Tag: agatha christie

  • VortCast 107 | Expectativas 2022

    VortCast 107 | Expectativas 2022

    Bem-vindos a bordo. Filipe Pereira (@filipepereiral | @filipepereirareal), Bernardo Mazzei (@be_mazzei) e Jackson Good (@jacksgood) se reúnem para comentar sobre os principais lançamentos nos cinemas e TV para o ano de 2022 e as principais expectativas.

    Duração: 89 min.
    Edição:
     Flávio Vieira
    Trilha Sonora: Flávio Vieira
    Arte do Banner:
     Bruno Gaspar

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  • Resenha | E Não Sobrou Nenhum – Agatha Christie

    Resenha | E Não Sobrou Nenhum – Agatha Christie

    Com o título alterado para E Não Sobrou Nenhum (do original O Caso dos Dez Negrinhos), Agatha Christie tem em seu livro mais famoso publicado em 1939 o maior diferencial que tanto a marcou durante sua carreira: um grande mistério dedutivo em uma trama policial recheada de suspense.

    Oito pessoas são convidadas para passar o final de semana em uma ilha na Inglaterra ao lado dos dois criados, e, após serem acusados por crimes distintos, todos são assassinados seguindo os versos de um poema.

    A construção perfeita de suspense de Christie para sua trama policial de mistério se baseia através das sólidas estruturas: uma trama simples e funcional, personagens com fortes motivações e medo da repercussão dos seus atos, o ótimo cenário onde tudo se desenrola, e o seu grande diferencial: o poema que prevê a morte de cada um dos dez
    personagens principais do livro e os soldados de enfeite que vão sumindo a cada morte.

    Christie consegue proporcionar uma leitura rápida que envolve o leitor logo no início com uma breve descrição dos personagens e suas motivações e termina de prender o público ao mostrar o grande mistério que permeia a trama: quem arquitetou a vingança contra os dez personagens acusados de cometer crimes diversos. A partir daí, torna-se cada vez mais prazeroso ver o escalonamento do suspense trazido pelas mortes e a tensão de que um dos restantes seria o assassino.

    O romance ganha ainda mais força quando se completa a história pois revela outras camadas quando se reflete sobre a obra ou a cada releitura. A dedução de E Não Sobrou Nenhum não é o principal alicerce da história, o mistério causado pelo simbolismo do poema e das estátuas enriquece a história trazendo outras discussões para além do usual de um romance policial: a que ponto alguém vai para arquitetar uma vingança e quais significados essa vingança teria.

    E Não Sobrou Nenhum, publicado pela Globo Livros, deve agradar a todos os que gostam de um bom romance que discute outras questões que vão além de uma história policial. A edição do livro só favorece a própria história deixando o texto fluido, direto, sem a necessidade de encher informação inútil com o objetivo de tornar o livro maior do que ele é.

     

    Compre: E Não Sobrou Nenhum – Agatha Christie.

    Texto de autoria de Pablo Grilo.

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  • Crítica | Assassinato no Expresso do Oriente

    Crítica | Assassinato no Expresso do Oriente

    Agatha Christie é a romancista mais bem sucedida da história em literatura popular no que diz respeito ao número total de livros vendidos, que juntos venderam por volta de 4 bilhões de cópias no decorrer dos últimos dois séculos, ficando somente atrás de William Shakespeare e da Bíblia Sagrada. Sua especialidade era escrever sobre romances policiais, o que lhe rendeu o apelido de “Dama do Crime”, sendo que seus livros renderam mais de quarenta adaptações para o cinema.

    Assassinato no Expresso do Oriente é um de seus livros mais famosos e, inclusive, já rendeu uma adaptação para a tela grande sob a batuta do mestre Sidney Lumet, em 1974. O filme teve ao todo seis indicações ao Oscar, com Ingrid Bergman levando a estatueta de melhor atriz coadjuvante. Em 2017, coube ao veterano Kenneth Branagh o desafio de dirigir e estrelar uma nova adaptação do livro que promete superar o número de indicações à Academia e quem sabe até mesmo dobrar o número de vitórias em relação à adaptação anterior.

    Tão logo o filme começa, somos apresentados ao simpático belga Hercules Poirot (Branagh), ou melhor, Hercule Poirot, no singular. Dotado de manias pela busca de equilíbrio e simetria (o que já rende boas risadas ao espectador), Poirot é simplesmente o maior detetive do mundo, como ele mesmo se denomina e com cinco minutos de fita, já descobrimos o motivo de tamanho orgulho para com si próprio e para com a sociedade, ao resolver um entrave ao pé do Muro das Lamentações, em Jerusalém. O detetive só quer voltar para sua casa, mas no meio do caminho, recebe notícias a respeito de um caso antigo e importante que o faz adiar seu retorno. É assim que Poirot embarca no Expresso do Oriente, um luxuoso trem de propriedade de seu amigo Bouc (Tom Bateman).

    Dentro dos vagões somos apresentados ao grande elenco principal que compõe a história e que está recheado de bons atores. Johnny Depp é Edward Ratchett, um vendedor de artefatos falsos que angariou diversos inimigos ao longo dos anos. Trabalham para Ratchett seu secretário Hector McQueen (Josh Gad) e seu mordomo Edward Henry Masterman (Derek Jacobi). A jovem Daisy Ridley interpreta a governanta Mary Debenham, acompanhada de seu parceiro, o médico, Dr. Arbuthnot (Leslie Odom Jr.). Judi Dench interpreta a grosseira princesa Dragomiroff e Olivia Colman, sua empregada, Hildegarde Schmidt. Também temos Willem Dafoe interpretando Gerhard Hardman, Michelle Pfeiffer na pele da fogosa Caroline Hubbard, além de Penelope Cruz, que faz a religiosa Pilar Estravados. O elenco ainda é composto por Manuel Garcia Rulfo, Lucy Bointon e Sergei Polunin.

