Resenha | Como Você Pode Rir de Uma Coisa Dessas
Evocando a sujeira e despeito emocional, o autor islandês Hugleikur Dagsson remonta eventos cotidianos sob uma ótica ácida e completamente diversa do que se entende por politicamente correto. Como Você Pode Rir de Uma Coisa Dessas, lançado pela editora Veneta, é um pequeno compilado de tirinhas, que ataca todos os setores sociais, religiosos, econômicos e raciais.
As ofensas proferidas não escolhem ou protegem nichos, desferindo asco, azedume e impropérios para variados estereótipos. O ódio é destilado e distribuído como o sentimento universal, ao contrário da quantidade exorbitante de poemas e músicas que propagam o amor e ternura. A misantropia é a sensação que impera nas dezenas de quadrinhos humorísticos, que brinca com dilacerações, mutilações e piadas referenciando o nazismo, por exemplo.
Sensações como arrependimento e remorso não abarcam a obra. Em detrimento disto impera xenofobia, conceitos de anti-família – paterna e fraterna principalmente – e piadas com deficientes em geral. Apesar do (alto) teor vergonhoso, o conteúdo das tirinhas faz rir na maioria dos momentos, por não ter qualquer pudor em chocar seu leitor, o que nos faz perguntar se suas gags humorísticas funcionam por serem de fato eficazes enquanto piadas, ou apenas choque pelo choque, superando assim a forma em detrimento do conteúdo.
O processo de compreensão textual é demorado, graças aos soluços e dificuldade de ler as pequenas tiras e digerir todo o ódio acumulado nas páginas. Os limites transgredidos em canibalismo, incesto e assassinato servem para mostrar a podridão da alma humana, vivida no lodo da primitividade e do riso constrangido pelos tabus sociais, mostrando que certamente há mais que se desvelar em matéria de limites do bom senso e urdição do riso. Ainda que os escritos do islandês não sectarize guetos ou contingentes raciais, fazendo qualquer ser humano como alvo de suas indiscretas adjetivações e deboche, como a representação do ideal que seria a vida sem a falsidade típica da vida adulta.
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