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  • Resenha | Sherlock Holmes: Um Estudo em Vermelho – Arthur Conan Doyle

    Resenha | Sherlock Holmes: Um Estudo em Vermelho – Arthur Conan Doyle

    É fato que Sherlock Holmes, criação máxima de Arthur Conan Doyle no séc. XIX, consagrou-se há muito como um dos personagens mais populares e interessantes da literatura ocidental. Não apenas graças a seu clássico bordão (“Elementar, meu caro Watson!”) e seu inigualável faro detetivesco, Doyle conseguiu a incrível façanha de tornar sua figura icônica, tipicamente londrina e vitoriana, o sinônimo real do próprio gênero que se encaixa perfeitamente bem, e ajudou a aprimorar com suas aventuras. Afinal, as histórias policiais, cheias de reviravoltas e pistas soltas compondo um quadro (aparentemente) não solucionável nunca mais seriam as mesmas. Não após Holmes e seu fiel escudeiro saírem as ruas com suas lupas, cachimbos e um fiel poder de dedução que a dupla sempre expressa, em cada um de seus já famosos contos clássicos, em um quase sem-número de romances de Doyle. Este é como tudo começou.

    E da forma mais natural, possível, já que Holmes e Sherlock aceitam dividir o mesmo apartamento numa Londres sombria, em pleno ano de 1878. Narrado em primeira pessoa pelo próprio John Watson, o homenzinho que cai de balão nas peripécias de Holmes, Watson estava apenas a procura de moradia para realizar um curso na área de medicina, no que lhe é avisado por um conhecido sobre uma possível oferta. Assim, testemunhamos em Um Estudo em Vermelho o primeiro encontro desta dupla, além de sua primeira interação sobre ideias díspares, e assuntos um tanto exóticos, mas banais para a mente ardilosa de Holmes. Através das palavras de seu companheiro, notamos que, na absoluta consequência de se morar com um perito em investigação e que sabe tudo (e mais um pouco) sobre criminologia, anatomia humana e química, Watson se vê às voltas com as teorias de seu novo amigo, e quando percebe, ambos já estão diante do crime mais bem elaborado que a polícia Londrina já teve acesso.

    Na mais normal das casas, um cadáver jaz com a mais assombrosa das impressões, enquanto vestígios do sangrento e violento crime tentam tornar tudo muito mais complicado do que parece. Neste misterioso cenário de morte urbana, repleto de pistas falsas e desinformação para os assassinatos que sempre explodem numa cidade grande, Sherlock Holmes ganha as oportunidades perfeitas para provar para Watson, tão admirado pela sua ciência da dedução quanto nós, seus leitores, e a todos os seus aliados da polícia que contam com ele para averiguar os suspeitos, tudo o que o torna o melhor e mais astuto detetive que uma trama literária pode se dar ao luxo de ter. Esse é um dos personagens que simplesmente não cansamos de seguir, conhecer seus pontos fortes e fracos, seus triunfos e contradições, e nos deliciar em suas aventuras, percebendo inclusive que nem toda teoria é perfeita, e até os mais inteligentes erram quando outra inteligência tão afiada quanto trabalha contra a primeira.

    Na condução frenética de uma história arquitetada, ponto a ponto, afim de nos amarrar cada vez mais forte a seus detalhes, e seus grandes acontecimentos sempre envolvendo a dupla principal, em sua incessante caçada aos culpados pelo crime que se mostra mais custoso do que Sherlock julga num primeiro momento, o mestre Arthur Conan Doyle dá vez a um estilo próprio de grande requinte na prosa, e extremamente hipnótico de se focar sobretudo no desenrolar dos fatos, como se tudo fosse um motivo para uma nova perspectiva sobre um caso que, muitas vezes, parece ser indecifrável. A publicação no Brasil pela editora Zahar ainda conta com espetaculares e educativas notas sobre os detalhes originais de Um Estudo em Vermelho, enriquecendo ainda mais o contexto da história, suas influências e pormenores, além de setenta pequenas ilustrações originais a potencializar, agora visualmente, o rico e fascinante universo de Watson, Sherlock e seu violino, o amado instrumento que conjurava o milagre de relaxar uma mente tão ativa, e labiríntica. Em suma: uma joia essencial para qualquer estante.

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  • Resenha | Sherlock Holmes: O Cão dos Baskervilles – Arthur Conan Doyle

    Resenha | Sherlock Holmes: O Cão dos Baskervilles – Arthur Conan Doyle

    Publicada originalmente em 1902, O Cão dos Baskervilles é uma das mais conhecidas histórias do famosíssimo detetive criado por Sir Arthur Conan Doyle. Dentre as várias versões, traduções e até adaptações para outras mídias, esta resenha vai tratar da edição da Editora Melhoramentos, que conta com tradução de Antonio Carlos Vilela.

    A trama mescla um mistério aparentemente sobrenatural com o habitual suspense investigativo das aventuras de Sherlock Holmes. A família Baskerville convive há séculos com uma fama de azarada, proveniente da lenda envolvendo um terrível cão demoníaco que persegue seus membros. Lenda esta que volta à tona quando Charles Baskerville morre sob estranhas circunstâncias, e tudo indica que seu sobrinho e herdeiro esteja em perigo. Entram em cena Holmes e o fiel Dr. Watson, aplicando os métodos racionais de observação e dedução num cenário que desafia a razão.

    Complicado avaliar uma obra tão marcante e influente no seu gênero. Talvez O Cão dos Baskervilles compartilhe do problema de muitos clássicos, que, dependendo do momento em que são consumidos, tem muito pouco a surpreender quem já está familiarizado com o estilo. Outra possibilidade é que esta edição em si, nitidamente voltada ao público infanto-juvenil, tenha simplificado (ou até resumido) demais a linguagem e a história em si.

    O fato é que o livro se revelou burocrático, raso e pouco estimulante. A maior parte da trama é apresentada em relatórios resumidos e reflexivos de Watson (que narra em primeira pessoa). Ou então em diálogos calmos e especulativos entre os personagens. Ação, movimentação, senso de urgência ou de TEMPO PRESENTE praticamente inexistem. Tudo acontece de forma rápida, personagens surgem e cumprem seu papel tão imediatamente que não há tempo nem para se ter qualquer dúvida a respeito deles. A intenção (se é que existia) de instigar o leitor, criar uma atmosfera inquietante e misteriosa, falha miseravelmente.

    Para completar o desagrado da experiência, o livro apresenta algumas ilustrações que passam perto da vergonha alheia. A impressão é que imprimiram por engano os esboços não finalizados de um adolescente que mal começou a aprender a desenhar. Como aspectos positivos, infelizmente só é possível citar a fluidez da linguagem e o fato do livro ser curto (152 páginas). Até mesmo a célebre genialidade de Sherlock não consegue despertar um mínimo de diversão, devido ao modo frio e tedioso com o qual a resolução acontece.

    Texto de autoria de Jackson Good.

  • Resenha | Detective Conan

    Resenha | Detective Conan

    Jovem prodígio, filho de escritor de romances policiais, é conhecido por seu brilhante poder dedutivo e de observação. Chamado algumas vezes para ajudar a polícia a solucionar alguns casos de assassinatos, este é Shinichi Kudo. Certa vez, levado pela sua curiosidade, ele investiga um ato suspeito de dois homens de preto e é emboscado. Na emboscada, dão a ele um veneno que supostamente iria matá-lo, mas na verdade apenas faz com que ele fique parecendo um garoto de 7 anos.

    Essa é a premissa básica de Detective Conan – ou Case Closed, como é conhecido nos EUA -, mangá de Gosho Aoyama. Com isso, ele leva a história de Shinichi se passando por uma criança de 7 anos, que ele nomeou de Conan Edogawa (nome baseado em Arthur Conan Doyle), na casa de sua melhor amiga Ran Mouri, por quem é apaixonado. Ele conta com a ajuda do Dr. Agasa, cientista inventor que tenta descobrir como reverter o veneno. O pai de Ran, Kogoro Mouri, é um detetive, o que vem a ser muito útil para a história.

    O estilo da história é algo meio que seriado, um caso por vez, geralmente durando cerca de 10 capítulos. Na maioria das vezes os casos são de assassinatos, sendo sempre desvendados por Conan, que quando vai contar o que/como descobriu usa um invento que modifica sua voz para parecer a de alguém mais velho que está desacordado no momento, geralmente Kogoro.

    Este estilo é bom no inicio, mas tende a cansar conforme passa o tempo; chega a ser enfadonho você passar de caso a caso e nunca mudar nada, sempre retornando ao mesmo ponto. Há poucos momentos de excitação: são os capítulos que ele usa para investigar a tal Black Organization (nessa hora todos estão pensando em criminosos com afro na cabeça), que foi quem o transformou em criança. Pois é nesses capítulos que esperamos um avanço na história. Só que esses são BEM RAROS, deixando a maioria com casos de assassinatos e, assim, um mangá chato (o que me fez largar o mangá, e olha que eu sou uma pessoa bem resistente nesse quesito, vi os 10 episódios de The Cape, Heroes até o final e afins…).

    Outros pontos divertidos são quando ele encontra seu “rival” em termos de habilidades de detetive, Heiji Hattori, e eles ficam disputando. Também quando aparece o Phantom Thief Kid, que é um ladrão que Shinichi tenta pegar e falha. Esses são outros bons momentos na história, mas um pouco raros.

    Outra coisa que contribui muito para a história ser cansativa é o famoso “assassinato do quarto fechado”, um gênero raro de assassinato onde a pessoa é morta num local trancado por dentro. O primeiro você acha legal, é algo novo, mas isso acaba se tornando algo tão comum que você se pergunta como pode ser chamado de raro se todo mundo consegue bolar um.

    O traço é bem comum, nada de extraordinário, não atrapalha nem ajuda. Não é rico em detalhes, mas não deixa a desejar. Num mangá com a premissa deste, que seria a de detetive, se esperava que o principal não fosse o traço, e sim os casos.

    Detective Conan é um mangá divertido no início, mas tende a cansar conforme você o lê. É antigo, então tem muitos capítulos até você chegar ao que está saindo atualmente, e isso é mais um ponto de desânimo. Mas faz um tremendo sucesso no Japão e alguns casos são realmente interessantes, já aprendi várias novas maneiras de matar alguém e tentar despistar a perícia. Eu larguei mas pretendo voltar, um dia. Quem quiser ler vá por conta e risco.

    Texto de autoria de André Kirano.

  • Resenha | Sherlock Time

    Resenha | Sherlock Time

    Sherlock Time é um quadrinho argentino lançado originalmente na Hora Cero Extra e Hora Cero Semanal em 1958. Lançando no Brasil pela editora Comix Zone, esse é o primeiro trabalho da parceria pelo roteirista Hector G. Oesterheld de O Eternauta e seu companheiro em tantos outros trabalhos, Alberto Breccia no lápis. A historia se baseia em tramas de mistério, com leves pitadas de ficção científica bem imaginativa, uma aventura escapista que reúne elementos de investigação e de literatura pulp e policial.

    A primeira parte desta publicação vem no formato magazine, na vertical e na segunda parte em widescreen. Dado que o quadrinho tem capa dura, ler a parte final é um pouco incômodo, mas obviamente a qualidade do material compensa esse inconveniente. As historias são curtas, introduzem seus dois personagens centrais de maneira gradual, primeiro com Julio Luna, o narrador da historia que acaba de comprar uma casa grande, por um preço barato, sem saber que ela guarda um grande mistério. Além dele, também surge o estranho e misterioso Sherlock Time, que aparece primeiro de maneira invasiva, para aos poucos se mostrar um sujeito cordial e amistoso.

    Breccia trabalha bem demais o preto e as sombras, fortalecendo bastante a aura de mistério. A reunião de elementos góticos e de terror faz não só as historias soarem mais interessantes e inventivas, mas também ajuda a compor o caráter do personagem-título. É curioso como o roteiro torna os personagens tridimensionais mesmo que o foco seja nos causos detetivescos e nas explicações ao final que, por sua vez, emulam as historias de Arthur Conan Doyle com seu Sherlock original.

    Em comum, as historias tem a sua duração sempre com dramas curtos e diretos, terminando com as conclusões inteligentes do detetive. Aos poucos, Sherlock Time deixa de ser uma novidade, passando então a aceitar trabalhos contratados como investigador, e as histórias podem ser de investigações diversas ou somente de viagens mentais que se tornam maiores do que a realidade, em que o pensamento livre se confundem com o tangível.

    Oesterheld e Breccia brincam com a metalinguagem fugindo do óbvio, sem falar diretamente com seu leitor, e mesmo em sua simplicidade sobra criatividade. Seus personagens são tangíveis inclusive por suas imperfeições, e mesmo condições que seriam atreladas a defeitos, se tornam adjetivos positivos, como o modo como Time encara teorias da conspiração, ufologia, e vida inteligente fora do planeta.

    As reclamações de que tais personagens são rasos não se justifica, pois a preciosidade da história se deve ao fato de ser episódica, dando vazão as boas ideias dos autores, com um quê de maravilhoso que seria ainda mais desenvolvido no trabalho posterior deles, Mort Cinder. A arte pincelada de Breccia fica muito bonita em um tamanho grande, como nessa edição. A maior parte das edições argentinas tem um tamanho menor e nesse formato tudo é muito mais pungente.

    As diferenças de tratamento e personalidade entre Luna e Time é muito charmosa, desde a origem estranha do detetive que, muito marcante, até o caráter pacato do dono da mansão antiga. O conceito de cosmonave, a possibilidade do investigador misterioso ser de outro planeta ou estrangeiro e sua sabedoria de um mundo tão primário, além dos cenários em em um país de terceiro mundo, temperam bem o prato servido em Sherlock Time. Uma pérola dos quadrinhos de aventura.

  • Crítica | O Nome da Rosa

    Crítica | O Nome da Rosa

    Poucas adaptações cinematográficas de romances literários podem se dizer tão elogiadas e tomadas como referência como foi a de O Nome da Rosa, de Jean-Jacques Annaud, que traduz em tela o material homônimo de Umberto Eco. A primeira cena do filme se dá em meio a uma tela preta, acompanhada de palavras sagradas em uma oração em forma de reza. Logo depois, somos apresentados a William de Baskerville e Adso Van Melk, personagens de Sean Connery e Christian Slater, recém-chegados a um mosteiro ao norte da Itália.