    A paz dos personagens dentro do trem muda quando uma avalanche faz a locomotiva descarrilhar, obrigando toda a tripulação aguardar o resgate. As coisas ficam realmente complicadas quando um dos passageiros acaba por ser brutalmente assassinado em sua cabine durante a noite. Assim, Poirot decide investigar o crime a pedido de Bouc, e o escala para auxiliá-lo na investigação, uma vez que foi o único que dormiu fora do vagão em que ocorreu o crime, estando livre, portanto, de qualquer acusação, sendo todos os outros suspeitos em potencial.

    O filme respeita exatamente aquilo que o gênero precisa e tudo que está em cena é para criar, de forma proposital, confusão na cabeça do espectador. Então, com o desenrolar da trama, mas antes do assassinato, aquele que assiste faz as suas apostas sobre quem será morto, sobre quem será o assassino, etc. Inclusive, temos desde o suspeito óbvio, até algumas pistas que estão na cara do espectador, mas que nem o olhar mais atento poderá sacar a jogada, além de reviravoltas interessantíssimas que culminam com o desenrolar do caso e que mexem com Poirot de forma profunda.

    Os méritos – além de Agatha Christie ser totalmente responsável por ter criado todo esse universo, também são do roteirista Michael Green, que recentemente trabalhou em histórias e roteiros de filmes como Logan, Alien: Covenant e Blade Runner 2049, além de ter escrito e criado a série American Gods. O trabalho de direção de Kenneth Branagh desenvolveu um estilo de filmagem bastante interessante, sabendo se valer dos espaços restritos que tem a sua disposição em um trem, gerando cenas interessantíssimas de dentro das pequenas cabines e apertados corredores. Há de se destacar ainda, o belo plano-sequência que funciona em prol do roteiro, apresentando cada um dos personagens, como também a tomada aérea onde a câmera do diretor enquadra seus personagens em um corredor quase como remetendo a um tabuleiro de xadrez, com a disposição de suas peças. Seu trabalho como diretor sempre se dá em função da narrativa, como por exemplo nas cenas de interrogatório, onde os seus enquadramentos se dão através de vários espelhos, denotando como cada um desses personagens podem ser multifacetados.

    Mas o destaque mesmo vem de sua brilhante atuação, que não seria de se estranhar se lhe rendesse sua quinta indicação ao Oscar. Aliás, existem grandes chances do personagem entrar para o “hall da fama” de queridos personagens da cultura pop. Branagh, ator provindo do teatro shakesperiano, sabe como ninguém construir a figura de Poirot em todo o seu desenvolvimento dramático, dosando quando necessário sua excitação em atuações mais contidas e extrapolando suas emoções em outros momentos. O cineasta sabe como ninguém colocar o peso das escolhas, ações e palavras de seu personagem.

    Vale destacar que o filme termina com um gancho para adaptar outro clássico de Christie que também tem o detetive Poirot como protagonista, Morte No Nilo, de 1937. Assassinato no Expresso do Oriente agradou tanto os executivos que o sinal verde para a nova adaptação foi dado e deve trazer novamente Branagh tanto na pele do maior detetive do mundo, quanto na cadeira de direção.

    Texto de autoria de David Matheus Nunes.

  • Resenha | Os Cinco Porquinhos – Agatha Christie

    Resenha | Os Cinco Porquinhos – Agatha Christie

    Poirot contra a névoa assassina do passado

    Publicado em 1942, Os Cinco Porquinhos, da dama do crime Agatha Christie, é mais um caso rocambolesco que cai no colo do excêntrico detetive Hercule Poirot. Dessa vez, Poirot é contratado para inocentar a condenada de um assassinado que ocorreu dezesseis anos antes. A reconstrução do passado é o obstáculo para o detetive. Isso o inflama a tal ponto de aceitar o caso.

    O livro começa com a jovem Carla Lemarchant procurando Poirot. Ela conta que seu pai, Amyas Crale, um famoso pintor, foi envenenado e, à época, a mãe dela, Caroline, fora julgada e condenada com prisão perpétua pelo crime. Contudo, pressentindo a morte, a mãe deixa uma carta à filha (com apenas 5 anos na época), onde alega inocência. Poirot se recorda superficialmente do crime, mas é fisgado pelo desafio.

    O principal desafio do detetive é remontar os acontecimentos que culminaram no crime. Para isso, ele delimita os suspeitos as cinco pessoas que estavam no momento da morte do pintor, a saber: a amante dele (a amante morava com o casal), a governanta, a esposa do pintor, e um casal vizinhos que frequentava a casa. A amante fazia-se de modelo, e vice-versa, na casa de Amyas. Ele pintava um grandioso quadro e, às escuras, fazia juras de largar a esposa e fugir com a modelo/amante. A esposa passou a perceber a situação, e, segundo o julgamento do caso, foi isso que motivou a esposa a cometer o assassinato envenenando a cerveja dele entre uma pincelada e outra no jardim.

    Poirot está com sorte: todos os suspeitos e ainda alguns magistrados que participaram do julgamento ainda estão vivos. Com esse benefício, o desenvolvimento da história flui com entrevistas do detetive com os suspeitos daquela época. A surpresa é que cada suspeito e advogado têm opiniões diferentes sobre a esposa do pintor, dificultando que Poirot determine a personalidade da condenada. Para driblar isso, Poirot se concentra no exame minucioso de fatos paralelos, chegando até a pedir que cada entrevistado escreva os acontecimentos que culminaram na morte do pintor. O detetive recebe essas descrições e a partir do exame de peculiaridades ao longo daquele dia, consegue dar um parecer diferente do proferido dezesseis anos antes.

    O estilo de Christie, ou pelo menos o que ela imprime enquanto é a títere por trás de Poirot, é essencialmente minucioso e dialogista. Ela trabalha com diferentes personagens e consegue imprimir personalidades distintas em cada um deles. Um trabalho notável que desenlaça alguns perfis que faziam parte da sociedade do início do século XX. Em Os Cinco Porquinhos temos o artista obstinado e cheio de vícios, a esposa fiel e resiliente, a jovem paixão que confunde-se com poder financeiro, novos burgueses, ciúmes entre casais, a governanta severa que preza pela solidez das instituições básicas, etc.

