorar uma tradição, um conhecimento acumulado, refletido, teorizado, apenas porque sim. Seria como dizer que e não é igual a mc². Ou que dia 25 de maio não é o dia da Toalha.

    Isso não quer dizer que você – e a podosfera brasileira – vai deixar de falar que Tolkien é literatura fantástica. Longe de mim exigir isso, policiar a fala alheia. Isso quer dizer, apenas, que agora você sabe. E saber é metade da batalha.

    Texto de autoria de Leandro Durazzo, escritor, tradutor, antropólogo, budista, da barriga da mãe para o mundo. Pode ser lido em Os Caras do Clube e Mísera Mesa.

  • Resenha | Dragões de Éter: Caçadores de Bruxas – Raphael Draccon

    Resenha | Dragões de Éter: Caçadores de Bruxas – Raphael Draccon

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    Ao lado de André Vianco e Eduardo Spohr, Raphael Draccon completa a tríade de autores brasileiros de ficção especulativa mais bem-sucedidos dos últimos tempos. Enquanto o primeiro ficou notório pela auto-publicação de Os Sete, vendendo-o diretamente às livrarias no ano de 2000, e o segundo utilizando as redes sociais e a força do podcast do Jovem Nerd, Raphael aqui utilizou-se do caminho convencional, sendo publicado inicialmente por uma grande editora como a Planeta e posteriormente pela gigante portuguesa Leya, a mesma casa do adorado George Martin aqui no Brasil com o seu Guerra dos Tronos.

    Curta sinopse: Nova Éter é um mundo protegido por avatares do semi-deus Criador em forma de fadas. Neste mundo ocorreu um dos mais importantes episódios do passado, conhecido como a “Caçada”, quando caçaram as bruxas liderados por Primo Branford – que acabou se tornando rei, o maior deles. Por 20 anos reina a paz, até que situações esquisitas começam a acontecer: a avó de uma menina é devorada por um lobo em uma floresta, e dois irmãos são atacados por uma bruxa enquanto estavam em uma casa que parecia ser de doces.

    Familiarizados com alguma coisa? Pois é. A utilização dos personagens e situações dos contos de fadas clássicos é ao mesm0 tempo o maior mérito e o maior problema do livro, não em relação ao enredo ou aos personagens, mas sim em propor uma releitura diferente de todas já feitas, criando assim os seus próprios cânones. Neste primeiro livro da trilogia, Raphael se utiliza de alguns personagens clássicos que, misturados à trama política criada, deixam a narrativa livre para fazer o que deseja. Quem é fã da visão infantil dos contos de fadas, por exemplo, deverá achar estranho Chapeuzinho Vermelho, João e Maria falando gírias dos adolescentes contemporâneos ou se envolvendo em outras situações esquisitas.

    Outra grande contribuição é o narrador do livro, que volta e meia conversa com o leitor, comentando várias partes da história. Por exemplo, na página 296: “Estava na hora de todas voltarem para casa, ainda mais porque em breve iria soar o toque de recolher, e isso era motivo suficiente para se dirigirem o mais rápido possível para seus lares. Certo, você e eu sabemos que o toque de recolher havia sido antecipado, mas elas não conseguiriam ouvi-lo de onde estavam“.

    Em outras partes ele até chega a cortar a trama de forma brusca, mas não menos interessante, como na página 113: “Viajaremos agora. Também iremos mexer no tempo e no espaço, pois, se narramos uma história em um local etéreo que só existe porque semideuses pensam nele, também o fazemos no passado, em eventos de sagas que já aconteceram até o momento. […] Confie em mim, vamos, venha. E um, e dois. E três.”

    No entanto, o narrador chega também a antecipar perigos de forma desnecessária, acabando com uma possível revelação surpreendente – por exemplo, na página 332: “Estava muito longe do Rei que imaginava se tornar, mas, sem saber, seu sofrimento estava purificando-o do Rei que deveria um dia ser. E que estivesse errado sobre aquela maldita sensação a lhe dizer que esse dia não parecia tardar a chegar.”

