Tag: cinema político

  • Crítica | São Bernardo

    Crítica | São Bernardo

    São Bernardo

    Parte integrante do movimento Cinema Novo, São Bernardo trata da história de Paulo Honório, um mascate que habita o sertão de Alagoas e negocia gado e toda sorte de coisas. A obra de Leon Hirszman mostra o personagem de Othon Bastos tentando de todos os meios, inclusive antiéticos, para adquirir a fazenda que dá nome ao filme, local este onde havia trabalhado quando criança.

    O filme começa com um coro de sons indistinguíveis, que simbolizam a confusão mental de Honório, um homem violento, machista e autoritário, com dificuldades claras de convivência. Sua postura autossuficiente esconde um modo de pensar e viver bastante miserável, aquém dos próprios delírios de grandeza que ele nutre.

    O roteiro é uma adaptação de um dos grandes clássicos da literatura nacional, São Bernardo, de Graciliano Ramos, e tanto Hirszman quanto Bastos conseguiram capturar bem a essência do romance, não só em mostrar a jornada do protagonista e todo o contexto político-social da obra, mas também nos demais personagens, em especial, Madalena de Isabel Ribeiro, uma professora de pensamento e atitudes progressistas entrando em conflito direto com o conservadorismo de Honório. Os dois se casam, apesar de não combinarem em praticamente nada.

    O gerenciamento da fazenda torna seu proprietário próspero, mas sempre causando temor em qualquer pessoa que se relacione com ele. Suas sensações e obsessões de controle se chocam com o ideal que Madalena tem para si, e o texto se desenvolve muito bem nos conflitos. Hirzman não aborda de maneira óbvia as contradições de uma relação, e a estética empregada pelo cineasta faz o filme parecer uma declamação, tanto pela narração do ator, que revela o pensamento torto, sexista e moralista, quanto suas expressões corporais, que deixa claro ser um sujeito que parece estar sempre prestes a explodir.

    A postura turrona de Paulo esconde mal sua real face. Além da índole estranha se percebe a fragilidade de seu caráter e até de sua auto imagem. O comportamento possessivo de fato tem a ver com o receio de ficar sozinho, e acaba resultando em uma vaidade que faz até quem está perto se afastar.

    Sua incompreensão também ajuda que ele seja um pária em casa, mesmo sendo bem-sucedido financeiramente, e ajudam a formar nele a postura de um sujeito paranoico. Isso resulta em fracasso até no mais banal de seus desejos, visto que até a paternidade, que lhe parecia natural lhe é negada. Sua esposa, que deveria ser sua protegida, adoece da dor da rejeição e da falta cuidados sentimentais básicos, pois não é tratada como um ser humano, e sim como mais uma propriedade.

    São Bernardo trata de questões candentes até os dias atuais, demonstrando a atualidade do texto de Ramos e da adaptação de Hirszman. O personagem de Othon é diferenciado, um explorador consciente de seu poder e ainda assim impotente no campo sentimental.

  • Crítica | Alvorada

    Crítica | Alvorada

    Em 2016, época do impeachment de Dilma Rousseff, parte da classe artística ligada ao cinema sentiu forte o Golpe. Cineastas como Petra Costa, Anna Muylaert, Douglas Duarte e tantos outros prometeram dedicar seus esforços a contar essa história. Eis que, Alvorada finalmente chega ao público, somente em 2021 na mostra do É Tudo Verdade 2021, se juntando a Democracia em Vertigem, Excelentíssimos, O Processo, Já Vimos Esse Filme e até Não Vai Ter Golpe, filme do MBL contando a narrativa dos opositores do PT. Muylaert retorna para o cinema documentário a fim de revelar mais uma vez a podridão dos bastidores do poder em Brasília, junto a codiretora Lô Politi, a mesma que conduziu o ficcional (e curioso) Jonas.

    As diretoras tentam  abordar o filme de  forma semelhante a que Eduardo Coutinho fez em Peões, mostrando os bastidores de baixo, os funcionários não endinheirados, assalariados baixos, que nem sequer estão com microfones. Até personagens celebres, como o ex-ministro José Eduardo Cardozo são mostrados muito de perto, chegando ao cúmulo dele ser mostrado com roupa de ciclista, já que ele pedalava até o planalto enquanto trabalhava em Brasília.

    O filme soa datado, o impeachment ocorreu em 2016. ainda há uma “desculpa” por parte de Muylaert de que o seu roteiro era profético e precisava dos fatos para se comprovar assim. Fato é que muita coisa aconteceu de 2016 até atualidade, ainda mais em tempos pandêmicos. A promessa de filme experiencial resulta em algo anacrônico.  Muylatert já foi mais inspirada, mesmo em suas  obras ficcionais ela conseguiu tocar em assuntos mais sensíveis, em Mãe Só Há Uma e Que Horas Ela Volta? se falou no papel da maternidade, também foram abordadas questões de identidade de gênero, abandono parental e ascensão da Classe C, temas caros a qualquer pensamento progressista, aqui, o que se assiste é apenas repetição. Alvorada até tenta tratar de alguns desses assuntos, e é muito bem vindo que sua câmera acompanhe os trabalhadores braçais e o proletariado, mas o intuito de entender o que o Brasil se tornou e como o povo foi iludido ao ponto de aderir a um discurso fascista não é sequer arranhado.

    Possivelmente se o filme tivesse sido lançado antes, como era previsto, teria outra digestão, mas se torna quase uma piada em 2021 verificar isso, uma vez que ele é preso num pedaço do tempo completamente diferente de seu lançamento, e não faz questão nenhuma de aplacar essa sensação, ao contrário, soa pretensioso ao extremo.

  • Crítica | O Favorito

    Crítica | O Favorito

    Novo longa de Jason Reitman, agora focando em uma história biográfica e política, O Favorito fala a respeito do político Gary Hart (Hugh Jackman), um democrata que chegou a disputar a corrida presidencial, e sofreu um revés estranho, perdendo mesmo estando à frente de quase todas as pesquisas e isso se deu por uma razão peculiar e inesperada em face da vida pública dos Estados Unidos.

    A trama começa durante as primárias do Partido Democrata, em 1980. Ele, casado com  Lee (Vera Farmiga), perde e isso o marca profundamente. Algum tempo depois ele acaba conseguindo ser o escolhido do partido e as administrações anteriores favorecem sua campanha, largando bastante na frente. O filme é dividido de forma capitular, em uma contagem regressiva semanal até o dia do pleito majoritário.

    O clima de vitória certa fortalece a parte cômica do roteiro de Reitman, Matt Bai e Jay Carson, o fato de haver poucas ou nenhuma preocupação torna todo o astral que poderia ser estressante em um verdadeiro mar de rosas e a trama faz questão de tornar Hart uma figura simpática e preocupado com os menos favorecidos, bem ao estilo JFK, tanto em suas virtudes quanto em seus defeitos.

    As caracterizações do filme buscam ser fidedignas, como foi com The Post: Guerra Secreta de Steven Spielberg e Spotlight: Segredos Revelados de Adam McKay. O roteiro segue dando indícios de que aquele paraíso é construído sob uma base frágil, com pequenos elementos que desconstroem a perfeição de Paladino que Hart ostenta. A proximidade com a imprensa faz com que assuntos tabus sejam timidamente levantados, como por exemplo, porque ele não se divorcia mesmo, claramente, não tendo uma vida íntima com sua esposa. Além disso, ocorrem ligações anônimas para a imprensa, inicialmente ignoradas pelo Washington Post, mas que ganham força ao chegar no Miami Herald, um tabloide conhecido pela sua fama sensacionalista.

    A partir daí começa uma trama diferenciada em formato thriller, com perseguição do jornal menor ao político, interrogatórios com a pessoa que teria se relacionado com o político, e outros tantos eventos sensacionalistas. A câmera de Reitman basicamente está lá para registrar os acontecimentos, mas sem julgamentos. O que mais se aproxima disso, é uma discussão na redação, onde os jornalistas falam que os desvios sexuais de Lyndon B. Johnson e John F. Kennedy eram tolerados e acobertados pela maioria das pessoas em nome de uma boa convivência. Quem determina se isso é algo relevante ou não, segundo um dos editores é o leitor e isso é um sinal dos tempos, ao menos é o que se alega, mesmo que não haja nesse momento como o povo saber de qualquer fato que não seja via imprensa.

    A grande questão do filme de Reitman é que ele não se arrisca. A abordagem de um evento tão complexo é feito de um modo demasiado careta e sem sal. A trajetória de Gary Hart desperta curiosidade, assim como o desempenho de Jackman é bastante interessante, mas a falta de um posicionamento mais contundente e a isenção política do texto final pesam contra os dois aspectos positivos citados, tornando desimportante a jornada e todo o desenrolar dos fatos, o que é lastimável pois a condução inicial do cineasta parecia no começo levar para outra direção.

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  • Crítica | A Valsa de Waldheim

    Crítica | A Valsa de Waldheim

    De Ruth Beckerman, A Valsa de Waldheim começa em maio de 1986, com uma filmagem encontrada em uma fita VHS antiga da diretora, em uma manifestação a respeito da candidatura de Kurt Josef  Waldheim, político carismático e amado pelo povo austríaco, mas que tinha um passado nebuloso e bastante confuso. Beckerman era oposição a ele, e suspeitava que a aparência de bom velhinho escondia algo.