    O que talvez torne enfadonha a leitura é a vagarosidade pela qual os detalhes importantes são apresentados. Diferentemente de outros trabalhos, nesse, Poirot não é tão veloz quanto antes, ele dá tempo ao entrevistado/suspeito e os interrogatórios por vezes se desenrolam em minúcias aparentemente sem importância, mas que para a mente tétrica do investigador, carregam a solução do caso. Por fim, é um belo livro, os desenlaces finais são fiéis a lógica interna da narrativa e conferem um ótimo desfecho – uma característica de todos os livros de Agatha Christie.

    Texto de autoria de José Fontenele.

    Compre: Os Cinco Porquinhos.

  • Resenha | O Assassinato de Roger Ackroyd – Agatha Christie

    Resenha | O Assassinato de Roger Ackroyd – Agatha Christie

    Poirot aposentado, mas não menos eficaz

    O Assassinato de Roger Ackroyd é o quarto livro de Agatha Christie (escrito em 1926), e o primeiro grande sucesso da autora. Romance policial dos mais assertivos do gênero, a trama funciona mecanicamente impulsionada por pequenas engrenagens narrativas que movimentam as maiores até que o criminoso seja revelado. Na ponta do trabalho, Hercule Poirot, aposentado, mas ainda uma lenda da investigação. Apenas ele para descobrir o assassinato do riquíssimo Roger Ackroyd.

    O famoso detetive utiliza uma mescla entre método dedutivo e analítico para resolver seus casos. Primeiro ele estipula o momento de morte da vítima e cria um intervalo de tempo seguro onde aconteceu o crime. Em seguida  anota todas as pessoas que estiveram ou poderiam ter acesso ao morto e os interroga. Em paralelo, ainda na cena do crime, busca os “pequenos casos”, ou seja, os desarranjos que cercam o crime e que aparentemente não tem ligação com a morte, mas que explicam, aos poucos, como o assassino agiu. De posse dessas informações, o detetive vai testar suas deduções e procurar as mentiras que as testemunhas contam, pois, segundo ele, todos mentem.

    Expliquei o método de Poirot para ilustrar os pontos que movem a narrativa da dama do crime: investigação sobre os personagens ilustres, “pequenos casos” e mentiras. Livro essencialmente trabalhado com diálogos, as descrições são em maiorias curtas e mesmo a natureza fica em segundo plano na comunidade onde se passa o crime. É interessante notar que a autora trabalha com o romantismo tanto nos diálogos quanto nas virtudes ou pecados dos personagens.

    A trama é alimentada por pontos de virada bem colocados. Agatha Christie sabe exatamente quando os personagens têm que descobrir mais alguma coisa para a narrativa não se tornar tediosa. Nós, leitores, somos alimentados parcimoniosamente com informações que revelam os intentos passivos que se escondem por trás do assassinato. As pequenas soluções alimentam as grandes e assim somos fisgados até o fim. Mas…

    O fim não é exatamente o desfecho prodigioso em um gênero policial. Leitores de romances policiais gostam de acompanhar o movimento do investigador e paralelamente identificar as pistas que levam até a resolução do conflito. Contudo, a solução empregada por Agatha Christie é o que se chama “Deus ex machina”. Esse termo serve para expressar, em linguagem de teatro, roteiro e literatura, o surgimento de uma personagem, artefato ou um evento inesperado, artificial ou improvável, de forma repentina para a resolução do conflito final.

    Ao final da leitura fica uma sensação de desapontamento. Mas enfim, talvez não houvesse outra solução tão impactante quanto aquela. Decida-se ao ler. Livro bem recomendado.

    Texto de autoria de José Fontenele.

    Compre: O Assassinato de Roger Ackroyd – Agatha Christie.

  • 10 Sequências de Best-Sellers

    10 Sequências de Best-Sellers

    É possível ressuscitar o detetive Hercule Poirot com toda a sua astúcia? O que dizer de reviver Drácula sem a pena sinistra de Bram Stoker? Criar um personagem de sucesso nos livros é um feito para poucos. Há alguns tão atraentes que nos sentimos miseráveis quando o último livro de uma série acaba, no caso de o autor original já não estar mais entre nós. Mas você sabia que há vários casos de livros famosos que ganharam sequências criadas por autores alternativos?

    Por mais estranho que pareça, a história está recheada de continuações para livros inesquecíveis, seja porque a obra caiu em domínio público ou os herdeiros dos direitos autorizaram uma retomada. Em alguns casos, as continuações são bem aceitas pela crítica e continuam a conquistar gerações de leitores. Em outros, são jogadas na sarjeta do esquecimento.

    A seguir, selecionamos 10 sequências que nasceram de um sucesso, mas escritas pelas mãos de segundos autores. Confira aí e diga qual você achou mais estranha.

    A Casa de seda - Anthony Horowitz

    1- A Casa de Seda – Anthony Horowitz

    O britânico Anthony Horowitz é um apaixonado confesso por Sherlock Holmes. Tem várias inserções na literatura policial e juvenil, além de onze episódios da série de TV Agatha Christie’s Poirot e também um romance para a franquia James Bond. Em A Casa da Seda (Zahar, 2012), Horowitz faz as vezes de Arthur Conan Doyle numa trama que se passa em Londres, em novembro de 1890. O livro foi o primeiro a ser oficialmente reconhecido pelo Conan Doyle Estate, que administra o legado do autor. Horowitz disse que levou longos três segundos para aceitar o convite da organização! Assim, “A casa da seda” foi lançado em homenagem aos 81 anos da morte de Conan Doyle.