    Por outro lado, Raphael consegue comentar brilhantemente algumas das situações, como na página 309, após mãe e filha serem abordadas por dois soldados no meio da floresta: “E os soldados se olharam e pareceram concordar em silêncio. Ariane ainda não havia entendido o que estava para acontecer a ela e a mãe. Era pura e inocente demais para isso ainda.

    Outro fato a ser comentado é o ritmo da narrativa. Às vezes ganha-se um fôlego enorme em algumas partes, como no ato 3, tornando-a eletrizante até o final do livro e fazendo o leitor querer ler o resto da trilogia logo; mas em outras engessa, podendo fazer perder boa parte do interesse do público, como no final do ato 1 e inicio do ato 2.

    Por último, o clima juvenil na maior parte do livro pode incomodar certos leitores mais velhos, mas deve agradar aos mais jovens. Alguns dos diálogos chegam a ser bobos em certas partes, além da descrição das cenas. No entanto, a seriedade em ambos os casos também acontece, mais para o fim do livro, chegando perto do ato 3.

    Ponto para a Editora Leya por simplesmente dar uma chance ao autor nacional de fantasia, tornando o box Dragões de Éter um dos mais desejados no Submarino, e que já vendeu mais de 100 mil cópias.

    Vale a leitura? Sim, se você quiser conhecer os autores nacionais de fantasia mais vendidos. Ainda mais agora que Draccon se tornou editor da Fantasy – Casa da Palavra, selo da Editora Leya específico para literatura especulativa.

    Texto de autoria de Pablo Grilo.

  • Resenha | Lugar Nenhum – Neil Gaiman (1)

    Resenha | Lugar Nenhum – Neil Gaiman (1)

    Lugar-Nenhum

    No começo da carreira que o tornaria famoso – quando a obra Sandman ainda estava sendo publicada, mas ele ainda não era conhecido por suas outras obras fora dos quadrinhos -, o promissor Neil Gaiman seria contratado pela produtora britânica de TV BBC para ser roteirizar uma serie chamada Lugar nenhum, que estreou em 1996. Mas não é sobre essa obra que falaremos hoje.

    A série contou com restrições de orçamento e alguns enganos na produção, que podem ser notados principalmente pela qualidade da direção de fotografia, que não tem uma iluminação boa. A qualidade da filmagem também não é boa e os efeitos são feitos com carinho, mas sem dinheiro. Por causa disso, Neil Gaiman não gostou do resultado da série e sempre achou que poderia fazer algo melhor. E ele de fato fez, recriando a mesma obra em outras mídias, como HQs, e lançando também um livro, em 1996 (que chegou ao Brasil em 2005).

    O fato de querer criar uma história digna do que ele imaginou e bem melhor do que o modo como a série foi feita fez com que Neil Gaiman escrevesse o seu primeiro livro, incrivelmente adaptado do roteiro que ele tinha desenvolvido na série, que pouco tempo depois foi publicado com o nome também de Lugar nenhum.

    O livro demostra o estilo literário de Neil Gaiman, muito parecido com o que ele usa em Deuses americanos e em outras obras. Podemos ver a falta de informação sobre alguns elementos da história, como em muitos contos de fantasia clássicos. Pelo fato de não ser explicado o porquê e o como, em muitos momentos a história abre para o próprio leitor imaginar o passado de lugares e personagens, o que acaba tornando bem mais fácil de criar cenários interessantes para o livro. Esse recurso é muito bem utilizado no livro porque normalmente essa é a realidade de quem vive em uma cidade (porque, por exemplo, não sabemos quem é a pessoa que tem um nome em uma placa ou local da cidade), mas ele extrapola esse desconhecimento para conceitos de historias fantásticas. Por exemplo, existe um distrito em Londres chamado Angel Islington (Anjo Islington), então Neil Gaiman extrapola o nome do lugar e diz que realmente existe um anjo chamado Islington, e depois revela pela metade detalhes sobre o passado dele em pequenas conversas entre os personagens. Isso é bem usado para passar o clima de uma sociedade dentro de outra sociedade.