    O filme é narrada pela diretora, fato que proporciona ao filme uma aura de pessoalidade extrema, mesmo que o objeto focado seja uma figura pública tão polêmica. Uma das situações que mais marca no depoimento de Beckerman é a descrição dos gestos que Waldheim vivia fazendo, sempre com movimentos de mãos que imitavam abraços. Sua linguagem corporal transparecia o seu discurso, de ser o homem da família. As filmagens de 86 lembram Opinião Pública, de Arnaldo Jabor, e em muitos outros momentos esses dois filmes conversam.

    O longa participou do Festival de Berlim esse ano, e curiosamente a história apagada de suas filmografias tem proximidade com a Alemanha, uma vez que ele foi um ex-soldado da SA (abreviação de Sturmabteilung), polícia de assalto nazista. Em alguns materiais biográficos, fala-se que ele foi dispensado por doença, e em algumas entrevistas ele simplesmente nega que tenha servido, apesar de seu nome constar nos registros e essas contradições fizeram sua reputação cair ainda mais. A diretora escolhe muito bem algumas imagens de julgamentos onde o filho do político passa uma vergonha tremenda ao tentar defender seu pai, ao mesmo tempo em que as autoridades internacionais afirmam que ninguém além da família dele acredita nessa versão açucarada que a campanha faz dele.

    Waldheim antes de tentar a presidência foi embaixador da ONU, pessoa respeitada apesar de ter em seu passado fatos que depunham contra si. Quando representava a Áustria em uma solenidade relacionada ao holocausto, ele não cobriu a cabeça como manda a tradição e a repercussão apesar de negativa, não foi tão execrada quanto poderia. Há um trecho de falas do político que se destaca em meio as muitas coisas que ele falava, todo momento ele perguntava se durante a segunda guerra mundial só morreram judeus. Beckerman quer reforçar ao público que esse argumento é tendencioso e perigoso, podendo esconder um preconceito interno e a vontade de se vitimizar para esconder os seus próprios pecados.

    Houve uma espécie de anistia aos austríacos nazistas e durante anos se acreditou que a Áustria não contribuiu com o Terceiro Reich, sendo sempre encarada como vítima, apesar da presença de pelo menos 550 mil nazistas no país. A construção da figura de homem justo em torno de Waldheim é muito bem orquestrada e conversa demais com algumas figuras políticas atuais, entre elas Jair Bolsonaro ainda que no caso do brasileiro essa construção seja muito mais escrachada e desavergonhada quando se trata de discurso de ódio. Ao final, uma cena chama a atenção: Kurt discursando para o povo em meio a uma forte chuva, uma amostra de sua importância para a população em geral.

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  • Crítica | Torre das Donzelas

    Crítica | Torre das Donzelas

    Documentário de Susanna Lira (Intolerancia.doc) a respeito do duro período da Ditadura Militar iniciado nos anos sessenta, Torre das Donzelas tenta resgatar e remontar as memórias de um grupo de mulheres que habitaram um presídio que tinha a mesma alcunha do filme, com a fala dessas pessoas quarenta anos depois delas terem sofrido tanto.

    A reconstrução do “quarto” onde as antigas prisioneiras se instalavam e o reencontro das moças – agora já mulheres – com essas memórias varia entre a pura emoção de algumas e a sobriedade de outras. Notar o quanto a tortura e o agouro dos autoritários agiu na mente e na lembrança de cada uma das suas vítimas é pesado, mas ao mesmo tempo é reconfortante ao se perceber o transbordar de braveza e coragem que essas senhoras transpiram.

    Há uma forte sensação claustrofóbica ao se apreciar o filme. Se a intenção da diretora era estabelecer o incômodo que as mulheres tiveram na época que estavam sofrendo com as “caixas de maldade”, o documentário acerta em cheio. Nas entrevistas e nos olhares das depoentes se nota o quão humilhante e desgraçados eram os métodos dos torturadores, que tratavam elas como objetos ou como humanos inferiores, vítimas de estupro – descritos com uma veracidade tremenda -, além de falar abertamente sobre os métodos medievais a que eram submetidas de uma maneira muito visceral e franca, sem qualquer receio ou vontade de não chocar o espectador. Elas falam em “curras”, e no desejo dos torturadores em provocar gozo nelas enquanto as mesmas sofrem (ou sofreram, já que o tempo dos discursos é no pretérito). Se não havia pudor dos que infligiam mal, não seria nas vítimas que isso ocorreria, e nesse ponto o registro em vídeo beira a perfeição.

    A empatia com as mulheres que aparecem em tela é estabelecida já no início, é preciso ser extremamente insensível para não se afeiçoar ou não se compadecer da situação que elas sofreram. Apesar de haver falas de famosas, a exemplo da ex-presidenta Dilma Rousseff, o que mais toca são as anônimas, pessoas honradas que tiveram suas peles, corações e mentes feridas.

    Os cenários onde acontecem as falas variam entre fundos pretos e reconstituições da tal torre, e em especial esse segundo faz criar uma atmosfera diferenciada, que remonta a memória das mulheres e que incrivelmente não as fez paralisar de medo, nem recriar o pânico que já as tomou ao longo da repressão, e o antídoto para isso certamente é a fibra dessas pessoas. A resistência ocorre apesar da fragilidade das mulheres que foram prisioneiras, basicamente porque os grilhões que as atavam eram físicos, a parte emocional delas obviamente foi tocada, mas não o suficiente para deixa-las inertes aos bons sentimentos, da camaradagem, tampouco foram desumanizadas. Todas elas são plenamente capazes de amar, de seguir a vida e ainda manter uma luta política com suas ideologias.

    Há algumas gorduras no  documentário, mas seu começo é tão certeiro e faz o público mergulhar tão profundamente no drama e na dor dessas pessoas que é impossível não ser levado pela emoção e compaixão geral. Os 97 minutos parecem mais longos do que realmente são, não por gerar enfado, mas sim pelo nível de intimidade que cada uma das mulheres dedica as falas, é como se quem assistisse conhecesse cada um daqueles testemunhos, e conhecesse também quem os declara. O cinema da diretora soa bastante maduro, em especial por saber equilibrar bem não só os momentos mais emocionantes de seu roteiro, mas também por harmonizar os sorrisos, confissões e claro intervenções suas como diretora, com uma sensibilidade ímpar, conseguindo equalizar a parte sentimental com a informativa muito bem.

    Torre das Donzelas soa como acalanto à alma, e serve de inspiração e esperança em um período tão caótico e cheio de incertezas quanto o quadro político pós-eleições.

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  • Crítica | Pixote: A Lei do Mais Fraco

    Crítica | Pixote: A Lei do Mais Fraco

    Pixote: A Lei do Mais Fraco, de Hector Babenco, é um marco do riquíssimo cinema brasileiro não-reconhecido pela maioria que se baseia apenas em Cidade de Deus e Central do Brasil para valorizar, por menor que seja, a produção audiovisual de uma nação que verte toneladas de exemplos culturais superiores. Arrisco dizer que o filme em questão pode rivalizar, enquanto retrato da difícil infância que uma pessoa pode levar no terceiro mundo com o soberano Os Esquecidos, de Luis Buñuel. Um doce período da vida estragado pelas agruras e mil dificuldades tempestuosas que o destino de cada um prepara ao infante, ao longo de uma trajetória repleta de desventuras.

    Pois, enquanto Alemanha, Ano Zero, um dos filmes mais tristes que já ocupou uma tela de Cinema coloca uma criança inserida no contexto de uma guerra europeia literal, entre tanques e bombas, a guerra de Babenco é o conflito diário a lá Brasil, esse que lemos e assistimos diariamente nas manchetes e no feed do Facebook: Crianças e adolescentes das nossas periferias virando alvo contínuo da polícia, do emburrecimento e da intolerância institucionalizadas, e delas mesmas. Um mundo de violência(s) cuja imprevisibilidade Babenco incorpora no ritmo da história de uma forma espetacular; realmente gloriosa. Eis, de longe, o seu melhor filme, ainda que bem menos famoso que o polêmico e ambicioso Carandiru, de 2004.

    Aos dez anos, Pixote já sabe bater, roubar, se virar; um legítimo membro dos capitães de areia, fazendo aqui referência inevitável ao livro de Jorge Amado, mas ainda guarda alma de criança órfã quando deixa-se descansar sobre um colo de mulher, ou viver a rebeldia exposta no contato com outros da sua idade, compartilhando do mesmo perigo que banha suas condições clandestinas. O menino já sabe matar, só não sabe o que é acordar pra curtir desenhos em um sábado de manhã, ou fazer birra para não ir a escola. Uma infância que vai pelo ralo, prestes a suicidar-se a qualquer momento pelos contornos que o menino adulto vai criando na inconsequência das relações que o mundo e a direção implacáveis de Babenco reservam para a itinerância do moleque meliante.

    O cineasta argentino nunca foi tão hábil em nos fazer sentir, com grande força, uma infância com gosto de morte e sem a promessa de se viver a adolescência fora de uma penitenciária. Pixote: A Lei do Mais Fraco pode ser o retrato da construção do que chamam de “perigo para a sociedade”, ainda que a unicidade do filme, sua excelência que não se encontra noutros filmes do tipo se dê pela crueldade deste conto sobre um menino que vê sua pureza escoando a cada momento, e nos reles instantes de sossego, como no seu emocionante contato com a prostituta Sueli, a câmera faz invadir seu rosto já marcado como se o mesmo lembrasse de um tempo almejado para ser criança, mas que a realidade suja dos fatos jamais o deixa tocar com seus dedinhos encardidos.