    Morte em Pemberley - P. D. James

    2 – Morte em Pemberley – P. D. James

    Imagine uma das principais escritoras policiais sequenciando uma das maiores autoras clássicas inglesas. Pensou em P. D. James e Jane Austen? Acertou. A baronesa do crime retoma a atmosfera de Orgulho e Preconceito, avança um pouco no tempo, e nos oferece um enredo daqueles! Elizabeth Bennet e Fitzwilliam Darcy se casaram, tiveram dois filhos e têm tudo para viverem felizes para sempre em sua propriedade rural. Até que assassinam o cunhado de Elizabeth… Morte em Pemberley (Cia das Letras, 2013) traz a aristocracia, seu glamour e suas intrigas. Nossos amáveis personagens não estão apenas envolvidos em gravatas e echarpes, mas cobertos também por um manto de mistério.

    Scarlett - Alexandra Ripley

    3 – Scarlett – Rhett Butler

    “Francamente querida, eu não dou a mínima”. Será que Rhett Butler repetiria a clássica frase de E o Vento Levou… para Alexandra Ripley? Afinal, a romancista norte-americana escreveu a primeira sequência oficial do relato épico da Guerra de Secessão, originalmente criada em 1936 por Margaret Mitchell. O livro é a continuação da saga, mostrando como a vida seguiu para a temperamental Scarlett O’hara, Rhett Butler e Ashley Wilkes. Apesar de ter agradado o público – o livro vendeu 6 milhões de cópias -, a história foi rejeitada pela crítica. Scarlett saiu em 1991 pela Editora Record.

    images.livrariasaraiva.com.br

    4 – A Garota na Teia de Aranha – David Lagercrantz

    Fenômeno editorial da última década, a série Millennium vendeu cerca de 100 milhões de exemplares no mundo desde o primeiro volume, Os Homens que Não Amavam as Mulheres. O sueco Stieg Larsson, jornalista e ativista pelos direitos humanos, utilizava o tempo livre para criar as histórias com a alucinante Lisbeth Salander, expondo violências sofridas pelas mulheres e uma heroína disposta a lutar por elas. Larsson morreu antes da publicação do primeiro livro e sem imaginar o tamanho do sucesso que conquistaria. Em 2015, seus herdeiros autorizaram uma continuação para a até então trilogia, liberando o volume 4 com A Garota Na Teia de Aranha (Cia das Letras, 2015). A sequência foi escrita pelo também jornalista sueco David Lagercrantz, e causou polêmica principalmente por não ter tido o aval da viúva Eva Gabrielsson. Um dos lançamentos mais populares do ano – foram vendidos duzentos mil exemplares só na primeira semana nos Estados Unidos -, o livro deve ser adaptado para o cinema pela Sony Pictures.

    Dracula - Morto Vivo - Drace Stoker

    5 – Drácula – O morto-vivo – Drace Stoker e Ian Holt

    Veja o sobrenome! Sim, Dacre Stoker é sobrinho-bisneto de Bram Stoker, o irlandês que publicou Drácula em 1897. Para dar sequência ao clássico gótico, Dacre pesquisou documentos e anotações não aproveitadas pelo bisavó, encontradas no Museu Rosenbach (Filadélfia). Também usou o título que Bram originalmente pensou para o clássico. Ambientada em 1912, a trama tem até uma aparição do “pai” do vampiro. Publicado em 2010 pela Ediouro, o livro vem com ilustrações de Ian Holt.

    James Bond Books

    6 – James Bond, a série

    O espião James Bond é uma criação do escritor e jornalista britânico Ian Fleming. O agente secreto mais famoso do mundo ganhou vida em 1953, com Cassino Royale, e todo ano Fleming escrevia uma nova história do personagem. Foi assim até 1966, quando o autor morreu de ataque cardíaco. Desde então, vários autores escreveram sequências para a franquia, como Kingsley Amis, John Edmund Gardner, Raymond Benson, Sebastian Falks, Jeffery Deaver e William Boyd. O cinema foi o terreno onde Bond mais brilhou e, após todas as tramas originais serem adaptadas, a série passou a produzir filmes com roteiristas que procuraram manter o estilo de Fleming. Parece que deu certo.

    Os Crimes da Monogamia - Sophie Hannah

    7 – Os Crimes do Monograma – Sophie Hannah

    Recolocar o detetive Hercule Poirot em cena e agradar aos milhões de fãs de Agatha Christie são tarefas que deveriam compor os doze trabalhos de Hércules! A inglesa Sophie Hannah aceitou o desafio em Os Crimes do Monograma, lançado em 2014 pela Nova Fronteira. Ao contrário do que se possa imaginar, o detetive não reaparece em tempos modernos mas sim em 1929, investigando crimes misteriosos no coração de Londres. Ao seu lado está o policial Edward Catchpool, o equivalente ao Capitão Hastings, o parceiro original. A sequência foi autorizada pelos herdeiros de Agatha mas dividiu opiniões entre os fãs, que não viam uma nova história com o detetive desde a morte da escritora, em 1976.

    A Volta do Poderoso Chefão -  Mark Winegardner

    8 – A Volta do Poderoso Chefão –  Mark Winegardner

    Quem não conhece os Corleone, essa família simpática, repleta de gente que não aceita quando as coisas contrariam seus interesses? Mario Puzo fez história ao trazer à tona mafiosos que não apenas matam e se livram dos corpos de seus desafetos. Eles se casam, têm filhos, são religiosos! É difícil não se apaixonar por personagens tão sanguíneos e sanguinários, que nos foram apresentados  nos anos setenta e chegaram às telonas nas décadas seguintes. Muitos fãs esperavam que Puzo retomasse a história, mas ele não mostrou interesse. Antes de morrer em 1999, ele autorizou Mark Winegardner a fazer a sequência, que saiu em 2005 pela Editora Record.