    Antes mesmo de revelar o motivo da chegada dos franciscanos se percebe nos hábitos e falas do homem mais velho um método de dedução e lógica acurados, com semelhanças gigantescas a Sherlock Holmes para além da referência óbvia em seu nome (homenagem ao romance de Arthur Conan Doyle, O Cão dos Baskerville). A motivação se dá graças a venda de parte das riquezas da igreja católica, mas forças externas parecem ir na direção de proibir tal conclave.

    As diferenças entre Adso e William são enormes, enquanto um tem toda uma vida de descobertas para explorar, o outro é descrente vendo o homem bastante distante do Divino, como se a entrega para o sacerdócio tirasse sua inocência e sua capacidade de crer indiscutivelmente na onipresença de Deus, não por conta de inabilidade do ser supremo, e sim pela sujeira inerente aos homens. A observação sobre os rumos da humanidade e o estudo das sagradas escrituras são uma boa possibilidade para explicar tal desencanto.

    A estrutura de narração do velho Melk também contém elementos da literatura de Conan Doyle, em uma emulação do modo que John Watson descrevia os feitos do detetive, inclusive com a mesma admiração entre pupilo e mentor. A vazão ao olhar sem esperança de Baskerville o faz enxergar que a natureza humana se distancia da santidade, mesmo aos que se dedicam aos estudos de Cristo. O modo como a história lida com a libertinagem e as pulsões sexuais, seja dos detentos do mosteiro ou seu aluno são provas do quanto tudo isso faz parte do comportamento normativo do homem. Curiosamente, William não opina sobre nenhuma delas, como se estivesse à frente desse tipo de julgamento moralista.

    O ingresso do desafeto de Baskerville na trama, o inquisidor Bernardo Gui (F. Murray Abraham), faz entender um bocado da falta de esperança do velho protagonista. As torturas, perseguições e a desnecessária demonização de eventos humanos são uma boa mostra da incredulidade dele na boa ação dos homens e sua falta de piedade com a raça. A aura de mistério e acusação ganham força com o decorrer do filme, isso é fortalecido não só pelo roteiro e pela construção de atmosfera organizadas pelo departamento de arte e fotografia, mas também pelos atores. Connery, Slater e Abraham fazem papéis importantes cuja dedicação é total para que o espectador entenda o intuito da história.

    O Nome da Rosa é o resultado de uma análise bem pragmática da condição humana, com uma valorização dos homens cultos e estudiosos, possuindo muitas camadas em si, desde a mais superficial delas como um mero filme de suspense e investigação, até a desconstrução de estereótipos e arquétipos não só ligado à religião, mas também as sociedades (modernas e antigas). Resulta em uma ode a um passado mais simples, porém mais violento, abrilhantada por uma presença forte e carismática de Connery e seus colegas do grande teatro britânico.

    https://www.youtube.com/watch?v=zeB8fWh4X-s

  • Crítica | Enola Holmes

    Crítica | Enola Holmes

    Parte da mitologia que Arthur Conan Doyle empregou no seu personagem mais famoso Sherlock Holmes mora na fraternidade dele com Mycroft, o talentoso e inteligente primogênito, que segundo teorias, trabalharia para o serviço e inteligência britânica. A curiosidade sobre a natureza deste irmão sempre causou furor nos leitores da Strand Magazine. Segundo o filme de Harry Bradbeer, os dois teriam uma irmã de dezesseis anos, a bela e jovem Enola Holmes, executada aqui pela atriz em ascensão Millie Bobby Brown, a mesma que brilhou em Stranger Things.

    Já nas primeiras falas há uma quebra da quarta parede, com a personagem-título narrando sua  história, diferente de Sherlock que tinha sempre John Watson para explicar os seus feitos em forma de literatura. Enola é uma menina esperta e audaz, desde cedo incentivada por sua mãe Eudoria (Helena Bonham Carter), buscava por aventuras e não conseguia se encaixar dentro do conservadorismo relegado as mulheres na Era Vitoriana.

    O mote da história é bem simples, a matriarca Holmes desaparece, e a menina é enviada para buscar seus irmãos, que se assustam com sua falta de modos e comportamento rebelde. Como bons filhos de seu tempo, eles decidem enviá-la a uma escola de etiqueta. De fato, a misoginia era uma característica muito vista no Detetive dentro dos contos e novelas de Doyle, e por mais que não se cite é natural imaginar que Mycroft também compartilhasse dessa ideia.

    A versão que Henry Cavill e Sam Caflin fazem são retratos tão próximos da realidade e pragmatismo que não há qualquer traço de heroísmo neles, Cavill mesmo lembra pouco o personagem, tanto na escrita quanto nas versões em carne e osso. O roteiro se baseia no livro de Nancy Springer, O Caso do Marquês Desaparecido e de fato no material original essa personalidade e o apreço pela irmã são melhor trabalhados, ainda assim se nota a frieza e crueza do personagem. Talvez fosse preciso um ator com mais capacidade dramática para lidar com um papel tão complexo.

    Bradbeer pega emprestado alguns elementos da série que dirigiu (Fleabag), como por exemplo, o modo mais incisivo de metalinguagem e a coincidência óbvia do protagonismo feminino. Os predicados positivos da direção param por aí. A trama de mistério envolvendo o personagem que Enola conhece no meio do filme é bem menos interessante que o jogo que sua mãe estabeleceu consigo, e a edição super moderna ajuda a deixar o filme como algo genérico, até em comparação com o estilístico Sherlock Holmes e sua continuação Sherlock Holmes: O Jogo das Sombras, ambos de Guy Ritchie.

    A jornada de emancipação de Enola ganha contornos épicos graças a Millie Bobby Brown, que se dedica bastante ao papel, e que apesar do forçado sotaque britânico, consegue representar uma jovem audaz e que não se encaixa no conservadorismo de seu tempo. Possivelmente, sua história renderia ainda mais elogios se não fosse atrelada a um ícone pop e literário como é Sherlock, mas dentre as combalidas adaptações recentes do personagem, essa não é tão problemática, mesmo com o pouco apego ao material original.

  • Resenha | Assassinatos na Rua Morgue e Outras Histórias – Edgar Allan Poe

    Resenha | Assassinatos na Rua Morgue e Outras Histórias – Edgar Allan Poe

    Como a própria contracapa diz, não fosse Edgar Allan Poe é possível que não tivéssemos toda uma gama de histórias e autores de mistério que o sucederam. Arthur Conan Doyle, Agatha Christie e muitos outros foram influenciados pelo estilo e pelas histórias criadas pelo autor ao longo de sua vida. É interessante ver que até mesmo personagens foram influenciados, tal como Sherlock Holmes é claramente inspirados em August Dupin, detetive que é o protagonista do conto “Assassinatos na Rua Morgue”, história que dá título ao livro e é a grande cereja do bolo aqui.

    A edição de bolso da editora L&PM Pocket reúne seis histórias de Allan Poe: “O Demônio da Perversidade”, “Hop-Frog e os oito Orangotangos acorrentados”, “Os fatos que envolveram o caso do Mr. Valdemar”, “O Gato Preto”, “Nunca aposte sua cabeça com o diabo” e “Assassinatos na Rua Morgue”. A escolha da editora é interessante, pois os contos, ainda que carregados de suspense e mistério, não são tão semelhantes quanto possa parecer. As histórias tratam de diversos temas, desde uma jornada filosófica sobre os instintos e os motivos que podem fazer com que uma pessoa cometa um crime (O Demônio da Perversidade), quanto uma história de um homem que se encontra à beira da morte e aceita se submeter à hipnose para continuar a viver até que uma cura para sua grave doença possa ser encontrada (Os fatos que envolveram o caso do Mr. Valdemar), história essa que flerta com o sobrenatural e o fantástico.

    É notório que ao longo de toda sua biografia e obra, o autor se especializou em retratar o lado negro da humanidade. Os contos presentes no livro não são diferentes. Durante todo o tempo, o leitor é colocado de frente com personagens insanos, autodestrutivos, melancólicos ou completamente desprovidos de qualquer bússola moral. Porém, ainda que de forma rápida, é muito bacana a forma como o autor consegue dar o estofo necessário para cada um deles, sem deixar cair no lugar comum ou mesmo no maniqueísmo de apontar quem é certo e quem é errado.

    Novamente, ainda que seja uma edição de bolso que contenha um número reduzido de contos em relação a outras edições, Assassinatos da Rua Morgue e Outras Histórias é uma ótima opção para quem deseja se iniciar no universo das histórias de Poe, pois a seleção de contos é muito boa. Além de proporcionar uma grande leitura, ainda que breve, faz com o que o leitor fique sempre querendo ler mais.

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  • Crítica | Entre Facas e Segredos

    Crítica | Entre Facas e Segredos

    Entre Facas e Segredos, novo filme do diretor Rian Johnsonn já começa dramático e um pouco sensacionalista, mostrando Christopher Plummer sangrando, com uma faca/punhal na mão tal qual o movimento suicida comum. Ele é Harlan Thrombey patriarca de sua família e escritor famoso, tão bem sucedido que seus filhos e netos tem uma boa vida muito graças ao seu trabalho e a fortuna decorrente da venda de seus livros e as pouco mais de duas horas de filme investigam os rumos dos últimos momentos do sujeito.

    Não há muita demora em mostrar flashbacks, de como era a rotina de Harlan, tanto com sua cuidadora Marta Cabrera (Ana de Armas), uma descendente de paraguaios que tem receio de ter sua mãe deportada, até sua relação com seus netos e filhos. O elenco é recheado de atores conhecidos, bons e/ou carismáticos, mas a realidade é que o filme é muito mais que apenas uma boa demonstração de um bom elenco.

    Os cenários, fotografia e figurinos fazem lembrar tipos de filme bem distintos. As cores muito vivas fazem lembrar as produções antigas da Hammer, ainda que a obra de Johnson seja atual, a atmosfera de mistério faz lembrar um Noir colorido enquanto as curvas do roteiro de Johnson lembram demais o jogo de tabuleiro Detetive/Clue (isso é inclusive é dito por um dos personagens), mas as reviravoltas só fazem sentido graças a dois fatores principais: Daniel Craig, que faz o engraçadíssimo detetive particular Benoit Blanc, e claro, a ingênua e sincera Marta, que apresenta um papel dramático para de Armas que vai muito além da beleza ímpar que ela tem e que sempre foi explorada para resultar em uma jovem sonhadora, prestativa e que tem dificuldades severas em mentir.

    A tensão e o suspense são enormes no filme, e por incrível que pareça o desempenho de Chris Evans é soberbo, mesmo que ele seja um ator limitado. Os momentos em que ele interage com Plummer são de uma qualidade enorme, que fazem lembrar um esquema teatral shakespeariano, assim como todas as discussões familiares envolvendo Michael Shannon, Toni Collette e Jamie Lee Curtis também fazem muito sentido, e produzem no espectador um misto de riso solto com lamentação pela enorme vergonha alheia que essas pessoas protagonizam, tanto na questão de serem pessoas do mesmo sangue se digladiando pelos espólios da herança, como a ganancia misturada com egoísmo que decorre após a leitura do testamento de Harlan.

    O fato de ter tantos mistérios e reviravoltas faz desse Entre Facas e Segredos uma historia que lembra demais as tramas de Arthur Conan Doyle, Agatha Christie e Ian Fleming, com o melhor das tramas rocambolescas desses três autores, com pitadas de drama familiar de Nelson Rodrigues (excluindo daí claro o fato incesto, muito presente nos rodriguianos), mas algo que faz desse um diferencial é a leveza cômica com que é levado, apesar de tratar de temas pesados como homicídios, brigas familiares e desespero financeiro, tudo é ridiculamente hilário e escandalosamente divertido.

    Rian Johnson dividiu opiniões em seu Os Últimos Jedi, bastante injustiçado diga-se já que o filme além de corajoso ainda é dramaticamente bem encaixado, mas mesmo os que torceram o nariz para os rumos que ele escolheu para a saga de George Lucas deverão se sentir abrasados e entretidos por esse, excluindo claro alguns fãs acéfalos de Star Wars. Este é um produto bem diferente de tudo que ele já havia feito, uma obra que valoriza o cinema de mistério que não deixa nada a desejar para as historias de Holmes e Watson que Basil Rathbone protagonizava, misturando esse estilo com as paródias de Mel Brooks e Gene Wilder, conseguindo em seu final ainda alfinetar os extremistas de direita dos Estados Unidos e a burguesia e elite cafona do país, desdenhando deles e mostrando o quanto são frágeis sem o aporte financeiro que eles normalmente tem. Entre Facas e Segredos é um pequeno espetáculo, que emula tão bem os moldes teatrais que faz toda a torpe jornada parecer uma opereta, é divertido, direto e bem engraçado.

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  • Os Dinossauros e o Cinema – Parte 3

    Os Dinossauros e o Cinema – Parte 3

    Dando continuidade a nossa série de textos sobre os dinossauros no audiovisual, em 1991 estreou Família Dinossauro, que retratava a história de Dino, seus três filhos, esposa e sogra, além de seu emprego maçante, que só exerce para ter como pagar suas contas, onde basicamente recebe para desmatar uma floresta. A comédia mostra os dinossauros como seres inteligentes antes dos humanos, e como os homens depredam tudo, inclusive levando a existência para algo que em breve deve se findar. A série contou com 43 episódios, e foi criada por Michael Jacobs e Bob Young, em parceria da Disney com a The Jim Henson Company. Seu fim é discutido até hoje, por conta do cunho ecológico e o denuncismo existente.

    Em 1993, tudo mudou com a chegada do clássico moderno de Steven Spielberg: Jurassic Park: O Parque dos Dinossauros. Nos primeiros minutos do filme é mostrado um dinossauro comendo um dos funcionários do parque, deixando claro que apesar de ser voltado para crianças, ainda existe elementos de terror no longa. Na adaptação, há um enfoque em Alan Grant (Sam Neil), e não em Ian Malcolm (Jeff Goldblum) como no livro de Michael Crichton. Ao tocar o tema musical de John Williams é impossível ficar indiferente, da mesma forma que ocorre com a primeira cena em que o brontossauro aparece.