    Assim como no clássico de Buñuel, troca-se as ruas da Cidade do México pelo subdesenvolvimento similar dos bairros de São Paulo. Muda-se o ambiente mas não a lógica da sobrevivência que o estado oferece para sua população, ontem e hoje. O garoto sem nome e sem moral é oriundo e faz mover uma espiral de criminalidade, um ciclo de desistência pelo futuro ainda nos seus primeiros anos de vida, acolhendo o que “Deus” lhe deu como se o mal que o cerca fosse seu amigo, e irreversível. Pixote foi seu apelido, aterrorizando a todos como se todos fossem culpados pelo terror que lhe deu de mamar. Babenco não busca o mesmo, segue imparcial do começo ao fim agindo como grande contador de histórias, e com grande influência do saudoso neorrealismo italiano, cronicando a selvageria dramática que irrompe das civilizações e injetando sobretudo ficção às narrativas de violência que encharcam nosso costumeiro jornalismo pagão.

    https://www.youtube.com/watch?v=MLf-GG4qfwo

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  • 10 Filmes Sobre a Ditadura Militar Brasileira

    10 Filmes Sobre a Ditadura Militar Brasileira

    A tradução, pelo cinema, dos anos de chumbo, pelos militares.

    Jango (Silvio Tendler, 1984)

    Já no campo presidencial, retratando a vida política brasileira desses anos através da ascensão e queda do saudoso presidente João Goulart, somos expostos então a um material foto jornalístico e documental de grande apuro sobre o período, em questão. Com certa pompa típica aos documentários da época, e com notável precisão, conseguimos estudar pela voz de José Wilker as engrenagens, por mais de duas décadas, que levaram o presidente Jango a ser deposto no (atual) golpe de 1964 por interesses ocultos que a história foi tratando de iluminar.

    Baile Perfumado (Lírio Ferreira e Paulo Caldas, 1997)

    E como seria, ainda no Nordeste no mais profundo agora do seu sertão, e sendo o oposto de Tatuagem, ter de lidar com o impedimento como se manda o figurino? Na tentativa de se fazer um filme sobre o rei do cangaço, o imortal Lampião e a sua tropa, um cineasta se vê atado ideológica e formalmente de rodar seu filme pernambucano sendo considerado subversivo – ou seja, alguém que pensa por si próprio, podendo atrapalhar o famoso sistema de intolerâncias. Das ficções a emblemar o tema da ditadura e suas agruras, talvez seja essa a mais icônica.

    O Que é Isso, Companheiro? (Bruno Barreto, 1997)

    Um dos filmes nacionais mais famosos, no mundo, na ficção de Bruno Barreto, o evento político que marcou os nossos anos oitenta se desdobra como pano de fundo de uma narrativa multiplot investigativa, e um tanto aventuresca, cujas personagens norteiam o espectador pela tensão coexistente na época através do sequestro por estudantes militantes do embaixador americano na época (Alan Arkin), num Rio de Janeiro tão ditatorial quando o já anunciado de 2018.

    Cidadão Boilesen (Chaim Litewski, 2009)

    Outra investigação pouco conhecida pelo povo brasileiro, e negligenciada pela mídia jornalística do país, e que o próprio Cinema tratou de desenrolar os fatos, é de onde veio parte do financiamento para toda a repressão violenta, e a tortura, no Brasil dos anos 60. As ligações do empresário Henning Boilesen, um dinamarquês naturalizado no país, com o setor privado, buscando nele fundos para estruturar a violenta Operação Bandeirantes, um centro de informações montado pelo governo do Estado de São Paulo e pelo Exército no combate às organizações de esquerda, são expostas neste documentário implacável e um tanto didático, mas com entrevistas chocantes e comoventes, principalmente pelo filho de Henning que não acredita que seu pai, tido como alegre e amável, tenha sido um cara de diversas facetas, até o fim.

    Utopia e Barbárie (Silvio Tendler, 2009)

    E se este não for o melhor documentário nacional a prestar contas ao nosso regime militar, longe ele certamente não fica. Tratando não só dos anos de chumbo brasileiros, mas de inúmeros fatos polêmicos e de grande valia para o que o século XX veio a se tornar, historicamente, Utopia e Barbárie consegue ir muito além do trato para com um tema só no pós-Segunda Guerra Mundial, em vários países aonde se sonhou utopias em meio as barbáries cometidas contra nós mesmos. Um amplo e coerente ponto de referência de investigações cosmopolitas de grandes eventos, e que merece muito mais fama e aclamação do que já passamos a lhe dar, aqui.

    O Dia que Durou 21 Anos (Camilo Tavares, 2012)

    A derradeira frase desta investigação é: tudo isso foi feito com fins democráticos. “Tudo isso”, em outras singelas palavras, referindo-se diretamente ao massacre intolerante que durou vinte anos no Brasil para estender o major monopólio estadunidense, na maior potência latino-americana. Quando o país se deu conta que o território, até então nas mãos de João Goulart, não iria trocar alianças de fino trato com os interesses do Tio Sam, no dia 1° de abril de 1964 o Brasil deixou de ser a humilde terra da banana para ser mais uma extensão da ambição dos “donos do ocidente”, como eles ainda se fazem ser.

    Os Dias com Ele (Maria Clara Escobar, 2012)

    Quando uma cineasta busca entender sua própria história, e a do seu pai, integrando suas vidas aos tempos da ditadura, sem apenas constituir um esbarro narrativo ao período. Maria Clara Escobar então discursa sobre o nosso país e o seu pai, Carlos Henrique Escobar, um dos intelectuais paulistas mais provocativos dos anos 60, e 70, preso e torturado como bem nos relata a ótima biografia Os Dias Com Ele. Eleito melhor filme na 16ª Mostra de Cinema de Tiradentes, em 2013, é uma inteligente cadência de relatos sobre uma pessoa, e a importância e o peso inseparáveis da história sobre a vida desta.

    Marighella (Isa Grinspum Ferraz, 2012)

    História de figura importantíssima do Brasil, Carlos Marighella, parlamentar e comunista, foi vítima de prisões e torturas considerado como o inimigo número Um da ditadura militar, e, como se não bastasse, foi o maior nome da militância de esquerda no Brasil dos anos 60. Viveu sob resistência, e junto, sua própria família. Em 1969, foi assassinado nas ruas de SP, com o documentário homônimo de 2012 resgatando, pelos cuidados de sua sobrinha, o que eles enfrentaram pelo caminho, construindo uma boa base de reflexão em prol de debate oriundos.

    Cara ou Coroa (Ugo Giorgetti, 2012)

    Saem os estudantes que chegam a sequestrar políticos, entra-nos o povo comum, de cada dia, tentando estabelecer um plano de vida digamos estabelecido, diante de um sistema totalmente contrário à sua sobrevivência – por mais que a elite econômica ache o oposto disso. Cara ou Coroa gira em torno de dois irmãos apaixonados por teatro e presos em uma dúvida: Seguir a profissão de ator, ou trilhar o mesmo caminho muito mais arriscado dos revolucionários jovens de 1971. Filme entre a veracidade do período e uma visão mais fantasiosa e encenada sobre os seus desenlaces, é uma boa pedida para a releitura mais aventuresca e bem-humorada dos fatos.

    Tatuagem (Hilton Lacerda, 2013)

    No território do que acontecia paralelo à ditadura, sobre quem ainda acreditava no colorido e nos ritmos musicais de um Brasil liberal e até mesmo anárquico, Tatuagem ocupa então o que restou da liberdade de expressão num período autoritário. Filmado na efervescência do fogo constante de quem resiste a padrões ou aos mais variados impedimentos políticos, é propositalmente escrachado. Um esforço válido, imprevisível e provocativo a honrar diversos quadros do cinema brasileiro, como o próprio movimento do cinema marginal.

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  • Crítica | Anna dos 6 aos 18

    Crítica | Anna dos 6 aos 18

    anna-dos-6-aos-18Em entrevista publicada para a saudosa revista Filme Cultura, uma das principais revistas da história do cinema brasileiro que circulou entre 1966 e 1988, Zuenir Ventura questiona Eduardo Coutinho, quando no lançamento de Cabra Marcado para Morrer, se ele havia escrito um roteiro e Coutinho responde dizendo que não tinha escrito, pois tinha apenas o objetivo de contar algumas histórias. E muitas perguntas. Perguntas é o que move a discussão promovida no documentário Anna dos 6 aos 18, de Nikita Mikhalkov.

    Assim como para Coutinho, seus entrevistados tem uma importância factual para compor sua história, Mikhalkov utiliza desse mecanismo o seu filme, voltando-se, que parte de cinco perguntas banais feitas feitas à Anna, sua filha, desde os 6 até os 18 anos de idade, repetidas religiosamente, ano a ano ao longo de 12 anos: o que mais a amedrontava, o que mais ela desejava, o que ela mais odiava, o que mais amava e o que ela mais queria naquele momento. De 1980 a 1991, o cineasta repete essas cinco perguntas à sua filha Anna e, por meio delas, traça paralelos entre o crescimento de sua filha, por meio de suas respostas, como também da própria história de um povo e sua terra.

    Segundo Mikhalkov, o longa inicia-se da ideia de utilizar um rolo de filme por ano na qual realizaria as mesmas cinco perguntas a sua filha. Dessa forma, dois temas iniciais são peças importantes de análise da obra do diretor: tempo e memória. O tempo, no cinema, é relativo, sendo o trabalho de montagem e edição instrumentos fundamentais para entendermos a construção narrativa de um filme, assim, notamos que a escolha de tais temas não se faz por mero acaso, já que a memória está ligada diretamente a noção subjetiva do tempo, bem como este se relaciona com uma noção de tempo cronológico, linear, ou melhor, histórico.

