Resenha | Hellblazer: O Capote do Diabo
Hellblazer e o seu protagonista, o mago inglês John Constantine, podem ser vistos como uma das chaves do sucesso da linha Vertigo, selo adulto da DC Comics. Com histórias que abordavam o tema do ocultismo, junto a uma visão de uma sociedade bastante corrompida e um protagonista carismático a sua maneira (os termos filho da puta e moralmente incorreto seriam mais precisos), tivemos uma série de grandes escritores e artistas durante todo o período de sua publicação até a sua recente incorporação ao universo dos Novos 52 da DC.
A última fase antes dessa incorporação coube ao competente escritor Peter Milligan, mas que não entendeu bem a proposta do mago inglês e de todo o seu mundo. Em O Capote do Diabo temos o famoso sobretudo de Constantine (peça de roupa tão atrelada ao personagem que só é menos característica do que o hábito de fumar do personagem) roubado pela sua sobrinha e vendido em um site qualquer de negociações pela internet como uma forma de vingança em relação ao seu tio. Isso tudo pareceria normal mas vamos dizer que o capote do mago inglês resolver imitar o “um anel” dos livros de J. R.R. Tolkien.
Isso mesmo, devido a estar presente em todas as grandes aventuras e negociações demoníacas de Constantine, a peça de roupa passou a ser um tipo de entidade também, com vontade própria. Apesar de velho e sujo seduzia pessoas a usá-lo e os manipulava para fazer maldades ou ressaltar o seu lado mais sombrio. Em outras palavras, o “um anel”.
A ideia em si não é de toda ruim. A própria condução da narrativa faz com que tenhamos um conto diferente do habitual para o personagem, que tem na sua peça de roupa favorita o seu principal antagonista. Junte a isso os intermináveis problemas familiares do personagem, com o adendo de que Contantine é casado com a filha de um mafioso a esta altura de sua cronologia, e temos uma boa história, nada mais do que isso, e muito longe das narrativas clássicas e ácidas do personagem.
No encadernado brasileiro ainda há outro pequeno arco, Outra Estação no Inferno, no qual novamente o tema é a relação de Constantine com a sua família e o inferno, especificamente como ele tenta resolver os problemas entre sua sobrinha, a sua irmã no inferno e um gêmeo maligno que possui (sim, teve isso!).
Nesse segundo arco, Milligan mostra toda a sua inabilidade de lidar com a personagem e o seu universo, que sempre teve na magia e no ocultismo o seu tema principal, mas de forma discreta e sutil. Constantine jamais foi mago de efeitos pirotécnicos e de mexer as mãos e fazer as coisas acontecerem imediatamente. Há claramente uma má interpretação do autor em relação à forma como a magia funciona no universo de Hellblazer. Junte a isso que ir para o inferno e voltar para Constantine funciona quase como um passeio no parque, do tipo “vou ali dar uma volta e já já estou em casa novamente”. Vamos dizer que houve uma banalização desse tipo de situação. Enfim, uma história fraca e que pouco contribui para a já lendária carreira do mago inglês.
A arte de Giuseppe Camuncolli e Stefano Landini, que não chega a ser tão ruim, também não contribui para salvar a HQ. Têm destaque, porém, algumas artes de capa de Simon Bisley que são apresentadas no interior da revista.
Uma HQ simplesmente normal, sem nada de mais, que pode agradar aos fãs que sofrem com o mago no universo dos Novos 52, mas a qual se distancia dos grandes arcos e histórias mais antigas.
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Texto de autoria de Douglas Biagio Puglia.