    60 anos depois - do outro lado do campo de centeio - Fredrik Colting

    9 – 60 Anos Depois – Do Outro Lado do Campo de Centeio – Fredrik Colting

    Em qualquer lista de livros obrigatórios do século 20, encontraremos O Apanhador no Campo de Centeio, um clássico de J.D.Salinger que ajudou a inventar a adolescência norte-americana. Criou fama pelo protagonista, o personalíssimo Holden Caulfield, e por levar o escritor ao seu completo isolamento. Salinger virou um bicho do mato, e isso alimentou uma série de lendas em torno dele. O fato é que, nesta sequência, Fredrik Colting junta criador e criatura num mesmo enredo. Imagine o sempre jovial e rebelde Holden na pele de um velhinho que simplesmente deixa pra trás o lar de idosos e parte atrás de mais uma aventura.

    A Loura de Olhos Negros - Benjamim Black

    10 – A Loura de Olhos Negros – Benjamim Black 

    Quem gosta de romances policiais certamente conhece o detetive Philip Marlowe, o mais durão da literatura (mais que Dirty Harry!). Marlowe é uma criação de Raymond Chandler, e no cinema foi vivido por Humphrey Bogart. Fato é que Chandler morreu em 1959, mas seu detetive continua vivíssimo. Benjamin Black é o nome, ou melhor, o pseudônimo do responsável pela volta de Marlowe. Em A Loura dos Olhos Negros (Rocco, 2014), o escritor irlandês recria a Los Angeles dos anos 1950, narrando a investigação de um misterioso desaparecimento. Tem clima noir, hipocrisia e femme fatale, combinação ao estilo de Marlowe & Chandler. Em tempo: Benjamin Black é, na verdade, John Banville, vencedor do prêmio Príncipe das Astúrias em 2014. Tem gabarito ou não para fazer um revival de Marlowe?

    Chris Lauxx

     Texto de autoria de Chris Lauxx, pseudônimo dos jornalistas Rogério  Christofoletti e Ana Paula Laux, autores da enciclopédia Os Maiores Detetives do Mundo e editores do site literaturapolicial.com

  • De que matéria são feitos os heróis?

    De que matéria são feitos os heróis?

    vortex_herois1Houve um tempo em que eles eram exemplos de virtude. Encarnavam os maiores valores, as melhores qualidades: coragem, bondade, honestidade, justiça. Eram fortes como Hércules, perspicazes como Teseu, astutos como Perseu. Mirávamos naqueles exemplos e seguíamos nossa jornada.

    Um pouco depois, não bastavam seus músculos e temperança. Foi preciso mais. E eles passaram a vestir trajes coloridos e a ostentar símbolos no peito. Era uma maneira de externalizar seus atributos, seus programas de ação. S não é apenas a inicial de seu nome, mas um sinal de esperança de onde ele veio, mundo tão distante e hoje só existente na memória. Um morcego serve para amedrontar os inimigos, mas colocado em pleno tórax, passa a ser também um alvo, moderno calcanhar de Aquiles. Homens e mulheres, eles ainda personificam a figura difusa do Bem, e sua presença na Terra (e no nosso imaginário) torna a vida mais segura. Aparentemente.

    Dias atrás, diante dos cartazes de cinema, nos perguntávamos por que tantos filmes com super-heróis. Respondemos antes mesmo de entrar na sala escura: o mundo anda tão sombrio que precisamos cada vez mais deles. Se antes nos contentávamos com o salvamento de Andrômeda, Ariadne e Lois Lane, passamos a esperar que protegessem Gotham, Nova York, o planeta, enfim. As ameaças vinham de alienígenas, cientistas malucos, conspiradores. Vinham também de mentes perturbadas, assassinos seriais e criminosos insuspeitos. Se o maior truque do demônio é fazer acreditar que ele não existe, o Mal também buscou formas de se travestir, seduzindo corações e mentes. O Bem também amoleceu seus contornos, e o caráter dos heróis ficou poroso, ambíguo e desconcertante.

    Mas o que faz alguém ser um herói hoje? O que ele veste? A função que ocupa na sociedade? O distintivo que exibe?

    Não dá pra negar. Nossos heróis estão a anos-luz dos modelos imaculados de conduta. Não carregam consigo apenas virtudes. Pelo contrário, são cheios de defeitos. Dexter mata sem remorso, Batman está transtornado, e Lisbeth Salander invade sistemas e busca vingança. Sherlock é um egocêntrico, Poirot, arrogante, e Montalbano é um boca-suja. Nero Wolfe é um glutão. O inspetor Clouseau, um atrapalhado, e Monk tem TOC. Ed Mort é um perdedor nato, Kay Scarpetta, esquisitona, e Pete Marino, um machista nojento. Mandrake é mulherengo, Wallander parece perdido e Mathew Scudder bebe demais. Como delegamos a eles a solução de nossas desesperanças?

    Parte desses nossos heróis trabalha na polícia e esta condição os posiciona do lado de cá do balcão: onde estão os que seguem a lei. Outra parte atua num sistema paralelo de justiça, como detetives particulares. Fardados ou não, ostentam as cores do que é certo e bom, e se distanciam da maldade condenável para a maioria de nós. Não nos esquecemos de seus desvios, manias e esquisitices. Eles borram suas figuras, como os santos com pés de barro, as estátuas trincadas…

    Exemplos mais atuais são os investigadores da série de TV True Detective. Na primeira temporada, tivemos o infiel Marty (vivido por Woody Harrelson) se debatendo com Rust, personagem de Matthew McConaughey, que – digamos – não batia bem da cabeça. Na segunda, Colin Farrell é o violento e instável Ray Velcoro, que contracena com a instável Ani Bezzerides (Rachel McAdams) e o desviante Paul Woodrugh (Taylor Kitsch). São apenas seus distintivos que os fazem nossos heróis? Claro que não. Eles são altamente problemáticos, abusam das drogas e da violência, e são desajustados sociais. Trazem em si ingredientes suficientes para colocá-los do lado de lá do balcão, onde ficam os algemados. Mas não! São nossos heróis! Negue se puder…

    Então, de que matéria são feitos nossos heróis de hoje? Personagens fronteiriços, são complexos e ambíguos como a realidade contraditória que vivemos. São fortes e destemidos, mas fraquejam diante das pequenas-grandes tragédias cotidianas. Sucumbem, perdem-se… Têm valores, mas às vezes, seu sentido particular de justiça colide frontalmente com o que acreditamos.