    Ao se trabalhar em um gênero como o documentário é comum pensarmos em algumas práticas corriqueiras, como a utilização de registros, entrevistas e materiais de arquivo para a construção do tema desenvolvido no filme, pouco importando se estes materiais são de caráter público ou privado, pessoal ou anônimo, portanto, novamente nos debruçamos sobre a memória, que é tão cara para Mikhalkov, como se torna evidente em sua narração em off no início do filme, onde ele alega não saber ainda que filme iria fazer, mas sentia, intuitivamente, que poderia ser um documento importante. Dessa forma, utilizando registros de família, e inúmeras imagens conhecidas mundialmente, Mikhalkov cria seu multifacetado documentário para contar um pouco da sua história familiar, mas também dos últimos anos da União Soviética.

    Interessante notar como quando Anna é questionada pela primeira vez suas respostas se encontram dentro de um universo típico de crianças, repleto de fantasia, contudo, um ano depois, com o ingresso à escola, seus medos e anseios passam a ser pensados no coletivo, sem saber ao certo os reflexos do um modelo de educação influenciaria os reais desejos de sua filha. A crítica ao modelo soviético se repete ao longo do documentário de modo menos ou mais implícito, como por exemplo, na montagem paralela onde o diretor contrapõe imagens de arquivo do líder soviético Leonid Brejnev de um teatro repleto de pessoas bem vestidas cantando a internacional, intercalada com imagens de pessoas simples dançando na rua, na qual é sobreposto os aplausos à Brejnev no teatro sobre as imagens do povo humilde, uma forma de retirar os aplausos dos líderes e dá-los aos cidadãos comuns. As críticas ao modelo socialista da União Soviética e a midiatização dão o tom da obra ao longo da vida de Anna.

    Em 1987, novamente Anna é indagada sobre as mudanças que o país vem sofrendo por conta das reformas políticas e econômicas de Mikhail Gorbachev. Já mais velha e com a abertura do país a iniciativa privada, as transformações em sua filha e na própria sociedade civil são evidentes pelas roupas utilizadas por Anna, seu modo de falar, como também pela inserção de imagens utilizadas pelo diretor, desfiles e concursos de beleza, comerciais de produtos repleto de cores e shows de rock. Curiosamente, em decorrência das reformas de Gorbachev, neste momento Mikhalkov abandona as críticas ao socialismo e passa a criticar todas as mudanças advindas da abertura do país ao capitalismo.

    Apesar da proposta inicial do documentário ser registrar os medos e desejos de sua filha no decorrer dos anos, Anna dos 6 aos 18 é acima de tudo uma exercício de autoanálise na medida em que o filme se desenrola. Por conta disso, é interessante notar como o filme parecer perder o seu foco inicial, naturalmente, isso ocorre num importante momento de transição político-ideológica, substituindo o tom crítico por um ar nostálgico na medida em que vemos o desenrolar da história que culminaria com o fim da União Soviética.

    Anna dos 6 aos 18 é acima de tudo um trabalho invejável sobre temas caros como a relação pais-filhos, tempo, transformações políticas e sociais, e além disso, uma aula de montagem e manipulação de imagens por meio de materiais de arquivo, seja público ou privado. Além disso, a postura anticomunista e crítica em relação à União Soviética soa vazia, já que a o declínio do socialismo real não provocou o esperado retorno que o diretor parecia almejar, abordando tais transformações da sociedade num retrato do capitalismo em sua forma mais degradante, concluindo o documentário de maneira desiludida e desesperançosa com o novo sistema político-econômico, mostrando um Rússia tomada por uma epidemia demagógica que engoliu e destroçou os sonhos e o saudosismo de uma época passada, encerrando seu filme com o tema central, o tempo.

  • Agenda Cultural 62 | Especial: Cinema Político

    Agenda Cultural 62 | Especial: Cinema Político

    agenda_cultural_62Bem vindos a bordo, camaradas. Nesta edição do VortCast da Agenda Cultural, Flávio Vieira (@flaviopvieira), Filipe Pereira (@filipepereiral), Rafael Moreira  (@_rmc) e Douglas Fricke, o Exumador  (@dwfricke), do Podtrash e Debate Histórico, se reúnem para realizar uma indicação de filmografia política que tem por objetivo a doutrinação ideológica de nossas criancinhas através do Marxismo Cultural e os estudos de Antônio Gramsci para transformá-los em soldados da Revolução Comunista. Hasta La Victoria Siempre!

    Duração: 102 min.
    Edição: Victor Marçon
    Trilha Sonora: Victor Marçon
    Arte do Banner: 
    Bruno Gaspar

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    Comentados na Edição

    Sala da FIFA e sala de guerra do Dr. Fantástico
    Íntegra do, talvez, último discurso de Fidel Castro

    Podcast Citados

    VortCast 36: O Que Restou da Ditadura
    Debates em História 10 – Islamismo e Xenofobia parte 1
    Debates em História 10 – Islamismo e Xenofobia parte 2

    Debates em Historia 7: Parte 1- História de Cuba e Inicio da Revolução
    Debates em Historia 7: Parte 2- Socialismo, embargos, política internacional e Cuba na atualidade
    Debates em Historia 7: Bônus – Indicação de Filmes Cubanos e sobre Cuba

    Literatura

    Por uma outra globalização: do pensamento único à consciência universal – Milton Santos
    Os Jacobinos Negros – C. L. R. James
    Poder e Desaparecimento: Os Campos de Concentração na Argentina – Pilar Calveiro
    Resenha As Veias Abertas da América Latina – Eduardo Galeano

    Séries

    Carlos
    Crítica A História Não Contada dos Estados Unidos

    Quadrinhos

    Resenha Palestina

    Cinema

    Crítica A Onda
    Ele Está de Volta
    Encontro com Milton Santos: O Mundo Global Visto do Lado de Cá
    Crítica Jango
    Crítica Dossiê Jango
    Marighella – Retrato Falado do Guerrilheiro
    Crítica Marighella
    Crítica Cidadão Boilesen
    Crítica Muito Além do Cidadão Kane
    A Revolução Não Será Televisionada
    A Batalha do Chile
    Essa Noite Encarnarei Teu Cadáver
    O Despertar da Besta (O Ritual dos Sádicos)
    Crítica O Anjo Exterminador
    Crítica A Batalha de Argel
    Crítica Queimada!
    Cabra Marcado Para Morrer
    Peões
    Canudos
    Crítica O Capital
    Estado de Sítio
    Os Edukadores
    Roger e Eu
    SiCKO: S.O.S. Saúde
    Trabalho Interno
    A Outra História Americana
    Crítica O Ato de Matar
    Crítica O Peso do Silêncio
    Dr. Fantástico
    Z
    O Salário do Medo
    Os Esquecidos
    Crítica Memórias do Chumbo: O Futebol nos Tempos do Condor
    Crítica Eles Não Usam Black Tie

    Crítica Ação Entre Amigos
    Machuca
    O Homem do Castelo Alto
    O Germinal
    Crítica Pra Frente, Brasil
    Doutrina do Choque
    Crítica Quase Dois Irmãos
    Crítica Que Bom Te Ver Viva
    Crítica Casa Grande
    Ao Sul da Fronteira
    Comandante

  • Crítica | A Batalha de Argel

    Crítica | A Batalha de Argel

    A Batalha de Argel

    Ambientado no ano de 1957, apenas nove anos antes da feitoria do filme, A Batalha de Argel registra em preto e branco o quão anacrônicos eram os métodos utilizados pelo exército francês a fim de tentar esmigalhar os ativistas políticos pró-independência argelinos, liderados pela Frente de Libertação Nacional. Com tema musical de Ennio Morricone e direção de Gillo Pontecorvo, a obra ajudou a remontar a urgência por identidade buscada pelo povo e nação, fazendo do filme mais um marco do cinema político clássico.

    Pontecorvo tem um cuidado sui generis em retratar tanto a violência dos conflitos, fatos inegáveis em se tratando de um levante popular – indo na contramão do discurso politicamente correto a respeito de manifestações sem confusões que acomete alguns discursos pós modernos – como também guarda espaço para desenvolver a docilidade do povo, que dá prosseguimento a sua vida comum e ordeira, realizando seus ritos religiosos e enlaces matrimoniais e humanizando os revoltosos, que normalmente são execrados por quem conta as histórias, em especial europeus que perderam o embate.

    Não há glamourização da luta pela libertação. As bombas que contemplam o território argelino são colocadas em pontos estratégicos. Os detalhes da câmera mostram a sujeira dos locais, o temor dos revolucionários e o medo, tanto de ser pego quanto de fazer mal ao homem comum do país.

    Há uma sequência que mostra de maneira didática a alienação que acomete parte da população. Há uma explosão de bomba em um estabelecimento comercial genérico, perto de uma danceteria que toca música caribenha. Quando ocorre o estouro, todos vão para fora a fim de ver o que ocorreu, mas movidos unicamente pela curiosidade e não pela empatia, uma vez que, assim que a música volta a tocar, retornam rapidamente ao entretenimento, até ocorrer outro atentado exatamente naquele lugar, fazendo a alegoria bíblica de que o salário do pecado é a morte, e a omissão, injúria.