    A continuação, também baseada em um livro de Michael CrichtonO Mundo Perdido: Jurassic Park começa na Ilha Sorna, chamado de Sítio B. Os dinossauros deveriam ter morrido, por conta da necessidade de lisina, a que foram acometidos quando criados, mas sobreviveram. Hammond (Richard Attenborough) convoca Malcolm, para liderar uma equipe que fotografará a ação dos dinossauros, provando que eles estão vivos, basicamente para pedir ajuda governamental na preservação do local, já que até a sua empresa, a Ingen, está prestes a ser retirada do seu poder. Malcolm se recusa, e acusa John de ter mudado de capitalista para ambientalista em 4 anos, no entanto, acaba mudando de ideia ao saber que sua namorada Sarah (Julianne Moore) está na Ilha.

    A primeira cena do filme mostra um incidente com uma garotinha, a filha de um magnata, e essa situação foi usada para tirar o velho Hammond do comando de sua empresa, os investidores mandaram um grupo de caça, e a partir daí o filme ganha uma licença poética para se tornar um épico de ação, com mais cenas de chuva (como o primeiro), ações com o filhote de tiranossauro e sequências maravilhosas. Por mais que o filme tenha deixado de ser fantasioso  para os núcleos familiares, esse é um roteiro que fala de clã e da necessidade de se sentir pertencente a um grupo.

    O Mundo Perdido: Jurassic Park, de 1997, dirigido por Steven Spielberg

    A robótica Stan Winston garantiu mais cenas com os T-Rex em detalhes grandiosos, e o final que emula o romance de Arthur Conan Doyle é sensacional. É lamentável a recepção ruim que boa parte do público teve com este filme, na verdade ele lembra bastante o exercício que James Cameron fez com duas continuações que comandou, Aliens e O Exterminador do Futuro 2, mudando de Terror para Ação em ambos. Aqui obviamente que se mudou de outros gêneros, de fantasia e aventura para uma ação mais frenética, e ainda contém momentos bastante épicos, diferente demais do que aconteceria em Jurassic Park 3, comandada por Joe Johnston, lançado em 2001.

    A história se passa na mesma Ilha Sorna, e Alan Grant (Sam Neil) volta, enganado por dois empresários. Talvez o maior problema seja a mudança do antagonismo principal, já que o Espinossauro apesar de ser maior e mais agressivo, claramente não tem o mesmo carisma do outro dinossauro, e esse “erro” foi de certa forma repetido em Jurassic World: O Mundo dos Dinossauros, ainda que ali tenha sido melhor explorado. Ainda assim, o filme de Johnston tem seus momentos. A tensão é bem construída e fora as piadinhas com os personagens que contratam Grant, é divertido acompanhar o protagonista do primeiro filme novamente.

    Ainda em 1993, Steven Spielberg produziu um longa animado, através da Amblin Entertainment, Os Dinossauros Estão de Volta, uma animação divertida sobre quatro dinossauros que viajam pelo tempo e fazem amizade com duas crianças, que mais tarde, tentam ajuda-los eles a fugirem para o seu lugar de origem. A animação é comandada por Dick ZondagRalph ZondagPhil NibbelinkSimon Wells e cada um deles esteve envolvidos em obras seminais, desde Balto e Fievel, até o filme da Disney Dinossauro. O longa explora o lado lúdico dos Dinossauros, tornando as figuras de Jurassic Park algo mais próximo do universo infantil.

    O filme que tenta traduzir o jogo Super Mario Bros também tem dinossauros. A premissa inclusive trata disso, mostrando que o meteoro que teria matado os dinossauros, na verdade divide a realidade em duas, e Koopa (ou Bowser) vivido por Dennis Hooper tenta raptar a princesa de sua dimensão, Daisy (Samantha Mathis), que seria a chave para unir os dois mundos. Daisy é arqueóloga, o que a faz se aproximar da ideia dos dinossauros. Na realidade onde Koopa vive, os dinossauros evoluem para humanos, e o mundo é desolado, um deserto que só tem uma cidade grande, que é Koopa City, onde o vilão é o soberano. O boneco que faz o Yoshi é até bem feito, e foi executado antes de Jurassic Park, e ele até usa a língua, como nos jogos, mas a transformação do inimigo em T-Rex é risível, e claramente é uma vergonha para todo elenco ter participado desse filme, inclusive para Bob Hoskins e John Leguizamo, que fazem Mario e Luigi.

    Em 1993, Annabel Jankel e Rocky Morton dirigiram a terrível adaptação Super Mario Bros

    A partir de 1993, houve uma trilogia produzida por Roger Corman, chamada de Carnossauro, em que basicamente se mostrava uma figura reptliana que ao consumir carne ia crescendo com o tempo. Em 1995, Louis Morneau dirigiu a continuação, Carnossauro 2. Esta versão tem 82 minutos, e demora-se demais para finalmente aparecer o tal vilão, com mais de meia hora decorrido de filme, sendo esse uma figura parecida com um velociraptor terrivelmente mal feito. Esse segundo capítulo é monótono, com praticamente um cenário fechado que tenta reunir diversos clichês. Há um tiranossauro que aparece no final, basicamente para relembrar a proximidade dessa saga com Jurassic Park.

    Somente em Carnossauro 3, ou Criaturas do Terror como foi chamado no Brasil, existe uma explicação melhor de como funcionam os carnossauros, que emulam características de algumas espécies do animal. Esse terceiro longa é basicamente igual aos anteriores, só estava lá para tentar angariar pessoas que queriam mais aventuras como as de Spielberg. O curioso é a que a trilogia foi concluída em dezembro de 1996, antes mesmo do lançamento de O Mundo Perdido: Jurassic Park, em maio de 1997.

    Em 1994, levando em conta o sucesso não só de Jurassic Park mas também de Família Addams (1992), foi realizado Os Flintstones: O Filme, com um elenco repleto de astros e bons atores. A adaptação do desenho clássico de 1960 ocorreu em uma parceria entre a Amblin e a Hanna-Barbera e o escolhido para a tarefa de direção foi Brian Levant. A história começa com o plano maligno de um homem ganancioso, e logo depois mostra-se uma cena que faz lembrar a abertura clássica, com o apito da pedreira tocando e Fred (John Goodman) descendo e encontrando seu amigo Barney (Rick Moranis). A primeira cena do filme mostra um brontossauro trabalhando. Nesse momento é claramente um robô que faz a cena, mas quando se trata de mostrar o pet da família, Dino, sua realização é toda por  computação gráfica, e os efeitos são quase perfeitos, aliás toda a atmosfera que Levant traz é muito condizente com a do seriado animado, desde as gags visuais, até a amizade inabalável de Fred e Barney.

    O começo do filme, as caracterizações e sacadas são muito boas, mas a ideia central do roteiro e o final carecem de uma qualidade maior, semelhante ao resto, mas ainda assim é um filme bem digno, em especial se comparado a outras animações baseadas em desenhos, ainda que Dino merecesse um pouco mais de participação na trama, como era no desenho. Em 2000, lançaram Os Flintstones em Viva Rock Vegas, que é uma continuação/prequel também conduzida por Levant, e que não leva praticamente ninguém do elenco original, exceto um ou outro figurante, e apesar de tudo, não chega a ser um filme terrível, embora perverta boa parte dos bons conceitos do filme anterior, em especial no Barney de Stephen Baldwin, que é um imbecil.

    Cena de Os Flintstones: O Filme, de 1994, adaptação de Brian Levant do desenho animado da Hanna-Barbera

    Já em 1995, Jonathan Betuel dirigiu Meu Parceiro é um Dinossauro, e na trama mostra um futuro alternativo, onde dinossauros foram recriados por engenharia genética, e vivem com os humanos. A policial Katie Coltrane (Whoopi Goldberg) ganha um novo companheiro, chamado Theodore. O visual dos animais pré-históricos lembram muito o utilizado em Família Dinossauro, mas o filme em si tem quase nenhuma graça. Isso foi em 1995, em 1999 mais uma vez O Mundo Perdido foi adaptado, agora para a televisão. Durou três temporadas, tendo mais de sessenta episódios. Os efeitos evidentemente deixavam a desejar, mas era uma diversão juvenil descompromissada, em especial para as crianças brasileiras que assistiam na Record. Obviamente que tinha um certo apelo sexual, em especial com a personagem Veronica (Jennifer O’Dell), que parecia um Tarzan feminina, sempre de biquíni de tanga.

    1998 foi a vez do telefilme Gargantua, sobre uma ilha na Polinésia, onde ocorrem atividades sísmicas estranhas, incluindo diversos afogamentos, que alegam ser obra de uma espécie de anfíbio, aparentemente, de tamanho gigante. As criaturas se assemelham demais a dinossauros, mas são mostrados com efeitos visuais terríveis, e o filme não passa de uma Sessão da Tarde terrivelmente mal pensada.

    Em 2000, a Disney lançou Dinossauro, uma animação divertida e aventuresca, com um caráter muito parecido com o de Rei Leão. Lançado para TV, Dinotopia é uma minissérie conduzida por Michal Bramblia, o mesmo diretor de O Demolidor filme com Sly e Wesley Snipes. Na trama, conhecemos a história de dois irmãos que viajam com seu pai e acabam parando em um lugar estranho, onde homens e dinossauros vivem em harmonia e parceria. O especial tenta ser lúdico, mas tem uma história enfadonha e que causa bastante sono em quem a acompanhou, passava aqui no Brasil no SBT e contém um elenco cheio de rostos conhecidos, como David  Thewlis, Colin Salmon, Jim Carter, Wentworth Miller, Geraldine Chaplin e outros, mas tanto o elenco quanto os dinossauros são bem sub-aproveitados, já que não há quase conflito nenhum e o discurso excessivamente politicamente correto também faz todo o drama em volta da minissérie desimportante.

    Dinotopia, minissérie de 2002, que propunha uma sociedade onde humanos e dinossauros conviviam pacificamente

    Como parte dos filmes e séries mais recentes, pode-se destacar o terrível O Som do Trovão, um longa dirigido por Peter Hyams. A história é baseada levemente em um conto de Ray Bradbury, mas sua execução é ruim em um nível inaceitável. Uma empresa presta serviços de viagem no tempo a quem pode pagar muito, levando os endinheirados ao passado para matar um dinossauro que já morreria sem interferência dos mesmos, o problema é que essas viagens tem de ocorrer muito protocolarmente, sem alteração nenhuma, se não todo o futuro mudará.

    A ideia, apesar de um pouco absurda, não é de todo mal, mas a execução… a maior parte dos cenários parece ter sido retirada de um show de horrores, se assemelhando demais as fitas de ficção cientifica da Asylum ou do canal Syfy, e o filme de 2005 ainda possui um elenco recheado de atores que em breve estariam em alta ou que já estiveram, como Ben Kingsley, David Oyelowo, Catherine McCormack, Corey Johnson. Ainda assim, o maior enfoque parece mesmo o de fazer um dos efeitos de computação gráfica mais mal feitos da história recente do cinema. Sequer o dinossauro que aparece é risível e não causa espécie em quem está vendo, completamente esquecível.

    Em 2008, houve uma outra versão do livro de Jules Verne, Viagem ao Centro da Terra: O Filme é conduzido por Eric Brevig, mostrando o (na época) astro Brendan Fraser vivendo o cientista malfadado Trevor Anderson, tentando provar suas teorias. Já aparecem dinossauros no início do filme, em uma espécie de epilogo, antes mesmo da ação começar, mostrando o que aconteceu a Max (Jean Michel Paré), irmão do personagem principal, que desapareceu. A vida do sujeito é bagunçada e ele recebe a visita de seu sobrinho, Sean (Josh Hutcherson),e ele vem junto com uma caixa de pertences do pai de Sean.

    O livro de Verne existe no universo do filme, ou seja, serve de inspiração para os personagens, além de obviamente ser baseado no romance. As anotações em uma cópia barata do livro os levam a um novo paradeiro, decidindo viajar até os pontos do mundo onde a pesquisa dele levou. Há todo um grupo de fãs do escritor que acreditam que o que o autor falava era realidade. As cenas de computação gráfica usada nos dinossauros são fraquíssimas, em especial, envolvendo um T-Rex, o que é no mínimo lamentável. Em 2012 houve uma continuação, Viagem 2: A Ilha Misteriosa, em que se mudou o diretor e Fraser foi trocado The Rock, mas esse não possui dinossauros, e é baseado em outra obra de Verne.

    Em A Era do Gelo 3, ainda sob a tutela do diretor Carlos Saldanha, Sid, Diego e Manny se deparam com seres que aparentemente já estariam extintos. Lançado em 2009, o filme era ainda um exemplar decente da franquia, antes de se tornar totalmente desprezível. O longa mostra a preguiça encontrando três ovos, que se revelam ser de tiranossauro. O mamute inclusive cita que os T-Rex deveriam estar extintos, mas há um vale onde os dinossauros vivem em paz e isolados. O problema seria dali para frente, onde até a suspensão de descrença ultrapassaria seus limites.

    A Era do Gelo 3 (2009), de Carlos Saldanha, introduziu dinossauros na franquia

    Ainda em 2009, como parte da tentativa de fazer filmes remakes de séries famosas, Brad Silberling conduziu O Elo Perdido, tendo Will Ferrell no papel principal. O filme pega emprestado a mitologia do seriado para ser mais um show de Ferrell, e apesar de fazer muita piada com os clichês do programa, é extremamente reverencial, e repleto de piadas que desconstroem o conservadorismo típico das comédias típicas dos anos 1990/2000. Seu final é um pouco complicado, e o filme não deu o retorno esperado ao estúdio, mas é bem mais que um filme bobo. Bastante subestimado, na verdade.

    Caminhando com Dinossauros foi um filme em 3D de 2013, dirigido por Barry Cook e Neil Nightingale. Ele conta com uma introdução mostrando humanos chegando a um lugar esmo, para logo depois mostrar animais falantes, que recontam histórias com dinossauros do período cretáceo, que são obviamente dublados, contendo voz de famosos como Leguizamo e Justin Long. O filme é baseado num programa de TV que fez sucesso, e tem um tom lúdico, mas não fez muito sucesso além do público infantil. Visualmente o filme é interessante, mas a historia é boba e superficial, sem grandes atrativos para o público mais velho.

    Assim também é o filme da Pixar O Bom Dinossauro, de Peter Sohn. A história acompanha o frágil Arlo, um pequeno filhote de apatossauro que vive com a sua família, que por sua vez, cultiva uma fazenda de leguminosas. Nessa realidade, o asteróide que teria acertado a Terra desviou do planeta, dessa forma homens e dinossauros coexistiram. Apesar de lidar com sentimentos de perda e orfandade, em comparação com outros filmes da Pixar, o longa é fraco, rivalizando com Carros, suas sequências e Procurando Dory, como produto menos elogiável.