    True Detective é uma criação de Nic Pizzolatto, autor de Galveston, recém-lançado no Brasil. Livro de estreia, deu ao autor vários prêmios, entre os quais o Edgar Award, distinção para a literatura policial, de mistério e de crimes. Galveston não é um policial clássico, até porque é quase totalmente habitado por bandidos, capangas e escroques de em geral. Ali, todos já atravessaram os limites do razoável e da legalidade. Mesmo assim, acompanhamos Roy Cady em sua jornada, e torcemos por ele, apesar das barbaridades e dos erros que comete. Ele é nosso herói! Tem coragem de negar?

    Nas tramas clássicas de detetive, temos a predisposição de acreditar que a justiça será naturalmente feita: a história será explicada, o culpado, punido e a ordem, restabelecida. Personagens como Sherlock Holmes e Hercule Poirot são nossos guias nessa premissa, e por incrível que pareça, suas histórias continuam atraindo milhões de leitores no mundo. É incrível já que esses justiceiros pertencem a uma época que já se foi, teoricamente de valores diferentes dos nossos, de uma inocência até lúdica. No entanto, histórias como O Assassinato de Roger Ackroyd, de Agatha Christie, e O Cão dos Baskervilles, de Arthur Conan Doyle, continuam entre as favoritas dos fãs de um bom suspense. Justamente ao lado das tramas que embaçam as fronteiras morais do certo e errado, bom e mau. O que acontece? Será que ansiamos finais mais justos e felizes? Ou será que estamos nos acostumando a conviver com facínoras e infames tentando impor seu bizarro modelo de justiça? Para responder a isso, precisaríamos de visão de raio X, células cinzentas super desenvolvidas, sentidos aguçados e de uma obsessiva vontade de solucionar mistérios. Próprio de heróis.

    Chris Lauxx

    Texto de autoria de Chris Lauxx, pseudônimo dos jornalistas Rogério Christofoletti e Ana Paula Laux, autores da enciclopédia Os Maiores Detetives do Mundo e editores do site literaturapolicial.com

  • O Caso dos Mais Vendidos

    O Caso dos Mais Vendidos

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    Há um grande mistério na prateleira dos romances policiais, e não se trata de uma nova onda de crimes ou de mais um serial killer. A questão está mais ligada a títulos, autores e editoras do que propriamente aos atos ilegais e aos corpos espalhados pelo caminho. Se o leitor se dispuser a olhar as listas dos mais vendidos dos gêneros Crime-Suspense-Mistério, vai certamente notar que a esmagadora maioria vem de autores estrangeiros.

    Se espiarmos a lista na Amazon, encontraremos Agatha Christie, Ian Fleming, James Paterson, Stieg Larsson, Patricia Cornwell, Nora Roberts, Harlan Coben, George Simenon e Arthur Conan-Doyle entre os primeiros. Bem depois, esbarraremos em alguns conhecidos locais. Tal observação permitiria constatar que esse tipo de literatura só sobrevive à custa de escritores norte-americanos, ingleses, escandinavos, franceses… Mas rezam as cartilhas do romance policial que as primeiras pistas não são suficientes para solucionarmos o caso.

    Deixemos de lado a hipótese derrotista (“autor policial brasileiro não vende”) e arrisquemos uma pergunta em forma de paradoxo: os estrangeiros aparecem mais na lista porque vendem mais, ou vendem mais porque aparecem mais na lista?

    A pergunta se justifica por um dado. Dos quase 61 mil títulos lançados no país em 2014, apenas 9,7% foram traduções. Quer dizer: nove em cada dez livros no mercado são assinados por autores brasileiros. Os dados são de uma pesquisa da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), encomendada pela Câmara Brasileira do Livro e pelo Sindicato Nacional dos Editores de Livros. O estudo não detalha se essa proporção se mantém em Crime-Suspense-Mistério, e se isso acontecesse, aí sim, teríamos um resultado alarmante para os escritores nacionais: venderiam muito pouco se comparados aos colegas gringos.

    Mas não se pode afirmar isso por causa de outro fator: nos catálogos das editoras, raros são os autores nacionais nos gêneros em questão. Claro que essas informações não estão reunidas e sistematizadas, mas podem ser facilmente acessadas nos sites das editoras. Não são muitas as casas que se dedicam a esses livros (Record, Cia das Letras, L&PM, Benvirá, etc.), e elas têm historicamente priorizado a compra de direitos de tradução em vez de apostar em talentos locais. Na Suma de Letras, por exemplo, estão nomes como Michael Connelly e Stephen King (mesmo que este esteja mais para o terror que o policial). A Editora Record investe em Jo Nesbo, Andrea Camilleri e James Ellroy, e até mesmo reedita os suecos ancestrais Maj Sjöwall e Per Wahlöö. Para julho deste ano sai o novo livro de Marcos Peres, ganhador do Prêmio Sesc de Literatura e finalista do Jabuti e do Prêmio São Paulo de Literatura, o romance policial Que fim levou Juliana Klein?. Para além de Peres, André Amado e Al Gomes, quais são seus principais nomes nacionais no gênero?

    A Cia das Letras dedica fatia um pouco mais generosa às apostas brasileiras com Luiz Alfredo Garcia-Roza, Jô Soares, Raphael Montes, Tony Bellotto. A Intrínseca tem a série com o jovem Sherlock Holmes, e a Arqueiro prefere os best-sellers: é assim com os carros-chefe Dan Brown, James Patterson e Harlan Coben. Ano passado, a Arqueiro também organizou encontros de literatura policial pelas livrarias do país para promover as obras de seu catálogo.