    Após uma hora e meia de exibição, as discussões estratégicas, lideradas pelo coronel Mathieu (Jean Martin), dão lugar a demonstrações de tortura como arma de condicionamento do povo cansado dos desmandos dos antigos poderosos. Ao menos nesse instante, não há preocupação com sutileza, ainda que um mundo de nuances e emoções conflitantes estejam presentes nos espectadores dos atos cruéis contra seus compatriotas, observados pelos closes certeiros que enquadram o olhar dos civis atemorizados.

    O período compreendido no clássico de Pontecorvo é bastante curto e pontual: o início da revolta que daria fim à opressão europeia sobre a nação africana, como um retrato do embrião da soberania local sobre a bruta colonização externa. O período conflituoso se arrastaria por mais dois anos. A Batalha de Argel mostra um levante popular, sem romantismos ou utopias, registrando de modo pragmático o martírio de uma população cansada de ser explorada gratuitamente. E sem respeitar o distanciamento muitas vezes empregado em relação à crítica aos antigos chefes de colônia da Europa.

  • Crítica | Queimada!

    Crítica | Queimada!

    QUEIMADA 1

    Clássico de Gillo Pontecorvo, o drama político Queimada! mostra uma história de manipulação e libertação. Sir William Walker, vivido pelo astro Marlon Brando, é enviado pela coroa britânica a fim de cumprir com os escusos desejos reais a respeito de uma ilha caribenha. Seu ideal é incitar a população a uma revolta popular, depondo assim o governo atual, para gerar instabilidade política, que favoreceria os negócios com a tal região.

    Walker é um sujeito sorrateiro que usa de sua influência para arquitetar um futuro bom para si e para seus empregadores. Apesar de ser uma aventura histórica, o roteiro de Franco Solinas e Giorgio Arlorio, baseado no livro de Norman Gant, não se preocupa a retratar os fatos e pessoas de modo literal, tangenciando sobre a realidade como em um conto realista. Com medo de ser censurado, Pontecorvo teria mudado o domínio que seria espanhol para português, graças ao regime militar que imperava na Espanha em 1969. A ilha de Queimada guarda muitas semelhanças com o Haiti, que teria tido seu nome trocado exatamente para driblar possíveis boicotes.

    Um dos papéis centrais é de José Dolores, vivido por Evaristo Márquez, um nativo que é tratado de modo rude por Walker e que aos poucos ganha sua afeição, bem como uma preparação para tornar-se um líder carismático de seu povo. Nota-se facilmente, no modo de operar do agente inglês, traços da filosofia maiêutica, em que o influenciador faz sugestões leves que de modo sofista vão alterando o ideal do tal líder em construção, no caso Dolores. As sugestões não são diretas, mas são construídas detalhadamente a ponto de gerar no escolhido a sensação de epifania autoinduzida, como se tais paradigmas estivessem em seu pensamento o tempo todo, ao invés de terem sido implantados.

    Pontecorvo não tem pudor em mostrar um personagem central canastrão e falacioso, que ganha nuances exatamente pela inspiração de Brando, que consegue expressar bem a canalhice do mentor fajuto. O viés ideológico comunista se vê na condução dos fatos, ao explorar os defeitos desse tipo de invasão e intervenção imperialista estrangeira, curiosamente ainda muito em voga atualmente, vide a situação de guerra ao terror dos Estados Unidos com os países árabes ricos em petróleo.

    Os pequenos detalhes no visual dos personagens dizem muito mais do que suas atitudes emulando o jogo de falsidade e cartas marcadas que ocorre durante o filme. Enquanto José se veste de trapos, exalando humildade, William é um homem de trajes bonitos, mas de modos e trajes elegantes para o local, fator que já o sobe de patamar naturalmente. No entanto, são seus pelos que dizem mais. Como se aquele trabalho fosse apenas mais um dentro da sua rotina, a barba por fazer determina um descompromisso com padrões, combinando com suas madeixas oleosas, não grandes o suficiente para atravessar os ombros, mas o bastante para ficarem descabeladas ao menor sinal de vento. Não há preocupação moral ou vergonha ética nos modos de condução executados pelo personagem vindo da Europa.

    A apologia feita por Pontecorvo ao proletariado ganha ares de importância ao demonstrar as condições insalubres que o povo de Queimada considera rotina. Os fatos corroboram a ideia de que os colonizadores eram cruéis ao extremo, ao contrário do que gostam de propagar os países europeus. Nem da parte dos portugueses/espanhóis e nem dos servos da Rainha há heroísmos.

    O embate entre criador e criatura é rápido, mas intenso o suficiente para uma troca de carinhos. Dolores retribui o treinamento que recebeu com um cuspe no rosto de seu professor, um revide agressivo e humilhante para quem o reduziu a um falso profeta, a um messias fajuto que viria para supostamente incitar seu povo e que, na realidade, domaria os pobres para que outros ricos o explorassem. Pontecorvo não faz concessões, tratando Walker como se trata um vilão, mostrando-o com um destino mal, tão ruim quanto suas atitudes manipuladoras. O artifício pode parecer maniqueísta, mas a escolha é sábia por se tratar de uma universalização do tema, resultando então em um paradigma vilanesco indiscutível, pondo o imperialista no lugar que lhe é devido diante da discussão ética do decorrer da história humana.

  • Crítica | Z

    Crítica | Z

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    Em 1964 as forças ocultas tomaram posse do Brasil. Foram controladas e guiadas por interesses estadunidenses para evitar o que poderia ser um novo governo socialista na América Latina. O preço disso foram vinte anos de dor e sofrimento. Em 1964 o desejo de um povo criado para temer o levante comunista foi um dos principais fatores para um retrocesso social e político. Um retrocesso histórico. Um lembrete do quanto temem aqueles que não entendem. E de quanto fazem por medo.

    Os pais que marcharam aos gritos de Pra Frente, Brasil nas ruas, aqueles em nome da família com Deus, tiveram suas filhas e filhos raptados, estuprados, mortos. Ainda que os saudosos repitam Nunca Fomos Tão Felizes, eles não são capazes de saber. Esses não estiveram nos porões da ditadura. Não estavam cientes das dívidas em que o país se afundava com empréstimos do estrangeiro. 1964 foi o ano em que os pais de tantos saíram de férias. O ano em que a ditadura militar se instalou no Brasil com o apoio do povo, mas em outros países ela se fez de outra forma, ainda que com mesmas peças em um tabuleiro de cores diferentes. Há sempre o medo e conservadorismo de valores estimados pelas classes dominantes, há sempre forças ocultas à espreita e alguém que simboliza o que pode haver de melhor. Um cabra marcado para morrer.

    Em grego, Z quer dizer: ele vive.

    Costa-Gavras é conhecido por fazer filmes políticos. Fez filmes como Desaparecido – Um Grande Mistério (vencedor da Palma de Ouro em Cannes) e seu mais recente, O Capital. Z é vista como sua obra mais famosa, possivelmente devido a tratar sobre algo de seu país de origem. Roteirizado por Jorge Semprún e baseado no livro de Vasilis Vasilikos: conta a história verídica do assassinato de Grigoris Lambrakis.

    z-costa-gavras-sceneQualquer semelhança com fatos ou pessoas vivas ou mortas não é casual, é intencional.

    Z (Yves Montand). Líder do movimento socialista na Grécia. Uma figura carismática e de esperança aos jovens que não se interessavam em integrar grupos extremistas de direita. Pregavam a paz e o desarmamento de uma Grécia com forte poder militar. Perturbavam o status-quo com seus gritos e protestos legítimos, mas que antes da instalação da ditadura já se demonstravam sabotados. Espiões e ameaças já eram comuns. Os jovens, no fim, eram vistos como as pragas de uma plantação, como infectados por uma doença.

    Quem combatia o que era visto como praga, doença, era a cura, ou pelo menos assim se exaltavam. Viam-se como os anticorpos no combate a ideologia que crescia no país. Os defensores da democracia. Desprovidos de ideais políticos externos. De novo, assim se viam. Isso é afirmado na primeira cena do filme, quando ocorre um monologo sobre o crescimento do socialismo em um encontro de militares. Demonizam a ideologia e buscam maneiras de poda-la. Controle dos jovens, repúdio aos intelectuais. O que se segue é a demonstração dos sentimentos fervorosos da população, seus comportamentos. Como os grupos se comportam perante seus diferentes. Z chega no país para comparecer a um comício em meio a uma enorme briga entre grupos e com presença da polícia. É na saída desse evento que sofre o atentado. O que ocorre depois são reações e investigações. Tentativas de transformá-lo em mártir e tentativas de calunia-lo.

    A maneira que lidam com a relação massa, imprensa e governo se faz pela tentativa de controle da primeira, sempre. A imprensa segue as ordens do governo e não busca iniciar rebeliões, exceto por um jornalista investigativo que deseja montar o quebra-cabeça para publicar no jornal. Há também o personagem do promotor pragmático, que muitos apontam como verdadeiro protagonista. Segue somente fatos que se depara na investigação, ainda que seja afetado pela suspeita e repulsa perante o que puder identificar como comunismo. Esses dois não são tão vistos como personagens quanto são como conceitos, mas encaixa. Os outros personagens se dividem entre o grupo socialista de Z, sentimental e intenso; os militares, contidos e frios; assassinos e contratados avulsos.

