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  • Resenha | Homem-Aranha Noir: A Face Oculta

    Resenha | Homem-Aranha Noir: A Face Oculta

    Nos Quadrinhos mainstream, de tempos em tempos surgem linhas editoriais alternativas, como podemos perceber pelas versões 2099 e zumbis da Marvel Comics e pelos incontáveis elseworlds do multiverso da DC Comics. O sucesso dessas publicações costumeiramente resulta em continuações, com grandes oscilações nos níveis de qualidade das histórias.

    A linha Marvel Noir não foge dessa tradição, colocando os grandes personagens da Casa das Ideias em um contexto mais violento e visceral da década de 1930, durante o auge da Grande Depressão norte-americana. Em um período simultaneamente sombrio e sedutor, as possibilidades narrativas se multiplicam consideravelmente, equilibrando o drama e o mistério inerentes às narrativas policiais com a ficção científica que resulta no arquétipo dos super-heróis.

    Dentro desse contexto, o sucesso dessa linha editorial era inevitável, e a versão alternativa que obteve maior popularidade, para surpresa de zero pessoas, foi o Homem-Aranha Noir, tornando-se natural que fosse dele a primeira sequência de aventuras dentro dessa continuidade.

    Para manter a fórmula que anteriormente funcionou, o editor Alejandro Arbona não poupou esforços para contar com o retorno da equipe criativa do volume original, formada pelos roteiristas David Hine e Fabrice Sapolsky e pelo desenhista/colorista Carmine Di Giandomenico.

    Nessa nova aventura, a equipe criativa situa o herói aracnídeo em 1933, poucos meses após os eventos do arco anterior, em um momento no qual a crise econômica ainda mantém o país em uma situação delicada, mas indícios de uma retomada são sentidos através de medidas adotadas pelo recém-empossado presidente Franklin Delano Roosevelt, enquanto a sombra do Nazismo começa a tomar força em solo americano, vindo secretamente do outro lado do Atlântico.

    Se no contexto macro podem ser percebidos tímidos sinais de melhora, nas ruas de Nova York a crueldade das gangues ainda impera, com o Mestre do Crime assumindo o posto outrora ocupado por Norman Osborn, O Duende, mantendo o submundo em polvorosa e preenchendo o vácuo momentâneo nas esferas de poder da máfia.

    Envolvido com Felicia Hardy, socialite dona da boate Gata Negra, Peter Parker se vê às voltas com uma intrincada investigação jornalística, junto de seu novo amigo Robbie Robertson, que envolve os bizarros experimentos com animais realizados por um certo Otto Octavius.

    Com um subtexto social bem calibrado, que aborda o racismo da forma abjeta que merece, a história mantém um ritmo de suspense que em muito se assemelha temática e estilisticamente ao filme de Jordan Peele, Corra!, lançado alguns anos após a publicação dessa HQ. Em, que pese o tom de ficção científica, a história mantém um diálogo bem fidedigno com a maneira com a qual a população negra sempre foi vista no ocidente, sobretudo nos Estados Unidos.

    O roteiro de Hine e Sapolsky se vira muito bem ao trabalhar sua história dentro do contexto da época, adaptando os personagens do cânone do Homem-Aranha de modo que faça sentido suas presenças na história, como o agente federal Jean De Wolfe, versão da Capitã Jean DeWolff, que na época jamais conseguiria atingir tal posto, dado o machismo estrutural que impossibilitava que mulheres ocupassem postos desse tipo até então.

    A inserção do Nazismo como um elemento preponderante na ameaça central da história garante um link poderoso com a história real do século XX, algo que gera uma camada de verossimilhança nessa proposta quase metaficcional de narrativa.

    A arte do italiano Di Giandomenico não é marcante por sua sutileza, ganhando destaque através do uso de seu alto contraste e de uma coloração digital que foge um pouco da estética proposta pelo traço, gerando um certo estranhamento no desenrolar da leitura, atenuado pela dinamicidade dos enquadramentos do artista, famoso por fazer storyboards para filmes de cineastas como Martin Scorsese.

    Um ponto que merece destaque negativo é a imprecisão histórica cometida pela tradução brasileira ao final da HQ, quando um oficial nazista fala, no original, em “the national socialist vision of the future (…)”, o trecho é erroneamente traduzido como “o ideal socialista para o futuro (…)”. Esse tipo de equívoco equipara nazismo e socialismo, correntes políticas antagônicas e cuja associação se mostra, à luz dos fatos e dos estudos teóricos, completamente descabida.

    Erros de tradução à parte, Homem-Aranha Noir: A Face Oculta logra êxito ao transpor a personalidade de Peter Parker para um contexto mais bruto e violento de sociedade, apresentando um Amigão da Vizinhança não tão amigável como estamos habituados, bem mais implacável e frio, como se fosse este de fato um homem reflexo de seu tempo.

    O volume publicado pela Panini Comics em capa dura reúne as quatro edições da minissérie Spider-Man Noir: Eyes Without a Face, e contém um pequeno glossário e uma interessante galeria de capas.

    Compre: Homem-Aranha Noir – A Face Oculta.

  • Resenha | The Fade Out

    Resenha | The Fade Out

    Ed Brubaker e Sean Phillips quando separados são brilhantes, e quando juntos são simplesmente espetaculares. De tempos em tempos os quadrinhos nos presenteiam com duplas criativas de alto calibre, como Brubaker & Phillips, Lee & Kirby, Claremont & Byrne, Miller & Janson, Vaughan & Staples, Bendis & Maleev, entre muitas outras equipes em que o talento de um não só se encaixa com o do outro como o eleva a patamares outrora inimagináveis.

    Brubaker e Phillips, apesar de terem trilhado suas carreiras trabalhando para o mainstream, ficaram famosos ao embarcarem na Image Comics, pela qual publicaram obras como Criminal*, Incognito, Fatale e Kill or be killed, nas quais seus dotes de narradores criminais puderam aflorar com maestria e sem amarras editoriais. Em The Fade Out, série limitada em 12 edições e compilada em um encadernado pela Image Comics, a dupla concebe uma elaborada e inventiva narrativa de crime, discorrendo sobre intriga, inveja, fama e abuso na Hollywood dos anos quarenta, mergulhando de cabeça em um período romantizado por muitos e consagrado como a era de ouro do cinema norte-americano.