    Outras editoras criam selos e coleções que só publicam autores não-brasileiros e ignoram a produção local do gênero. Nova Fronteira, Zahar, Globo Livros, Alfaguara e L&PM se concentram em títulos clássicos (com séries belíssimas de Agatha Christie, Raymond Chandler e Conan Doyle), e a Vestígio, do grupo Autêntica, investe em nomes mais contemporâneos. Na Rocco, há nomes estrangeiros e poucos nacionais no catálogo: de Benjamin Black, passando por Sophie Hannah, JK Rowling e Ruth Rendell a Patricia Melo, Luís Dill e Flávio Carneiro. A editora Planeta publicou o primeiro policial de Mario Prata (que escreveu mais um pela Leya) e um livro do paulista Roger Franchini. E pela Belas-Letras saiu, neste ano, Pólvora, do cantor Tico Santa-Cruz. Finalmente, na Editora Draco encontramos uma seleção de autores nacionais com romances e contos policiais comercializados, como Carlos Orsi e Cirilo L. Lemos. A maioria está disponível apenas em formato digital, e quem não tem um e-reader acaba não descobrindo o catálogo.

    As editoras brasileiras não abrem tanto espaço para autores nacionais por questões estéticas? Isto é: o gênero policial não funciona por aqui? As obras de Rubem Fonseca, Patrícia Mello, Marçal Aquino, entre outros, já mostraram a que vieram. Foram reconhecidas pela crítica e pelo público, e encontraram um lugar na literatura urbana contemporânea.

    As editoras brasileiras não publicam autores nacionais por razões mercadológicas? Quer dizer: o gênero não vende? Besteira. Leitores brasileiros continuam a consumir casos e mistérios, tanto em versões impressas quanto eletrônicas, apesar de estarem soterrados sob toneladas de filmes, seriados, programas de TV e outros produtos que nos impelem a descobrir os culpados dos crimes. Dias Perfeitos, de Raphael Montes, por exemplo, já foi editado em diversos países e, em breve, deve sair em Taiwan e Hong-Kong. O Matador e Elogio da Mentira, de Patricia Melo, já têm edições romenas!

    Raphael Montes

    Raphael Montes, autor de Suicídas e Dias Perfeitos

    Voltemos ao paradoxo, o mistério que nos trouxe até aqui: os estrangeiros aparecem mais na lista de best-sellers porque vendem mais, ou vendem mais porque aparecem mais na lista?

    Arriscamos dizer que as editoras brasileiras têm investido menos do que poderiam na safra de autores nacionais do gênero. As razões para isso estão mais nos temores financeiros que estéticos. Os motivos estão mais no conservadorismo e no oportunismo de mercado do que propriamente na qualidade dos originais recebidos. Afinal, para qualquer empresa, é menos arriscado vender um produto que fez sucesso lá fora ou foi agraciado com algum prêmio do que lançar um novo nome, oferecer um título inédito e original. É mais fácil pegar carona no sucesso internacional do que fomentar uma cena criativa local, que também pode ser bem lucrativa.

    Estamos tratando aqui de uma categoria específica de livros, os de Crime-Suspense-Mistério, que não é tão marginalizado quanto o Terror, por exemplo. Produções do cinema e da TV enxergam no gênero um terreno fértil de novos produtos e experiências. Não se trata de um fenômeno como o dos livros para colorir, um ponto fora da curva do mercado que já vendeu neste ano quase um milhão de exemplares, se contarmos apenas dois títulos, Jardim Secreto e Floresta Encantada, ambos de Johanna Basford, conforme dados da PublishNews. É uma raridade, um evento isolado. Estamos tratando de um gênero que existe e persiste há décadas, que está estabelecido, e que não demonstra cansaço ou perda de fôlego.

    Acreditamos que títulos de autores nacionais poderiam ter performances de vendas melhores se houvesse mais recepção de originais; se existissem mais lançamentos do gênero; se fossem investidas mais verbas de marketing e promoção; se fossem estimuladas produções derivadas das obras na TV e no cinema. Enfim, se os escritores locais tivessem mais espaço e visibilidade. Acreditamos que uma cena literária policial possa ser fomentada, já que existem muitos criadores do gênero no país. Prova maior está na quantidade de títulos lançados nos últimos anos na internet ou em formato impresso, sob o signo da autopublicação.

    Se a fresta estivesse menos estreita, poderíamos sonhar com embriões de uma geração criativa e produtiva no gênero policial. Clássicos e cânones como Agatha Christie e Simenon continuariam a frequentar as listas dos mais vendidos nas livrarias, mas poderiam ter vizinhos com o nosso sotaque e que narram crimes nas nossas paisagens.

    Texto de autoria de Chris Lauxx, pseudônimo dos jornalistas Rogério  Christofoletti e Ana Paula Laux, autores da enciclopédia Os Maiores  Detetives do Mundo e editores do site literaturapolicial.com

  • Resenha | O Chamado do Cuco – Robert Galbraith

    Resenha | O Chamado do Cuco – Robert Galbraith

    O-Chamado-do-Cuco-Robert-Galbraith

    Quando uma modelo problemática cai para a morte de uma varanda coberta de neve, presume-se que ela tenha cometido suicídio. No entanto, seu irmão tem suas dúvidas e decide chamar o detetive particular Cormoran Strike para investigar o caso.

    Desnecessário comentar sobre o burburinho causado pelo “vazamento” da notícia de que a autora de Harry Potter escrevera este livro sob o pseudônimo de Robert Galbraith. Talvez eu até chegasse a ler se esse detalhe não tivesse sido divulgado. Mas certamente que, ao saber disso, minha curiosidade a respeito aumentou exponencialmente. E, com ela, a expectativa, lógico, apesar de eu me esforçar bastante para deixá-la de lado.