    Jurassic World: O Mundo dos Dinossauros deu um novo fôlego para a franquia e para a exposição dos dinossauros no cinema, e apesar de não ter sido um primor de história, ajudou a tornar o assunto popular novamente. Nesse meio tempo, a Asylum e outras companhias semelhantes fizeram diversos filmes de baixo orçamento com dinos. Um pior que o outro. Depois de Jurassic World, de Colin Trevorrow, a continuação que J.A. Bayona trouxe, em Jurassic World: O Reino Ameaçado ajuda a resgatar um tipo de cinema como os das matinês, onde o espectador ia ávido por assistir filmes onde o escapismo imperava e os personagens eram afortunados unicamente por terem uma existência capaz lidar com acontecimentos grandiosos, que fogem do ordinário, e tudo por conta do encontro com criaturas de proporções dantescas, o mesmo fascínio que encantou Doyle, Burroughs, Crichton, O’Brien e Spielberg, além é claro do espectador, que certamente age como as crianças que encontraram o brontossauro na árvore, no clássico Jurassic Park, se encantando com as criaturas que já reinaram sobre a Terra.

    Leia: Parte 1 | Parte 2.

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  • Os Dinossauros e o Cinema – Parte 1

    Os Dinossauros e o Cinema – Parte 1

    O passado sempre fascinou a raça humana, e boa parte da arte que o homem faz remete a esse tempo que jaz inalcançável, e parte dessa obsessão explica um dos temas mais comuns no cinema de aventura, ação, e até horror, que normalmente lota salas de cinema ao redor do mundo. Desde muito antes de Steven Spielberg trabalhar em Jurassic Park: O Parque dos Dinossauros e O Mundo Perdido: Jurassic Park, já haviam outras tantas obras que tratavam do tema, algumas com mais conhecimento, outras com menos.

    Obviamente, deixarei de lado a franquia japonesa Gojira/Godzilla, pois ela merece uma análise própria, e trata mais de atomic horror do que o fascínio pelas criaturas que um dia tomaram o topo da cadeia alimentar pelo planeta. O primeiro filme digno de nota é em preto e branco, mudo e de curta duração, em torno de 12 minutos, chamado Gertie: O DinossauroWinsor McCay dá luz a obra, misturando um estilo que já lhe era comum, que é a animação em cenas com atores reais, onde um grupo de homens discutem em um museu, e em determinado ponto, aparece a animação que mostra Gertie, uma animal que faz lembrar o dinossauro hoje conhecido como Brontossauro vivendo seus dias, com participações de outros seres de períodos mais antigos, ainda que não haja preocupação com pesquisa histórica, até porque este é um filme lúdico e escapista somente, uma comédia leve que visava mostrar a capacidade de McCay em animar.

    Gertie: O Dinossauro, de Winsor McCay (1914)

    Há outras obras da época do cinema mudo, em especial onde Willis H. O’Brien está envolvido como The Dinosaur and the Missing Link: A Prehistoric Tragedy que foi lançado pelos estúdio de Thomas Edison em 1917. Ele mostra um homem das cavernas tentando agradar uma fêmea, e no meio dessa tentativa, se depara com um dinossauro, que o atrapalha. É bem curto, tem um tom de comédia ainda mais acentuado que Gertie, mas a passagem pelo animal antigo é bem rápida. Ainda em 1917, Prehistoric Poultry brinca com as semelhanças entra galinhas e dinossauros, é bem curtinho e mostra uma figura muito semelhante à ave que serve de alimento ao homem agindo na época antiga, conceito esse reutilizado mais seriamente em filmes nos anos noventa. Nesse mesmo ano, também foi exibido R.F.D., 10000 B.C. mostrando um carteiro que lida com um dinossauro como meio de transporte. Em 1919 o mesmo diretor faria The Ghost of Slumber Mountain, mostra um sujeito que através de um conto descrito aos seus sobrinhos, se volta ao tempo dos dinossauros. Esse é mais extenso, ao menos a cópia disponível para visualização, mas ainda não tão primorosa. Houve um projeto chamado Creation, que seria lançado em 1931, mas foi cancelado, sobrando apenas esboços do que deveria ter sido o longa-metragem definitivo de O’Brien, mas que jamais viu a luz do dia.

    Em 1925 chegava aos cinemas um dos maiores filmes sobre o tema, O Mundo Perdido, baseado na obra de Arthur Conan Doyle, conhecido criador do detetive Sherlock Holmes. Esta obra deu origem a outras adaptações, até fora do cinema, e mais para frente nos debruçaremos sobre algumas delas. A obra original se perdeu com o tempo e depois de um intenso trabalho de resgate de oito gravações diferentes, se chegou a versão mais comumente encontrada no mercado, de 93 minutos. A visão que Doyle e o diretor Harry O. Hoyt tem da Amazônia é completamente estereotipada, e comum a sua época, visto que o mundo era um lugar pouco explorado e conhecido como se tornou nesse quase um século que separa a atualidade e o filme em questão. O livro foi lançado em 1912, e nessa versão o único lugar onde teriam essas criaturas fantásticas era um platô da bacia amazônica. Em meio ao desbravar da ilha, os pesquisadores vêem uma luta que seria (ou a menos tentaria, dadas as limitações da época) épica, entre dois animais pré históricos gigantes, sendo ao menos um deles um Alossauro, um dino que lembra bastante o Tiranossauro Rex, e que mata o seu adversário facilmente, quebrando seu pescoço e deixando ele caído, ou seja, sua predação é pura e simplesmente porque ele pode matar as outras criaturas, e não por fome. Logo depois ele ataca um triceratopes.

    O grupo que viaja para a Amazônia consegue retornar, e ainda leva um brontossauro para Londres, desfecho esse bem semelhante ao visto em King Kong, de 1933, inclusive com a fuga da criatura monstruosa, embora nesta versão não seja mostrado isso, e sim contado através de texto. No entanto, a demonstração do dinossauro nas ruas inglesas é feita de maneira expositiva, com a criatura andando pelas ruas e atacando as pessoas hostis. O modo como ela escapa é curioso, e seria catastrófico, uma vez que a ponte de Londres cai e ele é empurrado pela correnteza em uma direção desconhecida. O longa não dá um destino definido para a criatura, ao contrário, prefere se dedicar a mostrar o destino romântico dos personagens humanos, em detrimento de mostrar a recepção de Londres ao seu novo “habitante”.

    Além do já citado King KongFantasia, clássico de animação que mistura música orquestrada com curtas animados de Walt Disney também traz referências aos monstros pré-históricos, ainda em 1940. Seu segmento The Rite of Spring, baseado em uma composição de Igor Stravinsky, mostra o planeta em meio a uma galáxia imensa, tendo a formação de seus rochedos, oceanos e primeiras formas de vida, desde as microscópicas até as marinhas. As cores lembram aquarelas pintadas e esse sem dúvida é um dos momentos mais bonitos de todo o longa-metragem, inclusive quando são mostrados os dinossauros.

    Fantasia, cena do segmento “Rite of Spring”, de Bill Roberts e Paul Satterfield (1940)

    Ainda em 1940, O Despertar do Mundo era lançado, contando a história de um grupo de aventureiros entrando em uma caverna, onde um paleontólogo começa a contar uma história que supostamente aconteceu entre homens primitivos que disputavam territórios. O longa erroneamente coloca na mesma linha temporal o homem pré-histórico junto dos dinossauros. Essa versão de Hal RoachHal Roach Jr. seria revisitada anos depois, pela produtora inglesa Hammer.

    Demora a aparecer um dos répteis gigantes, e quando surge, é bastante anti-climático, já que ele se disfarça atrás de plantas que dificultam sua visualização. Mais à frente, usam-se animais para emular os bichos pré-históricos, com iguanas fazendo às vezes de animais carnívoros, bem como tatus com  chifres artificiais, fingindo ser triceratopes, e ainda, jacarés fantasiados.

    Em 1951, Sam Newfield conduziu o filme Continente Perdido, sobre um grupo de cientistas que realizam provas com foguetes na Nova Guiné, e um desses foguetes acabam sumindo durante um desses testes. Já que o item é caro, o governo envia um piloto experiente para liderar uma expedição em busca do veículo. O filme é em preto e branco e em determinado ponto passa a ter coloração verde. Os efeitos das feras antigas são feitos em stop motion e dentro de sua limitações, funcionam bem, mas ainda assim a participação dos dinossauros é pequena, se tornando meros coadjuvantes para as subtramas bobas dos humanos.

    Em 1953, baseado em um texto do escritor Ray Bradbury, The Fog Horn, foi lançado O Monstro do Mar (The Beast from 20,000 Fathoms) tem efeitos técnicos assinados por Ray Harryhausen e conta em seu elenco com Lee Van Cleef, que ficaria famosos anos depois por trabalhar em filmes como Por Uns Dólares a Mais, Três Homens em Conflito e O Homem que Matou o Facínora. O visual gélido do longa lembrar outro clássico, O Monstro do Ártico, que originou o remake de John Carpenter, O Enigma do Outro Mundo. A história mostra os clichês dos filmes de atomic horror, onde um dinossauro carnívoro gigante desperta no Ártico após testes nucleares. Percebe-se uma tendência para os filmes envolvendo os predadores antigos e gigantescos, já que novamente o destino da criatura é semelhante ao do brontossauro em O Mundo Perdido, de 1925, quanto o de King Kong, em 1933, uma vez que a criatura é levada para Manhattan para atender a demanda dos gananciosos que a encontraram, que mais se importam em ganhar dinheiro do que preservar o milagre que é um animal como esse estar vivo. Aliás, esse clichê também foi utilizado na parte dois da franquia de Spielberg, Mundo Perdido: Jurassic Park.

    O Monstro do Mar, de Eugène Lourié (1953)

    O modo encontrado para deter a fera é bastante criativo, e a cena em questão se dá em um parque de diversões, próximo de uma montanha russa, um cenário completamente inesperado para esse tipo de sequência. O final é melancólico para a criatura, e faz perguntar afinal quem seriam os verdadeiros monstros da história, e nesse ponto o filme de Eugène Lourié acerta em cheio, pois propõe discussões e questionamentos importantes. O diretor ainda voltaria ao tema com outros dois filmes: O Monstro Submarino e Gorgo.

    Pouco tempo depois, chegava as telas O Rei Dinossauro, um filme sobre exploração espacial, onde um grupo de aventureiros vão até o planeta Nova, um novo corpo celeste que chega na Via Láctea. Neste planeta, a vida é basicamente formada por animais gigantes como os dinossauros terrestres, além de algumas criaturas pré-históricas. O filme dirigido por Bert I. Gordon, que era especialista em produtos de atomic horror (A Maldição da Aranha, A Maldição do Monstro, O Incrível Homem Atômico), ainda há um suposto T-Rex que aparece, “interpretado” por uma iguana. Ainda assim, o tom é sério, mas a questão de não se definir se a iguana que está no filme é realmente uma iguana gigante ou é um T-Rex, torna tudo muito tosco, piorado quanto um monstro maior se aproxima – um crocodilo – em um embate mortal, mas que já se sabe qual será o destino ao final. O crocodilo e a iguana, quando se deparam tem o mesmo tamanho, e isso é demonstrado com dois bonecos se enrolando pelo chão arenoso, de uma maneira terrivelmente filmada.

    A Besta da Montanha é o primeiro filme em cores dessa lista, lançado em 1956, começa como um drama de faroeste, com vaqueiros americanos e mexicanos convivendo com os perigos naturais do solo do país latino. Filmado em cinemascope, o longa de Edward NassourIsmael Rodriguez tem lindas imagens e cores muito vivas. Contudo, o filme se vale demais de estereótipos, em especial quando se desenvolve os personagens mexicanos. O texto do filme é baseado na ideia de Willis H. O’Brien, especialista em efeitos especiais que havia trabalhado no primeiro O Mundo Perdido. O Alossauro que ataca o vale e come alguns dos animais é uma referência clara ao filme de O’Brien e ao romance de Doyle. O modo como ele aparece varia, no começo é mostrada uma fantasia, com os pés do monstro e depois surge em stop motions, em cores cinzas e detalhes que até então não se viam em criaturas assim. Uma pena que o roteiro não colabore com as ótimas ideias visuais do filme.

    Em No Mundo dos Monstros Pré-Históricos (Land Unknown) o diretor Virgil W. Vogel faz muito uso de gravuras e pinturas como cenário, fato que já não era regra nos idos de 1957. Suas cenas com fundo falso soam artificiais demais em comparação com produções da época. Há outro momento complicado, com um pterodáctilo voando – terrivelmente mal filmada – além de batalhas de iguanas, ainda que melhor desenvolvidas. O T-Rex aparece de repente, logo depois da batalha de lagartos e é uma pessoa em um roupa andando em meio a miniaturas, como nos tokusatsus e filmes de Godzilla. Chega a ser cômico o uso da hélice do helicóptero para afastar a criatura e se vê muitos problemas com perspectiva, com o T-Rex variando de tamanho de acordo com as cenas. O longa termina de modo emocionante, mostrando os humanos que estavam na terra isolada fugindo.

    Viagem à Pré-História (Cesta do Praveku), de 1955, traz crianças viajando a uma terra perdida. O longa de Karel Zeman tem um tom bastante lúdico, mostrando criaturas pré-históricas sem um compromisso com a realidade, mas ainda assim bem retratadas no aspecto técnico. Zeman é conhecido por ter feito belas animações, não à toa ficou conhecido como o Georges Méliès tcheco De fato, a melhor coisa do seu filme são os efeitos especiais, pois a trama em si deixa muito a desejar.

    Viagem à Pré-História, de Karel Zeman (1955)

    Dirigido  pela lenda do Cinema B, Roger Corman, Teenage Cave Man tenta resgatar elementos de O Despertar do Mundo, ainda que seja mais explícito em sua proposta. Os homens da tribo já tem uma linguagem sofisticada, a mistura de elementos que claramente não tem congruência histórica é exibido bastante cedo, com os dinossauros aparecendo com menos de cinco minutos de exibição, variando entre stop motion e animais reptilianos disfarçados. Para variar, essa é mais uma produção onde acontecem as famosas lutas entre crocodilos e iguanas rolando pela areia, que se tornou clássica e reaproveitada entre os filmes desse subgênero. De curioso, há o protagonismo de Robert Vaughn, astro de filmes trash, entre eles, O Despertar dos Mortos, do pai dos filmes de zumbi George A. Romero.