    Charlie Parish é um roteirista frustrado e depressivo, que se vê preso em uma vida medíocre e fracassada, sem grande destaque, até que a protagonista do filme no qual estava trabalhando aparece morta, no cômodo ao lado do qual ele se encontrava, após uma noite de bebedeira. A pergunta que perturba Parish e o conduz ao longo da narrativa gira em torno de quem matou Val Sommers, e as respostas não são tão fáceis quanto ele esperava que fossem. Disposto a descobrir o que houve naquela noite, o roteirista parte junto de seu melhor amigo, o beberrão Gil, em busca da verdade, e daí em diante ambos mergulham nas particularidades da vida de aparências que permeia o ambiente hollywoodiano, percebendo que há muito mais em jogo do que apenas o assassinato de Sommers.

    Ed Brubaker e Sean Phillips trabalham com a histeria anticomunista que dominou os EUA pós-segunda guerra mundial, espiralando os acontecimentos em um grande efeito cascata, dentro do ambiente nefasto e degradante de uma Hollywood permeada pela corrupção e pela ambição de todos que ali se encontram. Jogos de azar, apostas, disputas de ego e a busca pela fama a qualquer preço tornam o entorno do mistério pela morte de Val Sommers muito mais complexo do que Parish poderia imaginar. Atores, Diretores, profissionais de Relações Públicas, todos estão de alguma maneira comprometidos e corrompidos por um sistema que devora boas intenções, em nome do sucesso e dos holofotes. Em The Fade Out Brubaker e Phillips apresentam Hollywood em seu estado mais puro.

    O traço de Phillips e o texto ágil de Brubaker se intercambiam de forma soberba, conferindo sensualidade, mistério e crueldade para seus personagens, ao passo que as cores de Elizabeth Breitweiser em muito ajudam na ambientação noir que a narrativa visual de Phillips pede. Ed Brubaker consegue, em The Fade Out, dosar muito bem os dilemas psicológicos de seus personagens com o enigma que movimenta a narrativa, tornando a Los Angeles de 1948 um organismo vivo e atuante dentro da trama, quase como um personagem propriamente dito. Nada na história é jogado de graça para o leitor, nenhuma palavra, nenhum gesto, nenhum quadro.

    É interessante notarmos que “fade out” é o nome dado ao recurso cinematográfico que consiste no escurecimento gradativo da imagem até chegar ao preto total, dando encerramento a uma cena ou filme. O título da história já é um prenúncio dos autores de que nessa narrativa não há espaço para amenidades, somente para a transição crua entre atos e consequências, como num bom filme noir. Em The Fade Out, parafraseando Arquivo X, a verdade está lá fora, mas nem todos terão estômago para ir busca-la.

    Um dos grandes mistérios do mercado editorial brasileiro reside no fato de que um autor do calibre de Ed Brubaker não tem seu material autoral publicado aqui no país. O espanto fica cada vez maior na medida em que a dupla empilha seis prêmios Eisners até o momento, tendo conquistado a estatueta por obras como Criminal, Incognito e pela própria The Fade Out (Melhor Nova Série em 2015 e Melhor Série Limitada 2016). Dessa maneira, só resta aos leitores da dupla acompanhar suas obras através dos encadernados importados, vendidos pela Amazon aqui no Brasil.

    *Criminal é um caso à parte, uma vez que a série começou a ser publicada pelo selo Icon, da Marvel Comics, e migrou com Brubaker quando este passou a escrever para a Image Comics. Os direitos de publicação do selo Icon no Brasil eram da editora Panini, que chegou a publicar os dois primeiros arcos da série, “Covarde” e “Lawless”, mas que ficaram sem continuidade no país. Atualmente Criminal já conta com 7 volumes, 1 graphic novel original e 1 série mensal, todos publicados pela Image.

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  • Crítica | A Lei da Noite

    Crítica | A Lei da Noite

    A Lei da Noite é o novo filme de Ben Affleck no papel de diretor e roteirista. Acostumado a acertar desde que se iniciou em suas múltiplas tarefas no cinema, primeiro em Medo da Verdade, até chegar em Argo, sua obra máxima. Recém saído da cadeira de diretor de The Batman, Affleck sentiu o peso nos ombros de estar frente ambiciosos de um grande estúdio como a Warner e ao mesmo tempo se mostrar artisticamente relevante. Tal compromisso, apresentar ao estúdio o filme que dominaria o Oscar deste ano e carregar o maior fazedor de dinheiro do estúdio, Batman, Affleck demonstrou confusão e talvez cansaço. Com um prejuízo de 70 milhões de dólares e fracasso de crítica, sem prêmios, o atual Batman se encontrou com seu pequeno inferno astral.

    A opção de A Lei da Noite é contar a história de um filhos de imigrantes irlandeses que foram aos EUA para “fazer a América”. Vencer na vida honestamente ou não, serem policiais, empresários, mafiosos, gangsters, ladrões comuns que não irão passar dos 40 anos. Assim, a ambição era a de fazer um revisionismo histórico das figuras incompletas e autodestrutivas que compuseram a construção dos EUA, basicamente grupos criminosos onerando imigrantes menos bem sucedidos, numa pirâmide de opressão e manipulação. Há até o mafioso do bem, tal qual Pablo Escobar foi visto em Medélin ao misturar-se como aquela figura meio homicida meio messiânica, o qual Ben Affleck veste a pele de maneira competente.

    A premissa do livre-arbítrio está impregnada em nossa cultura, é base do direito penal na maioria dos países, e esta embutida no tal Sonho Americano. É tão constante quanto falha. É basicamente a crença de que qualquer pessoa pode fazer aquilo que deseja de si, não importa de onde tenha começado. Um sonho baseado na fé e no otimismo. Tal coisa, porém, infelizmente não parece existir, pois nossa capacidade de tomar as melhores decisões tem forte influência em nossa herança genética e cultural. É a velha disputa conhecida como Nature vs Nurture. É também sabido que uma boa parte de nossas ações ocorre de maneira quase automática, antes mesmo de alguma atividade cerebral que trace a estratégia e nos faça escolher tal movimento, tal fala, tal reflexo.