    Z-31

    A montagem do filme é uma qualidade de destaque, especialmente pela rapidez e intensidade das informações que lida com precisão e agilidade, ainda que com problemas de continuísmo perdoáveis devido a grandeza do filme. Fatos se aceleram em cortes rápidos e a memória de personagens também, em uma forma não linear, o que torna impactante para o telespectador. Rende também um ritmo fluido ao filme, até mesmo quando confrontando os opostos entre os personagens. A câmera se movimenta pelo meio dos personagens e de suas dinâmicas bem atuadas em takes que podem ser considerados longos para o padrão, somado a frames bem compostos e por vezes carregados de simbolismo e significado. A trilha sonora apresenta um ar quase cubano, com seu violão fervoroso e emocional, exagerado.

    Z se demonstra um filme ainda atual, principalmente para países que enfrentam momentos como o Brasil. Levantes de conservadores por medo dos avanços progressistas. Mais do que nunca é a hora de entender e compreender o contexto, entender como melhor lidar e como evitar o aproveitamento por parte de forças ocultas, que não precisam ser necessariamente os militares, mas o sentimento de retrocesso, sentimento de desumanidade. Não importa o quão desolador pareça o momento, deve-se exaltar e sentir a humanidade. Deve-se sentir o pesar daqueles que não escolheram, no seu tempo, o lado fácil da história. E continuar.

    O coração não quer parar. Ele bate.

    Ele vive.

    Texto de autoria de Leonardo Amaral.

  • Crítica | Fahrenheit: 11 de Setembro

    Crítica | Fahrenheit: 11 de Setembro

    Fahrenheit 11 de Setembro 1

    Mergulhando ainda mais no estilo documental que emula o jornalismo gonzo de Hunther Thompson, após dois anos do recolhimento de louros por Tiros em Columbine, Michael Moore apresenta uma faceta muitíssimo cômica da vida política estadunidense, começando a esmiuçar a controversa e duvidosa subida ao poder no ano de 2000 por parte de George W. Bush, uma questão mal explicada – ou nada explicada – até a atualidade, com toda a polêmica posterior que envolveria também a posição de Al Gore como vice-presidente do país. A alegação de que toda aquela movimentação seria um sonho fazia da fantasia uma boa medida de escape, ante uma realidade insana o suficiente para ser desacreditada.

    A cena ocorrida dentro da casa da lei, onde os senadores afro-americanos falam e tentam o apoio dos seus colegas, sem sucesso, é tão inapelável que mais parece um ato encenado, dada a completa ignorância que todos os opositores sofrem, mesmo com a clara manipulação de assinaturas. O desconforto ganharia as ruas, W. Bush não conseguiria sequer fazer a caminhada pela posse até a Casa Branca, dada a presença do povo na rua protestando contra ele. Toda esta movimentação ocorrendo após a declaração da Fox News, contestabilíssima, de que ele havia vencido na Califórnia, conquistando então a maioria dos colégios eleitorais.

    O retrato de cowboy, descerebrado, é arquitetado nos primeiros 12 minutos do longa de Moore, tudo para fazer crer que o político era na verdade um fantoche, parte de todo o circo midiático que fazia do público massa de manobra, acreditando que seu presidente não teria muitas diferenças entre eles. Um autêntico boi de piranha para interesses de mandatários mais poderosos. O encerramento da construção deste arquétipo é pontuado por um ensaio em frente a tela, onde Bush e outros parlamentares se maquiam frente às câmeras, emulando a falsidade de suas feições e expressões, igualando-as de seus discursos falaciosos e vazios.

    O artifício usado pelo realizador para desmascarar ainda mais a possibilidade de farsa do republicano foi um evento em uma escola, após o atentado de 11 de setembro, onde Bush teve imposto, por si e pelos assessores um ensurdecedor silêncio de sete minutos, diante de câmeras inclusive, possivelmente refletindo sobre a quantidade de acordos comerciais que ele, pessoa física e sua família, incluindo George Sênior, também ex-presidente, tinham com o clã dos Bin Laden, que tinha em Osama um dos seus principais suspeitos, sendo amputado a culpa quase automaticamente.

    O destaque que o documentarista dá a multiplicidade de discursos midiáticos – da faceta mais podre e manipulatória possível – é ímpar, pois destaca a alienação que a população tem ao ingerir palavras oficiais tão ambíguas, de que os inimigos existem e querem o sangue inocente, e de que deve o cidadão comum curtir suas férias sem maiores preocupações. O tratamento a base de sofismas é exibido de modo categórico, e no qual Moore acaba por destacar a maior isenção possível dentro da fita, não narrando as falas mais desavergonhadas, de pura manipulação midiática exercida sobre o povo.

    A ironia nada fina de Moore chega a ser rude, ao comparar a paranoia do cidadão médio americano a um comportamento baixo e egoísta, capaz de denunciar um vizinho pelo simples fato dele discordar da postura presidencial de avanço rumo à exploração do petróleo do Oriente Médio, além de tratar grupos de discussão, desde os mais simples, como potenciais terroristas. As táticas esdrúxulas de cerceamento de liberdade também são flagradas, como a proibição de viajar com leite materno, mas com isqueiros e caixas de fósforos liberados, mesmo em voo. A contradição não é perdoada pela fala ferina do cineasta.

    Mas não há somente cinismo na fala do realizador, há também uma profunda compaixão aos moradores de cidades menos abastada de dinheiro, que veem no ingresso ao exército a possibilidade de ascensão social. A investigação dentro do corpo de alistados é municiada por argumentos e falas completamente soltas, onde os alistados falam livremente, deixando ao público claro o nível de desinformação geral e claro, levando o espectador a possivelmente aderir à ideia do idealizador de Fahrenheit.

    Cada meandro, cada detalhe e cada close que Moore flagra serve para provar o seu ponto, gritando aos quatro cantos do mundo a quantidade de injustiças e contradições do modo belicoso como os republicanos governam seu país e o quão prejudicial é sua política externa. O modo como ele aborda o causo é bem menos sensacionalista do que em Tiros de Columbine, mais moderada e amadurecida, mas prossegue tenaz e inconspícua, sem medo de reabrir feridas ou de sofrer perseguição, sem receio de parecer exagerado sequer nas cenas em que apresenta os mutilados; claro, em cenas de forte cunho visual, que visavam aterrorizar a audiência, tanto quanto a política atormenta os concidadãos norte-americanos.

    No final apelativo, Moore se dedica a entregar panfletos aos congressistas, para que eles possam alistar os próprios filhos. O argumento comumente usado – e achincalhado – dito por bocas direitistas é como um mergulho ao mundo dos conservadores, que tem o intuito de resgatar os corações e mentes daqueles que não conseguem ver na política expansionista de Bush e companhia um problema tão grave e real quanto o é, e ao menos nesse ponto o documentarista acerta exatamente na verve, sem chance alguma de argumento contrário, utilizando as armas de seus rivais para fazer valer seus próprios pontos de vista. Em uma perversão que acalenta a vergonha do político-alvo, destacando o modo grotesco como tudo foi arquitetado.

  • Crítica | O Capital

    Crítica | O Capital

    O Welfare State surgiu em meados de 1942, na Grã-Bretanha, mas passa por um forte desenvolvimento após a Segunda Guerra Mundial também nos EUA e boa parte da Europa Ocidental, sendo um modelo exportado pelo mundo todo. O Welfare State, ou Estado de Bem-estar Social, ficou conhecido por ser uma medida de política pública intimamente relacionada às áreas de direitos sociais, além de intervir diretamente na política econômica de seus Estados de modo a assegurar uma regulamentação dos capitais a fim de realizar uma tentativa de diminuição das desigualdades sociais.

    Difícil conceber a razão da criação desse tipo de política pública, que é atualmente uma das bandeiras levantadas por boa parte dos partidos de esquerda, por governos declaradamente capitalistas. Talvez tenha sido motivada por razões altruístas, ou mais provavelmente, pela tensão política causada pelos sindicatos e pela crescente ascensão do Socialismo na Europa Oriental. Ocorre que, nos anos 1970, esse modelo político passa a entrar em colapso, e os governos de Margaret Thatcher e Ronald Reagan representam o desmonte histórico do sistema, seguidos por regimes de outros países, dando lugar ao neoliberalismo e sua campanha contra o intervencionismo estatal.

    O Capital, de Constantin Costa-Gavras, não trata necessariamente deste período histórico, mas um pouco adiante, já que o filme se passa durante o clima de crise europeia, ainda vivido, fruto do neoliberalismo que colhemos diariamente. O cineasta mais uma vez se mostra incisivo, e até mesmo obsessivo (ainda bem), em retratar o poder político, uma assinatura temática de sua filmografia. Aqui, Gavras constrói – para em seguida desconstruir – o complexo modelo reestruturado do Capitalismo e a barbárie social e financeira causada por ele.

    O longa se inicia com uma partida de golfe; de modo metafórico, o diretor dá sinais do que veremos adiante, e claro, do que vemos cotidianamente no mercado financeiro: um jogo. Gavras repetirá isso dezenas de vezes ao longo do filme através de figuras metafóricas, mas não à toa isso ocorre de maneira brilhantemente colocada pelo diretor ao explicar a lógica do jogo do capitalismo globalizado.

    Marc Tourneuil (Gad Elmaleh) é um escritor e homem de confiança do então presidente de um dos maiores bancos da Europa, que o considera talentoso para assumir a presidência em seu lugar após descobrir-se acometido de câncer nos testículos. Tourneuil assume, mas sua nomeação é temporária, já que o conselho quer usá-lo apenas como marionete para uma verdadeira transição e que ajudará o banco a sair da crise em que se encontra. Dali em diante, veremos a rápida ascensão de Tourneuil como banqueiro e sua decadência moral advinda de suas escolhas. Sua ambição maquiavélica pelo poder e dinheiro, como uma tentativa de obter respeito pelos seus pares, denota a importância do dinheiro no mundo atual, o que fica claro em um dos diálogos da personagem com sua esposa; ao ser indagado sobre o que quer, ele diz apenas que deseja o dinheiro para ser respeitado, pois quanto menor o salário, menor o respeito. Observação dura, mas facilmente vista em nossa sociedade do consumo.