    Um dos romances mais famosos de ficção cientifica moderna, é Viagem ao Centro da Terra, não à toa tiveram dezenas de adaptações do livro de Jules Verne. A primeira dela é um curta antigo, de 1910, bastante difícil de achar por conta das raras cópias que existem dele. A mais notória adaptação aconteceu em 1959, uma produção grande, filmada em cinemascope e em cores, dirigida por Henry Levin. Os efeitos e cenários são um pouco caricatos se vistos hoje, mas cumpriam bem o papel de tentar alinhar a obra de Verne à época em que passavam, sem falar que os jogos de luzes do diretor de fotografia disfarçam as limitações técnicas da época em boa parte do filme. Já os dinossauros, em sua primeira aparição são lagartos disfarçados, com efeitos ligeiramente superiores ao das produções anteriores, mas claramente as figuras deles eram coadjuvantes diante da trama que tentava traduzir o livro de Verne para as telas.

    Em 1959, foi a vez também de exibir O Monstro Submarino, traz Behemoth, figura essa existente nos livros da Bíblia, mais especificamente em Jó. No livro, Behemoth é uma figura monstruosa, que para muitos estudiosos é mais aproximada de um bovino com três chifres, para outros um hipopótamo e há quem o compare com um dinossauro. No filme de Lourié, mais uma vez o antagonismo é por conta de uma criatura que sofreu interferência da ação humana, através da energia nuclear. Esse é o terceiro filme do diretor que traz “dinossauros”, e talvez seja o que temor apelo, ainda assim a forma como a criatura é desenvolvida é muito inventiva, apesar de não ser tão bem feita.

    Leia: Parte 2 | Parte 3.

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  • Review | Sherlock S04 E03 – The Final Problem

    Review | Sherlock S04 E03 – The Final Problem

    O início da season finale da quarta temporada de Sherlock se inicia de forma fantasiosa, como em um sonho de Mycroft Holmes (Mark Gatiss), sendo perseguido em sua própria casa, em um excelente despiste, que faria inveja até aos filmes de Alfred Hitchcock. A partir dali se desenrola a misteriosa trama a respeito de um terceiro Holmes, teoria normalmente levantada por especialistas nos estudos dos escritos de Arthur Conan Doyle.

    A vilania, que antes era de James Moriarty (Andrew Scott), finalmente ganha um nome e uma definição mínima, e os métodos implacáveis deste antagonista são muito semelhantes aos do antigo, inclusive com um atentado contra os heróis que quase morrem na detonação de uma granada, em uma das piores cenas envolvendo efeitos em CGI da série. Este terceiro episódio funciona como uma amálgama dos dois outros, reunindo parte dos acertos de Lying Detective, em especial às partes mais herméticas, além de alguns defeitos de conceito de Six Thatchers, ao se valer demais as referências sentimentais dos personagens canônicos.

    O roteiro de Gatiss e Steven Moffat serve como cópia do conto O Problema Final, o mesmo que introduzia Moriarty ao universo do Detetive. Além das cenas que inovavam o conteúdo literário – as herméticas, já distas – há também uma quantidade de eventos mais literais e verossímeis. No entanto, a ligação emocional estabelecida entre o Jim Moriarty e o novo/velho vilão soa bastante forçado. As ameaças e os métodos de dominação da personagem de Eurus (Sian Brooke) também destoam de outras personagens, principalmente se comparado ao apuro visto nas performances do próprio Scott e da Irene Adler de Lara Pulver em A Scandal in Belgravia. Sherlock finalmente se torna refém de seu próprio suspense.

    O suspense do decorrer da trama principal se perde em muitos momentos, graças aos núcleos secundários. A direção de Benjamin Caron soa confusa em alguns momentos, não conseguindo harmonizar simples cenas de ação com flashbacks. Pior que esta confusão é a dificuldade que o roteiro tem em fazer sentido, fazendo questão de explicar e re-explicar à todo momento que Jim está realmente morto. Esse aspecto é tão irritante que a comparação com Interestelar, de Christopher Nolan, torna-se inevitável, ainda que obviamente não haja o apuro visual do cineasta britânico ou o mesmo nível de discussão filosófica dentro do capítulo citado, sendo esses pontos fortíssimos da trama do sci-fi. Impressiona como tudo o que era pontual e acertado soa frívolo e esdrúxulo nessa temporada que pode ter sido a última.

    A muleta de Moriarty prossegue até o final do episodio e também do ano, evidentemente. O entrave entre irmãos mira a referência bíblica de Isaque e Jacó e acerta em uma exploração gratuita e infantil de uma rivalidade que claramente não estava nos planos originais dos showrunners. A maioria dos elogios a essa temporada moram na tentativa de demonstrar emoção por meio do sensacionalismo, e esses são completamente descabidos, uma vez que esse artifício quase nunca acerta nem no aspecto sentimental, tampouco no mais pragmático.

    Outra característica terrível é a falta de nuances das novas personagens, em especial no background de Eurus, que é mostrada como uma mulher louca, de cabelo grande e desgrenhado, como uma versão da Samara, de O Chamado. Suas atitudes transbordam desequilíbrio e cafonice, apelando para um estereótipo de loucura mais condizente com as séries americanas, como Da Vinci Demons, não com um programa que sempre foi elogiado por sua sobriedade.

    A ligação sentimental estabelecida entre o Sherlock (Benedict Cumberbatch), John (Martin Freeman) e a “nova” personagem até se aproxima de uma construção mais elaborada, mas é jogada por terra para dar vazão a mais um final errático e escapista, diferente de todos já vistos até aqui. Mais uma vez a base de comparação para a toada de Sherlock é uma obra de Nolan, com a mesma quebra de realismo vista entre O Cavaleiro das Trevas e O Cavaleiro das Trevas Ressurge, sendo que nessa, não há muita justificativa para a mudança brusca de tom, muito menos na cena final, onde os heróis correm contra o vento, como nos Batman de Joel Schumacher. Afora as referências aos textos originais, quase nada se destaca positivamente em The Final Problem, sendo esse um desfecho decepcionante e bastante melancólico para a dupla de Baker Street.

  • Review | Sherlock S04 E01 – The Six Thatchers

    Review | Sherlock S04 E01 – The Six Thatchers

    Muito tempo decorrido desde o ultimo episódio, His Last Vow – exibido em janeiro de 2014 – e após um especial que retornava as origens de Arthur Conan DoyleA Noiva Abominável – finalmente o programa de Mark Gatiss e Steven Moffat é retomado, com o protagonista sofrendo um julgamento, a respeito dos crimes que ele teria testemunhado no último capitulo, ao lado claro de Mycroft (Gatiss), para enfim entender o perigo que ele sofreu, já que poderia ter sido ele a perecer e não seu opositor. A questão é que essa urgência é deixada de lado, para dar vazão a uma trama mais medíocre que o usual em se tratando de Sherlock.

    Após algumas soluções fáceis, o personagem se concentra em tentar entender seu misterioso adversário já morto. Sherlock (Benedict Cumberbath) então se refugia junto a seu amigo John Watson (Martin Freeman) e sua esposa Marry (Amanda Abbington), ainda na Baker Street. O detetive aparece ligeiramente mudado, uma vez que não reclama sequer de acompanhar o casal rumo a maternidade, para ter o bebê de Watson, recebendo inclusive um convite diferente da expectativa em torno de si, tendo de aceitar o apadrinhamento do rebento por uma convenção social implícita.

    A fotografia do episódio começa bastante escurecida, e vai mudando de tom com o passar do tempo, se tornando mais clara enquanto as investigações prosseguem. A mostra a Holmes de qual seria a ligação de Moriarty com o caso averiguado é feita de modo muito ligeiro e atrapalhado. Apesar disso há bons aspectos, como as referências a Margaret Thatcher, inclusive no nome do capitulo, fazem um belo diálogo com a Guerra Fria. Junto a esse momento, há outra boa referência, como a sequência de ação que faz o seriado se assemelhar e muit aos produtos recentes como A Identidade Bourne, Cassino Royale e  o televisivo Nikita.

    A essência de Sherlock está lá, com o herói seguindo como um estrategista formidável, que consegue estar à frente até de seus aliados. A ação nesse segmento também é mais enérgica, e os cenários variados dão um charme à mais para a história de perseguição. Os pontos altos moram nas referências ao cânone, como a ignorância de Sherlock em relação ao nome de Lestrade ou da identidade de Dama de Ferro (essa na verdade, uma piada) e claro, os mesmos elementos visuais que deram certo na primeira, segunda e terceira temporada. Ainda assim, falta ineditismo a trama e feitoria, uma vez que os acertos se resumem quase somente aos tentos corretos das outras três temporadas.

    Até então os roteiros do programa não continham tantos defeitos capitais como há nesse. Talvez o hiato entre os anos tenha causado no espectador – em especial o mais crítico – uma expectativa alta em relação a qualidade dramatúrgica, agravada é claro pelo especial de natal que foi muito bem recebido. Há elementos diversos para enxergar preciosismo por parte do texto de Mark Gatiss, desde o flerte gratuito entre Watson e uma moça, até os momentos excessivamente melodramáticos. Um dos pontos centrais do roteiro é de qualidade bastante discutível, relativa ao destino de Mary. O desfecho do arco soa um bocado cafona e demasiado sentimental, em especial pelas músicas empregadas para causar uma comoção nada natural. Nesse interím, somente é positivo a base canônica, que reverencia Conan Doyle, mas a opção por tentar emular as tragédias shakesperianas é forçada, e irrita ainda mais por ser esta a base para o cliffhanger mais preguiçoso exibido no programa, ao menos até aqui.

    Todo as manobras de roteiro são muito convenientes, desde o tiro ocorrido, até os momentos posteriores, onde os figurantes deixam o espaço vazio para que somente os personagens mais próximos do sujeito vitimado possam lamentar a perda ocorrida, em uma mostra de extrema rapidez desses citados, a fim de manter a privacidade de alguém que ainda poderia ser socorrido. Até a questão de se resolver o conflito em um aquário soa acintoso, uma vez que não havia motivo aparente para ser ali, além de gerar a possibilidade do público associar aquele cenário ao esconderijo do Doutor Evil, vilão de Austin Powers que também tinha obsessão por tubarões, assim como a antagonista desse segmento.

    Os animais em CGI são pessimamente mal construídos, por pouco não soaria natural até a armamentação deles com raios lasers acima da cabeça. A escolha por esse efeito especial é tão errônea que serve de símbolo para quase todas as escolhas narrativas ruins, e fora a cisão da amizade de John e Sherlock, há pouco de maturidade na trama. Este início certamente foi o de qualidade mais discutível, e onde os defeitos mais saltaram aos olhos, driblando inclusive o paradigma de que o episódio dois das temporadas é o mais execrável, resultando em um capítulo de quase absoluta frustração e de expectativa aquém da qualidade do próprio seriado, que normalmente não se valia dos clichês da tv aberta.

     

  • Review | Sherlock: A Noiva Abominável

    Review | Sherlock: A Noiva Abominável

    sherlock-the-abominable-bride_posterO especial de 2015 do seriado Sherlock, de Mark Gattis e Steve Moffat começa rememorando uma prática comum tanto ao Holmes clássico de Arthur Conan Doyle quanto a versão da BBC One. Os eventos de His Last Vow impediriam, a princípio, uma aventura corriqueira e escapista nos mesmos cenários e moldes do seriado, o que em parte, ajudaria a “justificar” o retorno a Era Vitoriana para contar que essa história fugiria aparentemente do status quo do programa televisivo.

    O clima de conto doyliano se fortifica quando o recém-aposentado médico do exército James Watson (Martin Freeman) encontra seu possível novo colega de quarto, Sherlock Holmes (Benedict Cumberbatch), nos trajes clássicos de uma época mais sombria e acinzentada, com tons variando entre bege e marrom, servindo de resumo a uma tendência de época. A quantidade de homenagens é imensa, começando pelo comércio da Strand Magazine, revista que publicava os contos, o que determina um salto temporal entre os eventos indicados em Estudo em Vermelho e a história apresentada pelo Inspetor Lestrade (Rupert Graves), já no hall do apartamento localizado no 221B da Baker Street.

    O desenrolar da trama envolve ainda um sem número de referências que não são simplesmente gratuitas, como a personificação de Mycroft Holmes, executado por Gattis com uma maquiagem pesada, como figura glutona e obesa. Apesar de exagerada, esta versão serve para solidificar a rivalidade fraterna entre os personagens, além de pôr o primogênito em uma posição superior, esbanjadora, o completo inverso da vida discreta e pobre de Sherlock, que em alguns momentos, até recorria ao irmão para cumprir somas importantes do seu orçamento. É desta fonte que surgem pistas importantes, que dão rumo à investigação que o Detetive começou.

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    O desenrolar do roteiro demonstra alguns dos maiores dissabores do investigador, entre eles a descrença em figuras e seres sobrenaturais e a natural aversão à associação de fantasmas ao desfecho do caso. Outra fobia é aventada, como o uso contínuo de cocaína, aspecto dado como superado pelo personagem já em seu piloto Study in Pink. O episódio especial talvez seja o mais próximo do clássico de Nicholas Meyer Solução a Sete Por Cento em que Moffat e Gattis poderiam homenagear alguma obra de Holmes que não fosse parte do cânone.

    Mesmo as viagens temporais são plenamente justificadas dentro do argumento, bem como as tramoias envolvendo supostos mortos andantes. A textura antiga faz assinalar ainda mais os claros poderes intuitivos. O foco maior é claramente nos fantasmas do passado de Holmes, que não consegue lidar com a perda de seu adversário maior, seu nêmese. Toda  a lógica por trás dele passa pela troca de insultos e estratégias com o Moriarty de Andrew Scott. O capítulo também serve para ratificar a ideia de que o ator nasceu para executar esse papel, que é entregue com uma maestria impressionante e poucas vezes vistas em sua carreira.

    O desfecho nas cataratas de Reichenbach é simbólico para o aficionado no personagem e serve de mergulho na alma do sujeito biografado, como um estudo da própria escrita de Watson/Doyle nas novelas, contos, romances e afins. As soluções encontradas para o saudosismo são plausíveis e não excluem qualquer retorno à atividade, já que A Noiva Abominável trata também disso, dos receios dos que deveriam estar encerrados. A cena final, misturando as linhas de tempo distintas, serve para edificar a obra de Doyle como algo universal e inspiradora de tantas releituras importantes, poucas tão reverenciais, fiéis e sensíveis quanto esta.