    O livro também conta com um o clima bem punk inglês, porque Neil Gaiman descreve tudo de forma bem suja, com um visual sempre em farrapos e um clima bem “do it yourself“. A obra adquire uma identidade única (uma fantasia punk), além do leitor sempre ficar imaginando o visual da protagonista de forma especial, já que ela é uma gracinha.

    Outra coisa a se destacar é o trabalho de usar o próprio ambiente de Londres, que tem milhares de referências locais muito legais – até porque Neil Gaiman é inglês. Além de já estar acostumado com o ambiente por ser natural da Inglaterra, ele faz um ótimo trabalho criando ainda mais conteúdo com esses ambientes, fazendo brincadeiras e trocadilhos com nomes de lugares e personagens da cidade, e dando um background que eu não sei se são contos malucos e lendas urbanas londrinas, ou se ele tirou tudo da cabeça dele mesmo. Isso tudo para transformar todos os lugares (isso mesmo, os lugares) em personagens interessantes, imagine os personagens normais…

    São legais as mensagens que o livro passa também: a existência de uma sociedade dentro de um sociedade, de pessoas esquecidas, porque simplesmente é mais conveniente esquecer essas pessoas. Mas, apesar de tudo, por eles serem esquecidos, eles acabam sendo mais livres do que as pessoas que vivem na Londres de cima, onde todos são presos aos seus itens de consumismo, ou a vidas que eles não conseguem largar ou se adaptar, como era o personagem principal. A história chama o leitor a refletir mais sobre o mundo à sua volta, mais localmente, e sobre suas histórias de certa forma esquecidas ou que fazemos questão de não saber.

    Quanto aos personagens, temos que o principal é o que representa o personagem que guia o leitor da melhor forma possível nesse universo. O personagem principal carece de uma personalidade mais forte, mas ele foi feito para representar o londrino médio, o leitor do livro, então não podia ser alguém muito diferente do normal. Ele tem algumas características que o tornam diferente das pessoas comuns, mas só dando a ideia de que algo o diferencia e que por isso ele vai entrar na história. Os personagens restantes são personificações de lugares ou de ideias, e eles são tão marcantes quanto pensamos que eles sejam, já que Neil Gaiman deixa muito da personalidade deles para que o leitor imagine.

    Esse livro tem uma história muito bem desenvolvida, e tudo se acerta de uma forma bem mais natural do que em outras obras de Neil Gaiman, como Deuses americanos. Como este é o primeiro livro de Neil Gaiman, em resumo, Lugar Nenhum é mais obrigatório do que outras obras do autor – em minha opinião, claro.

    Compre aqui.

    Texto de autoria de Psycho Mantys.

  • Resenha | A Companhia Negra – Glen Cook

    Resenha | A Companhia Negra – Glen Cook

    a companhia negra

    Tolkien encontra Bernard Cornwell – estampa a quarta capa do livro.

    Estratégias publicitárias desse tipo são um tanto duvidosas, pois os fãs costumam ficar irritados com um novato comparando-se aos seus monstros sagrados. Neste caso, porém, vale a pena ignorar qualquer preconceito inicial, pois A Companhia Negra rapidamente define uma identidade própria no gênero da fantasia medieval, inclusive passando longe dos autores citados.

    No primeiro de uma série de dez livros, iniciada nos anos 1980 e que finalmente chega ao Brasil através da editora Record, o autor Glen Cook nos joga em seu universo sem qualquer aviso ou preparação. A Companhia Negra é um grupo de mercenários, cujos tempos de glória há muito passaram. Reduzidos a um pequeno contingente, eles se veem envolvidos num grandioso conflito entre a Dama, a mais poderosa feiticeira que já existiu, e um numeroso exército rebelde. Recrutados por um dos dez Tomados, principais servos da Dama (outrora ferrenhos adversários dela, corrompidos por uma espécie de lavagem cerebral mágica), os membros da Companhia logo se destacam por sua destreza, ao mesmo tempo em que passam a questionar se estão do lado certo dessa luta.

