Crítica | Além da Vida
Proposta bastante diferente dentro da sua costumeira filmografia, Além da Vida simboliza o flerte com uma vertente temática espiritual pouco abordada em geral no circuito mainstream de cinema, escolhida por Clint Eastwood por conter em seu argumento uma história curiosa e tocante. Após ambientar o público na rotina de um casal de estrangeiros em terras asiáticas, as cenas que abusam de CGI mostram o desastre natural tsunami assolando a costa, fazendo vítimas fatais, dentre elas Márie (Cécile de France), que miraculosamente sobrevive após ter contato com o post mortem.
O roteiro de Peter Morgan compreende outros personagens que igualmente tiveram – ou têm – experiências com o outro lado da vida, ou com o que comumente é chamado de outra dimensão. O núcleo de análise se estende até George (Matt Damon), um homem que desde muito moço tem contatos com espíritos, e que no passado foi diagnosticado como esquizofrênico. O texto toma bastante cuidado em ambientar seu público em situações que, se não atingem o real, ao menos soam plausíveis e palatáveis, o que facilita a imersão para muito além do espectador já afeito ao tema.
O que soa problemático são os atalhos textuais, como o uso excessivo do arquétipo de “orelha”, utilizado na personagem da bela Bryce Dallas Howard, Melanie, que basicamente serve para gerar empatia, além de funcionar como possível par romântico do personagem masculino, mas acúmulo de funções pesa, especialmente ao verificar a falta de profundidade da personagem, que é basicamente uma mulher encantadora que faz aulas de gastronomia e gostaria de se comunicar com entes queridos já falecidos.
O método de contar uma história sob vários olhares faz perder também um bocado da força do filme ao invés de produzir uma sensação de tomada do inconsciente coletivo, como era a intenção de Morgan e Eastwood.
Não há apologia ao espiritismo, ao menos não em nível liminar, tampouco os contatos são feitos de maneira escrachada. Há um excessivo cuidado por tratar cada pessoa, que conhece esse fenômeno, como seres humanos comuns, com frustrações e rotinas iguais, focando em sensações de solidão, comuns não só aos que são encarados como ” aberrações ” crédulas, como também a qualquer ente que viva normativamente.
A atmosfera agridoce algumas vezes funciona, em outras tantas não, já que com ela vem uma sensação de desimportância que não combina com qualquer premissa, ainda mais com uma que tenta levar a sério algo comumente relacionado a chacota, como o diálogo com o além. No entanto, Além da Vida, mesmo com todos os pontos positivos aventados dentro do argumento, resulta em um filme morno, que não se destaca sequer por planos mais elaborados por seu diretor, e também por não se destacar em matéria de simplicidade narrativa, esquemática demais até em comparação com outros filmes do cineasta.
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