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  • 10 Sequências de Best-Sellers

    10 Sequências de Best-Sellers

    É possível ressuscitar o detetive Hercule Poirot com toda a sua astúcia? O que dizer de reviver Drácula sem a pena sinistra de Bram Stoker? Criar um personagem de sucesso nos livros é um feito para poucos. Há alguns tão atraentes que nos sentimos miseráveis quando o último livro de uma série acaba, no caso de o autor original já não estar mais entre nós. Mas você sabia que há vários casos de livros famosos que ganharam sequências criadas por autores alternativos?

    Por mais estranho que pareça, a história está recheada de continuações para livros inesquecíveis, seja porque a obra caiu em domínio público ou os herdeiros dos direitos autorizaram uma retomada. Em alguns casos, as continuações são bem aceitas pela crítica e continuam a conquistar gerações de leitores. Em outros, são jogadas na sarjeta do esquecimento.

    A seguir, selecionamos 10 sequências que nasceram de um sucesso, mas escritas pelas mãos de segundos autores. Confira aí e diga qual você achou mais estranha.

    A Casa de seda - Anthony Horowitz

    1- A Casa de Seda – Anthony Horowitz

    O britânico Anthony Horowitz é um apaixonado confesso por Sherlock Holmes. Tem várias inserções na literatura policial e juvenil, além de onze episódios da série de TV Agatha Christie’s Poirot e também um romance para a franquia James Bond. Em A Casa da Seda (Zahar, 2012), Horowitz faz as vezes de Arthur Conan Doyle numa trama que se passa em Londres, em novembro de 1890. O livro foi o primeiro a ser oficialmente reconhecido pelo Conan Doyle Estate, que administra o legado do autor. Horowitz disse que levou longos três segundos para aceitar o convite da organização! Assim, “A casa da seda” foi lançado em homenagem aos 81 anos da morte de Conan Doyle.

    Morte em Pemberley - P. D. James

    2 – Morte em Pemberley – P. D. James

    Imagine uma das principais escritoras policiais sequenciando uma das maiores autoras clássicas inglesas. Pensou em P. D. James e Jane Austen? Acertou. A baronesa do crime retoma a atmosfera de Orgulho e Preconceito, avança um pouco no tempo, e nos oferece um enredo daqueles! Elizabeth Bennet e Fitzwilliam Darcy se casaram, tiveram dois filhos e têm tudo para viverem felizes para sempre em sua propriedade rural. Até que assassinam o cunhado de Elizabeth… Morte em Pemberley (Cia das Letras, 2013) traz a aristocracia, seu glamour e suas intrigas. Nossos amáveis personagens não estão apenas envolvidos em gravatas e echarpes, mas cobertos também por um manto de mistério.

    Scarlett - Alexandra Ripley

    3 – Scarlett – Rhett Butler

    “Francamente querida, eu não dou a mínima”. Será que Rhett Butler repetiria a clássica frase de E o Vento Levou… para Alexandra Ripley? Afinal, a romancista norte-americana escreveu a primeira sequência oficial do relato épico da Guerra de Secessão, originalmente criada em 1936 por Margaret Mitchell. O livro é a continuação da saga, mostrando como a vida seguiu para a temperamental Scarlett O’hara, Rhett Butler e Ashley Wilkes. Apesar de ter agradado o público – o livro vendeu 6 milhões de cópias -, a história foi rejeitada pela crítica. Scarlett saiu em 1991 pela Editora Record.

    images.livrariasaraiva.com.br

    4 – A Garota na Teia de Aranha – David Lagercrantz

    Fenômeno editorial da última década, a série Millennium vendeu cerca de 100 milhões de exemplares no mundo desde o primeiro volume, Os Homens que Não Amavam as Mulheres. O sueco Stieg Larsson, jornalista e ativista pelos direitos humanos, utilizava o tempo livre para criar as histórias com a alucinante Lisbeth Salander, expondo violências sofridas pelas mulheres e uma heroína disposta a lutar por elas. Larsson morreu antes da publicação do primeiro livro e sem imaginar o tamanho do sucesso que conquistaria. Em 2015, seus herdeiros autorizaram uma continuação para a até então trilogia, liberando o volume 4 com A Garota Na Teia de Aranha (Cia das Letras, 2015). A sequência foi escrita pelo também jornalista sueco David Lagercrantz, e causou polêmica principalmente por não ter tido o aval da viúva Eva Gabrielsson. Um dos lançamentos mais populares do ano – foram vendidos duzentos mil exemplares só na primeira semana nos Estados Unidos -, o livro deve ser adaptado para o cinema pela Sony Pictures.

    Dracula - Morto Vivo - Drace Stoker

    5 – Drácula – O morto-vivo – Drace Stoker e Ian Holt

    Veja o sobrenome! Sim, Dacre Stoker é sobrinho-bisneto de Bram Stoker, o irlandês que publicou Drácula em 1897. Para dar sequência ao clássico gótico, Dacre pesquisou documentos e anotações não aproveitadas pelo bisavó, encontradas no Museu Rosenbach (Filadélfia). Também usou o título que Bram originalmente pensou para o clássico. Ambientada em 1912, a trama tem até uma aparição do “pai” do vampiro. Publicado em 2010 pela Ediouro, o livro vem com ilustrações de Ian Holt.

    James Bond Books

    6 – James Bond, a série

    O espião James Bond é uma criação do escritor e jornalista britânico Ian Fleming. O agente secreto mais famoso do mundo ganhou vida em 1953, com Cassino Royale, e todo ano Fleming escrevia uma nova história do personagem. Foi assim até 1966, quando o autor morreu de ataque cardíaco. Desde então, vários autores escreveram sequências para a franquia, como Kingsley Amis, John Edmund Gardner, Raymond Benson, Sebastian Falks, Jeffery Deaver e William Boyd. O cinema foi o terreno onde Bond mais brilhou e, após todas as tramas originais serem adaptadas, a série passou a produzir filmes com roteiristas que procuraram manter o estilo de Fleming. Parece que deu certo.

    Os Crimes da Monogamia - Sophie Hannah

    7 – Os Crimes do Monograma – Sophie Hannah

    Recolocar o detetive Hercule Poirot em cena e agradar aos milhões de fãs de Agatha Christie são tarefas que deveriam compor os doze trabalhos de Hércules! A inglesa Sophie Hannah aceitou o desafio em Os Crimes do Monograma, lançado em 2014 pela Nova Fronteira. Ao contrário do que se possa imaginar, o detetive não reaparece em tempos modernos mas sim em 1929, investigando crimes misteriosos no coração de Londres. Ao seu lado está o policial Edward Catchpool, o equivalente ao Capitão Hastings, o parceiro original. A sequência foi autorizada pelos herdeiros de Agatha mas dividiu opiniões entre os fãs, que não viam uma nova história com o detetive desde a morte da escritora, em 1976.

    A Volta do Poderoso Chefão -  Mark Winegardner

    8 – A Volta do Poderoso Chefão –  Mark Winegardner

    Quem não conhece os Corleone, essa família simpática, repleta de gente que não aceita quando as coisas contrariam seus interesses? Mario Puzo fez história ao trazer à tona mafiosos que não apenas matam e se livram dos corpos de seus desafetos. Eles se casam, têm filhos, são religiosos! É difícil não se apaixonar por personagens tão sanguíneos e sanguinários, que nos foram apresentados  nos anos setenta e chegaram às telonas nas décadas seguintes. Muitos fãs esperavam que Puzo retomasse a história, mas ele não mostrou interesse. Antes de morrer em 1999, ele autorizou Mark Winegardner a fazer a sequência, que saiu em 2005 pela Editora Record.

    60 anos depois - do outro lado do campo de centeio - Fredrik Colting

    9 – 60 Anos Depois – Do Outro Lado do Campo de Centeio – Fredrik Colting

    Em qualquer lista de livros obrigatórios do século 20, encontraremos O Apanhador no Campo de Centeio, um clássico de J.D.Salinger que ajudou a inventar a adolescência norte-americana. Criou fama pelo protagonista, o personalíssimo Holden Caulfield, e por levar o escritor ao seu completo isolamento. Salinger virou um bicho do mato, e isso alimentou uma série de lendas em torno dele. O fato é que, nesta sequência, Fredrik Colting junta criador e criatura num mesmo enredo. Imagine o sempre jovial e rebelde Holden na pele de um velhinho que simplesmente deixa pra trás o lar de idosos e parte atrás de mais uma aventura.

    A Loura de Olhos Negros - Benjamim Black

    10 – A Loura de Olhos Negros – Benjamim Black 

    Quem gosta de romances policiais certamente conhece o detetive Philip Marlowe, o mais durão da literatura (mais que Dirty Harry!). Marlowe é uma criação de Raymond Chandler, e no cinema foi vivido por Humphrey Bogart. Fato é que Chandler morreu em 1959, mas seu detetive continua vivíssimo. Benjamin Black é o nome, ou melhor, o pseudônimo do responsável pela volta de Marlowe. Em A Loura dos Olhos Negros (Rocco, 2014), o escritor irlandês recria a Los Angeles dos anos 1950, narrando a investigação de um misterioso desaparecimento. Tem clima noir, hipocrisia e femme fatale, combinação ao estilo de Marlowe & Chandler. Em tempo: Benjamin Black é, na verdade, John Banville, vencedor do prêmio Príncipe das Astúrias em 2014. Tem gabarito ou não para fazer um revival de Marlowe?

    Chris Lauxx

     Texto de autoria de Chris Lauxx, pseudônimo dos jornalistas Rogério  Christofoletti e Ana Paula Laux, autores da enciclopédia Os Maiores Detetives do Mundo e editores do site literaturapolicial.com

  • 10 livros de suspense para detetives mirins

    10 livros de suspense para detetives mirins

    detetives mirins - destaque

    Quem pensa que histórias de crime e mistério só interessam a adultos não sabe de nada, inocente. Gerações de leitores são formadas com livros que unem transgressão à lei, personagens cativantes, enredos envolventes, adrenalina e até mesmo pitadas de sobrenatural. Boa parte dos títulos de literatura infanto-juvenil aproveita a fase de curiosidade intensa e desejo por aventuras para “iniciar” seus jovens leitores nas artes da resolução de crimes!

    Aproveitando o mês das crianças, listamos dez livros essenciais de suspense para investigadores mirins. Ah, você já passou da idade? Não importa! Certamente, você já enfrentou alguns dos títulos abaixo. Afinal, todo o mundo já foi criança um dia…

    O Caso da Estranha Fotografia - Stella Carr1. O caso da Estranha Fotografia – Stella Carr (Editora Moderna)
    O que acontece quando sua máquina fotográfica sumiu e o filme que você revelou traz fotos de um homem cavando um buraco com ossos ao lado? O que você faria se estivesse com seus dois irmãos de férias numa praia e se deparasse com esse mistério? Iria investigar, claro! Pois é o que fazem Marco, Isabel e Eloís nesse autêntico suspense de uma das autoras mais conhecidas do gênero: Stella Carr. Adicione à equação do mistério um antigo cemitério indígena e uma mina de diamantes. Resultado: um livro difícil de largar.

    O Clube do Mistério - Edson Antoni2. O clube do Mistério – Edson Antoni (Editora Edelbra)
    Quatro amigos se juntam em torno de uma árvore para criar enigmas, desafios e aventuras. Chamam a confraria de O Clube do Mistério e passam a descobrir mais sobre o lugar onde vivem e as muitas transformações ocorridas na cidade. Investigação, casos do passado histórico e relações de amizade são os ingredientes certeiros desse livro que antecede tendências que persistem até hoje, como a solução de charadas de forma colaborativa.

     

    9788508164257b

    3. Histórias de Detetive – vários autores (Editora Ática)
    Imagine um livro que junta alguns dos maiores nomes da literatura policial em histórias bem contadas para esse público esperto e dinâmico. É o que temos aqui! Arthur Conan Doyle, Edgar Allan Poe, Marcos Rey, Edgar Wallace, entre outros desfilam para olhos curiosos e inquietos. A seleção é de José Paulo Paes que mescla personagens esquisitões, casos aparentemente indecifráveis e vilões perversos. Quem enfrenta essas páginas, sai transformado… em leitor de policiais!

     

    O Mistério dos 5 Estrelas - Marcos Rey4. O mistério do 5 Estrelas – Marcos Rey (Editora Ática)

    Se tem uma série de livros que mexeu com os leitores jovens brasileiros nos anos 70 e 80 é a Coleção Vagalume, conjunto de títulos que simplesmente era devorado pela garotada antenada. Um dos maiores sucessos da coleção é O Mistério do 5 Estrelas, onde somos desafiados a resolver o caso de um assassinato no Emperor Park Hotel. Descubra o que aconteceu e entenda também por que o autor, Marcos Rey, foi um dos grandes craques da literatura infanto-juvenil brasileira de todos os tempos.

    Jimmy Fiasco - Stephan Pastis5. Timmy Fiasco: Errar é humano – Stephan Pastis (Editora Rocco)
    Esta lista não tem apenas nostalgia! Tem detetive novo nas paradas, como o Timmy Fiasco. O garoto se acha o melhor investigador da cidade e, no melhor estilo Sherlock, conta com um inseparável companheiro: Total, um urso polar! Astuto e meio atrapalhado, Timmy também é empreendedor e cria com seu sócio a Fiasco Total, agência de investigação particular cuja sede é o closet de sua mãe…

    Enigma na Televisão - Marcos Rey6. Enigma na televisão –  Marcos Rey (Editora Global)
    Mais Marcos Rey e mais Coleção Vagalume. Desta vez, um simples beijo de telenovela parece criar uma epidemia de mortes e não há pistas de quem esteja por trás daqueles corpos. Junte ao enredo atores decadentes, atrizes subindo na carreira e a Liga das Sentinelas, sociedade preocupada com a moral e os bons costumes. Ingredientes para muita faísca e risco de explosão.

     

     

     

    O Genio do Crime - Joao Carlos Marinho7. O gênio do Crime – João Carlos Marinho (Editora Global)

    Um grupo de garotos se mete em encrencas pelas ruas da cidade. Conhecidos como a Turma do Gordo, acabam encontrando uma fábrica clandestina comandada por ninguém menos que um gênio do crime. Já viu isso antes? Sim, o livro repete elementos que já encontramos em filmes, livros, quadrinhos e games. Tanto que esse título é considerado por alguns como o “Goonies brasileiro”.