    O estilo do autor já de início surpreende os leitores experientes no gênero. Como citado anteriormente, Cook começa a contar sua história como se o cenário e os personagens já tivessem sido apresentados. Sua preocupação em situar o leitor na geografia, história e política daquele universo é mínima, pra não dizer nula.

    Sabemos o que precisamos saber, e QUANDO precisamos saber. Pra alguém habituado a Tolkien, ou mesmo George R. R. Martin, é um choque e tanto. Mas, passada a estranheza inicial, é fácil e prazeroso embarcar na história, também porque a escrita em si é a mais direta e objetiva possível. O livro é narrado em primeira pessoa pelo médico Chagas, o responsável por registrar os anais da Companhia. Um detalhe divertido é que ele mesmo censura-se quando começa a ter alguma divagação mais filosófica, dizendo algo como “Ei, diabos, eu sou um mercenário, não um poeta”. Dessa forma, a linguagem dos personagens nada tem do lirismo tipicamente medieval, soando incrivelmente contemporânea. Também no quesito desenvolvimento dos personagens não há nada muito aprofundado. Eles são definidos por suas características mais marcantes, virando estereótipos. Isso e a forma como se relacionam entre si torna a Companhia Negra comparável, muito mais do que a qualquer obra literária, a filmes de ação com militares, em especial os oitentistas. O que faz muito sentido, sabendo que Glen Cook foi fuzileiro da Marinha norte-americana.

    O resultado de toda essa simplicidade (que passa longe de mediocridade, porém) é uma obra que se pode chamar de única no gênero. Com pouco mais de 300 páginas, A Companhia Negra é uma leitura rápida e agradável, uma grata surpresa e uma novidade muito bem-vinda no campo da fantasia medieval. Recomendável até para os não-apreciadores desse estilo, que não suportam longas descrições e enrolações. Fica a expectativa pelo lançamento dos demais livros da saga o mais breve possível.

    Texto de autoria de Jackson Good.

  • Resenha | A Cor da Magia – Terry Pratchett

    Resenha | A Cor da Magia – Terry Pratchett

    A Cor da Magia - Pratchett

    São poucos os autores que conseguem soltar as amarras e fugir do óbvio, principalmente quando se trata de literatura fantástica, onde frequentemente nos deparamos com uma história repetitiva, com a formúla básica desse genêro, grupos de aventureiros partem com o objetivo de um bem maior, tudo isso somado à criação de um novo mundo, uma nova língua para alguns habitantes desse mundo (tentativa frustrada muitas vezes) e os personagens de sempre com suas personalidades batidas.

    Não precisa ser grande conhecedor de leitura para notar as semelhanças das histórias de hoje com o que foi criado pelo Professor Tolkien. A velha forma de contar uma história vem sendo repetida inúmeras e inúmeras vezes, achar algo original no meio de tantos autores que têm medo de arriscar não é fácil, mas tem quem se arrisque, e Terry Pratchet é um desses.

    A série Discworld já tem mais de 30 títulos lançados, e foi escrita pelo britânico Terry Pratchett. Infelizmente, apenas alguns desses títulos chegaram por aqui, e boa parte deles já estão esgotados e sem previsão de relançamento pela Editora Conrad, responsável pela série no Brasil. A Cor da Magia, primeiro volume da série, foi publicada em 1983 e traduzido e publicado no Brasil apenas em 2001.