    Curto demais livros de detetive, e Agatha Christie e Conan Doyle estão entre meus autores prediletos, não apenas nesse gênero, mas na literatura em geral. E um dos motivos que me faz preferir os livros desses autores é a figura do detetive. Sherlock Holmes e Hercule Poirot são figuras que prendem a atenção do leitor tanto por sua excentricidade quanto por sua inteligência. E J.K. Rowling conseguiu conceber um detetive, Cormoran Strike, cujas características levam o leitor a querer acompanhá-lo literalmente a qualquer lugar, seja nas investigações, seja em suas crises pessoais.

    Os defeitos do protagonista são mais decisivos e atraentes que suas qualidades, sendo os elementos que o tornam um personagem interessante. No caso de Strike, a perna amputada – seus problemas com ela e a relutância em comentar a respeito -, seu casamento em crise, sua ascendência, suas dívidas, entre tantos outros problemas, agravam seu mau humor, seu pendor para o álcool e pelos exageros alimentícios, sua arrogância e seu desapego – que beira o desprezo – por um convívio social saudável. Diferente de Poirot e Holmes, Strike não é extravagante nem possui QI muito acima da média, mas consegue ser interessante o bastante para angariar a simpatia do leitor. E acompanhar a história significa não só se aproximar da descoberta do mistério, mas também conhecer mais do protagonista e de suas motivações.

    Todo herói que se preze tem um sidekick à altura e Strike tem o seu, ou melhor, a sua. E assim como o detetive é um herói relutante, Robin Ellacott, a secretária temporária, torna-se a ajudante quase por acaso, o que determina uma alquimia entre os personagens que funciona muito bem. Guardando-se as devidas proporções – lógico, não se pode perder de vista que é uma narrativa ficcional – os personagens, não apenas Cormoran e Robin, são bastante verossímeis e convincentes.

    A narrativa flui bem, apesar de algumas “barrigas”, trechos que poderiam ser suprimidos sem prejuízo à trama. E a pergunta que todos que me viram lendo o livro fizeram: “Parece Harry Potter?”. Não, não parece. Há, sim, o mesmo cuidado com o texto e com os personagens, mas apenas isso. Certamente, deve haver alguns detalhes estilísticos sutis que identifiquem a autora. Mas, principalmente no texto traduzido, não há nada perceptível, a não ser alguns easter-eggs – que eu nem sei se foram intencionais ou apenas “intrusões” do tradutor.

    Narrado em terceira pessoa, obviamente acompanha na maior parte do tempo os passos de Strike e, eventualmente, os de Robin. Rowling se preocupou em deixar o leitor ter acesso às mesmas informações que o detetive, contudo as conclusões de Strike pertencem apenas a ele. Mas mesmo assim, quando o mistério é revelado, não é um deus ex machina, em que algum elemento nunca antes visto na trama torna-se a chave da solução. Há algumas explicações um pouco “forçadas”, mas nada que faça o leitor duvidar demais do que está lendo. Uma das motivações do vilão não convenceu; havia outras possibilidades menos simplistas.

    Enfim, é uma trama bem estruturada, sem fios soltos. Não é excepcional, mas cumpre bem a função de entreter. E deixa o leitor com vontade de acompanhar outros “causos” da dupla Strike & Ellacott.

    Texto de autoria de Cristine Tellier.

  • Resenha | Assassinato no Expresso do Oriente – Agatha Christie

    Resenha | Assassinato no Expresso do Oriente – Agatha Christie

    assassinato no expresso do oriente - capa

    Publicado em 1934 – e reeditado até os dias atuais (a minha edição é a 18ª) – este talvez seja um dos livros mais importantes da “Dama do crime”. Junto com Os dez negrinhos – na minha opinião, o melhor de todos – e O Assassinato de Roger Ackroyd – o primeiro que li da autora – representa o que há de melhor em termos de narrativa de suspense e mistério. Não é à toa que o livro foi adaptado inúmeras vezes tanto para a televisão quanto para o cinema, sendo talvez por isso mais conhecido do público em geral que os demais. Quem tiver curiosidade de assistir a uma das adaptações, sugiro a dirigida por Sidney Lumet, de 1974, com o famoso detetive Hercule Poirot representado por Albert Finney.

    Pouco depois da meia-noite, uma tempestade de neve para o Expresso do Oriente nos trilhos. O luxuoso trem está surpreendentemente cheio para essa época do ano. Mas, na manhã seguinte, há um passageiro a menos. Um americano é encontrado morto em sua cabine, com doze facadas, e a porta estava trancada por dentro.

    A partir dessa premissa simples, a autora desenvolve uma trama envolvente que deixa o leitor em suspense até o momento em que se revela a solução do mistério. Extremamente criativa e engenhosa, tanto a ‘mise-en-scène’ – grupo de pessoas confinadas em local temporariamente inacessível onde ocorre um crime – quanto a solução – que obviamente não irei revelar – foram reaproveitadas exaustivamente por diversos outros autores e roteiristas, inclusive pela própria Agatha, em Morte no Nilo.

    Sem fazer uso dos recursos de estruturação de romances tão na moda hoje em dia – capítulos muito curtos, alternância de pontos de vista e cliffhangers a cada final de capítulo – a autora prende o leitor em sua trama, deixando-o intrigado e curioso o bastante para não interromper a leitura. A estrutura do livro, dividido em três partes – “Os fatos”, “Os testemunhos”, “Hercule Poirot para para pensar” – também contribui para enlaçar o leitor, que se sente quase na obrigação de, tendo os fatos e os testemunhos assim como Poirot, solucionar esse imbroglio.

    Engana-se quem pensa que, por ter sido escrito há quase um século, é um texto de difícil compreensão. A linguagem é simples, sem ser simplista, e a autora é mestra em descrever personagens e cenários na medida certa, sem detalhes demais nem de menos. Agatha Christie conduz o leitor de uma suspeita a outra com maestria, deixando-o com aquela ‘pulga atrás da orelha’ característica dos bons livros de suspense. Enfim, um deleite para os fãs do gênero e uma ótima opção para os não iniciados adentrarem o mundo maravilhoso de Christie.

    Texto de autoria de Cristine Tellier.