    Então, se existe algo de muito acertado neste filme, que é sua relação com a natureza inequivocadamente errante da vida. Existe uma insensatez nos rumos que nossas trajetórias, sempre cruzadas, tomam, e aparentemente aceitar isso é parte de uma vida em paz. Não feliz, mas em paz, que aparentemente é o máximo que se pode exigir de um mundo regido pela entropia. Karma, darma, payback, “leis naturais”, “aqui se faz aqui se paga”, “uma hora a vida cobra”. Talvez sim, talvez não, só o caos é reconhecível.

    Antes mesmo de montarmos nossas percepções e idealizações sobre a vida, um pacote completo nos é entregue pela cultura. Percepções do mundo traçando nossa moralidade e ética, de justiça divina e concepções sentimentais. Tudo entregue e reformulado constantemente, sem alterar seu conteúdo, para que pensemos que concluímos algo. Para que pensemos ser capazes de manipular nosso próprio destino, tomar decisões e conviver com elas. Idealizamos o sonho de sermos livres como um pássaro sem que ninguém se dê conta de que nem mesmo o pássaro é livre. Ora, ele não tem outra escolha a não ser ir de um ponto ao outro voando, piar, procriar e cuidar de seus filhotes. Não há liberdade para animal algum que esteja vivo.

    Deste ponto de vista, a esperança é um dom insensato, talvez ingênuo, talvez imaturo. Uma forma de flutuar entre os devaneios da rotina literária, que nos promete expectativas e perspectivas, mesmo naquelas que se julgam viscerais e quase cruéis. Por outro lado, de acordo com A Lei da Noite, a causalidade é tão pouco rastreável que é como se não fazer sentido fosse a melhor das opções. Tão impossível prever qualquer as consequências de qualquer ação, principalmente aquelas onde tudo degringola, que buscar elucidar qual a melhor decisão e forma de agir se torna um exercício de futilidade para lustrar nosso ego que faz acreditar que somos pessoas “senhoras de nós mesmos”.

    Tecnicamente bonito, mas confuso, a Lei da Noite tem momentos enfadonhos onde não nos é permitido ter real empatia com os personagens que nos são apresentados, a ponto de que quando retornam sequer conseguimos reconhecê-los. Outro problema é que, apesar das boas intenções, o texto acaba utilizando estereótipos étnicos para apoiar suas teses, fazendo seus argumentos soarem constantemente inconcretos e defasados. A ideia era óbvia, dizer que espiar o passado é uma forma de se precaver no futuro, mas ao mesmo tempo seu roteiro deixa claro que não há futuro suficientemente agradável para ninguém. Como refletor do cotidiano, A Lei da Noite faz sentido em mostrar que nos resumimos perseguir McGuffins que resultam em nada, mas como narrativa isso pode trazer exigências as espectadoras que não serão correspondidas. A ideia central é que a vida é aleatória e cobra preços que não esperamos. Mas isso deixou o filme um tantinho aleatório também.

    Texto de autoria de Marcos Paulo Oliveira.

  • Noir | Um guia para assistir aos filmes de detetive

    Noir | Um guia para assistir aos filmes de detetive

    Noir Um guia para assistir aos filmes de detetive

    Volta e meia surgem ciclos temáticos dentro da história do cinema norte-americano. Iniciando com os monstros da Universal, faroestes dos anos 1940 e 1950, filmes de ficção científica dos anos 1950, a era dos épicos dos anos 1960, o cinema de contra-cultura dos anos 1970, os brucutus do cinema de ação dos anos 1980, e a atual safra de filmes de super-heróis dos anos 2000.

    Porém, entre esses temas, um dos mais reverenciados é o noir dos anos 1940 e 1950. Considerado um dos grandes sub-gêneros dos filmes policiais, o noir surgiu na literatura nos 30 e conseguiu ser transposto para o cinema com maestria pelos melhores diretores e roteiristas dos anos 40 e 50. O ScriptLab esmiuçou os principais elementos de um filme noir, sendo eles o contexto, a escuridão, o fatalismo, voz off e flashbacks que nem sempre são necessários, o protagonista falho, e, principalmente, a dama fatal.

    Munido dessas informações, elaborei uma lista com os 20 filmes mais importantes e/ou marcantes do gênero em ordem cronológica para quem deseja se aventurar pelo cinema noir. Lembrando sempre que pode haver algum título importante que deixei passar.

    1941O Falcão Maltês (The Malthese Falcon, 1941)

    Escrito e dirigido por John Houston e baseado no livro de Dashiell Hammett, O Falcão Maltês é talvez o mais emblemático entre os filmes noir que ajudou a estabelecer o gênero. Humphrey Bogart é o detetive particular que aceita pegar o caso do desaparecimento da irmã de Mary Astor. Após seu sócio Jerome Cowan aparecer morto, a investigação se desdobra em algo muito maior que envolve uma relíquia rara de valor incalculável.

    double_indemnityPacto de Sangue (Double Indemnity, 1944)

    Dirigido por Billy Wilder, este se tornou um dos noir mais memoráveis ao inverter a estrutura do gênero. Fred Macmurray, detetive de uma companhia de seguro, se une a Barbara Stanwick, esposa de um homem rico, na tentativa de assassiná-lo e fraudar a investigação para ficar com o dinheiro.

    laura-movie-poster-1944-1020143698Laura (Laura, 1944)

    Com Vincent Price no elenco, Laura narra a clássica investigação do assassinato da personagem título, interpretada por Gene Tierney, conduzida pelo detetive Dana Andrews, que não só descobre que ela está viva como se apaixona por ela.

    lost_weekend_xlgFarrapo Humano (The Lost Wekeend, 1945)

    Outro filme dirigido por Billy Wilder, Farrapo Humano é um noir que foge da trama policial ao focar no drama e na condição humana de Ray Milland, um alcoolatra que não consegue largar o vício enquanto tenta ser salvo por Phillip Terry, seu irmão e Jane Wyman, sua namorada, enquanto quase tem um caso com Doris Dowling. Destaque para as cenas do bar com Howard da Silva.