    As pérolas metafóricas espalhadas por Gavras demonstram um pouco do pensamento do autor, ou seria mera coincidência o afastamento do antigo presidente em decorrência de um câncer nos testículos? Claro que não. A esterilidade do ex-presidente é também a esterilidade do mercado de capital. A perda de virilidade é a crise e a ruína desse modelo político. Não à toa, essa mensagem é reforçada através de relações humanas artificiais mostradas no filme, ou o desejo não consumado de Marc pela modelo.

    Em contrapartida, Gavras mantém uma visão bastante pessimista quanto a essa possível ruína do capital financeiro, o que deixa claro, inclusive, na escolha do nome do banco: Phenix. Assim como o capitalismo, que sempre se renova, para o bem ou para mal. Ainda assim, o cineasta greco-francês não deixa de realizar suas críticas e colocar o dedo na ferida, indo ao cerne do mundo político e econômico, retratando a desfaçatez desse mundo ao utilizar os ensinamentos da figura do líder socialista chinês Mao Tse-Tung como estratégia para realizar uma demissão em massa e ainda aumentar os lucros do banco. Uma completa inversão de valores.

    O Capital é uma leitura esmiuçada sobre os aspectos perversos do neoliberalismo. A síntese desses males é bastante clara em dado momento, quando o tio do protagonista questiona: “Seu banco obtém benefícios e você demite as pessoas. Como lida com isso?”, ao que Marc diz: “Muito mal, tio. O Banco estava afundando. Tive que salvá-lo. E tive que despedir para salvar 100 mil empregos.” A indignação de seu tio explode, e ele responde: “Não me venha com isso. Cansei de ouvir isso. Vocês sangraram as pessoas três vezes: primeiro, a bolsa quer sangue. Você realoca, funcionários perdem emprego; segundo, você os sangra como clientes; terceiro, pressiona os Estados endividados e quem paga é o cidadão. E como o funcionário é cliente e cidadão, você o fode três vezes. O dinheiro contamina tudo.”

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  • Crítica | Ação Entre Amigos

    Crítica | Ação Entre Amigos

    O método de edição escolhido por Mingo Gattozzi demonstra como Ação Entre Amigos é diferente dos seus pares, já que seus créditos iniciais são exibidos como se fossem parte do relatório de uma das autoridades militares que estavam no poder em 1971. O filme é construído como um episódio antigo, mas é abordado de uma forma vanguardista, ao contrário do resto da iconografia típica do cinema brasileiro dos anos 90.

    O presente mostrado em tela apresenta um grupo de amigos de meia-idade, já em uma fase decadente de suas vidas, relembrando momentos dos seus melhores dias, quando as ideologias eram muito mais presentes em suas ações, do que em suas idéias. A reunião é convocada por Miguel (Zé Carlos Machado), que teria descoberto um antigo torturador do seu grupo revolucionário, 25 anos após o aprisionamento dele e dos seus.

    Miguel tem seu grito abafado por seus amigos, que ou não acreditam no fato do sujeito ainda estar vivo, uma vez que os jornais noticiaram a sua morte, ou não querem remexer em todo o passado, arriscando-se mais uma vez, já que a o peso da idade e da maturidade os obriga a pensar de modo menos instintivo e mais racional. A revolta toma Miguel, que não consegue esquecer o que sofreu, nem se conformar com isso, possivelmente até cedendo à paranoia típica dos anos de chumbo.

    O extremismo dos ativistas é discutido no núcleo dos anos setenta. Lúcia (Melina Anthís) tenta convencer seu parceiro sexual de parar com a luta armada e resolve fugir com Miguel, ainda jovem (encenado por Rodrigo Brassalto), já que ela espera um bebê dele. O aborto para ela é um preço demasiadamente alto a pagar, mesmo com a luta e com a revolução que eles tencionavam instaurar a qualquer custo. Com alguns pontos semelhantes ao raciocínio sofista, os guerrilheiros normalmente não se envolviam com seus colegas exatamente para não cair na tentação de abrir mão da revolução.

    Em 1996, Miguel segue com as suas suspeitas e, em uma reunião com seus três amigos, mostra os dados que reuniu, sendo mais uma vez  demovido de suas ideias. Em uma pescaria, ele resolve parar um instante para verificar o túmulo do sujeito e de sua esposa. Os membros do grupo, já adultos, têm a calvície em comum, exceto – obviamente – Miguel, talvez em uma referência visual à rebeldia e juventude ainda presentes na vida do personagem, enquanto os outros se permitiram envelhecer, tentando apagar de suas identidades as marcas da dor e do cárcere a que foram submetidos.

    Como era de se esperar, o líder do grupo estava certo, descobrindo o paradeiro do ex-militar, que é pego em uma rinha de galo, um dos seus muitos pecados antigos. Os quatro encontram a propriedade do sujeito, um lugar enorme, fruto do sangue de muitos dos ativistas, onde vive com uma identidade nova. O revanchismo dentro do grupo era muito mais pessoal que político, movido pela emoção e com a mesma animosidade que os impedia de traçar um plano à prova de falhas.

    O quarteto se divide, e somente três vão atrás do objetivo. O acerto de contas com o aposentado senhor ocorre sob protestos do idoso soldado, que declarava que aqueles eram tempos de guerra. Essa era mesma fala dita nos anos setenta, quando suas atitudes eram extremas, o que, claramente, não justifica o que ele fez a Miguel e aos outros.

    O sentimento de vingança do protagonista o faz ficar cego e ir atrás do suposto delator. A sede de justiça passa dos limites, fazendo-o atentar contra o covarde que os deixou. O roteiro de Marçal Aquino, Brant e Renato Ciasca acaba trágico, validando até alguns dos pontos do acordo de anistia, que obviamente precisava ser revista, mas que tem pontos cruciais para as resoluções dos problemas do grupo. Beto Brant não tem qualquer receio em demonstrar suas influências estilísticas estrangeiras de Quentin Tarantino, Martin Scorsese e Michael Mann. Em seu drama, é aventando o ódio desmedido, tão perigoso quanto a omissão e a falta de coragem de abrir os inconvenientes segredos pecaminosos entre os ditos amigos. Um thriller repleto de ansiedade, cujo fôlego impressiona por não se perder em nenhum momento.

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  • Crítica | Tudo pelo Poder

    Crítica | Tudo pelo Poder

    Pouco depois do início de Tudo pelo Poder, o personagem Tom Duffy (Paul Giamatti) tenta convencer Stephen Meyers (Ryan Gosling) a mudar de lado na campanha das primárias para escolher o futuro candidato democrata às eleições presidenciais dos Estados Unidos.

    Ambos trabalham para concorrentes dentro do mesmo partido. Impressionado com o carisma do jovem e ambicioso assessor interpretado por Gosling, Giamatti quer contratá-lo a todo custo e, para isso, argumenta que o candidato de quem o jovem é empregado dificilmente vai vencer a disputa.

    “Não posso aceitar a oferta”, recusa o assessor. “Trabalho para Mike Morris (George Clooney). Acredito nas propostas dele. Acredito que ele realmente pode fazer diferença na vida das pessoas. E, além do mais, ele é meu amigo”.

    A resposta do personagem de Giamatti – na forma de uma pergunta – não poderia ser mais direta: “Você quer trabalhar para o seu amigo ou para o futuro presidente?”. A fagulha que incendeia a ambição e a vaidade de Stephen Meyers é lançada aí. As chamas desses sentimentos vão se espalhar e virar sua vida do avesso.

    Na verdade, esse exercício de retórica apenas abre espaço para o assunto sobre o qual George Clooney – que dirige o filme e também interpreta o candidato Mike Morris – quer colocar sua lente de aumento: a perda definitiva da inocência. O personagem de Gosling não é bobo. Sabe que está num jogo. Que todas as palavras de cada discurso, entrevista ou debate são fundamentais para que seu candidato chegue à vitória. No entanto, percebemos que ele possui uma visão limitada da máquina monstruosa da qual faz parte. A realidade é percebida por um filtro de credulidade devotada a seu chefe. Um grande erro, sem dúvida.

    Em pouco tempo, entretanto, ele vai aprender da pior maneira que, dentro do jogo político, não há espaço para sentimentos. Não há espaço para falhas. E também não há espaço para deslealdades, como o chefe da campanha de Clooney, interpretado por Philip Seymour Hoffman, o lembra num momento crucial do filme.

    As campanhas estão acima de tudo. E mesmo supostos inquebráveis laços de amizade podem ser partidos sem maiores preocupações em favor da vitória do candidato defendido. Isso fará toda a diferença ao longo da trama. A inocência do personagem principal será arrancada pedaço por pedaço de forma impiedosa.

    No começo da história, os dois candidatos democratas disputam as primárias no estado de Ohio. A conquista do apoio de um senador de posições radicais é fundamental para saber quem será o vencedor. Clooney, apesar dos esforços de seus dois assessores principais para convencê-lo, não está disposto a aceitar.

    Gosling o olha com respeito e admiração.