    A originalidade e o bom humor do autor é um colírio para os olhos, logo nas primeiras páginas ele descreve o mundo dos personagens da série mais ou menos assim: “Tente imaginar o mundo plano, no formato de um disco, esse disco é sustentado por quatro elefantes gigantes(!), e esses quatro elefantes são sustentados por uma tartaruga gigantesca(!!!) que fica vagando pelo universo”. Achou muita maluquice? Você não viu nada.

    A Cor da Magia foca na ambientalização do leitor ao mundo apresentado pelo escritor, além de contar a história do mago Rincewind, que sabe apenas um feitiço, mas que nunca o utilizou, pois não se lembra, ou quando lembra tem medo das consequências que ele pode causar e DuasFlor, um viajante maluco e ingênuo que só arruma confusão e é acompanhado por sua bagagem que tem vida própria, com direito a dezenas de perninhas para correr e dentes para proteger quem tentar ameaçar seu dono.

    O livro tem personagens fantásticos, como o Morte (sim, aqui ele é um homem), que para mim é o melhor de todos. Morte sempre aparece nos piores momentos, tentando levar a alma de um personagem e, sempre com tiradas de humor negro e sarcasmo. Temos também a espada mágica que não pára de falar nunca e tem poder sobre aquele que a empunha ou ainda um grupo de cientistas que estão desenvolvendo uma pesquisa para descobrir qual o sexo da tartaruga gigante e se ela pode ter relações sexuais com outra tartaruga gigante(?!).

    Pratchett abusa das referências mitológicas e lendárias para criar sua história, mas usa tudo isso com extrema originalidade, dando toques de humor e até mesmo críticas a sociedade moderna, não deixando passar nada. Seu roteiro não é pré-delineado, e com isso ele vai brincando com os personagens sem se sentir obrigado a seguir o caminho habitual de boa parte das histórias que vemos por aí.

    A Cor da Magia é extremamente recomendado, uma pena ter esgotado e a Conrad não ter planos de republicá-lo tão cedo, aproveito a oportunidade para fazer um apelo a Conrad que republique os volumes que estão esgotados ou que outra editora compre os direitos da série, porque eu quero garantir os meus.

  • Agenda Cultural 12 | Steampunk, True Vampires e Fantástico Blues

    Agenda Cultural 12 | Steampunk, True Vampires e Fantástico Blues

    Agenda Cultural com a participação do escritor/tradutor Eric Novello (@cericn), Amilton Brandão (@amiltonsena), Flávio Vieira (@flaviopvieira) e Mario Abbade (@fanaticc) complementam os participantes desta edição.  Confiram o bate papo sobre captura de movimento nos games, vampiros (de verdade!) na TV, o septuagésimo ano do maior detetive de todos os tempos… e muito mais.

    Duração: 54 min.
    Edição: Flávio Vieira
    Trilha Sonora: Flávio Vieira

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    Comentados na edição

    Quadrinhos

    Batman 70 Anos

    Literatura

    Evento – Fantasticon
    Vapor Punk – Eric Novello
    Neon Azul – Eric Novello
    Histórias da Noite Carioca – Eric Novello
    Dante, O Guardião da Morte – Eric Novello
    Necrópole: Histórias de Bruxaria – Eric Novello e outros autores (contos)
    Paradigmas Vol. I – Eric Novello e outros autores (contos)
    Imaginários Vol. II – Eric Novello e outros autores (contos)

    Para maiores detalhes sobre o trabalho realizado pelo Eric, acesse http://ericnovello.com.br/.

    Games

    PS Move
    Xbox Kinect
    Nintendo 3DS

    Música

    The Black Keys
    Cyndi Lauper – Memphis Blues
    Mario Abbade no show da Cindy Lauper

    Série

    Review True Blood

    Cinema

    O Pequeno Nicolau
    15 Anos e Meio
    Vittorio de Sica – Minha Vida, Meus Amores
    Entrevista com o cineasta Laurent Tirard

    Extra

    Copa do Mundo

    Produto da Semana

    Cinto Massageador Physical Fat Reducing