    Detour_(poster)A Curva do Destino (Detour, 1945)

    Mais um noir de drama, A Curva do Destino apresenta Tom Neal, um músico de jazz que viaja pelos Estados Unidos de carona e assume a identidade do motorista que morreu na sua frente. Após se envolver com Ann Savage, uma mulher que lhe dá outra carona, a relação dos dois termina mal.

    big-sleep-movie-poster-1946À Beira do Abismo (The Big Sleep, 1946)

    Considerados por muitos como um dos melhores filmes noir, À Beira do Abismo é baseado no livro de Raymond Chandler e tem a direção de Howard Hawks. O detetive particular Humphrey Bogart investiga o caso de extorsão contra a filha mais nova de um rico industrial enquanto se envolve com a sua irmã mais velha, Lauren Bacall.

    The-Killers-PosterAssassinos (The Killers, 1946)

    Baseado em uma história de Ernest Hemingway, a morte do personagem de Burt Lancaster desencadeia uma investigação por parte do detetive de uma agência de seguros, e acaba por revelar como se deu um grande crime no passado e o envolvimento de Lancaster com Ava Gardner.

    blue_dahliaDália Azul (The Blue Dahlia, 1946)

    No filme escrito por Raymond Chandler e dirigido por George Marshall, Alan Ladd é um ex-piloto de guerra que se torna o principal suspeito de matar Doris Dowling, sua infiel esposa, que tem um caso com Howard da Silva, o dono da boate Dália Azul. Para provar a sua inocência, tem a ajuda de Veronica Lake, a ex-esposa do dono da boate.

    20319302Gilda (Gilda, 1946)

    O filme dirigido por Charles Vidor que consagrou Rita Hayworth é outro noir que foge às tramas policiais. Gleen Ford é um apostador que abandona o vício do jogo e vai trabalhar para o dono de um Cassino em Buenos Aires. A sua vida vira ao avesso ao ver que seu chefe voltou de viagem casado com Rita Hayworth, antigo caso seu.

    the-lady-from-shanghai-movie-poster-1948-1020414234A Dama de Shanghai (Lady From Shanghai, 1947)

    Escrito, dirigido e protagonizado por Orson Welles, se tornou um dos grandes filmes da sua carreira com todos os elementos noir. Welles é um marinheiro que se apaixona por Rita Hayworth e aceita fazer parte da equipe do navio de seu marido, Everett Sloane, acabando por se envolver em uma trama de assassinato.

    b70-9896Fuga ao Passado (Out of The Past, 1947)

    Robert Mitchum está refugiado em uma pequena cidade, até ser encontrado pelo capanga do seu antigo chefe, Kirk Douglas, para acertar as contas sobre um serviço não realizado do passado, que envolvia a bela Jane Greer e uma alta quantidade de dinheiro. Participação de Rhonda Fleming.

    Francesco-Francavilla-The-Third-Man-Movie-Poster-2015O Terceiro Homem (The Third Man, 1949)

    Outro grande noir sobre espionagem na Europa pós-Segunda Guerra Mundial. Dirigido por Carol Reed, Joseph Cotten é um escritor americano que chega a Viena para encontrar um antigo amigo, interpretado magistralmente por Orson Welles, que foi dado como morto e tenta por todos os meios continuar assim.

    sunset-boulevard-movie-poster-1950-1020142705Crepúsculo dos Deuses (Sunset Boulevard, 1950)

    Outra direção de Billy Wilder, Crepúsculo dos Deuses é um dos filmes mais marcantes da história do cinema fazendo referência à própria indústria em um grande noir de drama humano. William Holden é contratado para reescrever o roteiro de um filme por Gloria Swanson, em uma interpretação memorável como uma ex-estrela do cinema mudo que caiu no ostracismo. Participação memorável de Cecil B. DeMille e Buster Keaton como eles mesmos, além de Erick von Stroheim.

    InaLonelyPlace_US_30x40No Silêncio da Noite (In A Lonely Place, 1950)

    Uma mistura de policial e drama, Humphrey Bogart é um roteirista violento que vive no mundo de glamour de Hollywood. Suspeito de assassinato, ele é inocentado por sua vizinha, Gloria Grahame, e os dois acabam se envolvendo até que a sua difícil personalidade complica a relação.

    the-asphalt-jungle-movie-poster-1950-1020190945O Segredo das Joias (The Asphalt Jungle, 1950)

    Em outro filme dirigido por John Houston e com Marilyn Monroe fazendo uma pequena participação, O Segredo das Joias é o típico filme de assalto onde se mostram todas as etapas de preparação, além do roubo. Conduzido pela mente criminosa do recém-saído da prisão Sam Jaffe, conta com Sterling Hayden no elenco.

    cry-danger-movieGolpe do Destino (Cry Danger, 1951)

    Nesta obra dirigida por Robert Parish, Dick Powell vive um homem inocente que sai da prisão perpétua após uma testemunha ajudá-lo com um álibi, mas que na verdade quer informações sobre um assalto que Powell não cometeu. Durante a vingança contra quem o colocou na cadeia, tentam incriminá-lo novamente enquanto se envolve com a bela Rhonda Fleming.

    1953 - The Big Heat 2Os Corruptos (The Big Heat, 1953)

    Em outro grande noir, Os Corruptos é dirigido por Fritz Lang e conta a história de Gleen Ford, um detetive que ao investigar a morte de um colega se vê lidando com criminosos que comandam o próprio departamento de polícia, sendo um deles Lee Marvin. Após ter a sua família assassinada, ele busca justiça ao lado de Gloria Grahame.

    killing_xlgO Grande Golpe (The Killing, 1956)

    O Grande Golpe é outro dos filmes noir diferentes. O terceiro longa-metragem dirigido por Stanley Kubrick é o típico filme de assalto que lembra bastante a estrutura de O Segredo das Joias. Um bando de vigaristas é liderado também por um ex-presidiário, Sterling Hayden, que planeja um grande assalto durante uma corrida de cavalo.

    large_i2gJBlr01BZiZb5b5TOJudc4nv6A Marca da Maldade (Touch of Evil, 1958)

    O filme que tem a melhor cena de abertura da história do cinema, A Marca da Maldade, dirigido por Orson Welles, é também o último dos filmes noir. Charlton Heston e Janet Leigh são um casal composto por um mexicano e uma americana que vivem na perigosa fronteira entre os dois países, em uma perigosa investigação conduzida por Welles sobre uma bomba que explodiu um carro.

    film-noir-chinatown-1974-movie-poster-via-professormortis-wordpressChinatown (Chinatown, 1974)

    Considerado pós-noir, o filme dirigido por Roman Polanski é uma homenagem aos filmes de 20 e 30 anos anteriores, com todos os elementos do noir, inclusive com a presença de John Houston. Jack Nicholson é um detetive particular que investiga o caso de uma mulher traída, e que acaba se revelando algo muito maior. Com a ajuda de Faye Dunaway, ele enfrenta uma trama política e de assassinato sobre a seca na Califórnia. Leia a crítica do filme aqui.