    O Fio da Meada - Giselda Laporta Nicolelis8. O fio da meada – Giselda Laporta Nicolells (Editora Pioneira)

    No ônibus, um estranho se aproxima e deixa nas suas mãos uma misteriosa caixa. Depois, desaparece. Luciana controla o medo e a curiosidade e decide abrir aquele mistério apenas em casa. Aí… Intrigante? Então, conheça esse livro que chacoalhou as jovens mentes brilhantes dos anos 80, e que foi escrito por uma das escritoras mais produtivas do seu tempo. Um detalhe: a autora é mãe de um dos maiores cientistas da atualidade, Miguel Nicolelis. Imagina se ele não se contagiou em casa…

    O Mistério da Casa Verde - Moacyr Scliar9. O mistério da casa verde – Moacyr Scliar (Editora Ática)

    Arturzinho lidera um grupo de amigos para transformar um casarão abandonado na cidade de Itaguaí num clube onde possam ouvir música alta à vontade. Entretanto, se deparam com um mistério e, para resolvê-lo, buscam o conto O Alienista, de Machado de Assis. A história também trata de uma tal Casa Verde, que teria sido um estranho hospício… histórias do século 19, coincidências e aventura fazem parte do cardápio oferecido por Moacyr Scliar.

    O Escaravelho do Diabo - Lucia Machado de Almeida10. O escaravelho do diabo – Lúcia Machado de Almeida (Editora Ática)

    Numa pequena cidade do interior paulista, o garoto Hugo recebe um estranho pacote contendo um escaravelho. Pensando se tratar de uma pegadinha dos colegas, ele nem se preocupa com quem teria mandado o tal presente. Acontece que, no dia seguinte, Hugo é encontrado morto com uma espada no peito. Seu irmão decide ir atrás do assassino e a essa hora já fomos fisgados pela curiosidade e pelo suspense. Um dos maiores sucessos da Coleção Vagalume, o livro vai virar filme e em breve estará em cartaz nos principais cinemas brasileiros.

    Lembrou de mais algum livro policial para jovens mentes brilhantes? Desafiamos você a sugerir a sua lista e a compartilhá-la conosco. Se não fizer isso, já sabe. Cuide-se! Você viu o que aconteceu com o Hugo de O Escaravelho do Diabo.

    Chris Lauxx

     Texto de autoria de Chris Lauxx, pseudônimo dos jornalistas Rogério  Christofoletti e Ana Paula Laux, autores da enciclopédia Os Maiores Detetives do Mundo e editores do site literaturapolicial.com

  • Crítica | Sherlock e Eu

    Crítica | Sherlock e Eu

    Sherlock e Eu 1

    Em dois minutos de tela já são apresentados John Clay – um dos maiores vilões do cânone, o 4° homem mais perigoso do mundo -, o oficial Lestrade (Jeffrey Jones), Sherlock (Michael Caine) e Watson (Ben Kingsley), numa cena bastante edificante e cheia de referências as aventuras clássicas. Mas isto não dura muito, pois no terceiro minuto de exibição tudo é desconstruído com uma enorme bronca vinda do médico, seguida de um pedido de desculpas do atrapalhado “investigador”. Without a Clue é uma comédia que apresenta Sherlock Holmes como uma farsa, um detetive perfeito criado por Watson para publicar suas próprias reminiscências provindas de suas deduções e investigações.

    O pastiche, realizado por Tom Eberhardt, mostra que Holmes não era mais que um papel interpretado pelo ator alcoólatra Reginald Kincaid, que fora encontrado na sarjeta pelo autor dos contos da Strand Magazine. Em poucos momentos, a dupla se separa após uma briga, e o doutor acha que pode seguir a frente das investigações sem o alterego famoso, o que se prova um engano dos mais terríveis e ardis, pois sua obra supera em muito o autor em popularidade e notoriedade de forma semelhante ao paralelo real entre Sherlock Holmes e Arthur Conan Doyle, e o argumento metalinguístico é muito bem executado.

    Logo Watson percebe que terá de lançar por terra seu orgulho e recorrer a Kincaid, que também não se mostra muito bem quando está só, visto que é absolutamente inábil em quase todos os seus afazeres e se mete em dívidas de jogo como ninguém, a ponto de não ter capital sequer para arcar com sua bebedeira.

    Quando Watson declara suas próprias deduções, ele é sumariamente ignorado, mas quando as mesmas palavras vêm dos lábios de Sherlock, todos acreditam, numa clara referência ao conceito de placebo. A comédia do roteiro é muito semelhante ao humor presente nas séries televisivas americanas, o que se deve ao background dos dois roteiristas, Gary Murphy e Larry Strawther. A ideia inicial era boa, mas fica presa somente à premissa, pois com o decorrer do tempo a comédia perde o fôlego e só se sustenta graças ao humor pastelão.

    Holmes treme diante da possibilidade de Moriarty (Paul Freeman) estar envolvido, este sim um vilão á altura do intelecto de John Watson. É curioso como neste Sherlock e Eu a figura de bufão e de bobo alegre é de Sherlock, ao contrário dos filmes dos anos 30/40, em que Nigel Bruce e seu médico eram o alívio cômico. O duelo final de esgrima garante a Kincaid um justo momento de honra diante do inimigo mortal, fazendo valer finalmente os louros que receberia. Sua nobreza aumentaria ao dar créditos ao real “resolvedor” de casos, superando assim sua antiga birra e assumindo sua amizade pelo médico. O anúncio de “Caso Encerrado”, revela que mais aventuras dali viriam, e apesar da mensagem final, politicamente correta, esta é uma película eficiente em misturar humor e o universo criado por Arthur Conan Doyle.

  • Os festivais que nunca tivemos

    Os festivais que nunca tivemos

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    A literatura não acontece só quando os olhos de alguém percorrem as páginas de um livro. Ela vai além das abarrotadas prateleiras e dos silenciosos gabinetes de leitura. A literatura também se materializa em ocasiões agitadas, onde as pessoas se encontram, se confraternizam e compartilham paixões iguais e interesses diferentes. Esses espaços privilegiados são as feiras e festivais que reúnem escritores, editores, capistas, tradutores, ilustradores, distribuidores, vendedores, mídia especializada e públicos. Alguns desses eventos assumem a condição celebrativa e adotam o nome de “festa”, como é o caso da Flip, que se firmou como um dos mais importantes momentos do ano literário no país.

    A questão é que esses festivais são peças necessárias para a engenharia de uma cena cultural. Diversas razões apontam pra isso. As feiras literárias permitem que leitores tenham contato com escritores, e que editoras exibam seus autores e catálogos, buscando fidelizar públicos. Esses eventos costumam despertar a atenção de outros públicos e ajudam a formar novas gerações de leitores. Além disso, geram mídia espontânea para o setor, alavancam vendas e ainda atraem realizadores de outras mídias, como a TV e o cinema, interessados em adaptações e produtos derivados. Ganham o mercado editorial, os criadores e os leitores. Se por um lado quem lê pode trocar ideias com grupos de interesses comuns, assistir a palestras e conhecer grandes autores, por outro as editoras têm a chance de conhecer seus públicos, divulgar coleções e pesquisar diretamente a opinião dos leitores sobre seus produtos. Quer dizer: eventos literários movimentam a economia, valorizam a escrita e a leitura, e expandem a presença da literatura na vida das pessoas.

    Para os fãs de romances policiais e de suspense, há várias feiras todos os anos. É uma pena que não no Brasil. Com exceção de participações isoladas de autores em festivais mais amplos, não se criou ainda um evento totalmente dedicado à literatura policial do porte dos que existem na França, Inglaterra e Estados Unidos, por exemplo. De olho nessa receptividade, os mercados locais não pensam duas vezes em investir para fomentar produção e vendas.

    Sangue na Europa

    Na Inglaterra, um dos mais interessantes festivais é o Harrogate Crime Festival, que acontece em julho e dura quatro dias. Com jogos investigativos, premiações e palestras, já reuniu nomes como Ian Rankin e Tess Gerrintsen. O público elege o melhor romance do ano, e o vencedor recebe 3 mil libras como incentivo. Uma curiosidade: é justamente em Harrogate que fica o Old Swan Hotel, lugar usado por Agatha Christie para desaparecer misteriosamente por 11 dias em 1926!

    Ainda na terra da rainha, em Bristol, acontece sempre no mês de maio a CrimeFest. Considerado um dos 50 melhores festivais literários do mundo pelo jornal The Guardian, teve a primeira edição em 2008, com jantares, mais de 40 mesas de discussão com autores e editores, workshops e apresentações variadas.

    Não poderia faltar um evento em homenagem à Rainha do Crime. O International Agatha Christie Festival acontece em setembro em Torquay, onde a escritora nasceu em 1890. A celebração dura em torno de uma semana, reunindo fãs de todo o mundo desde 2004. Um dos pontos mais visitados pelos participantes é Greenway, a famosa casa de verão onde Agatha escreveu muitos de seus sucessos.

    Na Escócia, há o Bloody Scotland (Escócia Sangrenta), que movimenta o mês de setembro na cidade medieval de Stirling. Durante uma semana, tradutores, leitores e escritores reúnem-se para discutir a diversidade do gênero e o festival apresenta os melhores romances policiais publicados no país de Arthur Conan Doyle.

    Os festivais criminais atravessam o Canal da Mancha e invadem a parte continental da Europa. Entre março e abril, Lyon, na França, sedia o Quai du Polar Crime Festival, um dos mais prestigiados do gênero. Por lá, já passaram Patricia Cornwell, Henning Mankell, P. D. James, Harlan Coben e Gillian Flynn, entre outros. Na última edição, mais de 65 mil aficcionados visitaram a cidade.

    Se os nórdicos são a nova moda criminal, não poderiam faltar nessa lista. A Islândia promove o Icelandnoir, e a Noruega, o Krimfestivalen. Na Suécia há o Crime Writing Festival, que acontece em agosto na ilha de Gotlândia. O slogan é “para quem ama suspense em livros e filmes”, e o evento apresenta trilhas investigativas, exibição de filmes, peças de teatro e cinquenta autores participando, com nomes da casa como Lars Kepler e Anne Holt.

    A Espanha também merece destaque, pois tem um mercado muito ativo no que se refere à literatura policial. Há dez anos, Barcelona promove entre janeiro e fevereiro a BCNegra, reunindo 60 autores em mais de 20 atividades. Charme adicional é o prêmio de melhor romance – Pepe Carvalho Award – homenagem ao detetive criado por Manuel Vasquez Montalban.

    No mesmo país, há a Semana Negra em Gijon. A edição deste ano teve 120 autores, 20 deles vindos América Latina. Foram 100 atividades culturais gratuitas para o público durante nove dias de festival. É no evento que são concedidos o Dashiel Hammett Prize!

    No resto do mundo

    Os alemães têm o seu Krimifestival e os nova-iorquinos, o ThrillerFest. Argentinos realizaram a quarta edição de sua Buenos Aires Negra (a BAN!), e os uruguaios dedicaram uma semana de seu mês de agosto para a Semana Negra de Montevidéo. Foram painéis literários, simpósios, dezenas de atividades e entrada gratuita para o público. Jornalistas, criminologistas, especialistas forenses, policiais, e – claro! – autores do gênero trocaram ideias e experiências sobre violência, corrupção e criminalidade na literatura.

    No Chile, desde 2011 acontece o Festival Iberoamericano de Novela Policial “Santiago Negro”. Com autores da Argentina, Chile, México, Venezuela e Espanha, um dos objetivos é incentivar o intercâmbio cultural entre os participantes, qualificando a produção e difundindo novas expressões do gênero.

    Como se não bastasse a Feria Internacional del Libro de Santiago (Filsa), marcada para outubro e novembro, vai homenagear a literatura nórdica com ou devido destaque para Sissel-Jo Gazan (Dinamarca), Kjartan Fløgstad (Noruega), Tove Alsterdal e Johan Theorin (ambos da Suécia).

    Esses são apenas alguns dos festivais mais reverenciados do noir no mundo. Com uma produção de qualidade cada vez mais crescente, um mercado leitor gigantesco e editoras que nada devem às estrangeiras, por que não temos um festival do tipo no Brasil? Falta coragem ou ousadia? O que impede que uma cena cultural dessas aconteça pra valer? Quando chegará a nossa vez? Com a palavra, editores, livreiros, escritores e agitadores culturais…

    Chris Lauxx

     Texto de autoria de Chris Lauxx, pseudônimo dos jornalistas Rogério  Christofoletti e Ana Paula Laux, autores da enciclopédia Os Maiores Detetives do Mundo e editores do site literaturapolicial.com

  • De que matéria são feitos os heróis?

    De que matéria são feitos os heróis?

    vortex_herois1Houve um tempo em que eles eram exemplos de virtude. Encarnavam os maiores valores, as melhores qualidades: coragem, bondade, honestidade, justiça. Eram fortes como Hércules, perspicazes como Teseu, astutos como Perseu. Mirávamos naqueles exemplos e seguíamos nossa jornada.

    Um pouco depois, não bastavam seus músculos e temperança. Foi preciso mais. E eles passaram a vestir trajes coloridos e a ostentar símbolos no peito. Era uma maneira de externalizar seus atributos, seus programas de ação. S não é apenas a inicial de seu nome, mas um sinal de esperança de onde ele veio, mundo tão distante e hoje só existente na memória. Um morcego serve para amedrontar os inimigos, mas colocado em pleno tórax, passa a ser também um alvo, moderno calcanhar de Aquiles. Homens e mulheres, eles ainda personificam a figura difusa do Bem, e sua presença na Terra (e no nosso imaginário) torna a vida mais segura. Aparentemente.

    Dias atrás, diante dos cartazes de cinema, nos perguntávamos por que tantos filmes com super-heróis. Respondemos antes mesmo de entrar na sala escura: o mundo anda tão sombrio que precisamos cada vez mais deles. Se antes nos contentávamos com o salvamento de Andrômeda, Ariadne e Lois Lane, passamos a esperar que protegessem Gotham, Nova York, o planeta, enfim. As ameaças vinham de alienígenas, cientistas malucos, conspiradores. Vinham também de mentes perturbadas, assassinos seriais e criminosos insuspeitos. Se o maior truque do demônio é fazer acreditar que ele não existe, o Mal também buscou formas de se travestir, seduzindo corações e mentes. O Bem também amoleceu seus contornos, e o caráter dos heróis ficou poroso, ambíguo e desconcertante.