    No entanto, o envolvimento romântico que ele terá com a estagiária interpretada por Evan Rachel Wood vai lhe colocar em contato com o choque de realidade que despedaçará sua visão idílica dos fatos. Seus olhos serão abertos à força. Mesmo ídolos aparentemente perfeitos possuem máculas. Algumas delas, bem graves.

    Não há heróis em “Tudo pelo Poder”. Mesmo o protagonista é capaz de mudar radicalmente de posicionamento quando está de posse do principal segredo do enredo. Tudo para obter uma vantagem. Suas convicções iniciais, outrora defendidas com tanta veemência, são descartadas por ele mesmo sem maiores traumas. A mudança de posicionamento é valorizada pela interpretação de Ryan Gosling – a partir desse ponto, sua postura física e olhar mudam visivelmente.

    O diretor faz uma apropriação de termos usados durante a disputa da última eleição para a Casa Branca. O termo “socialistas” usado pelos Republicanos – principalmente pela então candidata à vice-presidência Sarah Palin – para se referirem aos democratas está lá. Até mesmo o “We are ready to lead” proferido por Obama encontrou eco no personagem no representado por Clooney. A incorporação de um dos fatos mais marcantes da gestão Bill Clinton também é visível no roteiro. É impossível não notar a influência de cineastas proeminentes no cinema norte-americano nos anos de 1970, como Norman Jewison e Alan J. Pakula, na estética adotada por Clooney.

    A composição é limpa. Seus planos, na maioria das vezes, são estáticos. A ênfase não é no trabalho de movimentação de câmera, mas na interpretação dos atores. Coerente, uma vez que o próprio Clooney é um ator. Preferências estéticas que já haviam sido evidenciadas em seus trabalhos anteriores: “Confissões de Uma Mente Perigosa” e “Boa Noite e Boa Sorte”.

    Ainda sobre a composição de “Tudo pelo Poder”, os personagens são reduzidos quando comparados ao ambiente que os cerca. O homem aparece sempre pequeno diante de grandes prédios, palcos e salões. A metáfora é clara: dentro da política, o indivíduo é minúsculo. Apenas uma peça frente aos interesses e poderes que o sobrepõem largamente.

    Além disso – e mais uma vez volto a Pakula – luz e sombra são definidos claramente. Em boa parte das cenas, dentro do mesmo quadro, há espaços iluminados e outros sombrios. É o simbolismo do homem dividido entre a luz e a sombra. E que, no final, descobre de forma dolorosa que ter uma visão dualista da vida – e mais especificamente dos bastidos res da política – pode ser limitante e perigoso.

    Vivemos num grande cinza. E na luta pelo poder político, esse cinza é ainda mais intenso. George Clooney sabe disso. Nós deveríamos, também.

    Texto de autoria de Carlos Brito.

  • Crítica | Tropa de Elite 2: O Inimigo Agora É Outro

    Crítica | Tropa de Elite 2: O Inimigo Agora É Outro

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    Demorei cinco “longos dias” para juntar coragem em entrar numa sala de cinema que tivesse o cartaz do novo filme de José Padilha. Tentar anestesiar o monstro da ansiedade sobre o que esse diretor traria talvez tenha sido o motivo dessa minha letargia inicial.

    Vacinado com o modismo que se apropriou, no primeiro filme do BOPE e de seu fictício capitão, não me permitia acreditar nos (até o momento deste post) mais de 2 milhões de espectadores que foram, antes de mim, dar os olhos à surpresa das novas agressões que Padilha nos traria dessa vez.

    Mais que números e toda sorte de merchandising pós-filme-febre, minha reserva em ser levado pelas massas estava direcionada à dúvida sobre como os responsáveis pelo longa desenvolveriam ainda mais uma história que, desde o documentário Ônibus 174 já estava lustrada o suficiente para mostrar outros personagens que não apenas a díade de mocinhos e bandidos: nós próprios, “cidadãos de bem”, em nossa cativa passividade. Como, nessa sequência, o BOPE poderia ser mais “dissecado” do que fora anteriormente? Haveria um novo banho de sangue? Conheceríamos um novo repertório de palavrões e frases de efeito, entre fanfarrões e pedidos para sair? O que Padilha, agora associado a Mantovani (um dos nomes por trás de Cidade de Deus) teriam preparado para nós?!

    Quando a tela do cinema focou no filme, deixando para trás toda propaganda barata e efêmera, essa que pinta uma realidade rósea, bombardeando nossos sentidos dia a dia, foi projetada uma frase, que além de contrastar com o cenário habitual e comercial descrito neste parágrafo, colocava em transe não só o que as milhões de pessoas veriam a seguir, mas o próprio contexto social e político-eleitoral latente, porta do cinema afora:

    “Qualquer semelhança com a realidade é apenas uma coincidência. Essa é uma obra de ficção.”

    Pois, a “ficção” que ali se desenrolava trazia um problema de coordenação à dinâmica de quem a assistia: pensar sem respirar.

    Refletir sobre um Estado que, ao invés de coibir a violência e todos os seus derivados, está engendrado a estimulá-la por suas próprias instituições, no filme representadas pelo Poder Judiciário, na “idônea” polícia militar fluminense (tal qual aconteceu no primeiro filme), já era mote esperado nesta sequência. Contudo, Padilha fez mais: desdobrou a corrupção aos quinhões dos Poderes Executivo (representados na figura de um Governador inexistente e de um Prefeito estético e estático) e Legislativo (capaz de acomodar as mais caricatas figuras ao corpo dirigente, de um apresentador televisivo sensacionalista a um palhaço iletrado. Opa, perdão, não há palhaço iletrado na “ficção” de Padilha).

    A trama que o roteirista e diretor fez questão de mapear como irreal mostra um período posterior à saga do primeiro filme, mas que corresponde à nossa atualidade, onde o crime na “Cidade Maravilhosa” teria sido desorganizado pelo BOPE, agora mais estruturado e com maior campo de ação no combate à criminalidade carioca. Contudo, no vácuo desse poder paralelo, então supostamente erradicado, outra fonte de poder se apossou dessas fronteiras periféricas: as milícias. Constituídas e aparelhadas por policiais e políticos, fazendo com que a elite da tropa, representada na figura do, ainda, arrogante, inflexível, bad-ass-motherfucker e, acima de todas as demais características, determinado Nascimento. Esse que, de Comandante Geral do Bope à Sub Secretário de Inteligência, percebe a complexidade do sistema corrupto que assola nosso País e sua incapacidade de modificá-lo pelas vias “legais e pacíficas”.

    Os atores que dão personalidade aos personagens “cumprem a missão dada”. Enquanto Wagner Moura ratifica o principal personagem de sua talentosa carreira, Milhem Cortaz e André Ramiro mantém a maturidade de suas interpretações e reavivam a nostalgia dicotômica de seus personagens: a volta do malandro (tipicamente brasileiro) Capitão Fábio, contrastando com a severidade e disciplina militar de André Mathias. Somando esses altos patamares, outros personagens menores recebem nomes e interpretações muito além do que se esperaria desses na trama. Destaques que faço às representações de Antré Mattos, como o típico político que temos escolhido, Seu Jorge, num “Zé Pequeno” amadurecido e Irandhir Santos, que de figura secundária conseguiu elevar seu personagem a um embate paralelo na trama com Wagner Moura: as duas facetas (ou as “Duas-Caras”) da justiça.

    O desafio de respirar (asfixiado por um saco, parágrafos atrás) foi a acrobacia que todo espectador teve de realizar para refletir enquanto era esbofeteado por uma produção cara, importada e refinada, com direito a tomadas aéreas ausentes no primeiro filme, câmera dinâmica nas cenas de ação, roteiro truncado entre quem morria, como falecia e os porquês de cada “baixa”, uma fotografia propositalmente crua, oscilando entre cores fortes nas dependências abastadas, oficiais e, claro, no sangue jorrado, contrapondo com a opacidade desbotada da miserabilidade e condição rudimentar das comunidades.

    A edição, ainda que sem ineditismo algum em relação ao primeiro filme (iniciando um pouti-porri de cenas do primeiro e sucedido por uma apresentação que, tal qual em Cidade de Deus ou no primeiro Tropa, estampava uma cena-chave complementada e explicada ao longo da história), dá ritmo aos nossos fôlegos, de forma inteligente a cada salto da atividade profissional de Nascimento, assim como a cada tropeço na relação desse com seus entes: filho, ex-esposa e Mathias.

    A trilha sonora não se mostrou impactante como no primeiro. Fixar o grupo Tihuana na música tema, ainda que em nova versão, foi um voto pela preservação de uma imagem que já fora construída, assim como optar por um repertório bem conhecido entre faixas e artistas, caso de Paralamas, Marcelo D2 etc. Ademais, os efeitos sonoros ficaram bem alinhados com as cenas de ação.

    Extasiado, vi as cenas aéreas e audaciosas (não tecnicamente) finais desse filme cru, cruel e NADA fictício, com certo otimismo. Não se tratava de esperança nos dirigentes de nosso País que, ao meu ver, já estão de “pomba-gírice” há muito tempo, mas sobre o futuro da mensagem de Padilha que, tal qual fazia Sérgio Bianchi em seus filmes, mas sem arrebatar milhões de expectadores, novamente nos coloca em xeque:

    Se nada acontecer para mudar o cenário cancerígeno de nossos sistemas político e social, fodeu para todos nós. E, parafraseando Capitão Fábio (o modelo de nossa brasilidade), se “quer me foder? Então me beija!”

    Texto de autoria de Luciano Francisco.