    Texto de autoria de Pablo Grilo.

  • Resenha | Homem de Ferro Noir

    Resenha | Homem de Ferro Noir

    Homem de Ferro Noir

    Como seria se alguns de nossos heróis favoritos vivessem nos anos 1930? Algumas respostas para essa pergunta podemos encontrar na série Noir da Marvel. Criada em 2009 e de forma bastante desbalanceada, diga-se, conta com Demolidor, Homem-Aranha, Wolverine, JusticeiroX-Men, entre outros, que ganharam suas versões ambientadas no universo pulp-noir do período. Mas o resultado dividiu opiniões.

    No caso específico de Homem de Ferro Noir, seria possível dividir essa resenha para tipos diferentes de público: o fã iniciado no universo dos comics ou aquele que é iniciante ou que apenas admira o Homem de Ferro. E o motivo é muito simples: o roteiro.

    Totalmente inspirado em Indiana Jones, Tony Stark nos é apresentado praticamente da maneira que o conhecemos: um bon vivant, engenheiro, milionário, que herdou a herança do pai e que sofre de um problema crônico no coração, que precisa ser recarregado por uma bateria. Tony é um explorador, que assim como “o velho Indi”, busca encontrar os mais famosos tesouros mitológicos. Ocorre que essa busca desesperada de Tony, na verdade, é a busca para a cura de seu problema. O interessante é que Stark é uma espécie de Bear Grylls da década de 1930 e tem todas as suas expedições aventurescas publicadas numa revista serial chamada Marvels.

    E é aí que a trama começa.

    Numa espécie de prólogo, durante uma dessas expedições, os planos de Tony são frustrados quando a Dra. Gialetta Nefaria, amante de Tony, se revela uma nazista e o entrega ao Dr. Zemo e o Barão Strucker. Durante o conflito, Stark perde parte de sua equipe, sobrevivendo somente seu fiel amigo, Rhodes. Ao voltarem para a América somos apresentados a Jarvis, que volta a ser um mordomo, como nas histórias clássicas do ferroso, e à armadura do Homem de Ferro, que se assemelha à Mark I, porém, com um visual muito mais polido e agradável aos olhos. Vale destacar que o problema no coração de Tony, bem como os motivos que o levaram a construir a armadura, não é revelado. E não podemos colocar a culpa por preguiça de roteiro, uma vez que as histórias da série Noir são curtas, o que ajudou na omissão das origens do herói.

    Dando continuidade, o protagonista encontra na gaveta de Nefaria algumas pistas que fazem ele reunir uma nova equipe em busca de Atlântida, o assunto principal da trama que fica um pouco mais interessante, já que passamos a conhecer Pepper Pots e o navegador Namor, numa versão completamente diferente da que conhecemos.

    O problema é o que acontece daqui pra frente.

    O verdadeiro fã de quadrinhos provavelmente odiará a história, principalmente por ela ter sido escrita por Scott Snyder, uma vez que o conhecido roteirista foi duramente criticado por ter praticamente copiado um arco e os personagens de Mandrake. E para piorar a situação, ainda tirou uma cena de uma obra sua, o spin-off de Vampiro Americano. E ainda tem o fato de o coração de Tony ser ligado a uma bateria, recurso muito semelhante ao do filme Adrenalina 2: Alta Voltagem, lançado na mesma época.

    Porém, de um modo geral, Homem de Ferro Noir tem tudo que uma história em quadrinhos de aventuras precisa: locais exóticos, natureza, animais selvagens, nazistas, traições e o famoso resgate da mocinha no alto de um castelo. Um amontoado de clichês, mas que acaba por funcionar por tratar-se justamente daquilo que o público gosta.

    Texto de autoria de David Matheus Nunes.

    iron man noir

  • Crítica | Chinatown

    Crítica | Chinatown

    8FItRq1pNPeni9FkDYUug7YhfggLançado no meio dos anos 70, Chinatown aproveitou a contracultura que revolucionou o cinema norte-americano e inseriu a marca de autor baseada em um realismo dramático dentro do gênero noir, que havia estacionado no cinema clássico hollywoodiano dos anos 40 e 50.

    Na Los Angeles de 1937, um detetive particular é contratado por uma mulher para investigar a traição que esta sofre do marido, mas descobre que foi enganado quando a verdadeira esposa aparece, revelando uma conspiração na Companhia de Água da cidade.

    O ótimo roteiro de Robert Towne aproveitou fatos verídicos e conseguiu criar uma ambientação diferente de um filme noir mantendo as características do gênero. O interessante do argumento são os elementos noir que variam dos filmes clássicos: a investigação de J.J. Gittes (Jack Nicholson) vai desenrolando uma trama simples até revelar um complexo sistema de corrupção; a falsa mulher fatal que inicia o filme também foi outra marca interessante do autor; os motivos que movem o protagonista são mais sólidos, como ser enganado e virar piada no seu meio de trabalho; os perigos que ele enfrenta são reais, já que está mexendo com a máfia que existe em uma grande empresa como a Companhia de Águas.

    A direção de Roman Polanski conduz com habilidade e destreza o bom roteiro de Towne, desde a escolha dos enquadramentos, passando pela boa direção de atores, até a ótima mise-en-scene. Enfim, Polanski é um maestro que mantém a ótima direção que o havia revelado para o mundo no clássico O Bebê de Rosemary seis anos antes.