    Mas o que faz alguém ser um herói hoje? O que ele veste? A função que ocupa na sociedade? O distintivo que exibe?

    Não dá pra negar. Nossos heróis estão a anos-luz dos modelos imaculados de conduta. Não carregam consigo apenas virtudes. Pelo contrário, são cheios de defeitos. Dexter mata sem remorso, Batman está transtornado, e Lisbeth Salander invade sistemas e busca vingança. Sherlock é um egocêntrico, Poirot, arrogante, e Montalbano é um boca-suja. Nero Wolfe é um glutão. O inspetor Clouseau, um atrapalhado, e Monk tem TOC. Ed Mort é um perdedor nato, Kay Scarpetta, esquisitona, e Pete Marino, um machista nojento. Mandrake é mulherengo, Wallander parece perdido e Mathew Scudder bebe demais. Como delegamos a eles a solução de nossas desesperanças?

    Parte desses nossos heróis trabalha na polícia e esta condição os posiciona do lado de cá do balcão: onde estão os que seguem a lei. Outra parte atua num sistema paralelo de justiça, como detetives particulares. Fardados ou não, ostentam as cores do que é certo e bom, e se distanciam da maldade condenável para a maioria de nós. Não nos esquecemos de seus desvios, manias e esquisitices. Eles borram suas figuras, como os santos com pés de barro, as estátuas trincadas…

    Exemplos mais atuais são os investigadores da série de TV True Detective. Na primeira temporada, tivemos o infiel Marty (vivido por Woody Harrelson) se debatendo com Rust, personagem de Matthew McConaughey, que – digamos – não batia bem da cabeça. Na segunda, Colin Farrell é o violento e instável Ray Velcoro, que contracena com a instável Ani Bezzerides (Rachel McAdams) e o desviante Paul Woodrugh (Taylor Kitsch). São apenas seus distintivos que os fazem nossos heróis? Claro que não. Eles são altamente problemáticos, abusam das drogas e da violência, e são desajustados sociais. Trazem em si ingredientes suficientes para colocá-los do lado de lá do balcão, onde ficam os algemados. Mas não! São nossos heróis! Negue se puder…

    Então, de que matéria são feitos nossos heróis de hoje? Personagens fronteiriços, são complexos e ambíguos como a realidade contraditória que vivemos. São fortes e destemidos, mas fraquejam diante das pequenas-grandes tragédias cotidianas. Sucumbem, perdem-se… Têm valores, mas às vezes, seu sentido particular de justiça colide frontalmente com o que acreditamos.

    True Detective é uma criação de Nic Pizzolatto, autor de Galveston, recém-lançado no Brasil. Livro de estreia, deu ao autor vários prêmios, entre os quais o Edgar Award, distinção para a literatura policial, de mistério e de crimes. Galveston não é um policial clássico, até porque é quase totalmente habitado por bandidos, capangas e escroques de em geral. Ali, todos já atravessaram os limites do razoável e da legalidade. Mesmo assim, acompanhamos Roy Cady em sua jornada, e torcemos por ele, apesar das barbaridades e dos erros que comete. Ele é nosso herói! Tem coragem de negar?

    Nas tramas clássicas de detetive, temos a predisposição de acreditar que a justiça será naturalmente feita: a história será explicada, o culpado, punido e a ordem, restabelecida. Personagens como Sherlock Holmes e Hercule Poirot são nossos guias nessa premissa, e por incrível que pareça, suas histórias continuam atraindo milhões de leitores no mundo. É incrível já que esses justiceiros pertencem a uma época que já se foi, teoricamente de valores diferentes dos nossos, de uma inocência até lúdica. No entanto, histórias como O Assassinato de Roger Ackroyd, de Agatha Christie, e O Cão dos Baskervilles, de Arthur Conan Doyle, continuam entre as favoritas dos fãs de um bom suspense. Justamente ao lado das tramas que embaçam as fronteiras morais do certo e errado, bom e mau. O que acontece? Será que ansiamos finais mais justos e felizes? Ou será que estamos nos acostumando a conviver com facínoras e infames tentando impor seu bizarro modelo de justiça? Para responder a isso, precisaríamos de visão de raio X, células cinzentas super desenvolvidas, sentidos aguçados e de uma obsessiva vontade de solucionar mistérios. Próprio de heróis.

    Chris Lauxx

    Texto de autoria de Chris Lauxx, pseudônimo dos jornalistas Rogério Christofoletti e Ana Paula Laux, autores da enciclopédia Os Maiores Detetives do Mundo e editores do site literaturapolicial.com

  • Crítica | O Mundo Perdido (1925)

    Crítica | O Mundo Perdido (1925)

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    Quase quinze anos antes dos filmes de Sherlock Holmes com Basil Rathbone, o autor Sir Arthur Conan Doyle já era adaptado para as grandes telas com um clássico do cinema mudo, em 1925. O Mundo Perdido conta a estranha história do desbravador Challenger (Wallace Beery), um professor que lidera uma expedição britânica até a “longínqua” América do Sul, atrás do lugar em que ele acreditava viver criaturas pré-históricas, em pleno mundo urbanizado.

    Os exploradores rumam em direção a um planalto amazônico, sem delongas, numa trama de arrogância e total desconhecimento por parte dos europeus poderosos que enxergam em tudo o que é “não branco” algo necessariamente primitivo. Mesmo deixando de lado a xenofobia que compunha o conhecimento popular da época, há pouco de pensamento substancial, mesmo em nome dos que se dizem defensores da ciência. Mesmo Challenger parece um devoto que não dedica a sua vida a crença religiosa, mas que faz de sua obsessão um artifício tão maniqueísta quanto.

    Um tempo demasiado é gasto na preparação da força-tarefa da viagem, estabelecendo-se que aquela era na verdade uma expedição de resgate, visto que já haviam incursionado àquelas terras distantes anteriormente. A formação dos bravos inclui caçadores, membros da imprensa e uma mulher apaixonada, conduzindo a equipe ao máximo de heterogeneidade possível, fator completamente irrelevante diante dos perigos que supostamente enfrentariam.

    A condução de Harry O. Hoyt é amadora se comparada às produções de hoje, mas consegue equilibrar de modo não assustador as cenas com atores reais e as criaturas digitais, inserindo pela primeira vez em larga escala a tecnologia de stop motion. A primeira criatura do filme é um pterodáctilo, dinossauro voador que se assemelha a uma ave e que alimenta seus filhotes em um ninho. Fora a aparição do animal, ainda surge um símio, cuja caracterização não passa de um homem fantasiado, o que se faz perguntar se ele corresponde a um macaco ou um elo perdido entre os seres pré-históricos e o homo sapiens.

    É curioso notar como a exploração da atmosfera da Terra mudou. Ao exibir uma luta, que deveria ser emocionante, entre um tiranossauro e um alossauro – ambos carnívoros gigantescos –, não há mudança na trilha sonora, que faz menção ao otimismo ao invés de focar os acordes na temível batalha a qual os pobres homens assistem. O conceito de usar a música como elemento narrativo de suspense ainda não era tão claro, apesar das óbvias exceções vistas no Nosferatu de F.W. Murnau e em seus pares do expressionismo alemão e do movimento Kammerspiel.

    Os erros e indiscrições provenientes da louca batalha pela cadeia alimentar são passíveis de perdão pela obra se passar em uma época que a paleontologia passava longe de ser uma ciência acessível – piorando e muito na época que Conan Doyle escreveu sua novela. O Mundo Perdido consegue, apesar de muitos pesares, manter um clima de escapismo ímpar, típico do cinema de sua época, sobrevivendo ao tempo, sendo apreciado por muitos e servindo de inspiração para obras posteriores, como os filmes de King Kong, suas continuações (e remakes), além de alimentar o imaginário de Steven Spielberg rumo ao clássico Jurassic Park – O Parque dos Dinossauros.

    As influências, tanto no filme de Merian Caldwell Cooper Ernest B. Schoedsack quanto no segundo volume de Jurassic Park, O Mundo Perdido: Jurassic Park, são vistas através da tentativa de trazer uma das criaturas monstruosas para o convívio urbano, transportando um braquiossauro (chamado de brontossauro, à época) para a capital inglesa, o que obviamente deu errado e fez causar um sem número de problemas à metrópole londrina. O alvoroço fez com que as pessoas corressem para os subterrâneos, agindo como manada e fazendo se perguntar qual dos seres possuía comportamento animalesco. Ao final, abate-se o animal irracional, deixando a questão de quem seria a fera ainda mais viva do que o óbvio diálogo ao final de King Kong de 1933. O argumento abre um precedente para uma discussão maior, fazendo de Mundo Perdido uma pérola não tão valorizada quanto deveria ser.

  • Crítica | Sherlock Holmes: A Voz do Terror

    Crítica | Sherlock Holmes: A Voz do Terror

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    Primeiro dos doze filmes feitos pela Universal com Basil Rathbone e Nigel Bruce fazendo os canônicos personagens de Arthur Conan DoyleSherlock Holmes: A Voz do Terror é regido por John Rawlins (de As Mil e Uma Noites, Dick Tracy em Luta e Dick Tracy Contra o Monstro). A primeira história do detetive se passa em tempos atuais, no ano de 1942, e toca em um assunto relevante, a Segunda Guerra Mundial. Iniciando-se com uma transmissão de rádio de cunho sensacionalista, A Voz do Terror remete a Alemanha do III Reich na tentativa de apavorar o “bravo” povo inglês, anunciando um grande número de atos de guerra com o claro intuito de minar a autoestima dos estrategistas e do povo.

    Após uma reunião da inteligência nacional, a portas fechadas, uma parcela dos presente sugere a inclusão do detetive particular no encontro, ideia que seria prontamente rebatida pela ala mais temerosa. Rathbone encarna um Sherlock mais sério que nos filmes anteriores, menos piadista e mais autocentrado, um sujeito mais experiente, talhado pelo tempo. A escolha da iluminação do figurino junto a fotografia dão à obra uma atmosfera noir inexistente nos episódios da 20th Century Fox, o que faz do filme como um todo bastante pitoresco e competente.

    O trabalho de investigação de Holmes não funciona perfeitamente com o excesso de interferências e relatórios, o que deixa aqueles que eram contra a sua convocação em polvorosa. Sherlock é quase tão onisciente quanto o público, o que prova ainda mais o seu valor como investigador. Pouco depois de comprovar em tela quem teria entregue informações ao inimigo, Holmes chega à conclusão de que alguém trabalhara contra a causa.

    É complicado acreditar que o protótipo do MI6 aceitaria de forma tão condescendente as orientações de um profissional como Holmes, ainda mais após uma tratativa fracassada à primeira vista. Mesmo com toda a superioridade do protagonista em relação aos outros personagens, a explicação do herói mostra que o seu método de dedução não obteve o êxito esperado graças à ação e interferência de seus ditos superiores, tendo que terminar o seu raciocínio discursando aos presentes numa espécie de tribunal improvisado – que de forma profética antevia Nuremberg – desmascarando um agente infiltrado que agiu no alto escalão britânico por longos 24 anos.

    Apesar de inverossímil, e até infantil, a trama é intrigante. Como cinema-resposta aos filmes de propaganda partidária de Joseph Goebbels, na Germânia, a obra contempla uma mensagem positiva de “marcha em frente” contra o vil inimigo nazista, traduzindo-se em um discurso motivador para a Inglaterra e as forças do bem contra o Eixo.

  • Crítica | Sherlock Holmes e a Arma Secreta

    Crítica | Sherlock Holmes e a Arma Secreta

    A cine-série protagonizada por Basil Rathbone apresenta a temática da Guerra contra o nazifascismo e pretensa soberania alemã, numa “adaptação” do conto de Arthur Conan Doyle, The Dancing Men. Dessa vez a obra é regida por Roy William Neill, que prosseguiria na franquia por mais 11 filmes. Logo de cara nota-se que os disfarces de Holmes estão melhor construídos do que a versão de 1939 para As Aventuras de Sherlock Holmes.

    Sherlock, em frente a um espelho, se desvencilha da máscara que usava como maquiagem, mostrando ao público sua real face e compartilhando com ele um pouco do seu processo de trabalho, numa frase bastante emblemática que lembra muito o detetive dos contos doylianos: “Eu nunca suponho, Watson”.

    Graças a um atentado, e com receio disso respingar em sua amada, Doutor Franz Tobel (William Post Jr.) aliado de Holmes, exige que seus experimentos não tenham interferência ou supervisão inglesa, fato interessante por si só por demonstrar de forma clara o paralelo com a costumeira neutralidade da Suíça, país de origem do espião infiltrado, e que só se permite entrar no esforço de guerra contra o Führer em seus próprios termos. A elevação de Tobel evidencia um defeito que cada vez mais se agrava: a lastimável transformação de Watson em um alívio cômico; o médico mal entra nas investigações.

    A única semelhança factual entre o roteiro final e o conto original é o código usado para esconder o segredo do agente infiltrado, que serve mais como easter egg do que como fonte de inspiração. A versatilidade de Rathbone constitui um dos pontos mais altos do filme, principalmente pela quantidade de disfarces que Sherlock lança mão. As cenas de tortura também são muito bem executadas.

    O Professor Moriarity – grafado errado na ficha técnica – é completamente diferente do retratado por George Zucco em Aventuras de Sherlock Holmes. Lionel Atwill, que já havia feito o Doutor Mortimer em O Cão dos Baskerville de 1939, metamorfoseia-se em um vilão comum, apenas preocupado com o lucro, em nada lembrando o Napoleão do Crime, inferior, e muito, ao seu antecessor no papel. O problema é tão gritante que ganha ares de ato falho, em uma fala de Sherlock/Basil emblemática: “Ora essa, esse não é o professor Moriarty, mestre dos crimes, que eu conheço”.

    A tentativa de deter Sherlock é muito facilmente desbaratada, e caracteriza este plano como algo muito mal construído, aliado à armadilha que o Detetive arquiteta para o seu rival, que o reduz a um simples bandido ordinário e sem criatividade própria, o que leva a crer até mesmo na possibilidade deste ser um impostor. Sua morte é ainda mais indigna que a versão do pastiche presente no filme.