    A atuação de Nicholson é um dos pontos altos do filme. O ator consegue compor o detetive com passado obscuro, de moral duvidosa, que tem sentimentos contraditórios quanto a Evelyn, a ótima Faye Dunaway que dá vida a mulher fatal, objeto de desejo do protagonista. Roman Polanski faz uma rápida aparição como o Homem Com Uma Faca. Destaca-se também a participação do ator e diretor John Houston (que, talvez com Humphrey Bogart, seja um dos maiores expoentes dos filmes noir).

    A boa fotografia naturalista de John A. Alonzo mantém os tons alaranjados e amarelos do filme, características dos filmes rodados em Los Angeles que focam muito a fotografia de deserto. Ela se sobressai nas cenas com Dunaway. A edição de Sam O’Steen, além de ser invisível, mantém o filme com um bom ritmo. Ela se destaca nas cenas de ação, como a da perseguição de carro na fazenda e sempre que os dois protagonistas se encontram.

    A direção de arte de W. Stewart Campbell, aliado à composição de cenário e locação de Ruby R. Levitt e ao figurino de Anthea Sylbert, ambientou de forma muito competente os anos 30 de Los Angeles.

    Chinatown vale a pena por ser o tipo de filme que transcende não só o gênero noir, mas também a preferência dos amantes do cinema norte-americano dos anos 70. O tipo de clássico obrigatório para quem aprecia a sétima arte.

    Texto de autoria de Pablo Grilo.

  • Resenha | Sangue na Lua – James Ellroy

    Resenha | Sangue na Lua – James Ellroy

    James Ellroy - Sangue na Lua - Blood on The MoonJames Ellroy estava em início de carreira quando lançou seu terceiro romance, Sangue na Lua, com o detetive Lloyd “Crazy” Hopkings. A partir deste romance, o autor cresce literariamente, modificando estruturas narrativas e moldando o estilo até atingir um primeiro ponto sublime em Dália Negra, que impulsionaria sua carreira destacada pelos romances policiais noir.

    No prefácio assinado pela autor na edição da Record, pertencente a Coleção Negra, Ellroy menciona a composição de sua narrativa contrapondo-a a outra lançada um ano depois: Dragão Vermelho, de Thomas Harris. O escritor pontua suas impressões sobre este romance e assume as falhas de sua história perante uma que considera superior na construção de personagens e no paralelo entre assassino e policial. Um espanto que lhe impulsionou a escrever dois outros romances com o detetive Hopkings para tentar lapidar a personagem e aproximá-la da complexidade de Will Graham de Harris. Demonstrando assim, nas entrelinhas, a formação de seu romance ainda que ironicamente Harris teria somente este livro e O Silêncio dos Inocentes como obras-primas em sua carreira, narrativas forte o suficiente para gerar um impacto em outros autores.

    Em Sangue na Lua, o detetive Hopkings investiga o violento homicídio de uma mulher quando descobre diversos casos antigos que poderiam compor a carreira de um serial killer. Transformando a investigação em uma obsessão que destrói sua família e põe em risco sua vida, o detetive à beira de um colapso tem um objetivo claro: deter o matador e descobrir sua identidade.

    É possível observarmos o embrião da prosa do autor em formação. O estilo narrativo seco equilibrado com bonitas metáforas poéticas que realizam brutais descrições belas. O domínio em desenvolver personagens conflitantes é notável, ainda que a investigação seja um tanto precária devido a sua condução inserida no tradicional estilo do escritor, que desenvolve sempre três atos em suas tramas focando, em momentos anteriores ao ato central, a investigação em si, e o desenlace após a conclusão da investigação. Sendo assim, há uma construção anterior da personagem central para que se compreenda sua psicologia, bem como uma estrutura que fundamenta as motivações do assassino.

    Embora tente criar uma efetiva contraposição entre policial e assassino, o estilo e o desenvolvimento do ambiente e as tensões da época se destacam com mais vivacidade, retratando uma dualidade presente em seus romances posteriores com homens da lei vivendo à margem da lei, tanto por atos escusos quanto pelo desamparo em serviço. Quando o embate chega ao ápice, o autor conduz a ação com qualidade, principalmente devido ao seu estilo narrativo capaz de decompor frases comuns ao gênero, como descrições de assassinatos e mortes, com uma poética peculiar que causa choque no leitor, pela leveza momentânea de entregar frases com detalhes grotescos.

    Além de uma obsessão comum em investigações fictícias, o detetive Hopkins apresenta as características tradicionais de muitos policiais personagens vivendo com retidão no trabalho mas apresentando deslizes em vícios, além do detrimento familiar. Sua índole tempestuosa se destaca mas foge de qualquer personificação diferenciada como Ellroy afirma em texto que acompanha a contracapa da edição. Ainda assim, a leitura de sua obra inicial é interessante como material comparativo de uma vertente a qual não demonstra o mesmo fôlego do que aquela que o consagrou.

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    Time Magazine
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  • Resenha | Demolidor Noir

    Resenha | Demolidor Noir

    Demolidor - Noir - Capa

    Dando prosseguimento à coleção Noir da Marvel, na qual heróis da Casa das Ideias são inseridos em um contexto policial, o escritor Alexander C. Irvine e os artistas Tomm Coker e Daniel Freedman apresentam a versão do herói da Cozinha do Inferno, Demolidor, em sombras, realismo, mulheres fatais situados no período da Lei Seca americana.

    Nesta série, a estética noir é delimitada como uma narrativa composta por parâmetros específicos como regras institucionais necessárias para a trama. Apesar do aparente esvaziamento para adequar personagens em uma roupagem diferente, o noir é um estilo rico dentro do gênero policial. O desenvolvimento da história importa menos do que a construção das personagens. Uma inversão em relação às investigações de enigma em que o crime era tão importante quanto o detetive.

    A maioria dos roteiros da série preenche uma lista simples do que deve ou não conter um noir para adequá-lo ao estilo. Porém, é difícil retrabalhar personagens para inseri-los em outros contextos sem deslocá-los completamente das características originais. No caso de Demolidor, um personagem urbano que há muito tempo dialoga com uma estética realista e crua, não há uma grande recriação e, por consequência, um impacto menor em diversificar o herói.

    Matt Murdock mantém a parceria com Foggy Nelson, mas se torna um investigador informal da Cozinha do Inverno. Um vigilante que perdeu a visão quando seu pai boxeador foi assassinado e reaprendeu a utilizar seus outros sentidos, incluindo uma passagem na infância por um circo da cidade. O roteiro enfoca a mudança que a cegueira trouxe ao garoto, destacando com dubiedade as novas percepções apuradas. Ao mesmo tempo que Murdock se torna mais atento ao mundo a sua volta e conquista vantagens naturais sobre outras pessoas, sua habilidade lhe impede momentos de tranquilidade e solidão.

    Iniciada in media res – estilo de narrativa que começa no meio da história –, a trama mostra o herói invadindo a casa de Wilson Fisk para um embate. Fisk e Murdock dialogam e estabelecem a origem que promoveu este encontro. Na Cozinha do Inferno, um novo assassino começa a assassinar capangas rivais de Fisk, e Demolidor investiga tais acontecimentos. Ao mesmo tempo, uma mulher misteriosa pede apoio a Foggy e Murdock por seu envolvimento com um mafioso local.

    A narrativa de Irvine se sustenta bem com um bom personagem central narrador da história. Porém, nada acrescenta ao personagem urbano, nem mesmo em relação a reflexões metafísicas sobre sua condição. Fosse uma trama sem nenhum herói, talvez seria mais funcional. A maior diferença entre o protagonista original e esta versão é deixar a inferência de que Murdock escolheu formas definitivas de diminuir a corrupção do local ao matar os vilões. Porém, o próprio roteirista afirma que essa percepção foi deixada em aberto para interpretação de cada leitor. Dois grandes personagens, Elektra e Mercenário, foram transformados em um só na figura da femme fatale Eliza. Uma mulher que desde o primeiro encontro deixa Matthew apaixonado, mesmo que em nenhum momento da história se estabeleça alguma cena de afeição entre ambos.

    A composição inicial e o desfecho da série realizam um bom recorte que representa a continuidade da luta do herói contra a corrupção do local. Mas dentro de um projeto cuja temática é a releitura narrativa, a história falha por não conseguir ir além da excelente representação tradicional, modificando pouco de suas estruturas, como se preenchendo os requisitos mencionados apenas para se adequar ao contexto.

    Especialmente para a edição nacional, Irvine escreveu um prefácio exclusivo, presente na publicação da Panini Comics. O quadrinho mantém o padrão das edições anteriores, com capa dura e um preço acessível, e ainda contém uma breve entrevista com o desenhista e as diversas capas originais.

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     Demolidor Noir - Destaque 2

  • Resenha | A Rica Indecente (Vertigo Crime)

    Resenha | A Rica Indecente (Vertigo Crime)

    A Rica Indecente - Azzarello

    A fantasia de Richard Junkin começa por seu passado, um tempo somente citado pela memória história de Brian Azzarello. O clima noir é cortado pela narração em primeira pessoa, exibindo luxúria e desgosto pela atual rotina, distante demais dos tempos áureos de quando o personagem tinha uma promissora carreira esportiva a queimar.

    A chegada ao local de trabalho é melancólica. Segue-se uma reprimenda que o afasta das imagens sexuais e o faz retornar ao seu lugar de direito, como um capacho, péssimo vendedor que era. Seu patrão Helm Soeffer pede para que ele se exiba para um possível cliente, um fã ávido por futebol americano que narra as marcas e recordes que ele tinha no desporto, esmagando sua moral em virtude do seu presente. O joelho, peça quebrada em sua equação, é tão esfolado e esmigalhado quanto sua alma, quebrada, sem uso, somente funcional para a sustentação de um homem que tão cedo já se vê como um alguém decadente, que vê na esbórnia um modo de aplacar sua depressão.

    A cercania de Junk é formada por indivíduos medíocres e sem planos muito elaborados além das banais vendas de carros para suburbanos. Isso faz com que o protagonista piore sua perspectiva de existência, afirmando que a vida parece não lhe reservar mais qualquer coisa. A propensão para o suicídio parece querer saltar de seus lábios antes mesmo do chamado à aventura. Após quase ser demitido, Junk tem mais uma chance de se redimir, sendo designado para um inglório serviço: cuidar da mimada (e boêmia) Vicki, que mais frequenta as páginas de coluna social do que qualquer outra roda de conversa, o que claramente atrapalha as vendas da concessionária.

    A missão de Junkie é a de evitar que Vicki seja matéria da imprensa e para que ela não se meta em apuros ou indiscrições. As ordens dadas por seu pai exibem as baixas expectativas do personagem em relação a uma mudança de comportamento da garota. Ao frequentar a primeira das baladas de Vickie, o encarregado esbarra em algo que odeia; todo aquele cenário repleto de subcelebridades e personagens presentes em colunas de fofoca exalavam futilidade e vazio, e eram exatamente da parte informativa do jornal que ele propositalmente ignorava, ainda que não pudesse negar o conhecimento da identidade de algumas delas. De todas as socialites, Victoria se destacava por ser herdeira do maior negócio de carros do nordeste estadunidense, e também por sua persona.

    A mulher fatal acumula o papel como alvo da proteção do anti-herói. A principal tentação aos olhos e tato de Junkie dentro de sua jornada é a moça, que teima em praticar suas indiscrições e ainda se exibir a ele, mostrando seus dotes que se distanciam da figura de menina pintada por seu pai. Os encantos da moça excedem o arquétipo de ninfeta e de presa sexual para apresentar uma manipulação mental atroz em que se reúnem o senso de proteção e o desejo por sua carne, como se ambas as sensações fossem sinônimas, o que acaba saindo do campo de ideias para invadir a realidade.

    O desenho de Victor Santos consegue exibir a violência de modo simples e bastante gráfico. O realismo do asfalto é bem enquadrado, permitindo ao leitor uma imersão quase impenetrável.

    Uma gangorra de emoções, Junkie dá vazão ao seu desejo, servindo aquela a quem deveria proteger em instâncias bem maiores que sua obrigação contratual. A vontade em prosseguir usufruindo do corpo da moça o embevece, deixando-o cego ante os desejos de Victória e perdendo o critério ao vê-la ferida. Mesmo os seus instintos básicos eram enganados. Os atos finais mostram o papel subalterno que ele escolheu para si, evidenciando uma ilusão travestida de auto-engano. O engodo interno criado para que a sensação de rejeição e certeza de estar sendo usado caracteriza-se por sensações aplacadas numa tentativa pobre e fracassada de fechar os olhos para realidade, inventando uma nova para si mesmo.

  • Resenha | Wolverine Noir

    Resenha | Wolverine Noir

    Chegou às bancas mais um lançamento do selo Marvel Noir. Depois de Homem-Aranha, X-Men e Homem de Ferro, a editora Panini traz agora ao Brasil a reinterpretação sombria do mutante mais famoso e casca-grossa dos quadrinhos. Wolverine Noir tem roteiros de Stuart Moore e desenhos de C.P. Smith e, ainda que tenha seus problemas, traz uma aventura que parece ter se encaixado melhor do que seus antecessores na proposta da linha.

    Enquanto os autores das citadas histórias concentraram-se em transpor os elementos de cada herói para a estética noir (entre acertos e equívocos), aqui temos uma trama verdadeiramente desse gênero, na qual a presença de Wolverine e de seus coadjuvantes parece mera coincidência. Para isso, o roteiro parte dos clichês mais monumentais do estilo: Jim Logan é um detetive particular, sentado na escuridão de seu escritório tendo pensamentos melancólicos sobre esta droga de mundo e querendo matar seu parceiro, o grandalhão simplório chamado Cão. Quase dá pra ouvir sua narração com uma trilha de jazz ao fundo e sentir o cheiro da fumaça. Eis então que surge a femme fatale Mariko Yashida, que vai arrastar Logan para um caso em que as coisas definitivamente não são o que parecem.

    A partir daí, a história se divide entre duas linhas temporais. Enquanto o presente incorpora diversos elementos das passagens de Wolverine no Japão, temos flashbacks de alguns anos antes que são uma adaptação fiel e bastante interessante da minissérie Origem. James é mostrado como um tímido filho de um pastor cujo tema preferido para sermões é o conflito do homem com seus instintos bestiais. Quem conhece um mínimo de Wolverine já imagina o quanto isso afeta o caráter do jovem James, consumido por uma sede de violência que não compreende, além de desejos pouco puros pela bela ruiva Rose. Ele aprende a controlar seus impulsos com as lições do jardineiro Smitty, que o instrui na técnica e filosofia dos samurais. Mas a presença de Cão desencadeia uma tragédia.

    A opção por contar duas histórias em uma tem um resultado ambíguo. O passado acaba engolindo o presente, torna-se mais interessante. Embora isso possibilite um bom desenvolvimento do personagem Logan e do conflito interno que o move (ou o impede de se mover na vida), a trama no presente se torna rápida e apressada demais no espaço que lhe é dedicado. Não há uma investigação aprofundada, um grande trabalho detetivesco. As coisas simplesmente acontecem e pronto, com direito inclusive a sub-aproveitamento do vilão Creed (pra quem não sabe, o Dentes de Sabre, arqui-inimigo do herói) e do inusitado plot de ninjas agindo na New York dos anos 1930.

    Pode-se dizer que temos um conto noir no lugar de um romance, algo não necessariamente ruim, mas que poderia ter rendido mais. Vale ressaltar, porém, que a fidelidade à proposta é mantida com louvor: o tom é pessimista e profundamente amargo do início ao fim. Sobre a arte, houve uma certa inconstância. Alguns momentos são brilhantes dentro dos já citados clichês, ao trabalhar muito bem luz e sombra (ou sombra e sombra), focando apenas nas silhuetas. Mas em outros o artista apresenta um traço “sujo” burocrático, chegado a ser feio e com anatomias questionáveis. Reflexo talvez da variação do próprio roteiro. No saldo final, Wolverine Noir não é uma obra magnífica, mas tem qualidades que a fazem merecer ser lida.

    Texto de autoria de Jackson Good.

  • Resenha | Fell: Cidade Selvagem

    Resenha | Fell: Cidade Selvagem

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    Fell é uma daquelas HQs com uma premissa simples mas muito bem desenvolvida. Também pudera, os responsáveis por ela são ninguém menos que Warren Ellis e Ben Templesmith, dois talentos incontestáveis em suas respectivas áreas.

    Ellis se tornou um dos grandes escritores e hoje em dia figura ao lado de grandes nomes do gênero como Alan Moore Neil Gaiman. Sua engenhosidade emparelha-se as suas bizarrices. Independente do trabalho que seja responsável, o autor sempre tende a revolucionar o universo que escreve, e por onde passou, deixa uma série de fãs, amantes de seu trabalho.

    Em Cidade Selvagem (Fell, no original), Ellis cria um misto de trama noir com terror psicológico  bem desenvolvido. Os desenhos de Templesmith, habituado a desenhar história de Terror como 30 Dias de Noite, têm papel fundamental na obra casando perfeitamente com o objetivo final da história.

    Após um incidente que envolve seu parceiro, Richard Fell é transferido para Snowtown, uma cidade sombria, suja e violenta, onde até mesmo seus habitantes aceitam resignados sua decadência. A trama foca o dia a dia do policial indo fundo na putrefação da cidade, confrontando seus receios e compreendendo melhor seus habitantes, uma escória variada como psicopatas, suicidas e pedófilos. A cada dia observamos sua paranoia crescer mais e mais.  A cidade corrompe a todos como uma droga, porém, Sem nenhum estase. Sugando os habitantes com sua opressão e subtraindo deles a sanidade.

    As histórias de Cidade Selvagem são fechadas, trazendo em cada volume uma trama distinta com início, meio e fim. Também merece destaque o fato de que cada história tem menos de 20 páginas. O autor quis lançá-las dessa forma para vender cada edição por um preço menor (lá fora cada edição foi vendida por $1,99). Mesmo com poucas páginas, o material tem boa qualidade e a narrativa de Ellis e a arte de Ben são sensacionais.

    Recomendado para aqueles que gostam de uma boa história policial que vai na contramão dos clichês das grandes editoras e também pela grande iniciativa dos autores de colocar um material com essa proposta disponível por um preço tão baixo no exterior.

    Compre: Fell.